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Docência para o Ensino Superior

CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO E TEORIAS DA


APRENDIZAGEM APLICÁVEIS AO ENSINO SUPERIOR

Valéria Aparecida de Souza Siqueira


Edna Barberato Genghini

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SIQUEIRA, Valéria Aparecida de Souza
GENGHINI, Edna Barberato

Construção do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem


Aplicáveis ao Ensino Superior (livro-texto) / Valéria Aparecida de
Souza Siqueira; Edna Barberato Genghini – São Paulo: Pós-
Graduação Lato Sensu UNIP, 2019.
81 p.: il.

1. Conhecimento. 2. Aprendizagem. 3. Docência. 4. Ensino


Superior. Pós-Graduação Lato Sensu UNIP. III. Docência para o
Ensino Superior.
Construção do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem aplicáveis ao
Ensino Superior

Professor Conteudista
VALÉRIA APARECIDA DE SOUZA SIQUEIRA, Doutora em Educação pela
Universidade de São Paulo (2017). Possui Mestrado em Educação pelo Centro
Universitário Moura Lacerda (2012). Licenciada em Pedagogia
por essa mesma instituição (2009). Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas
em Avaliação Educacional - GEPAVE, na Faculdade de Educação da USP. É
professora em cursos de Pedagogia (presencial) e de Pós-Graduação (EAD). Foi
consultora externa do INEP/MEC: Elaboração de Sentenças Descritoras e
Comentários Pedagógicos de Itens. Atuou como Pesquisadora da Fundação para o
Desenvolvimento da UNESP (FUNDUNESP), por meio do Projeto de Avaliação do
Programa Melhor Gestão, Melhor Ensino. Desenvolve pesquisas na área de
Educação relacionadas aos temas Avaliação Educacional, Política Educacional,
Currículo e Formação Docente. Trabalhou como formadora de professores na área de
avaliações externas em Projetos como Educa Brasil (Editora do Brasil), Excelência
com Equidade (Fundação Lemann) e Programa Mais Educação São Paulo (SME-SP).

Professora Colaboradora/coordenadora:
EDNA BARBERATO GENGHINI, Professora Universitária desde 2002. Atualmente
no exercício da função de Coordenadora para todo o Brasil de três cursos ao nível de
Pós-Graduação Lato Sensu: em PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL, DOCÊNCIA
PARA O ENSINO SUPERIOR e em FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA,
pela UNIP - UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP/EaD, onde também atua como
Professora Adjunta, nas modalidades SEI e SEPI. É Diretora e Psicopedagoga da
MENTOR ORIENTAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA LTDA. ME desde 1991. Possui
graduação em Economia Doméstica - Faculdades Integradas Teresa D'Ávila de Santo
André (1980), graduação em Pedagogia pela Universidade Guarulhos (1985), Pós-
graduação em Psicopedagogia pela Universidade São Judas (1987), Mestrado em
Ciências Humanas pela Universidade Guarulhos (2002) e pós-graduação Lato Sensu
em Formação em Educação a Distância pela UNIP - Universidade Paulista (2011). É
autora e coautora de livros Textos para os cursos de Pós-Graduação Lato Sensu em
Psicopedagogia Institucional, Docência para o Ensino Superior e Formação em
Educação a Distância da UNIP - EaD. Áreas de Interesse: Neurociências - Educação
Inclusiva - Psicopedagogia Clínica e Institucional - Formação e Gestão em Educação
a Distância - Formação de Docentes para o Ensino Superior.
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 05

INTRODUÇÃO 06

Unidade I: TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO E SEUS EFEITOS E/OU POTENCIALIDADES


NO PROCESSO DE ENSINO/APRENDIZAGEM 08
1.1 Teoria Inatista no campo educacional 09
1.1.1 Teoria Inatista e suas implicações no ensino superior 10
1.2 Teoria do comportamento: o Behaviorismo 11
1.2.1 Teoria behaviorista e suas implicações no ensino superior 15
1.3 Teoria interacionista no campo educacional 16
1.3.1 Teoria interacionista e suas implicações no ensino superior 18
1.4 Considerações Finais 21

Unidade II: PROCESSOS DE ENSINO/APRENDIZAGEM NO ENSINO SUPERIOR:


SEMELHANÇAS E DISTANCIAMENTOS EM RELAÇÃO AO ENSINO NA
EDUCAÇÃO BÁSICA 25
2.1 Teoria Construtivista de Piaget e sua aplicabilidade no ensino superior 26
2.2 Estágios de desenvolvimento e ciclos de vida: a adequação a cada faixa etária 31
2.3 A valorização e utilização do conhecimento prévio dos alunos do ensino superior como
alavanca para a construção do conhecimento 35
2.4. Considerações Finais 39

Unidade III: ABORDAGENS TEÓRICO-METODOLÓGICAS COMO CONTRIBUIÇÃO PARA


A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DISCENTE NO ENSINO SUPERIOR 43
3.1 A Neurociência e os aspectos cognitivos do adulto 43
3.2 Aprendizagem Significativa e Inteligências Múltiplas 48
3.3 Taxonomia de Bloom e a mobilização de processos cognitivo 53
3.4 Considerações Finais 58

Unidade IV: MUDANÇA DE COMPORTAMENTO DISCENTE: PROFESSOR MEDIADOR E A


TRANSFORMAÇÃO DOS PROCESSOS DE APRENDIZAGEM DISCENTE 62
4.1 A Pedagogia de Resolução de Problemas como aliada à construção do conhecimento do
aluno adulto 62
4.2 Aprender praticando: desenvolvimento de habilidades a partir de sua mobilização 66
4.3 O espaço da interação planejada na sala de aula de um professor interacionista 71
4.4. Considerações Finais 76

REFERÊNCIAS 80
APRESENTAÇÃO

Olá, caríssimo(a) aluno(a)!

Seja bem-vindo(a)!

É com muita satisfação que juntos começamos mais um caminho de


descobertas!

Neste material você vai encontrar os conteúdos referentes à disciplina


Construção do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem aplicáveis ao Ensino
Superior. A disciplina versa sobre as principais teorias de aprendizagem que
explicaram o desenvolvimento humano ao longo da história.

É de fundamental importância para o exercício docente no Ensino Superior que


se conheça as linhas de pensamento que embasaram as correntes pedagógicas no
Brasil e no mundo ao longo do século XX até a atualidade.

Tais correntes representam o eixo que norteia o fazer docente; conhecer sua
evolução até a corrente interacionista vigente contribui para uma prática reflexiva que
tome o aluno como protagonista em seu processo de aprendizagem.

Está preparado(a)?

Então, vamos começar!!

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INTRODUÇÃO

O fazer do professor não se dá em campo neutro, desprovido de significados,


ao contrário, representa uma visão de mundo e como tal, representa uma ação que
se apoia em concepções que, por sua vez, se fundamentam em valores e teorias.

Grandes teorias ao longo da história pavimentaram essa prática com


repercussões na trajetória de alunos. As principais teorias foram o Inatismo, o
Behaviorismo e o Interacionismo. O objetivo deste livro-texto, da disciplina Construção
do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem aplicáveis ao Ensino Superior do Curso
de Pós-Graduação DOCÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR é apresentar os
principais fundamentos de cada teoria, nos detendo com mais atenção às inúmeras
oportunidades da teoria interacionista vigente com destaque para seus benefícios
para o aluno do Ensino Superior.

Dividimos o livro em quatro unidades sequenciais. Em cada uma você poderá


conhecer as características de cada corrente teórica que explica o desenvolvimento e
compreende-las no âmbito do Ensino Superior.

Vamos a elas:

Unidade 1 – Teorias do desenvolvimento e seus efeitos e/ou potencialidades


no processo de ensino/aprendizagem

Unidade 2 – Processos de ensino/aprendizagem no ensino superior:


semelhanças e distanciamentos em relação ao ensino na educação básica

Unidade 3 – Abordagens teórico-metodológicas como contribuição para a


construção do conhecimento discente no ensino superior

Unidade 4 – Mudança de comportamento discente: professor mediador e a


transformação dos processos de aprendizagem discente

Veja que, ao abordarmos as teorias de desenvolvimento, ao mesmo tempo


discutiremos o papel do professor e do aluno, sujeitos do processo de
ensino/aprendizagem e como tal, indivíduos situados histórica e socialmente, agentes
de um processo em constante transformação.

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Veremos que as visões Inatista, Behaviorista e Interacionista trazem consigo
uma dada imagem do que seja aluno e professor, com repercussões importantes
sobre o trabalho docente e sobre a trajetória discente, o que pode potencializar ou
inibir o desenvolvimento deste último.

Nesse sentido, conheceremos as características das teorias que influenciaram


e ainda influenciam os processos escolares, explorando as possibilidades de
transformação da prática docente no ensino superior nos detendo mais precisamente
sobre a formação de professores que atuarão na docência do ensino superior.

Entenderemos, por exemplo, que a visão que concebe o saber como um “dom”
torna-se seletiva, na medida em que pressupõe que as habilidades estão com o aluno
desde o seu nascimento e que, em se tratando de “dom”, uns têm outros não. Platão,
por exemplo, foi o primeiro Inatista de que se tem notícia ao distinguir os indivíduos
em habilidades desde o seu nascimento, classificando-os em “almas” de bronze, prata
e ouro. Essa concepção influenciou os processos escolares, uma vez que projeta uma
dada imagem de aluno.

Da mesma forma, o olhar de um professor, cuja visão de mundo se apoia no


Behaviorismo, repercutirá nos processos de ensino/aprendizagem os quais conduz
influenciando o percurso escolar de seus alunos repercutindo na trajetória dos
mesmos. Uma postura que orientou, sobretudo, a chamada “escola tradicional”. Ao
final do século XX, entretanto, teóricos da corrente Interacionista revolucionaram o
ambiente escolar com forte apelo sobre o papel ativo do aluno sobre o conhecimento.

Veremos que expoentes representantes de tal corrente como Piaget e Vygotsky


apresentam conceitos semelhantes, mas também divergentes quando o assunto é o
papel do meio sobre o desenvolvimento do sujeito.

Entenderemos que, para a teoria Piagetiana, os estímulos do ambiente


contribuem com o ritmo apenas enquanto para Vygotsky, o meio social é essencial
para a aprendizagem. Procuramos extrair da linha interacionista os principais
benefícios para uma prática docente transformadora para os profissionais que atuarão
no ensino superior.

Aproveite as dicas ao longo do livro-texto para se aprofundar nos temas em


“Saiba mais”, Lembretes, Observações e outros.

Bons estudos!

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1. TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO E SEUS EFEITOS E/OU
POTENCIALIDADES NO PROCESSO DE ENSINO/APRENDIZAGEM

A abordagem sobre teorias de desenvolvimento é uma viagem ao longo da


história e, não raras vezes, remete o indivíduo à própria trajetória escolar, com
memórias sobre seu processo de escolarização. O fazer profissional do professor não
é desprovido de valores, ao contrário, é moldado pela própria visão de mundo,
pavimentada por sua vez, por um misto de conceitos teóricos, experiência própria
como aluno e valores delineados por toda sua existência.

Trataremos aqui, em especial, dos efeitos das teorias vigentes durante a


formação e experiência profissional docente, mas é importante que não nos
esqueçamos que a prática não se resume à teoria que respalda a formação inicial e
continuada, pois o professor é um ser que, diferentemente de outras profissões, traz
consigo uma experiência prévia com o ambiente de trabalho de pelo menos doze
anos, o que limita ou favorece a apropriação da corrente pedagógica que orienta os
processos escolares no momento de sua atuação profissional.

Ressalta-se que, no campo educacional, três foram as concepções de


desenvolvimento e aprendizagem que fundamentaram a prática docente no decorrer
do século XX até a atualidade, sendo o Inatismo, o Behaviorismo e o Interacionismo,
esta última dividida entre o Construtivismo de Piaget e o Sócio-Interacionismo
baseado no materialismo dialético de Vygotsky. As correntes psicológicas em questão
influenciaram processos pedagógicos em todos os níveis, em especial na educação
básica. Contudo, as contribuições de diferentes olhares sobre o desenvolvimento são
também perceptíveis no ensino superior para a formação de professores em todos os
níveis.

Em se tratando de professores de ensino superior, a métrica é a mesma,


apenas os conflitos são menores, uma vez que a passagem pelo ensino superior e o
trânsito pela pesquisa ocasionado pela experiência universitária podem reduzir os
efeitos de concepções de desenvolvimento já superadas como o Inatismo e o
Behaviorismo.

De todo modo, tenhamos em mente o elemento das vivências anteriores do


futuro professor de ensino superior a fim de resistirmos à ingênua ideia de que tudo
se resume à formação técnica, ao conhecimento acadêmico. Saibamos de antemão
que a disposição do professor em atualizar-se e colocar em xeque as próprias
concepções e crenças é determinante para o sucesso de propostas transformadoras
como o Interacionismo.

Será preciso um cuidadoso e permanente olhar sobre os próprios valores,


questionando-os e, eventualmente, dispondo-se a alterá-los.

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1.1 Teoria inatista no campo educacional

A teoria inatista é uma tendência racionalista, em que fatores internos ao sujeito


são predominantes. Nesse sentido, há o predomínio da hereditariedade e, portanto,
do dom. Para os inatistas, o conhecimento é pré-formado, inato, nasce com o sujeito.
De acordo com essa concepção, as capacidades do indivíduo estariam pré-formadas
desde o seu nascimento. Outro fator importante, a linguagem, seria uma herança
genética e, portanto, inata.

Nessa perspectiva, as pessoas nascem com certas habilidades, conceitos,


conhecimentos e qualidades em sua bagagem hereditária. Fatores internos são
predominantes. Enfatiza os fatores maturacionais (potencialidades e aptidões) e
hereditários (dom). Os inatistas, ao considerar o desenvolvimento, dão maior
importância a fatores internos e menor influência ao ambiente.

Na Educação, tal concepção defende que o conhecimento é um processo que


se dá de dentro para fora. Nesse caso, o professor interfere o mínimo possível,
trazendo o saber à consciência e organizando-o. Em resumo, “o estudante aprende
por si mesmo”, como descreve Fernando Becker, no livro Educação e Construção do
Conhecimento.

Na Filosofia Grega, Platão era um inatista. Para o filósofo, “conhecer é


relembrar”. Para o discípulo de Sócrates, a alma precede o corpo, a qual, antes de
encarnar, tem acesso ao conhecimento, sendo assim, ao nascer, o indivíduo já
domina determinados conceitos. Platão, no livro “A República” assim se manifesta,

Mas o deus que vos modelou, àqueles dentre vós que eram aptos para
governar, misturou-lhes ouro na sua composição, motivo por que são mais
preciosos; aos auxiliares, prata; ferro e bronze aos lavradores e demais
artífices.

Platão diz que o homem nasce com certas características físicas e que elas
justificam a posição social de cada um. Ser apto a governar ou trabalhar como auxiliar
é resultado de uma vontade divina. Não se considera nenhuma possibilidade de
mudança.

No século XVIII, tivemos um importante representante do Inatismo na figura de


Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Vivendo em um período importante marcado
pelo Iluminismo, as ideias de Rousseau influenciaram de forma marcante o campo
educacional. Opondo-se às concepções tradicionais de educação, propôs um
repensar a formação da criança em sua obra “Emílio”, valorizando elementos da

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criança que considerava naturais. Para Rousseau, a educação não deve iniciar-se
com abstrações racionais, para não antecipar aquilo que as crianças não estariam
preparadas, a fim de não as confundir.

Derivada do Inatismo, a corrente Humanista, a qual tem como expoente Carl


Rogers, define o ser humano como alguém que traz consigo desde o nascimento as
habilidades necessárias para se desenvolver. Para os defensores do Humanismo, “o
aluno é um indivíduo que nasce com grandes possibilidades de desenvolvimento”,
dotado, portanto, de habilidades inatas.

No campo da Educação, entendem que a aprendizagem é um processo de


dentro para fora. Se a aprendizagem é um processo interno, a Pedagogia também se
realiza de forma a garantir essa forma de aprendizagem. Por essa razão, tem-se na
figura do professor um facilitador, cujo papel é o de facilitar que as aptidões se
manifestem, entendendo que quanto menor a interferência, maior será a
espontaneidade e criatividade do aluno. Essa visão, contudo, gerou uma ideia
autoritária e sobretudo pessimista para a educação de crianças e adolescentes,
gerando preconceitos ao trabalho em sala de aula.

1.1.1 Teoria Inatista e suas implicações no ensino superior

A Teoria Inatista, no campo educacional, gerou uma ideia de ser humano que
produziu uma abordagem rígida, autoritária e, sobretudo, pessimista para a educação
de crianças e adolescentes. Como o ser humano já nasceria “pronto”, poder-se-ia
apenas aprimorar um pouco aquilo que ele é ou, inevitavelmente, viria a ser. Isso
geraria enormes preconceitos enrijecendo o processo de desenvolvimento.

Se no campo da educação básica, que envolve educação infantil, ensino


fundamental e médio, tal concepção gerou críticas, o mesmo ocorre com sua adoção
no ensino superior. Com políticas educacionais voltadas à ampliação das vagas nas
universidades, a proposta inatista vai na contramão do ideal de igualdade e equidade
tão defendidos nos dias atuais.

Uma visão inatista não contempla a diversidade cultural e social característicos


da sociedade brasileira e não contribui com o atendimento às camadas mais pobres,
visto que desconsidera elementos inerentes ao ambiente exterior que nada tem a ver
com nascimento, mas que têm um impacto muito grande no percurso escolar e
universitários de alunos, elementos como o capital cultural, fruto, por sua vez, do
acesso a bens culturais que jovens das classes desfavorecidas muitas vezes não têm.

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É o pouco acesso a bens culturais e não a herança genética que tem impactado
em percursos escolares e universitários provocando diferenças e reforçando o
abandono dos estudos por parte de jovens e adultos e reforçando a exclusão social,
transformando diferenças de entrada em percursos educacionais acidentados.

Só faz sentido enfatizar habilidades uma vez garantido o atendimento a lacunas


de aprendizagem existentes pelas razões acima elencadas. Dito de outra forma, o
ensino superior tem objetivos diferentes da educação básica, no que refere à garantia
de conhecimentos mínimos frente a um currículo que apresenta habilidades mínimas
a se desenvolver atendendo, por sua vez, a direitos de aprendizagem estabelecidos
em documentos oficiais como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Mesmo assim, estabelecer distinção entre indivíduos com base em suas


capacidades inatas é um retorno a um ensino superior elitizado, reservado àqueles
cujos bens culturais já os privilegia naturalmente. Garantidos direitos de aprendizagem
na educação básica, é preciso favorecer ao jovem o ingresso à universidade de modo
que ele possa pavimentar seu caminho com o devido estímulo às habilidades naturais
que não apenas ele, mas todo indivíduo tem, sendo uma questão de oportunidade e
tratamento equitativo às diferenças e não de berço, o sucesso em sua trajetória
acadêmica.

1.2 A teoria do comportamento: o Behaviorismo

A Teoria Behaviorista é uma corrente que explica o desenvolvimento a partir da


preponderância do ambiente sobre o mesmo. Inaugurado pelo americano John
B.Watson (1904-1990), refere-se à ideia de interações entre sujeito (suas respostas)
e o ambiente (seus estímulos) que levariam ao desenvolvimento.

Em artigo publicado em 1913, sob o título “Psicologia: como os behavioristas a


veem”, Watson assegura que a psicologia deveria observar o comportamento dos
organismos, a fim de compreendê-lo, prevê-lo e até modifica-lo. Barros (1996)
descreve que os Behavioristas definiam o comportamento do organismo como suas
respostas aos estímulos do ambiente e enfatizavam a importância do
“condicionamento” das respostas.

O termo inglês behavior que significa “comportamento” é utilizado para


denominar essa tendência teórica, assim como Comportamentalismo, Empirismo,
Teoria Comportamental, Análise Experimental do Comportamento, Análise do
Comportamento. O Behaviorismo se baseia na relação “estímulo/resposta” que, por
sua vez, provoca um “comportamento respondente”, ou “reflexo” (involuntário,

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incondicionado). Watson, em seus experimentos, descobriu que até o comportamento
respondente pode ser criado, condicionado.

O “comportamento operante”, outro elemento da teoria Behaviorista, é um


comportamento voluntário, ativo, tem efeito sobre o mundo. Tal comportamento
abarca uma série de atividades humanas, desde comportamentos do bebê de
balbuciar, agarrar objetos e olhar enfeites do berço até atividades mais sofisticadas
apresentadas pelo adulto. Comportamento operante se apresenta em diferentes
atividades como ler um livro, escrever uma carta, tocar um instrumento musical, etc.

O mais importante dos behavioristas que sucedem a Watson é B. F. Skinner


(1904-1990), que criou a teoria do “comportamento operante”, estímulo e resposta que
envolve ainda o chamado “comportamento reflexo ou respondente”. O comportamento
reflexo ou respondente é o que chamamos de “não-voluntário” e cujas respostas são
produzidas por estímulos antecedentes do ambiente.

Um exemplo de comportamento reflexo é a contração das pupilas quando uma


luz forte incide sobre os olhos ou ainda a salivação provocada por uma gota de limão
colocada na ponta da língua e ainda, o arrepio da pele quando um ar frio nos atinge,
as famosas “lágrimas de cebola”, entre outros. Esses comportamentos reflexos ou
respondentes são interações estímulo-resposta (ambiente-sujeito) incondicionadas,
nas quais certos eventos ambientais confiavelmente eliciam certas respostas do
organismo que independem de “aprendizagem”.

Para verificar como as variações do ambiente influenciavam os


comportamentos, animais como ratos, pombos e macacos foram vastamente
utilizados por pesquisadores em seus experimentos. Um conhecido experimento
realizado por Skinner em laboratório exemplifica bem a teoria Behaviorista.

De acordo com Bock, Furtado e Teixeira (1999), um ratinho, ao sentir sede em


seu habitat, manifesta algum tipo de comportamento que lhe permita satisfazer sua
necessidade orgânica. Um comportamento que, segundo os Behavioristas, foi
aprendido pelo ratinho e se mantém pelo efeito proporcionado: saciar a sede. Para
apreender o comportamento de um rato ao sentir sede, Skinner manteve em uma
caixa em laboratório, um ratinho privado por algum tempo de beber água com vistas
a apreender o comportamento que tem ao sentir sede, simulando assim uma situação
que o animal viveria em um ambiente natural.

A “caixa de Skinner” possuía apenas uma barra que, ao ser pressionada pelo
pesquisador, acionava um mecanismo (camuflado) que lhe permitia obter uma gotinha
de água, que chegava até a caixa por meio de uma pequena haste. Por ter obtido
água ao encostar na barra quando sentia sede, constatou-se a alta probabilidade de
que, em situação semelhante, o ratinho a pressionasse novamente (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

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Neste caso, o comportamento operante que propicia a aprendizagem dos
comportamentos é a ação do organismo sobre o meio e o efeito dela resultante – a
satisfação de alguma necessidade, ou seja, a aprendizagem está na relação entre
uma ação e seu efeito. Assim, agimos ou operamos sobre o mundo de acordo com as
consequências criadas por nossa ação.

Outro elemento da Teoria Behaviorista diz respeito ao “reforçamento”, aquele


que, seguido de uma resposta, altera a probabilidade futura de ocorrência dessa
resposta. O reforço pode ser positivo ou negativo; positivo quando aumenta a
probabilidade futura da resposta que o produz, e negativo quando aumenta a
probabilidade futura das respostas que o remove ou atenua.

Assim, voltando à “caixa de Skinner” em que uma gota d’água era oferecida ao
ratinho sempre que encostasse na barra, num segundo momento, o ratinho passa a
receber choques do assoalho. Após várias tentativas de evitar os choques, o ratinho
chega à barra e, ao pressioná-la acidentalmente, os choques cessam. Dessa forma,
as respostas de pressão à barra tenderão a aumentar de frequência.

Chama-se reforçamento negativo o processo de fortalecimento dessa classe


de respostas (pressão à barra), pois se trata de remoção de um estímulo aversivo que
controla a emissão da resposta. Bock, Furtado e Teixeira (1999) asseguram ser
condicionamento por se tratar de aprendizagem e reforçamento porque um
comportamento é apresentado e aumentado em sua frequência ao alcançar o efeito
desejado. O reforçamento positivo oferece algo ao organismo (gotas de água com a
pressão da barra, no experimento), enquanto o negativo permite a retirada de algo
indesejável (os choques).

Fonte: Bock, Furtado e Teixeira (1999).

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A “punição” é outro procedimento que o behaviorismo utiliza e envolve a
consequenciação de uma resposta quando há apresentação de um estímulo aversivo
ou remoção de um reforçador positivo presente. A punição sempre apresenta um
estímulo negativo ou retira um estímulo positivo, o que pode provocar a “esquiva” –
resposta ou comportamento para evitar o estímulo aversivo – e a “fuga” – resposta ou
comportamento para fugir do estímulo aversivo já iniciado.

Por outro lado, punir ações levaria à supressão temporária e não definitiva da
resposta, ou seja, não alteraria sua motivação. Tal constatação divide opiniões entre
os behavioristas quanto a seu uso na Educação. Práticas punitivas correntes na
escola como ajoelhar-se no milho, reproduzir inúmeras cópias de um mesmo texto,
palmatória entre outras foram questionadas por defensores do Behaviorismo que
faziam críticas a Skinner e propuseram a substituição de práticas punitivas por
procedimentos de instalação de comportamentos desejáveis.

A constatação de críticos a Skinner é de que punições não motivam os


indivíduos a adotar um comportamento adequado, mas sim estimulam a desenvolver
mecanismos de fuga e de esquiva. Um exemplo disso é o trânsito, cujas punições não
têm motivado motoristas a adotar comportamento adequado, mas sim tornarem-se
especialistas em fuga e esquiva.

Voltando ao campo educacional, para essa corrente, o conhecimento tem


origem e evolui a partir das experiências que o sujeito vai acumulando. O sujeito seria
uma “tabula rasa”, uma “folha de papel em branco”, vazio de conhecimentos, sendo o
homem produto do ambiente. O processo educacional seria entendido como uma
modificação do comportamento provocada pelo agente que ensina, pela utilização
adequada dos estímulos reforçadores, sobre o sujeito que aprende.

A Pedagogia utilizada nessa concepção é a “diretiva”, de modo que o aluno


aprende se, e somente se, o professor ensina. O professor é aquele que detém o
conhecimento e o transfere ao aluno. Quanto ao reforço positivo e negativo na
educação, os efeitos, sobretudo do reforço negativo, têm sido observados ao longo
do tempo e constatou-se que, assim como em outras áreas descritas anteriormente,
na educação, a utilização de castigos não tem se mostrado eficaz para eliminar
comportamentos inadequados como indisciplina, por exemplo.

Ao contrário, tal como indicavam os críticos de Skinner, a frequência com que


as punições são aplicadas ensina o aluno a desenvolver mecanismos para fugir da
punição, mecanismos de aversão que, consequentemente, provocarão aversão à
escola.

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1.2.1 Teoria behaviorista e suas implicações no ensino superior

Como vimos, no campo educacional, são muitos os estudos que indicam os


efeitos da concepção behaviorista sobre os alunos. A literatura abarca, em especial,
trabalhos que apontam os efeitos prejudiciais que a teoria comportamental teria sobre
os alunos. No entanto, existem pesquisas que se debruçaram sobre eventuais
benefícios que arranjos reforçadores teriam para a aprendizagem – o trabalho de
Costa, Lopes e Fermoseli (2014) é um exemplo.

Em nossa disciplina, entretanto, privilegiaremos o olhar sobre o impacto que o


reforçamento negativo teria sobre o itinerário dos alunos. É importante ressaltar que
esses efeitos se manifestam no cotidiano escolar de diversas formas, seja em
momentos de explanação do professor sobre o objeto de ensino, seja em ocasiões de
avaliação, fato é que as punições ampliam as possibilidades de fracasso escolar
traduzido em reprovações frequentes, abandono e evasão dos alunos mais expostos
ao reforçamento negativo.

Nesse caso, pairam algumas perguntas: e no ensino superior, há prejuízos para


o aluno assim como na educação básica? O reforço negativo ainda se aplica na
universidade? Punições são aplicadas no ensino superior?

São destacadas aqui as punições a que estavam sujeitos alunos da educação


básica por longo período de tempo, punições legitimadas, sobretudo, pela escola
tradicional. Ainda que o ensino superior se diferencie da educação básica em vários
aspectos, os efeitos do reforço negativo são semelhantes e contribuem para situações
de abandono e evasão tal como observados na escola básica. Não são relatados
castigos, mas a exposição do aluno frente a comportamentos indesejados seja de
indisciplina, seja de apatia, tem efeitos negativos e pode repercutir sobre a trajetória
do mesmo na universidade.

É importante lembrar que muitos alunos que atualmente frequentam o ensino


superior trazem marcas do reforçamento negativo a que foi exposto durante a
escolarização. Muitos abandonaram a escola após sucessivas reprovações e apenas
muito tempo depois enfrentaram tal bloqueio e tentam, mais uma vez, prosseguir nos
estudos, ingressando em uma universidade. A exposição dos erros e lacunas do aluno
no ambiente universitário em nada contribui para um comportamento desejável, ao
contrário, contribui para que o abandono ao curso se repita.

Finalmente, é importante apresentar outros elementos que fazem parte da


aplicação da Teoria Behaviorista no campo educacional e, portanto, no ensino
superior também. Em relação à organização do ambiente, ressaltamos que os
métodos de ensino são programados e que há um controle e organização do
aprendizado

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1.3 Teoria interacionista no campo educacional

A visão Interacionista é o terceiro modo de entender o desenvolvimento do ser


humano. Tem como principais expoentes o suíço Jean Piaget (1896-1980) com a
Teoria Construtivista e o russo Lev Vygotsky (1896-1934) com o Sócio-Interacionismo.

Defensores do Interacionismo acreditam que, tanto fatores internos (orgânicos)


quanto fatores externos (ambientais) influenciam o desenvolvimento de tal modo que
a hereditariedade e o meio ambiente interagem no desenvolvimento da criança.

No Construtivismo, acredita-se que o modo de funcionamento intelectual da


criança é diferente do adulto e a leva a adaptar-se ao meio e a organizar suas
experiências. Barros (1996) mostra que na visão piagetiana, a criança, pelo contato
com objetos e pessoas, irá construindo seu conhecimento de mundo. Se destacando
pelo estudo da inteligência, Piaget assumiu que o desenvolvimento cognitivo se
realiza por estágios, cuja sequência é a mesma em todas as crianças, uma sequência
fixa, linear e universal.

Os fatores que influenciam a mudança de estágio é a maturação, as


experiências (físicas e sociais), a transmissão social (interação social, que tem
importância, mas só para o ritmo), assim como sucessivas equilibrações que não
podem ser consideradas hereditárias, mas fruto das interações entre o meio e o
indivíduo. Piaget dividiu em quatro os estágios de desenvolvimento, sendo o sensório-
motor (0-2 anos), o pré-operatório (2-7 anos), o operatório concreto (7-12 anos) e o
operatório-formal (dos 12 anos em diante).

Piaget baseou-se no método clínico que consiste em observações, registros,


intervenções, entrevistas e testar hipóteses. Apesar da contribuição ímpar do
Construtivismo à ciência do desenvolvimento, a Teoria Piagetiana enfrentou críticas
quando de sua elaboração. Críticas ao fato de que Piaget utilizou registros
sistemáticos que fez do acompanhamento do crescimento mental dos três filhos.
Outra crítica, derivada da primeira, se refere à amostra pequena de sujeitos e pelo
fato de que não seguia um padrão de entrevistas.

Outro fator que influenciou a crítica foi a tradição behaviorista que se voltava
aos efeitos do ambiente, desprezando estudos de processos mentais. Outro fator que
dificultou a aceitação de sua teoria foi o idioma em francês e a própria leitura, densa,
complexa.

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Na concepção Construtivista, a construção do conhecimento da criança é
adquirida durante toda a sua vida, de forma ativa, interagindo com o mundo a sua
volta. Segundo Piaget, o desenvolvimento se dá a partir da tentativa constante de
buscar o equilíbrio através de processos de assimilação e acomodação, nos quais o
indivíduo vai construindo estruturas variáveis, visando sua adaptação ao mundo
exterior.

Segundo Piaget, as estratégias da criança são inatas, contudo, mudanças vão


surgindo nessas estratégias através da exploração voluntária e sequencial. Assim,
acredita que elementos hereditários são combinados continuamente com estímulos
exteriores, e que esses, por sua vez, por serem ambientais, incidiriam sobre o ritmo
do desenvolvimento.

Embora desenvolvida para a Psicologia, a teoria de Piaget obteve grande


aceitação no campo educacional devido a novas interpretações para o “erro” das
crianças. No início de suas investigações, aplicava testes de inteligência em crianças
e nesses testes interessava-se não pelas respostas corretas que as crianças davam,
mas pelas incorretas. Seu objetivo era aprender sobre a extensão e a profundidade
das ideias e dos processos mentais infantis, procurando compreender como crianças
de várias idades obtêm o conhecimento do mundo que as rodeia.

Piaget ficou conhecido como o “psicólogo da inteligência” e se destaca dos


demais pesquisadores do campo da Psicologia pela vasta produção teórica (mais de
100 livros escritos em 60 anos) e pelo rigor científico que promoveram muitos avanços
no âmbito educacional. Piaget não pretendeu construir uma teoria pedagógica,
embora o procedimento de observação utilizado no método clínico pode sugerir uma
atitude extensiva à prática pedagógica.

Outro expoente do pensamento interacionista é Lev Vygotsky que atribui papel


determinante para o desenvolvimento as relações do sujeito com o meio social em
que se encontra inserido desde o seu nascimento. Para Vygotsky, o funcionamento
psicológico fundamenta-se nas relações sociais entre o indivíduo e o mundo exterior,
as quais desenvolvem-se num processo histórico. Sua teoria enfatiza que a
inteligência se forma a partir da linguagem e da integração do sujeito à sociedade.

Vygotsky diverge da teoria Piagetiana quanto à aprendizagem e


desenvolvimento, sobre qual processo ocorre primeiro e qual se subordina ao outro.
Enquanto Piaget assegura que a aprendizagem está subordinada ao
desenvolvimento, Vygotsky acredita que a aprendizagem com o outro é decisiva para
o desenvolvimento, resultando dos processos de interações sociais que o indivíduo
estabelece.

Nesse sentido, a aprendizagem é uma apropriação de conhecimentos já


construídos pelas gerações anteriores enquanto o desenvolvimento dependeria da
aproximação com a cultura de outros indivíduos.

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Também divergentes são a visão de homem-mundo que possuem Piaget e
Vygotsky. Para o primeiro, essa visão partiria do individual para o social, tudo começa
com o sujeito. Vygotsky, por sua vez, discorda e assegura que tudo se inicia no social
para o individual, uma relação mediada por sistemas simbólicos.

Assim sendo, para Vygotsky, a relação-mundo seria uma relação mediada por
sistemas simbólicos. Outro ponto de discordância entre ambas as teorias diz respeito
ao que seria objeto da educação, a construção do conhecimento, para Piaget, e o
desenvolvimento das funções psicológicas superiores como, atenção, memória e
imaginação para Vygotsky.

A aprendizagem, para Vygotsky, é um processo que se dá especialmente pela


interação social do sujeito que aprende com o meio social à sua volta.

Você sabe distinguir o que é ensino para Piaget e o que é ensino para
Vygotsky? Para ambos, a função de quem ensina é fazer a mediação entre o
aluno e o conhecimento. Para Piaget, essa mediação favorecerá a construção
do conhecimento de maneira autônoma pelo aluno. Para Vygotsky, essa
mediação adquire importância fundamental por que se refere à interação do
indivíduo com o meio social, cujas conhecimentos serão aprendidos.

1.3.1 Teoria interacionista e suas implicações no ensino superior

A contribuição da Teoria Interacionista para os processos que envolvem ensino


e aprendizagem são extensivos ao ensino superior. A abordagem dialógica,
característica do Interacionismo, pressupõe o aluno como um ser ativo que age sobre
seu meio adaptando-se por meio de constantes equilibrações que se constituem
aprendizagens significativas, pois são contruídas pela ação e, portanto, pela
experiência do sujeito como um ser social.

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Admitindo que fatores hereditários e ambientais se harmonizam articulando-se
continuamente, a concepção interacionista de ensino e aprendizagem lança mão de
elementos como problematizações, levantamento de conhecimentos prévios dos
alunos, situações-problema que os coloque em desequilíbrio cognitivo, além de
abordar conhecimentos como problemas a serem solucionados, construídos, exigindo
do professor que resista à abordagem que entrega o conhecimento pronto por meio
de conteúdos acabados.

Mas, longe de se aplicar no ensino superior uma prática tal qual se aplica no
ensino fundamental, por exemplo, é preciso refletir sobre quem é o estudante
universitário. O primeiro ponto de relevância é o fato de que esses alunos são, em sua
maioria, indivíduos que estão entrando na fase adulta. Trazem, portanto, uma extensa
bagagem de experiências e anseios típicos dessa etapa do ciclo vital. Para esse
público, é importante que trabalhem em grupo, que exercitem a autonomia de ideias,
que discutam diferentes pontos de vista, que argumentem, que reflitam e,
eventualmente, reformulem concepções. Para que isso aconteça, esse aluno precisa
de desafios, de situações-problema que o mobilize.

O estudante do ensino superior necessita desenvolver habilidades que


favoreçam o próprio aprendizado e desenvolvimento, assim como a autogestão e
autoavaliação como formas de gerir o próprio desenvolvimento, uma vez que a etapa
universitária o preparará para exercer uma profissão, construir uma carreira.

O estudante adulto apresenta extensa experiência pessoal que o torna único


mesmo diante de pessoas que estejam na mesma faixa etária, de modo que a
definição de um estágio psicológico não se sustenta, dada a singularidade de cada
indivíduo e a diversidade de experiências que cada um traz consigo. Para Oliveira
(2004) a ideia de estágios do desenvolvimento devem ser substituídas, no caso do
aluno adulto, por “ciclos de vida”.

Discutindo questões relacionadas à idiossincrasia da psicologia do adulto, a


reflexão da autora também inspira a se pensar no aluno do ensino superior. Dizer algo
a alguém não provoca aprendizagem nem conhecimento, pois é necessário que o que
se diga entre em conexão com os interesses, crenças, valores ou saberes daquele
que escuta. É importante ressaltar que processos de aprendizagem envolvem
atribuição de significado por parte de quem aprende.

Nesse sentido, considerar que entre os alunos do ensino superior há aqueles


cuja etapa de vida revela certa homogeneidade quanto a circunstâncias culturais,
históricas e sociais nas quais sua existência transcorre é de fundamental importância
para que o professor favoreça a interação e integre os alunos a partir de suas
vivências.

Oliveira (2004) assevera que a etapa da vida em que a pessoa se encontra é


um elemento que deve ser valorizado pelo professor, de modo que ele possa

19
identificar na sala de aula alunos que compartilham a mesma condição, e também
aqueles que se encontram em outro ciclo de vida, valorizando a contribuição de cada
aluno que compartilhará saberes referentes a experiências semelhantes, mas também
interessando-se e interagindo com as experiências particulares, privadas de cada um.

Oliveira (2007), ao abordar a aprendizagem do adulto, sugere que as conexões


são singulares, dependentes das experiências e saberes anteriores. Sendo assim,
manter um ensino que não leve o aluno a evidenciar suas experiências e repertório
de conhecimentos, limita a compreensão ao conhecimento transferido pelo professor.
A autora assevera que cada um tem sua forma própria e singular de tecer
conhecimentos através dos modos como atribui sentido às informações recebidas,
estabelecendo conexões entre os fios e tecituras anteriores e os novos.

Assim como se almeja na abordagem interacionista na escola, espera-se que


o professor do ensino superior questione, estimule, problematize conteúdos,
provocando seus alunos a pensar e buscar respostas por si mesmos. Que não
entregue pronto um conhecimento estático e acabado, mas que possibilite aos alunos
vivenciarem situações em que sejam chamados a agir sobre o meio, encontrando
soluções, construindo seu conhecimento de forma significativa.

Oliveira (2004) reforça a importância que a experiência pessoal acumulada pelo


adulto tem sobre seus processos de desenvolvimento. A construção do adulto se dá
continuamente, marcadamente pelas vivências que acumula durante toda a
existência.

Tal como ocorre em processos de ensino/aprendizagem escolares, o professor


universitário dificilmente aguarda as respostas de seus alunos e perdem a
oportunidade de acompanhar o raciocínio dos mesmos ao estabelecer relações com
as próprias experiências acumuladas, deixando de observar as condições dos alunos
para aprenderem.

A intervenção clássica dos professores é a de atividades dirigidas e


controladas, explicando o “como fazer”, avaliando ao final se está “certo” ou “errado”.
A concepção interacionista aplicada ao ensino superior valoriza o processo, as
atividades que os alunos desenvolvem, as ações desempenhadas pelos mesmos.
Nesse contexto, as estratégias de ensino se baseiam na atividade do estudante, pois
ao aprenderem verdades já estruturadas e apresentadas de maneira organizada os
alunos perdem a oportunidade de realizarem suas próprias tentativas e estruturarem
seu próprio conhecimento.

É importante destacar que a variabilidade na sequência do desenvolvimento


pode ser observada em qualquer faixa etária, lembrando que o aluno adulto se difere
da criança pela expressiva vivência acumulada que demandaria, portanto, a ideia
anteriormente apresentada de “ciclos de vida”.

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Espera-se, portanto, que a Teoria Interacionista possa contribuir para um novo
modelo de ensino universitário que coloque o estudante como protagonista. Para
tanto, é preciso que também o professor se disponha a aprender e mudar suas
estratégias se preciso for. É necessário entender que aprender implica em
compreender, o que demanda do professor o conhecimento sobre o processo de
pensamento do aluno, o que demanda estratégias e instrumentos de avaliação
diagnóstica a fim de acompanhar a construção do conhecimento do aluno.

“Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia” é um livro que


apresenta as principais correntes teóricas da Psicologia que influenciaram o campo
da educação. É uma leitura importante para compreender os processos envolvidos
no desenvolvimento e as diferentes concepções que explicaram essa evolução do
ser humano ao longo dos tempos. Conheça!

BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. de L. T. Psicologias: uma


introdução ao estudo de psicologia. 13 ed. São Paulo: Ática, 1999.

1.4 Considerações finais

Como vimos, ao longo da história, vários foram os olhares sobre o


desenvolvimento humano. Das contribuições do campo da psicologia, destacam-se
aquelas deixadas pela Teoria Inatista, Behaviorista e Interacionista. Esta última,
atualmente aceita, nos mostra que o indivíduo, desde o seu nascimento, estabelece
com o meio físico e social que o cerca interações que se constituem o eixo fundante
para seu pleno desenvolvimento.

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Ainda que haja distanciamentos em alguns tópicos da aprendizagem, é fato que
Piaget e Vygostsky revolucionaram a maneira de se compreender o desenvolvimento
humano. Suas descobertas revelam que qualquer que seja a etapa da vida do sujeito,
os fatores hereditários aliados a vivências determinam suas aprendizagens e,
consequentemente, sua visão de mundo ainda que discordem sobre a predominância
dos fatores individuais e do ambiente.

Para pensarmos um pouco sobre a aprendizagem nos processos de


ensino universitários

Suponha que você lecione para duas turmas em uma mesma instituição como
professor responsável por certa disciplina e se depare com a seguinte situação:

Uma das turmas, a classe A, apresenta um número expressivo de alunos que


saíram da escola há mais de duas décadas, alguns ingressaram na Educação de
Jovens e Adultos como forma de concluírem o ensino médio para cursar um curso na
universidade e outros, mesmo tendo concluindo a educação básica, não deram
prosseguimento aos estudos por motivos variados, desde trabalho até a criação de
filhos, ficando também afastados por um longo período de tempo.

A turma B, em contrapartida, é uma turma muito jovem, com alunos cuja média
de idade é de 21 anos, todos recém formados no ensino médio. Digamos que você
tenha como concepção de aprendizagem baseada no Interacionismo e pretenda
apresentar a disciplina que trabalhará com eles na primeira aula.

Adotando uma postura Piagetiana ou Vygotskyana, indique de que forma


iniciará seu trabalho considerando as características de cada grupo explicitadas
acima.

Bom trabalho!

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Terminamos a unidade inicial para debatermos as concepções de
desenvolvimento existentes no espaço escolar e sua aplicação no contexto
universitário. Sabe-se que as diferenças entre os indivíduos são singulares, mas há
uma base de elementos hereditários e cuja interação com o meio que o cerca
possibilita que todos tenham condições de aprender.

É importante que tenhamos a noção sobre os avanços da psicologia para


explicar o desenvolvimento humano, enfatizando as contribuições ímpares dos
representantes do Interacionismo, Piaget e Vygotsky. Conhecer os fundamentos de
cada um dos autores é necessário para consolidação de nossa identidade docente ao
gerir processos de aprendizagem de alunos adultos no ensino superior que estão
percorrendo uma trajetória de formação acadêmica para ingresso no mercado de
trabalho.

Pense nisso!

Continuaremos juntos nesse caminho de descobertas passando para a próxima


unidade, nos aprofundando nos processos de ensino/aprendizagem no ensino
superior, destacando semelhanças e distanciamentos em relação ao ensino na
educação básica.

Vamos lá?

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2. PROCESSOS DE ENSINO/APRENDIZAGEM NO ENSINO SUPERIOR:
SEMELHANÇAS E DISTANCIAMENTOS EM RELAÇÃO AO ENSINO NA
EDUCAÇÃO BÁSICA

Nesta unidade abordaremos inicialmente os conceitos da Teoria Construtivista


de Piaget, com destaque para os estágios do desenvolvimento comparando-os com
os ciclos de vida definidos por Marta Kholl. Os ciclos de vida representam as fases do
desenvolvimento do adulto que difere dos estágios infantis, especialmente em função
da extensa bagagem de experiências acumuladas ao longo da vida de um indivíduo
que atingiu a vida adulta. Refletiremos sobre a aplicabilidade dos conceitos
piagetianos no ensino superior com destaque para problematizações que identifiquem
os conhecimentos prévios do aluno como um instrumento favorável às aprendizagens.

Se analisarmos os processos de desenvolvimento humano com ênfase no


desenvolvimento cognitivo, poderemos dizer que os processos mentais na criança são
semelhantes aos do adulto? É correto dizer que a criança “pensa” como um adulto
diferenciando-se do mesmo apenas pela capacidade?

Certamente, as teorias do desenvolvimento muito contribuem para


compreendermos como se forma o raciocínio lógico-matemático no ser humano, como
se dá o desenvolvimento cognitivo, enfim como o indivíduo pensa.

Contudo, o desenvolvimento é um processo e na visão de teóricos


interacionistas como Jean Piaget, esse processo se dá em fases que ele denomina
de estágios. Fruto da interação entre aspectos internos ao indivíduo e externos a ele,
o desenvolvimento representaria o produto resultante das interações ocorridas ao
longo da vida do sujeito.

Subordinada ao desenvolvimento, a aprendizagem ocorreria desde que


satisfeitas as condições maturacionais do indivíduo. Essa teoria analisa o indivíduo
desde o nascimento até a adolescência, dividida em quatro estágios, sendo o estágio
sensório-motor, que vai de 0 a 2 anos de idade, o estágio pré-operatório,
contemplando o período de 2 a 7 anos, o estágio operatório concreto, de 7 a 12 anos
e finalmente o estágio operatório formal, de 12 anos em diante, contemplando a
adolescência.

A teoria construtivista de Piaget não se propôs a examinar os processos


cognitivos de um adulto e muito embora seus conceitos tenham sido apropriados pelo
campo educacional, é preciso dizer que para explicar os processos cognitivos de um
adulto torna-se necessário considerar maior ênfase em suas experiências
considerando que a maturação neurológica de que nos fala Piaget, na idade adulta já
se encontra completa.

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Nesse sentido, temos a teoria dos ciclos de vida apresentados por Marta Kholl
que analisam os processos cognitivos baseados nos ciclos, nas experiências do
sujeito.

2.1 Teoria construtivista de piaget e sua aplicabilidade no ensino superior

A Teoria Construtivista faz parte da corrente Interacionista do campo da


Psicologia que concebe o desenvolvimento como fruto das interações entre aspectos
internos ao indivíduo, com destaque para a maturação neurológica e aspectos
externos físicos e sociais.

Jean Piaget é o representante da teoria que assegura que o indivíduo


constrói seu conhecimento adaptando-se continuamente ao ambiente por meio de
sucessivos processos de equilibração que envolvem, por sua vez, assimilações e
acomodações. Seu objeto de estudo é o sujeito epistemológico, ou seja, o sujeito do
conhecimento. Por isso, seus estudos, desenvolvidos em mais de 60 anos dedicados
à pesquisa, se voltaram a compreender como o sujeito conhece.

A Psicologia de Piaget está fundamentada na ideia de equilibração e


desequilibração. Quando uma pessoa entra em contato com um novo conhecimento,
há naquele momento um desequilíbrio e surge a necessidade, de voltar ao equilíbrio.
O processo começa com a assimilação do elemento novo, com a incorporação às
estruturas já esquematizadas, através da interação.

Há mudanças no sujeito e tem início o processo de acomodação, que aos


poucos chega à organização interna. Começa a adaptação externa do sujeito e a
internalização já aconteceu. Um novo desequilíbrio volta a acontecer e pode ser
provocada por carência, curiosidade, dúvida etc. O movimento é dialético (de
movimento constante) e o domínio afetivo acompanha sempre o cognitivo (habilidades
intelectuais), no processo endógeno.

Piaget reconheceu o papel dos fatores sociais no desenvolvimento


intelectual. As interações sociais foram consideradas como uma fonte do conflito
cognitivo, portanto, de desequilibração e, consequentemente, de desenvolvimento.
Ou seja, também desta forma, são consideradas para a construção do conhecimento
social. Piaget considerou a construção do conhecimento como um ato individual da
criança.

Os fatores sociais influenciam a desequilibração individual através do conflito


cognitivo e apontam que há construção a ser feita. Para Piaget, a verdadeira

26
construção do conhecimento não é medida pelo fator social e ambiente; ele não é
copiado de um referencial e modelo. O conhecimento anterior é reconstruído diante
da desequilibração socialmente provocada e estimulada. O papel do professor é visto
basicamente como o de encorajar, estimular e apoiar a exploração, a construção e
invenção.

Segundo Piaget, o ser humano constrói seu conhecimento. Nessa


concepção, o desenvolvimento humano é resultado de uma combinação de fatores:

 Inatos (maturação)
 Experiência (física ou social)
 Sucessivas equilibrações, que não podem ser consideradas como
hereditárias, mas fruto das interações entre o meio e o indivíduo (quanto
mais complexa for essa interação, mais inteligente será no futuro)
 A passagem por estágios cuja sequência é fixa e universal.

Algumas definições e pressupostos são essenciais para entender a teoria de


Piaget. São elas:

 Epistemologia genética – teoria do conhecimento que aborda as mudanças


e a evolução do conhecimento.
 Equilíbrio (equilibração) – processo progressivo de organização das
estruturas cognitivas num sistema coerente, interdependente, que
possibilita ao indivíduo um tipo ou outro de adaptação à realidade.
 Estruturas – formas de organização da atividade mental; explicações
particulares, diferentes, da inteligência.
 Esquema – ação ou estratégia, interna ou externa, à qual um conteúdo é
assimilado.
 Adaptação – processo de ajustar-se ao ambiente que se decompõe em
assimilação e acomodação.
 Assimilação – incorporar as coisas e pessoas à atividade própria do sujeito;
assimilar o mundo exterior às estruturas já construídas.
 Acomodação – reajustar as estruturas já construídas em função das
transformações ocorridas, ou seja, acomodá-las aos objetos externos.

O Construtivismo apresenta como pressupostos centrais a ideia de que as


estratégias são inatas, as explorações do ambiente são voluntárias, o papel do
ambiente é sobretudo o de afetar o ritmo da aprendizagem, a criança age ativamente
sobre o meio, o que provoca contínuas mudanças nas estratégias.

Piaget vê, de maneira singular, a interação social no desenvolvimento e


aprendizagem escolar: a aprendizagem não começa na escola e toda situação de
aprendizagem escolar se depara sempre com uma história de aprendizagem prévia,
ou seja, o ambiente da sala de aula requer interação social, uma interação com os
colegas e adultos.

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Nas obras de Piaget, a criança pode utilizar as fontes e formas de informação
no processo de construção. A criança pode ativamente ouvir uma exposição ou ler um
livro e empregar a informação recebida na construção. O processo não é o de recriar
um modelo, mas o de inventá-lo. As Dificuldades de Aprendizagem surgem porque
muitos indivíduos estão estacionados em algumas etapas de desenvolvimento e isso
é refletido no dia a dia, com um jeito particular de pensar.

A teoria construtivista assegura que a construção do conhecimento se dá por


sucessivas equilibrações a que o sujeito estaria exposto cada vez que se deparasse
com um novo conhecimento que a ele se apresentaria como um “problema”. Diante
deste “problema”, o novo colocaria o indivíduo em desequilíbrio cognitivo, de tal sorte
que este mobilizaria suas estruturas mentais a criar estratégias para resolver o
problema que se coloca.

Em busca da solução, o indivíduo busca, inicialmente, em suas estruturas,


algo em que possa se apoiar; a esse processo Piaget deu o nome de “assimilação”,
uma ação mental que consiste em colocar algo novo àquilo que já se conhece, sem,
contudo, sofrer transformações em tal estrutura.

Piaget, em suas pesquisas, identificou que o ser humano nasce com três
tipos de estruturas:

 Programadas: já nascem com o sujeito, estruturas como os reflexos (de


respirar, sugar, piscar os olhos, etc.), sendo que algumas delas vão
desaparecendo com o curso do desenvolvimento, outras, entretanto,
conservam-se durante toda a vida, como o respirar.
 Parcialmente programadas: são aquelas em que, ao nascimento, ainda
não estão completamente “prontas”, mas vão se desenvolvendo pelo
caráter maturacional do desenvolvimento. Exemplo disso é o sistema
nervoso central, ou seja, a criança, ao nascer, ainda não anda, mas após o
processo de mielinização, entre outros fatores, isto já pode ocorrer;
 E não programadas: são aquelas que ainda não existem desde o
nascimento, mas que são construídas a partir da interação de seus
instrumentos cm o meio ambiente. São as estruturas mentais, ou seja,
estruturas específicas para conhecer (que compõe a inteligência).

As estruturas não programadas, com destaque para as da inteligência, não são


inatas, ao contrário, são construídas, não sendo, portanto, nem cópia fiel do meio,
nem dado desde o nascimento. Após anos de observação de crianças e, dispondo de
sua formação de Biólogo, Piaget demonstrou o processo de construção das estruturas
mentais e o esquematizou em quatro estágios, segundo as características peculiares
dessas estruturas.

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Outro elemento importante da teoria piagetiana é o processo de assimilação e
acomodação, parte de um processo mais amplo denominado processo de
equilibração. Assimilação representa a incorporação de novos objetos em estruturas
pré-existentes. Para Piaget, no processo de construção do conhecimento, o indivíduo
tende a buscar em suas estruturas mentais uma base, algo já conhecido em que possa
se apoiar diante do novo conhecimento que se coloca como um problema. É o
processo de assimilação, isto é, ao se deparar com algo desconhecido, o sujeito busca
assimilar esse novo a algo que ele já conhece.

O processo seguinte, acomodação, é a criação de novas estruturas para


assimilar um objeto. Nele, a criança tem que ajustar a estrutura que ela já tem para se
adaptar a algo novo. Trata-se de uma transformação sofrida pelo organismo para lidar
com o ambiente. Diante do novo, a criança modifica seus esquemas adquiridos
anteriormente tentando se adaptar à nova situação; há um rearranjo das estruturas
para se adaptar ao novo que se apresenta.

O desenvolvimento se dá por meio da tentativa constante de buscar o equilíbrio,


através dos processos de assimilação e acomodação. Nessa busca, o indivíduo vai
construindo estruturas variáveis, visando sua adaptação ao mundo exterior. Piaget
considera que o fator mais importante para o desenvolvimento é a equilibração

Importante ressaltar que os esquemas se referem à ação ou estratégia que o


indivíduo desenvolve com uma certa organização para abordar e conhecer a
realidade.

Piaget trabalhou o desenvolvimento humano em etapas, períodos, estágios.


Para Piaget, se uma pessoa erra e continua errando, uma das três situações está
ocorrendo:

1. Se a pessoa não tem estrutura suficiente para compreender determinado


conhecimento, deve-se criar um ambiente melhor de trabalho, clima, diálogo, porque
é impossível criar estruturas necessárias. Ex: não se deve ensinar conhecimentos
abstratos, teorias complicadas para uma criança que ainda não atingiu a faixa etária
esperada, que se encontra no período das operações concretas;

2. Se a pessoa possui estruturas em formação, o professor deve trabalhar com


a ideia de que o erro é construtivo, deve fazer a mediação, ajudando o aluno a superar
as dificuldades;

3. Se a pessoa possui estruturas e não aprende, os procedimentos estão


errados. O professor fará intervenção para que o aluno tome consciência do erro. Em
muitos casos quem deve mudar os seus procedimentos é o professor.

A adaptação, outro conceito chave do Construtivismo, representa o equilíbrio


dinâmico entre os processos de assimilação e de acomodação, chegando, com isso,
à equilibração.

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A Teoria Piagetiana, em síntese, assegura que a construção do conhecimento
se dá quando acontecem ações físicas ou mentais sobre o objeto; ações que
provocam o desequilíbrio resultando em assimilação e acomodação dessas ações.
Para Piaget, as estratégias são inatas, a exploração é voluntária, se dá por meio da
curiosidade, o desenvolvimento é marcado por uma sequência e o papel do ambiente
seria o de afetar o ritmo da aprendizagem. A aprendizagem se dá, não por decorar a
solução, mas por entender o problema e buscar uma solução.

A contribuição da teoria piagetiana para compreensão dos processos cognitivos


na infância é inegável, mas e no ensino superior, qual a sua aplicabilidade?

Em primeiro lugar, abre-se a possibilidade de se pensar em uma educação


mais humanizada, voltada à descoberta de novos meios de aquisição do
conhecimento.

O Construtivismo leva a uma reflexão, ainda, sobre velhos modelos ou padrões


de ensino tradicional de exposição do conteúdo e transferência de conhecimento. A
educação bancária, tão criticada por Paulo Freire, é um exemplo de estratégia que
leva a uma aprendizagem mecânica e descontextualizada.

A noção de que o sujeito é autônomo deve se solidificar nas práticas docentes


do ensino superior. Vale destacar que o acesso ao ensino superior, ainda que esteja
longe de ser universalizado, sofreu mudanças positivas possibilitando o ingresso de
classes populares que anteriormente não tinham a menor perspectiva. Isso se torna
particularmente desafiador em função das lacunas oriundas de uma trajetória escolar
deficitária em muitos casos que desafia a prática docente a pensar em formas de
atendimento que vise à inclusão.

Longe de um perfil padronizado, o ensino superior na atualidade começa a


receber em maior número que o passado alunos oriundos das classes populares, o
que exige dos professores desse nível de ensino que adequem suas práticas para o
atendimento a esses.

O acesso das classes populares ao ensino superior deve se constituir um


marco para a necessária transformação dos processos de ensino/aprendizagem
dessa modalidade de ensino.

O professor, como ator responsável pelo processo educacional é o agente


capaz de promover as transformações histórico-sociais no campo da aprendizagem
favorecendo o ingresso de metodologias que atendam às necessidades desse público
diverso que chega à universidade rompendo com o modelo tradicional, conservador e
elitista característico desse meio.

Em se tratando da concepção construtivista aplicada ao ensino superior


ressalta-se que sua aplicabilidade é possível em meio à demanda do desenvolvimento
de competências por parte do aluno que o habilite ao exercício da profissão escolhida.

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2.2 Estágios de desenvolvimento e ciclos de vida: a adequação a cada faixa
etária

Os estágios do desenvolvimento, outro traço marcante da Teoria Construtivista,


se refere à existência de fases de desenvolvimento que apresentariam uma sequência
fixa e linear.

São quatro os estágios, sendo:

1. Estágio Sensório-Motor (de 0 a 2 anos);

2. Estágio Pré-Operatório (de 2 a 7 anos);

3. Estágio Operatório-Concreto (de 7 a 12 anos);

4. Estágio Operatório-Formal (de 12 anos em diante).

São fatores responsáveis pela mudança de estágio:

 A maturação, com destaque para a neurológica;


 As experiências como o brincar com objetos, as vivências e experiências
lógico-matemática;
 A transmissão social por meio da interação constante com o outro,
ressaltando que a importância da transmissão social para Piaget se refere
ao ritmo;
 As constantes e sucessivas equilibrações.

Piaget assegura que tudo o que ensinamos à criança, estamos impedindo que
ela invente ou descubra. Os estágios apresentam características de suma importância
para o pleno desenvolvimento da criança. Em cada um, há características a serem
construídas, superadas e aprimoradas.

No estágio Sensório-Motor, que vai de 0 a 2 anos, a criança tem contato com


o meio de forma direta e imediata, sem representação ou pensamento. Ao longo desse
estágio a criança passa por uma revolução copernicana, ou seja, quando nasce, a
criança acredita ser o centro do mundo.

31
Com o tempo, ela vai aprender que é mais uma parte do mundo, uma parte da
família. As noções de tempo e espaço são construídas pela ação - inteligência prática,
principalmente pela manipulação e sucção (a criança leva tudo à boca). A criança
apresenta coordenação de reflexos e reação como repetição de ações quando
produzem resultados. Nessa fase ocorre a construção da noção de objeto.

Na fase seguinte, estágio Pré-Operatório, a criança, através da ampliação dos


esquemas de ação, nas trocas com o meio e com os objetos ao seu redor, após
sucessivas assimilações e acomodações e também devido a um processo
maturacional, surge a função simbólica, inaugurando uma nova fase na vida da
criança.

A partir de então, a criança simboliza, diferenciando o significante (caráter


invariável do objeto) do seu significado (para o que pode servir, como uma caneta que
serve para escrever ou para prender o cabelo). É com o aparecimento da função
semiótica que a criança pode manifestar sua atividade mental através do desenho, do
jogo simbólico, da linguagem oral – ou escrita – e da imitação.

Tudo isso porque agora já possui também a imagem mental, porque houve a
incorporação e representação mental das suas experiências vivenciadas no estágio
anterior. Na visão de Piaget, a intuição é a lógica da primeira infância, caracterizada
pelo “apego” da criança ao primado das percepções.

O estágio Operatório-Concreto, dos 7 aos 12 anos, marca o ingresso da


criança à fase das operações mentais mais complexas, mas dependentes de
elementos concretos de seu cotidiano. Vale ressaltar que a criança pré-operatória
ainda não desenvolveu suas funções lógicas, ou seja, ainda não é lógica, mas o
“outro” exige lógica da criança.

Essa solicitação do meio exige da criança regulações e equilibrações que vão


estimular a construção das estruturas lógicas por alavancar a construção de novas
estruturas. Tais estruturas se fecham e se organizam através da reversibilidade do
pensamento.

Através da manipulação concreta dos objetos, agora no Operatório-Concreto,


a criança interioriza uma ação. Quando a criança pode reverter e coordenar uma ação,
ela está operando e começando a usar o pensamento dedutivo. A operação de
inclusão de classes, reversibilidade e transitividade, desenvolve, respectivamente, as
noções de classificação, conservação e seriação.

Finalmente, a partir dos 12 anos, a criança entra no estágio Operatório-


Formal. De acordo com Piaget. Esse período caracteriza-se pelo uso do raciocínio
dedutivo, a formulação de hipóteses e a coordenação de vários pontos de vista. Tal
período, apesar de ser a última etapa de desenvolvimento da inteligência não é
fechado, mas amplia-se a partir das variações empíricas que oferecem possibilidades

32
de o sujeito realizar novas abstrações e estabelecer além relações sobre as
operações, relações sobre relações, deduzindo hipóteses, que nem sempre podem
ser verificadas no concreto.

A contribuição da teoria piagetiana para o campo educacional está


especialmente na revelação de complexos processos envolvidos nas aprendizagens
do indivíduo que nos ajuda a compreender o desenvolvimento humano. Embora nada
tenha escrito para a educação, seus achados foram fundamentais para a
transformação dos processos escolares, agora sob o paradigma Construtivista.

A aplicabilidade do Construtivismo no ensino superior está no destaque dado à


mediação do professor entre o aluno e o conhecimento. Sai de cena um ensino
baseado na transferência de conhecimentos via transmissão de conteúdo por parte
do professor. Supera-se ainda a noção de aluno como um ser sem luz, desprovido de
conhecimentos e cuja passividade é perfil desejável pelo educador que se sente em
posição de superioridade perante o mesmo.

O Construtivismo mostra que “erros” que o aluno comete no processo de


construção de conhecimento não são aleatórios, desprovidos de sentido e de lógica.
Ao contrário, representam esquemas mentais utilizados para solucionar o que se
coloca como um problema cognitivo, ou seja, o novo conhecimento. Além disso, a
teoria piagetiana mostra a busca pela equilibração ocorre ao longo da vida e leva o
sujeito a constantes assimilações e acomodações, o que torna fundamental a
importância dos conhecimentos prévios.

Por outro lado, é forçoso admitir que, em relação ao aluno do ensino superior
que é um jovem ou um adulto, a teoria construtivista tem limitações. Por exemplo, a
ideia de um desenvolvimento baseado em estágios não se sustenta para explicar o
desenvolvimento cognitivo desse público. Embora toda a base construtivista seja de
extrema importância para os processos de ensino/aprendizagem, o público do ensino
superior tem suas idiossincrasias.

Na sequência, veremos a abordagem de Marta Khol Oliveira, cuja base, ainda


que admita a importância ímpar de Piaget, se apoia no conceito de “ciclos de vida”,
considerando-o mais adequado a essa fase do desenvolvimento.

É importante ressaltar que sua ênfase foi em torno do desenvolvimento infantil,


chegando até o início da adolescência, sendo assim, podemos questionar: sua teoria
se aplicaria também ao ensino superior? A resposta é que, se considerarmos a ideia
de que estágios representam características universais que todas as crianças
passam, essa não seria uma ideia razoável para explicar o desenvolvimento do adulto
que acumula experiências muito mais expressivas no que se refere ao tempo que as
crianças, inclusive experiências em diferentes grupos sociais, família, escola, amigos,
trabalho, entre outros.

33
Muito se sabe acerca do desenvolvimento infantil, mas há pouco conhecimento
sobre a psicologia do adulto, uma conclusão de Oliveira (2004), para quem a definição
de um estágio psicológico, tal como apregoa Piaget, não se sustenta para explicar o
universo do adulto. A autora lembra que adultos trabalham, constituem família, se
relacionam, aprendem em diferentes dimensões da vida, educam seus filhos, têm
projetos individuais e coletivos, o que se constitui fontes variadas de experiências e,
portanto, de aprendizado.

O adulto está inserido no mundo do trabalho e das relações interpessoais de


um modo diferente da criança, continua a autora. Embora as pesquisas de Oliveira
(2004) tenham ênfase na educação de jovens e adultos, seus achados trazem
contribuições significativas para a compreensão dos processos cognitivos do adulto
de modo geral, o que necessariamente insere o jovem adulto aluno do ensino superior.

Nesse sentido, Oliveira (2004) analisa a idade adulta como um ciclo de vida e
não como um estágio de desenvolvimento. Ciclos de vida representam etapas
culturalmente organizadas, o que impõe a necessidade de analisar o modo de
inserção na vida social de jovens e adultos que se encontram na sala de aula.

É necessário, na visão da autora, que instituições de ensino superior, assim


como instituições escolares, criem formas de diálogo entre a inserção social do jovem
e do adulto, seu acesso a diferentes tecnologias e linguagens, e os signos e modos
de pensar próprios da instituição de ensino.

Práticas nessa linha possibilita aos sujeitos adultos apropriarem-se da


instituição de ensino como um espaço social que é de todos os atores que nela
interagem. A ideia de ciclos de vida pode ser mais promissora para uma compreensão
minuciosa do fenômeno do desenvolvimento no adulto.

Para a docência no ensino superior, a proposta de ensino ancorada na visão


de ciclos de vida é um caminho viável para a aprendizagem significativa, uma vez que
utiliza saberes que constituem a vida do aluno. Ciclos de vida são ciclos culturalmente
organizados; eles representam a passagem dos sujeitos sociais pela existência
humana. Oliveira (2004) acredita que eles possam ser definidos a partir dos tipos de
atividades em que os sujeitos estão envolvidos e os correspondentes instrumentos,
signos e modos de pensar.

Uma ação pedagógica que se apoia na concepção de ciclos de vida tem no


indivíduo seu foco, isto é, sua organização está pautada nas trajetórias singulares dos
alunos como elemento mediador para a abordagem de conhecimentos referentes ao
curso em questão. Tal como a visão construtivista, o conhecimento prévio, as
experiências anteriores são importantes e devem ser valorizadas.

A questão é que, em se tratando do aluno jovem ou adulto não haveria um


único caminho de desenvolvimento ou uma única forma de funcionamento psicológico,

34
e sim, uma multiplicidade de instâncias que serviram para a base conceitual que o
aluno no ensino superior traz como bagagem.

Você saberia definir aproximações e distanciamentos entre a concepção de


construção do conhecimento na infância e a construção do conhecimento na
idade adulta? Os conceitos são muito semelhantes quando a análise foca os
processos cognitivos envolvidos na aquisição do conhecimento, nos esquemas
mentais envolvidos. Distanciam-se quanto a etapas ou características que
marcariam cada estágio, no caso da infância, pois tais características
envolveriam uma forma peculiar de a criança pensar que é absolutamente
diferente da maneira como o adulto pensa.

2.3 A valorização e utilização do conhecimento prévio dos alunos do ensino


superior como alavanca para a construção do conhecimento

Do exposto até o momento, vimos que a Teoria Construtivista trouxe


importantes respostas à pergunta “como o indivíduo conhece”. Desenvolvida
especialmente para se compreender o desenvolvimento cognitivo da infância à
adolescência e apropriada pelo campo educacional ainda que não tenha sido
idealizada para tal, o fato é que o Construtivismo pode auxiliar processos de
aprendizagem em todos os níveis.

Ainda que tenhamos autores como Oliveira (2004) que preferem o conceito de
ciclos de vida, mesmo esses, trazem em sua base a ideia de que conhecimentos
prévios devem ser valorizados. Nesse sentido, convém pensar na estrutura do ensino
superior que é organizado em torno de competências a serem desenvolvidas por seus
alunos.

A inteligência adulta é menos associada a processos e mais a conhecimentos,


particularmente conhecimentos associados a toda sua experiência de vida, o que
inclui saberes especializados, mas também tácitos, adquiridos na prática cotidiana,

35
voltados a procedimentos e necessidades práticas. É importante pensar que jovens e
adultos são também indivíduos que, em sua maioria, estão ou estiveram inseridos no
campo de trabalho.

Nesse quadro, ressalta-se também o fato de que as condutas humanas adultas


são orientadas especialmente pela razão, autonomia e responsabilidade. Esse
indivíduo se vale da razão para conhecer o mundo e a si mesmo por meio da
consciência e tem seus passos guiados sobremaneira pela autonomia no pensar e
agir. Através da consciência e autonomia, o sujeito se percebe como um ser livre,
capaz de tomar decisões e fazer escolhas. Essas características têm efeitos sobre a
consciência de responsabilidades que levam o sujeito a se comportar de formas
variadas diante de desafios que se colocam para ele.

Não se pode ignorar, no entanto, que o próprio docente do ensino superior


necessita desenvolver certas competências e habilidades que o preparem para tal
universo. De acordo com Pimenta e Anastasiou (2002), a docência no ensino superior
também se configura um desafio para o desenvolvimento de competências dos
alunos, uma vez que em geral, não se exige formação pedagógica para professores
dessa modalidade de ensino, exceção a cursos de humanidades. Em geral, a
competência técnica, isto é, o domínio de conteúdos específicos, é suficiente para
habilitação de docentes nas universidades.

Atualmente, esse cenário aos poucos vem se transformando com a percepção


de que saberes do campo das humanidades, especialmente, do campo da psicologia,
são essenciais para o sucesso dos alunos no ensino superior.

Sabemos que o Construtivismo preza pela construção do conhecimento pelo


aluno, num processo a ser desenvolvido pela relação professor/aluno em uma nova
perspectiva na qual o professor não é o centro do processo de ensino/aprendizagem,
mas antes um mediador entre aluno e conhecimento.

Sob essa ótica, o ato de ensinar e de aprender tornam-se substancialmente


dialéticos, uma vez que a mediação do professor será determinante para a construção
do conhecimento por parte do aluno. Ganha importância nesse contexto o que o aluno
traz em sua bagagem, o que foi responsável pela base conceitual que apresenta em
sua subjetividade. Assim, os conhecimentos prévios se tornam um instrumento valioso
tanto para o professor que os utilizará em sua mediação, quanto para o aluno que se
apoiará neles para construir novos conhecimentos.

A importância de se apoiar em conhecimentos prévios é apresentada tanto na


visão de Piaget quanto de Paulo Freire, o que mostra a relação estreita entre
mediação docente na educação básica e ensino superior, entre crianças, jovens e
adultos, guardando as respectivas características de cada faixa etária.

36
Vale lembrar que uma metodologia que se apoia na visão construtivista de
educação instiga a curiosidade dos alunos em constantes desafios por meio de
situações-problema. O aprendizado de fato ou a aprendizagem significativa acontece
o aluno tem a oportunidade de buscar a solução para problemas que se colocam.
Cabe ao professor criar situações problema e estratégias para despertar o interesse
do aluno em resolver o problema.

Ao professor é esperado que possua igualmente competências que o permita


organizar ambientes físico, social e emocional na sala de aula com posturas que sejam
significativas aos olhos de seus alunos, num constante construir, desconstruir e
reconstruir sejam ideias, conceitos ou saberes teóricos e práticos.

No campo da docência do ensino superior torna-se urgente, portanto, que se


desenvolvam competências para que esse professor tenha condições de valorizar,
estimular e utilizar o conhecimento prévio de seus alunos como alavanca para a
construção do conhecimento dos mesmos.

A perspectiva de estudos que se interessam pela singularidade do jovem e do


adulto é apresentada por autores como César Coll e visam adentrar no terreno
das subjetividades do indivíduo que devem ser consideradas no que diz
respeito a processos de ensino/aprendizagem mais humanizados. O livro
“Desenvolvimento psicológico e educação: psicologia evolutiva” faz uma
abordagem pertinente à temática.

COLL, C.; MARCKESI, A.; PALACIOS, J. Desenvolvimento psicológico e


educação: psicologia evolutiva. 2 ed. São Paulo: Artmed, 2004.

Por fim, destaca-se o fato de que a aprendizagem requer funções psicológicas


como atenção, memória, percepção e emoção, o que imprime ao processo de
ensino/aprendizagem a necessidade de se criarem espaços que valorizem tais
elementos.

37
A mobilização de saberes prévios é dependente do tipo de relação estabelecida
entre professor e aluno, uma relação que se pauta nas trocas afetivas como explica
Goleman (2001). Para ele, o controle das emoções contribui de forma essencial para
o desenvolvimento da inteligência do indivíduo, mostrando que a incapacidade de lidar
com as próprias emoções pode dificultar ou até destruir nossas vidas. O autor ressalta
que a crise que a humanidade vive hoje, com aumento da criminalidade, violência e
infelicidade é o reflexo de uma cultura que se preocupou apenas com o intelecto,
esquecendo o lado emocional da pessoa.

Goleman (2001) afirma que existem duas mentes: a que raciocina e a que
sente. Esses dois modos de conhecimento diferentes interagem na construção de
nossa vida mental. A mente racional é o modo de compreensão de que quase sempre
temos consciência, é mais destacado na consciência, mais atenta, capaz de ponderar
e refletir. Já a mente emocional, é um sistema de conhecimento impulsivo.

Na maior parte do tempo, essas duas mentes operam em harmonia, mesclando


seus modos de conhecimento para que nos orientemos no mundo. Em muitos
momentos, essas mentes se coordenam; os sentimentos são essenciais para o
pensamento e vice-versa. Mas quando as paixões surgem, esse equilíbrio se desfaz.
E então a mente emocional assume o comando.

Muitas das nossas ações são determinadas pelas emoções que têm sua razão
e uma lógica peculiares. A mente emocional é muito mais rápida do que a racional,
levando à ação, sem dar tempo para pensar. Essa rapidez não permite a reflexão que
caracteriza a mente racional. Provavelmente, essa rapidez na ação, se explique, no
curso da evolução humana, como um meio de preservação da vida, da necessidade
de defesa diante do perigo.

As ações que provêm da mente emocional trazem uma sólida sensação de


certeza, permitem que determinadas coisas sejam encaradas de forma simplificada,
coisas essas que, para a mente racional seriam intrigantes e questionáveis. Passado
o momento de ímpeto, surgirá um questionamento sobre o motivo da ação; aí está o
sinal da percepção da mente racional. As emoções se apossam de nós com muita
rapidez, antes mesmo de nos darmos conta de que já se instalaram em nós.

A mente racional demora mais para registrar os fatos e para reagir a eles do
que a mente emocional. Em circunstâncias emotivas, o primeiro impulso vem do
coração e não da cabeça. Existe também o tipo de reação emocional que não é tão
rápida, desenvolve-se e fermenta-se no pensamento até configurar-se como
sentimento.

Esse caminho é mais deliberado e permite que se tenha consciência do


raciocínio que leva à eclosão da emoção. Nesse caso, a reação que se desencadeia
é precedida de uma avaliação extensa que engloba o pensamento, o processo

38
cognitivo. Nesse processo mais lento, um pensamento mais articulado precede o
sentimento e surge a resposta emocional adequada.

No processo de resposta rápida, ao contrário, o sentimento precede ou é


simultâneo ao pensamento. Essa reação emocional assume o comando em situações
de urgência, por isso, essa reação tem o poder de mobilizar-nos quando se trata de
sobreviver a um iminente perigo. Da mesma forma que há caminhos rápidos e lentos
para o desencadeamento de uma emoção, há emoções que alimentamos e que
convidamos para permanecer conosco. São sensações provocadas propositalmente.

Embora não saibamos, com certeza, qual o tipo de emoção que um


pensamento pode desencadear, podemos escolher em que pensar. A mente racional,
por outro lado, não decide que emoções devemos ter. Diante disso, o que a mente
racional pode fazer é controlar o curso da nossa reação, pois não podemos decidir
quando ficar tristes, furiosos, alegres, etc. A mente emocional considera que suas
crenças são totalmente verdadeiras e assim despreza qualquer coisa que lhe seja
contrária.

Por isso, é muito difícil fazer com que uma pessoa, sob perturbação emocional,
raciocine; não há argumento do ponto de vista lógico que o demova de suas
convicções. A mente emocional reage, no presente, a um fato, como reagiu no
passado a esse mesmo fato. Temos então, como professores, o desafio de lançar
mão de estratégias que, ao mesmo tempo se valham dos conhecimentos prévios dos
alunos como forma de potencializar sua aprendizagem, e que os envolva em um
ambiente que estimule sua mente racional e emocional.

2.4 Considerações finais

Como vimos, o desenvolvimento infantil e o desenvolvimento do jovem e do


adulto guardam semelhanças e disparidades. A criança possui uma forma particular
de perceber o mundo e essa relação aliam maturação a processos constantes de
interação com o meio, denominados assimilação e acomodação.

O jovem e o adulto, por suas experiências também com o mundo do trabalho e


ápice da maturação interna de suas estruturas mentais, possuem uma forma diferente
de se relacionar com o mundo a sua volta.

Em comum, a criança, o jovem e o adulto têm o fato de que seus conhecimentos


prévios representam a base para que novos conhecimentos se consolidem. Portanto,
ganha importância os processos de ensino/aprendizagem tanto na educação básica

39
quanto no ensino superior que priorizem estratégias que mobilizem tais experiências
prévias com vistas ao pleno desenvolvimento do educando.

Prevendo estratégias pedagógicas no ensino superior com base


construtivista

Desenvolvendo uma proposta pedagógica ancorada nos preceitos da teoria


Construtivista, um professor de determinado curso superior se vê diante de uma turma
com perfil bastante variado. Há alunos na faixa etária entre 19 e 65 anos, bem como
alguns alunos com vínculos familiares como filha e mãe, e irmãos. O conteúdo a ser
trabalhado introduz um conceito específico da área de formação que o professor teme
não ser de entendimento para a maioria, pois exige uma base da matemática que ele
não sabe se todos os alunos daquela turma têm. Se considerarmos esse professor
como um profissional que decide lançar mão de estratégias construtivistas, como ele
poderá mobilizar os conhecimentos prévios de seus alunos para a introdução de um
assunto que exige a compreensão de conceitos de base da matemática.

Ao trabalho!

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A unidade que acabamos de ver abriga conhecimentos essenciais para a


prática de um professor construtivista. Compreender que as pessoas trazem
conhecimentos fruto de sua experiência de vida é essencial para a condução de
processos educativos mais humanizados.

Pudemos conhecer os preceitos da Teoria Construtivista, tão importante e


difundida na educação básica graças ao entendimento da forma peculiar como pensa
a criança diferentemente do adulto. Conhecimentos acerca dos processos envolvidos
no desenvolvimento cognitivo são de fundamental importância para o futuro docente,
seja ele um profissional que vai atuar na educação infantil ou no ensino superior, para
falarmos de dois extremos. Qualquer que seja a etapa atendida, entender como o ser
humano aprende, como se relaciona com objetos de conhecimento, é essencial para
a prática docente.

41
Vimos semelhanças que a teoria construtivista apresenta em relação à fase
infantil e à fase adulta, com destaque para os processos constantes de assimilação e
acomodação que ocorrem continuamente, bem como o fato de que conhecimentos
prévios se constituem uma base de fundamental importância para construção de
novos conhecimentos.

Em relação a diferenças entre os dois públicos (infantil e adulto), observamos


especialmente a ideia de estágios de desenvolvimento. Autores como Marta Khol nos
apresentaram as especificidades do adulto que inviabilizam a noção de estágios de
desenvolvimento, defendendo a presença de ciclos de vida como a explicação mais
viável para compreensão dos processos de desenvolvimento nessa fase da vida.

Apesar das diferenças no que se refere a estágios e ciclos de vida, fato é que
outros elementos da teoria construtivista se adequam perfeitamente ao ensino
superior com contribuições importantes para se organizar estratégias didáticas. É o
caso dos conhecimentos prévios e a importância para a construção de novos saberes.

O ensino superior, portanto, é uma modalidade de ensino em que o


Construtivismo pode contribuir com os processos pedagógicos otimizando estratégias
didáticas a partir da mobilização de conhecimentos prévios dos alunos estimulando-
os a resolução de situações problema que possam ser apoiadas em saberes
construídos ao longo de sua trajetória de vida.

42
3. ABORDAGENS TEÓRICO-METODOLÓGICAS COMO CONTRIBUIÇÃO
PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DISCENTE NO ENSINO
SUPERIOR

Como se processa o conhecimento no ser humano? Essa é uma questão que


sempre mobilizou e ainda mobiliza inúmeros pesquisadores com o propósito de
identificar e, se possível, mapear, como ocorre o conhecimento na mente das
pessoas.

Desde a visão inatista de conhecimento como um dom, pronto desde o


nascimento, passando pelas teorias do comportamento que denominavam
conhecimento aquilo que seria produzido pelo ambiente por meio dos estímulos
corretos, até a visão interacionista de desenvolvimento segundo a qual o
conhecimento resulta de inúmeras interações entre o sujeito, suas características
internas maduras e o meio que o cerca, é fato que ainda que o Interacionismo balize
as explicações contemporâneas sobre a aprendizagem, permanece o desafio,
sobretudo no campo educacional, de se criar estratégias que favoreçam as interações
entre o indivíduo e situações que potencializem a aprendizagem.

Nesse quadro, a presente unidade visa apresentar abordagens teórico-


metodológicas da atualidade que possam favorecer os processos de
ensino/aprendizagem com foco no desenvolvimento pleno do aluno, aqui entendido
como as condições para que o mesmo exerça funções profissionais e pessoais agindo
e transformando o meio que o cerca.

Assim, veremos as contribuições atuais que a Neurociência apresenta para o


desenvolvimento, assim como recorreremos aos estudos de David Ausubel e de
Howard Gardner com a teoria da aprendizagem significativa e de inteligências
múltiplas, respectivamente, finalizando com os pressupostos teóricos de Bloom ao
explicitar os fundamentos do que se convencionou chamar de a Taxonomia de Bloom.

3.1 A Neurociência e os aspectos cognitivos do adulto

Um dos principais desafios da comunidade científica na


contemporaneidade é desvendar a complexidade do cérebro humano e o
funcionamento do sistema nervoso central. Entender a fisiologia cerebral nas
suas dimensões cognitivas, afetivas, emocionais e motoras é cada vez mais
importante para a compreensão do ser humano.

43
Bear, Connors e Paradiso (2002) destacaram que a comunidade
científica de diversas áreas, entre elas a medicina, a psicologia, a psiquiatria e
a biologia, tem se debruçado sobre o tema, com o propósito de compreender
funcionamento desse importante órgão do corpo humano. Sob o ponto de vista
investigativo são inúmeros os fatores que impactam as funções do sistema
nervoso.

Tais alterações podem ocorrer por eventos ambientais como trauma,


agentes infecciosos ou tóxicos; por tumores, mutações gênicas e defeitos
congênitos; por eventos vasculares e deficiências nutricionais, e por muitos
outros fatores (VENTURA, 2010).

A junção de interesses de diferentes áreas deu origem a um novo campo


de pesquisa chamado de Neurociência. O conceito de neurociências é amplo e
atual, de modo geral, esses estudos investigam o funcionamento do Sistema
Nervoso e suas funcionalidades. Não abarcam uma única dimensão de
pesquisa, mas sim um conjunto de estudos que podem ser agregados em
momentos distintos. De acordo com Cosenza e Guerra (2011) a literatura faz
uso do termo neurociência para designar estudos que investigam:

 os neurônios e suas moléculas constituintes,


 os órgãos do sistema nervoso e suas funções específicas,
 as funções cognitivas e os comportamentos que são resultantes da
atividade dessas estruturas;
 os processos de desenvolvimento, envelhecimento e as possíveis
alterações que ocorrem no cérebro no decorrer da vida.

Importante destacar que o produto das reflexões geradas pelos profissionais


de diversas áreas insere o conhecimento neurocientífico no campo multi e
interdisciplinar e isso significa dizer que ocorre uma aproximação das produções
teórico-conceituais que diferentes disciplinas que procuram entender como alguns
processos acontecem no cérebro.

Do ponto de vista da diretriz interdisciplinar, tal cenário leva esse novo campo
de estudos a refletir e construir estruturas conceituais e metodológicas
compartilhadas, já que assume o desafio de reunir conhecimento científico e
tecnológico de vários nichos acadêmicos.

Dessa forma, torna-se um desafio para os neurocientistas e ao mesmo tempo


uma necessidade, investigar, compreender, articular e compartilhar o conhecimento
produzido a fim de contribuir com os avanços científicos e a ampliação do
conhecimento acerca do cérebro e suas conexões em forma de redes.

44
Em relação aos estudos que se voltem ao campo multidisciplinar, Marques e
Faria (2013) consideram que, os aportes interdisciplinares contribuem com a validade
da pesquisa como uma alternativa para a obtenção de novos conhecimentos, a partir
de combinação metodológica e novos pontos de vista. Isso indica que as pesquisas
neurocientíficas não se filiam ao campo da medicina ou da biologia como também não
ficam atreladas ao campo da psicologia ou da psiquiatria.

Esses estudos com uma inflexão interdisciplinar transitam pelos diversos


campos ao mesmo tempo e enveredam no desafio de construir um campo comum de
discussão, partindo da perspectiva interdisciplinar, impulsionando a produção de
conhecimento sobre o funcionamento desse complexo órgão.

Aleksandrowick (2000) postula que a respeito da diversidade de estudos que


se voltam ao campo inter e multidisciplinar considera-se que, diante da complexidade
do cérebro, há consenso sobre a importância da interdisciplinaridade como foco
investigativo. Para o autor, diante de um objeto de estudo tão complexo como o
cérebro e movido pelo desafio de compreendê-lo, é indispensável em qualquer linha
de investigação e, especialmente, no caso do sistema nervoso, que os avanços
obtidos principalmente da neuroquímica sejam somados aos progressos obtidos pela
filosofia da mente (fenomenologia), e esses conectados com os progressos na área
da física (mecânica, quântico e teoria do caos), na matemática (teoria dos jogos) e na
biologia (projeto genoma) e na computação.

Outro aspecto importante da conceituação da neurociência diz respeito à


distinção entre as pesquisas. Embora progressos consideráveis tenham sido
alcançados nos estudos sobre o sistema nervoso, a neurociência pode ser
considerada uma ciência em estágio embrionário e está em grande expansão
(VENTURA, 2010). No Brasil, tais projetos envolvem muitos pesquisadores, ganharam
densidade a partir dos anos 1990 e ainda precisa passar por diversas fases até
alcançar sua maturação.

Analisando historicamente o tema, o conhecimento neurocientífico e potencial


tratamento de doenças neurológicas obtiveram um crescimento substancial nos
últimos 30 anos. Em 2010, o Congresso americano considerou que os anos 1990-
1999 como a “Década do Cérebro”, em reconhecimento as descobertas e aos
progressos obtidos nesta área.

Nas décadas seguintes com os avanços tecnológicos da neuroimagem, da


eletrofisiologia, da neurobiologia molecular, bem como os achados no campo da
genética e da neurociência cognitiva possibilitaram um avanço do conhecimento
campo da neurociência em ritmo até então nunca observado (COZENZA; GUERRA,
2011).

No terreno da pesquisa, um retrato da área da neurociência destaca-se os


estudos giram que em torno do uso de fármacos; uso de células-tronco; reabilitação e

45
imaginação motora; fisioterapia neural; diagnóstico e tratamento de transtornos
mentais psiquiátricas do ponto de vista biológicos; uso de novas tecnologias de
neuroimagem; uso de métodos estatísticos e computacionais para extrair dados de
imagens para compreender melhor como o cérebro se desenvolve; entre outras.

Esses estudos podem ser reunidos em grupos. Os oito (8) principais grupos de
estudo da Neurociência são:

I. Neurociência da emoção e do afeto: analisa como os neurônios se


comportam em relação às emoções e os afetos. Esse horizonte teórico
considera que as emoções fazem parte do nosso processo cognitivo. Do
ponto de vista experimental e teórico há na neurociência afetiva duas linhas
de investigação em torno das emoções. A primeira considera que as
emoções são formadas por seis constructos básicos compostos por
elementos psicológicos. São eles: nojo, raiva, medo, alegria, tristeza e
surpresa. Nessa conjectura teórica os tipos de emoções são a base para a
compreensão das respostas fisiológicas do corpo frente aos fenômenos
afetivos. Esses estudos acreditam que as emoções são inatas e utilizam os
mesmos mecanismos neurais de funcionamento cerebral para cada uma
das emoções básicas. Além das emoções básicas existem também as
emoções complexas. Essa perspectiva teórica entende que as emoções
complexas, como a vergonha, por exemplo, que são formadas por uma
combinação de emoções básicas. Por sua vez, a outra dimensão teórica
apresenta um novo olhar sobre o tema ao buscar compreender as emoções
como sendo um conjunto de reações fisiológicas que se somam a
comportamentos corporais e experiências subjetivas. Entende as emoções
e os afetos como experiências sensórias e nessa conjectura as emoções
não são consideradas inatas. Elas são na verdade significados e reflexos
que atribuímos às experiências específicas da natureza humana que
vivenciamos.

II. Neurociência computacional: área de estudo que procura desenvolver


modelos matemáticos e computacionais para entender como funcionam os
padrões de atividade neuronal. Descobrir as regras das interações das
células nervosas e conhecer os processos cerebrais é o objetivo da
neurociência computacional. Nesses estudos são utilizados modelos
computacionais para simular e modelar as funções cerebrais diante, por
exemplo, de uma intervenção farmacológica, de uma lesão física ou mesmo
para simular situações reais do cérebro. Tais simulações permitem
descrever os processos cerebrais utilizando-se da matemática e deram
origem a um novo campo da ciência chamado de estudo experimental in
silico, que são diferentes dos estudos tradicionais feitos através de
processos biológicos conhecidos como in vitro e in vivo.

46
III. Neuroimagem: é um ramo imagiologia médica que se concentra no
cérebro e são utilizadas para diagnosticar doenças e avaliar a saúde do
cérebro. Os principais métodos de neuroimagem são: radiografia simples;
ultra-sonografia; tomografia computadorizada; ressonância magnética;
angiografia e medicina nuclear. Esses métodos fornecem uma grande
variedade de informações do cérebro tanto da sua ordem funcional como
estrutural. Permite que se construam imagens anatômicas de alta
resolução do cérebro que são utilizadas para estudar o órgão e ver como
ele reage a uma atividade específica. Existem dois tipos de neuroimagem,
a funcional que está focada nas funções do cérebro e estrutural que
investiga a estrutura física do cérebro.

IV. Neurociência cognitiva ou neuropsicologia: Estuda os processos


mentais relacionadas à inteligência como a linguagem, memória,
autoconsciência, percepção, atenção. Um traço especial desses estudos é
que ele procura estabelecer correlações entre as principais funções do
aprendizado que são: atenção, a memória e o pensamento. Essas
pesquisam procuram verificar como as funções cognitivas se modificam
durante o processo de envelhecimento saudável e patológico, investigam
também os processos que preservam ou deterioram a memória episódica
nos indivíduos e quadros de demência.

V. Neurociência cultural: Aqui temos as crenças e os valores culturais como


componente dessa perspectiva de investigação. Com efeito, as pesquisas
desenvolvidas nesse campo procuram realizar um diagnóstico de como
esses elementos são moldados pelo cérebro.

VI. Neurociência celular e molecular: estudam os neurônios, o papel


individual das moléculas e a sua relevância funcional no interior sistema
nervoso e as células nervosas que compõem o cérebro. Investiga como a
química e a física estão imbricadas na função neural. Estuda as diversas
moléculas.

VII. Neuroengenharia: é uma área que estuda a interface entre o cérebro e


artefatos mecânicos, eletrônicos, virtuais. Ela busca estabelecer uma
conexão computacional entre esses dois elementos através ferramentas da
neurociência e da engenharia. A neuroengenharia também estuda o
funcionamento do sistema nervoso e utiliza técnicas de engenharia para
entender, restaurar ou melhorar os sistemas neurais.

VIII. Neurofisiologia: Mantêm seu olhar atento as relações do cérebro e


sistema nervoso periférico. Pode ser entendido como uma fusão da

47
neurologia que estuda o cérebro humano e suas funções e a fisiologia que
estuda a soma das partes do corpo e como elas se inter-relacionam. Estuda
também os sinais bioelétricos do cérebro e dos sistemas neurais para
diagnosticar possíveis patologias e distúrbios neurológicos como a
epilepsia.

Como se vê, a Neurociência representa um novo campo de conhecimento em


que muitos pesquisadores têm empenhado esforços para desvendar os complexos
processos mentais envolvidos no desenvolvimento humano.

Em se tratando de estudantes universitários, não podemos ignorar que, em sua


maioria, são pessoas que estão ingressando na fase adulta e trazem muitas
experiências a serem valiosas ferramentas para novas aprendizagens. São indivíduos
autônomos com vasto leque de saberes, o que demanda do professor organizar
constantes desafios para que o ensino não limite os alunos a ouvir ou assistir
passivamente a exposição de conteúdos. A aprendizagem significativa se dá na
medida em que o aluno é desafiado a resolver uma situação problema que consolide
o conhecimento teórico na prática cotidiana.

3.2 Aprendizagem Significativa e Inteligências Múltiplas

O conceito de aprendizagem significativa deriva da ideia de protagonismo


exercido pelo aluno em seu processo de construção do conhecimento, cuja base é
piagetiana. Buscamos no pensamento de David Ausubel, a compreensão dos
processos cognitivos que asseguram a aprendizagem significativa por meio da
experiência.

A aprendizagem significativa se opõe à aprendizagem mecânica, esta de


natureza fragmentada e descontextualizada. O que chamamos de aprendizagem
mecânica se refere ao produto de um ensino que desconsidera o aluno como ator
ativo do processo de ensino/aprendizagem. No contexto da escola tradicional,
sobretudo, esse modelo se coloca como o ideal em um ambiente cuja referência
central é o professor.

Nesse cenário, privilegia-se o papel do professor como alguém que fornece


informações de modo que o aluno possa retê-las e aplicá-las. Sob a forma de
reprodução do conteúdo ensinado, tem-se nesse modelo, a aprendizagem ideal em
que os conteúdos assumem papel fundamental. A aprendizagem é averiguada por

48
meio de instrumentos e práticas de avaliação que aferem a capacidade de
memorização e de reprodução do conteúdo por parte do aluno.

Na visão tradicional de ensino, um bom ensino leva a uma boa aprendizagem,


o que torna o ambiente um fator relevante na medida em que estímulos controlados
por meio de prêmios reforçadores ditam a dinâmica de aprendizagem dos estudantes.
Tal modelo, via de regra, tem se mantido nas salas de aula desde a educação básica
até o ensino superior, provocando aprendizagens superficiais sem grande
aplicabilidade no cotidiano de crianças e adolescentes.

No ensino superior há um agravante nesse modelo, pois se trata da formação


para o exercício profissional em que uma aprendizagem mecânica tende a produzir
conhecimentos rasos para a carreira a que se destina o curso. Por essa razão, os
saberes oriundos da formação inicial necessitam de muita atenção, pois subsidiará
ações do indivíduo sobre a vida cotidiana de outras pessoas, sejam eles saberes da
engenharia, da docência, do direito entre tantas outras áreas profissionais.

Nesse sentido, recorremos, primeiramente aos fundamentos da teoria


desenvolvida por Ausubel que propõe a ação constante do aluno sobre o meio. Para
o teórico, os ensinamentos do professor devem servir como instrumentos de
conhecer, fazer, viver e ser. Quando tentamos guardar elementos soltos como frases
as quais não reconhecemos seu sentido, a tendência é que, pelo fato de não as
relacionarmos a algo que já conhecemos, elas sejam esquecidas tão logo o conteúdo
abordado seja outro.

Ausubel assegura que a aprendizagem significativa é aquela que se relaciona


de maneira não arbitrária à estrutura cognitiva do aluno. Em seus estudos, ele
apresenta fundamentos que mostram como o cérebro apreende informações do
exterior trabalhando conceitos de forma mecânica ou significativa.

O caminho que a mente percorre se inicia com a busca por sentidos à


informação recém recebida. Seu processamento busca uma significação nas
estruturas mentais do sujeito. Na ausência de algo para se apoiar, algo para significar
a nova informação, o que resta é a aprendizagem mecânica ou automática, apoiada
na memorização e reprodução isenta de sentidos.

A aprendizagem mecânica não conduz a processos de construção de


conhecimento, de modo que uma exposição do professor concebida como uma
transferência de conhecimentos da parte de quem ensina para o sujeito que aprende,
não tem a menor relevância do ponto de vista do conhecimento como fonte de
intervenção sobre a realidade.

É preciso analisar o processo de ensino/aprendizagem como uma relação entre


um sujeito que ensina e um sujeito que aprende. O sujeito que ensina certamente leu,
refletiu, pensou, analisou, ou seja, mobilizou conhecimentos prévios de uma sólida

49
formação anterior para atribuição de sentidos ao conjunto de conhecimentos que
“passará” aos seus alunos.

A questão central que se coloca é que, do outro lado, há um aluno cuja base
de conhecimentos é diferente da do professor e, portanto, os conceitos em que se
apoiará para refletir, pensar e analisar serão, provavelmente, inferiores ou de outra
natureza, o que inviabiliza uma transferência pura e simples de informações sem que
haja conexões possíveis de serem realizadas.

O grande desafio é estabelecer uma relação dialógica entre professor e aluno


de modo a buscarem juntos tais conexões que contribuirão para a significação dos
novos conhecimentos.

Intervenções do professor, seja na educação básica, sejam no ensino superior,


devem ser planejadas tendo como princípio uma intervenção mediadora de forma a
mostrar significações que, sozinho, o aluno teria dificuldades em encontrar. Entra em
cena um elemento fundamental que se refere à problematização dos conteúdos a
serem trabalhados.

Como saber o significado que será atribuído pelo aluno se essa significação
tem relação direta com as experiências do aluno ao longo de sua trajetória escolar e,
sobretudo, humana? É só através de rodas de conversa que intentem levantar o
conhecimento prévio e as hipóteses que os alunos têm em relação ao que será objeto
de ensino que se produz as condições para a aprendizagem significativa.

Por meio da relação dialógica e investigativa é que o professor poderá


decodificar e traduzir conceitos teóricos com base nos saberes presentes na estrutura
cognitiva e no universo vocabular, fruto por sua vez, das experiências vividas.

A mobilização de processos de contextualização é uma ação de essencial


importância na prática docente, seja na educação básica, seja no ensino superior, pois
mobiliza saberes do aluno, seja ele criança, jovem ou adulto. Esses saberes são
produto das interações realizadas cotidianamente com o meio que o cerca e serão
fundamentais para que o aluno os relacione com os saberes formais.

Do professor mediador é esperado que resgate os saberes que o aluno tem,


utilizando-os como mola propulsora para os novos que serão apresentados e,
portanto, incorporados à sua estrutura cognitiva. Nesse cenário, ganha importância o
processo cognitivo definido como contextualização, um processo que favorece a
significação do novo por meio da visão mais ampla da realidade.

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O livro “A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel” é uma
leitura importante para se conhecer os fundamentos em que se baseia Ausubel
para a defesa de interações do aluno com situações em que ele seja levado a
fazer conexões entre o novo conhecimento e o conhecimento já existente em
suas estruturas cognitivas. Obra de significativa importância para a formação
docente.

AUSUBEL, D. P. A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel.


São Paulo: Moraes, 1982.

Outro conceito importante difundido no campo educacional diz respeito às


Inteligências Múltiplas, definido por Howard Gardner. Não se trata de um método, mas
de um novo paradigma que se contrapõe à ideia de uma inteligência individual única.
Desenvolvida no início da década de 1980, a teoria defende que as ações do sujeito
envolvem atividades simultâneas, ainda que haja diversidade na intensidade com que
se manifesta, de modo que haveria pelo menos oito inteligências assim definidas:

1. Inteligência linguística ou verbal – uma inteligência notada na aptidão em


aprender idiomas e fazer uso da fala e da escrita para atingir objetivos. Possui
sensibilidade à estrutura, ao som e ao significado das palavras. Comum em poetas,
escritores, advogados, etc.

2. Inteligência lógico-matemática – uma habilidade focada na capacidade de


realização de operações numéricas e de deduções. Uma inteligência que, estimulada,
se apresenta no indivíduo como a capacidade para trabalhar longas cadeias de
raciocínio. É uma inteligência predominante em engenheiros, projetistas, entre outros.

3. Inteligência espacial – favorece o reconhecimento e a manipulação de


situações que envolvem apreensões visuais, é a capacidade de percepção do mundo
visuoespacial. É uma característica que se destaca em publicitários, inventores,
motoristas, etc.

4. Inteligência sonora ou musical – revelada pela aptidão para tocar, apreciar


e compor padrões musicais.

51
5. Inteligência cinestésico-corporal – é a inteligência do movimento,
representa o potencial para usar o corpo com o fim de resolver problemas ou fabricar
produtos. Presente especialmente em atletas, mágicos e atores.

6. Inteligência naturalista – representa a compreensão integral da ecologia;


uma sensibilidade na percepção integral da vida e da morte, muito presente em
paisagistas e jardineiros.

7. Inteligências pessoais – intra e interpessoal; a primeira voltada a aspectos


internos de autoconhecimento, de entendimento de si próprio para alcançar certos
fins; a segunda voltada à relação com o outro, uma capacidade de entender as
intenções e os desejos das outras pessoas.

Gardner admite que cada indivíduo nasce com um vasto potencial de talentos,
sendo que tais talentos passam a ser moldados pela cultura na qual a criança está
inserida por volta dos 5 anos. Nesse sentido, a trajetória de vida do ser humano tende
a privilegiar certas inteligências no lugar de outras, embora tenha nascido com a base
para todas.

Isso significa que, ao ingressar no ensino superior, esse adulto tem definidos
seus talentos, os quais foram se aperfeiçoando ao longo de sua história de vida.
Assim, como um ser autônomo, é bastante provável que sua escolha por um curso
superior tenha sido influenciada por uma ou várias das inteligências predominantes.
Cabe ao professor valorizar uma visão de ser integral, bem como mediar
aprendizagens em espaços de diversidade como é a sala de aula.

Por essa razão, é de suma importância que no ambiente universitário haja


enfoques variados para habilidades diversas, enfoques estes que estimulem todas as
habilidades potenciais dos alunos quando se está abordando um mesmo conteúdo.
Estratégias nessa direção são aquelas que promovem a resolução de problemas.

No trabalho pedagógico, é essencial que se organizem situações didáticas que


potencializem as inteligências múltiplas. Para esse fim, boas estratégias são aquelas
que não determinam atitudes ou ações dos alunos, mas antes, criem diferentes
espaços ou atividades, como grupos temáticos, por exemplo, que estimulem a
autonomia deixando as escolhas para os próprios alunos.

52
Diversificar espaços e/ou atividades para que as múltiplas inteligências se
manifestem e otimizem o aprendizado dos alunos é um desafio para o
professor. Nesse contexto, faz sentido um planejamento prévio da aula por
parte do educador? Haveria a necessidade de se manter um plano de aula
previamente demarcado diante da imprevisibilidade da aula em contexto de
diversidade? Qualquer que seja a estratégia didática aplicada, o planejamento
é imprescindível. Privilegiar a autonomia do aluno, favorecendo espaços para
que se manifestem as múltiplas inteligências não exclui a importância de um
planejamento, pois os objetivos de aprendizagem sempre comporão um plano
seja ele de aula ou de ensino.

3.3 A Taxonomia de Bloom e a mobilização de processos cognitivos

A Taxonomia de Bloom refere-se aos processos cognitivos mobilizados pelo


indivíduo diante de tarefas que precisa realizar. Trata-se de esquemas mentais
utilizados, estratégias cognitivas de que o sujeito lança mão diante de uma situação
problema. Sua importância está em reconhecer que para qualquer situação, diante de
qualquer tarefa ou comanda recebida o indivíduo mobiliza processos cognitivos, busca
em seu repertório algo em que possa se apoiar para solucionar o problema que se
coloca.

Nesse sentido, o “erro” do aluno, tal como vimos nas teorias interacionistas de
desenvolvimento, tem um sentido, segue uma lógica, um raciocínio por parte do
sujeito que aprende.

Mas afinal, o que é Taxonomia?

Táxis = ordem, classificação

Nomos = lei, ciência

Taxonomia é o estudo da classificação das coisas e se refere aos critérios e ou


parâmetros escolhidos arbitrariamente pelo classificador. No campo do conhecimento,
taxonomia dos objetivos de aprendizagem é uma tentativa de classificar níveis e
formas de aquisição de conhecimentos.

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A Taxonomia de Bloom foi desenvolvida por Benjamin Bloom, educador norte-
americano e refere-se à classificação de objetivos de processos educacionais. Trata-
se de uma estrutura de organização hierárquica de objetivos educacionais. A
Taxonomia foi resultado de pesquisas realizadas por uma comissão multidisciplinar
de especialistas de várias universidades americanas tendo como pesquisador
responsável Benjamin Bloom. Uma das principais contribuições de tal teoria foi a
classificação de níveis e formas de aquisição de conhecimentos por parte do sujeito.

É importante ressaltar que a aprendizagem se dá por três domínios, quais


sejam, o cognitivo, voltado à aprendizagem intelectual; o domínio afetivo, referente a
aspectos de sensibilização e o domínio psicomotor, relacionado às habilidades de
execução de tarefas e ações físicas.

No campo da aprendizagem escolar e universitária, o domínio cognitivo é o


mais valorizado. Para fins de planejamento educacional professores, tanto da
educação básica quanto do ensino profissional e superior, se voltam ao domínio
cognitivo definindo objetivos de aprendizagem, estratégias, procedimentos e
instrumentos de avaliação.

Objetivos de aprendizagem ou cognitivos referem-se à descrição clara sobre o


que se espera que o aluno aprenda, isto é, eles descrevem um resultado intencional,
diretamente relacionado ao conteúdo.

A ideia é de que a performance que os professores almejam para os alunos,


definida na descrição dos objetivos educacionais, possa ser arranjada numa
hierarquia do menos para o mais complexo. Tal hierarquia comporta seis níveis
cognitivos, com subníveis no interior de cada nível.

As categorias definidas por Bloom envolvem:

1. conhecimento

2. compreensão

3. aplicação

4. análise

5. síntese

6. avaliação

Cada categoria, por sua vez, apresenta subdivisões que podem ser
estimuladas e avaliadas a partir de estratégias definidas por ações (verbos
específicos). O quadro a seguir exemplifica essa relação.

54
Taxonomia de Bloom

Categoria Descrição Verbos

Conhecimento Lembrar a informação Identificar, descrever,


nomear, rotular,
reconhecer, reproduzir

Compreensão Entender o significado, parafrasear Resumir, converter,


um conceito defender, parafrasear,
interpretar, dar exemplos

Aplicação Usar a informação ou o conceito Criar, fazer, construir,


em uma nova situação modelar, prever, preparar

Análise Dividir a informação ou o conceito Comparar/contrastar,


em partes visando um dividir, distinguir,
entendimento mais completo selecionar, separar

Síntese Reunir ideias para formar algo novo Categorizar, generalizar,


reconstruir

Avaliação Fazer julgamentos sobre o valor Avaliar, criticar, julgar,


justificar, argumentar,
respaldar

Fonte: Bloom et al (1956).

Na atualidade, temos o esforço empreendido por pesquisadores em apresentar


a Taxonomia de Bloom revisada. É o caso de trabalhos como os de Anderson et al
(2001) que propõem uma hierarquia de processos cognitivos modificada, como se
segue:

1. lembrar

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2. entender

3. aplicar

4. analisar

5. avaliar

6. criar

A nova configuração da Taxonomia de Bloom consideraria que os processos


devem ser descritos como verbos de ação, mantendo o princípio da complexidade da
Taxonomia original, qual seja, do simples para o complexo, do concreto para o
abstrato. Na Taxonomia original verbo e substantivo eram categorizados na descrição
dos objetivos de aprendizagem.

Na Taxonomia revisada, observa-se uma alteração na relação que passa a ser


direta entre verbo e substantivo. A Taxonomia revisada diferencia “saber o quê” de
“saber como”. A dimensão do conhecimento (Taxonomia original) é o “saber o quê”, e
possui quatro categorias:

 Factual ou efetivo
 Conceitual
 Procedimental
 Metacognitiva

A categoria factual/efetivo se relaciona ao conteúdo básico que devem ser de


domínio dos alunos para que consigam realizar e resolver problemas apoiados nesse
conhecimento.

A categoria conceitual da dimensão conhecimento é a inter-relação dos


elementos básicos, em contexto mais elaborado que os alunos seriam capazes de
descobrir.

Procedimental é a categoria voltada ao conhecimento de “como realizar


alguma coisa” fazendo uso de método, critérios, algoritmos e técnicas.

A última categoria é a metacognitiva e está voltada ao conhecimento dos


processos cognitivos e das informações sobre como manipular esses processos de
forma eficaz.

A dimensão do processo cognitivo é o “saber como”, que se divide, por sua vez,
em seis categorias conforme o quadro a seguir:

56
Lembrar Reconhecer e reproduzir informações importantes da
memória de longa duração e também conteúdos.
Subcategorias: reconhecendo e reproduzindo.

Entender Capacidade de fazer sua própria interpretação do material


educacional estabelecendo uma conexão entre o novo e o
previamente adquirido. Subcategorias: interpretando,
exemplificando, classificando, resumindo, inferindo,
comparando, explicando.

Aplicar Está voltado a usar o procedimento aprendido em uma


situação familiar ou nova. Subcategorias: executando,
implementando.

Analisar Consiste em dividir o conhecimento em partes e pensar como


essas partes se relacionam com a estrutura geral.
Subcategorias: diferenciando, organizando, atribuindo,
concluindo.

Avaliar Relacionado a realizar julgamentos baseados em critérios e


padrões qualitativos e quantitativos. Subcategorias:
checando, criticando.

Criar Envolve reunir elementos para dar origem a algo novo.


Subcategorias: generalizando, planejando, produzindo.

Fonte: Quadro elaborado pela autora.

A contribuição da Taxonomia de Bloom original e revisada está em fornecer ao


professor indicativos de processos cognitivos mobilizados por seus alunos ao se
depararem com tarefas avaliativas. Conhecer e planejar atividades considerando tais
processos contribui para se pensar em estratégias que estimulem o aluno e, ao
mesmo tempo, traga indicativos sobre a aprendizagem do mesmo.

57
A Taxonomia de Bloom é uma teoria que demonstra os processos cognitivos
que são mobilizados pelo indivíduo diante de situações-problema. Os
processos a serem mobilizados são dependentes da complexidade da tarefa a
que o aluno foi exposto, o que implica situações didáticas preparadas para este
fim, bem como instrumentos de avaliação que possam confirmar a mobilização
de tais processos. O artigo de Ferraz e Belhot (2015) sugere adequações nessa
temática. Confira:

FERRAZ, A. P. C. M.; BELHOT, R. V. Taxonomia de Bloom: revisão teórica e


apresentação das adequações do instrumento para definição de objetivos
instrucionais. Gestão & Produção, São Carlos, v. 17, n. 2, p.421-431, 2010.

3.4 Considerações Finais

A tendência Interacionista representa uma concepção de ser humano que age


espontaneamente sobre seu meio desde o seu nascimento e de forma ativa constrói
seu conhecimento. A partir dessa ideia, temos articulações com teorias de outros
campos de conhecimento como a Neurociência e muitas são as oportunidades que se
abrem por meio dos estudos dessa importante área que explora o sistema nervoso e
suas funções específicas assim como as funções cognitivas e de comportamento fruto
das estruturas mentais.

Considerando esse recente campo do conhecimento com base interdisciplinar,


percebemos as inúmeras possibilidades de se utilizar seus conceitos como auxiliar
em processos de ensino/aprendizagem.

Outro ponto de fundamental importância abordado nesta unidade se refere à


aprendizagem significativa, delineada por David Ausubel como alternativa a processos
mecânicos de aprendizagem baseados, especialmente, na memorização e
reprodução de conteúdo. A consciência da existência de inteligências múltiplas,
apresentadas por Howard Gardner, é de fundamental importância para processos de
ensino que visem a inclusão de todos os alunos, diferenciando estratégias com vistas
a contemplar os variados perfis presentes na sala de aula.

58
Por fim, mas não menos importante, vimos na Taxonomia de Bloom a
hierarquia de processos cognitivos mobilizados pelo sujeito diante de tarefas que deve
realizar.

Concebendo a autonomia e protagonismo do aluno frente ao conhecimento,


observamos que muitas são as possibilidades para favorecer esse processo. Cabe ao
professor mediador incorporar tais conhecimentos em sua prática diária otimizando a
aprendizagem de seus alunos lançando mão de estratégias que abarquem os
fundamentos que aqui abordamos.

Desafios para a concretização da aprendizagem significativa em


contextos diversos

Novas metodologias de ensino têm sido pensadas a partir de estudos que


mostram que o ser humano tem seu desenvolvimento favorecido quando apoiado em
experiências acumuladas ao longo de sua trajetória de vida. Com base nos estudos
acerca da aprendizagem significativa, de Ausubel, pesquise em fontes como artigos
científicos, livros em bases virtuais ou na biblioteca física da instituição propostas
metodológicas que tenham como princípio o protagonismo do aluno. Reflita sobre tais
propostas e elabore um texto que exponha sua opinião a respeito, ressaltando os
pontos favoráveis e os pontos frágeis que tornariam a execução da proposta algo
desafiador em determinados contextos e de que forma contornaria tais dificuldades
rumo à aprendizagem significativa de seus alunos.

Bom trabalho!

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Nesta unidade, vimos que as teorias do desenvolvimento, em especial, a teoria


Construtivista, derivada do Interacionismo, nos ajuda a compreender como se dá o
processo de formação no âmbito cognitivo da criança e do adulto. Abordagens
derivadas dessa linha de pensamento dão conta que o indivíduo é um ser pensante e

60
autônomo, capaz de estabelecer relações contínuas entre conhecimentos prévios e
novos conhecimentos em constantes interações com o meio que o cerca. Entre essas
abordagens, destacamos o campo da Neurociência que na atualidade tem contribuído
para a compreensão de complexos processos mentais envolvidos na construção do
conhecimento discente.

Tal abordagem vai ao encontro da Taxonomia de Bloom que explora


exatamente os processos envolvidos no raciocínio do indivíduo diante de situações-
problema, estabelecendo, para tanto, uma hierarquia de processos mentais
abordados na presente unidade.

Nesse quadro, é de fundamental importância que professores desde a


educação infantil até o ensino superior conheçam os fundamentos da Neurociência,
bem como tenham o domínio dos conceitos estabelecidos por Bloom como forma de
entender como se dá o processo de aprendizagem no ser humano a fim de
estabelecer estratégias didáticas que concebam o aluno como protagonista de sua
aprendizagem, em uma visão interacionista.

Finalizamos esta etapa considerando possibilidades de usos da Teoria


Construtivista para potencializar a aprendizagem de alunos, em especial, do ensino
superior, admitindo que muitas são as oportunidades de desenvolvimento nessa
perspectiva, uma vez que o adulto traz consigo extensa bagagem de experiências e,
portanto, de conhecimentos prévios, que lhe servem de base para novas
aprendizagens.

Sigamos!

61
4. MUDANÇA DE COMPORTAMENTO DISCENTE: PROFESSOR
MEDIADOR E A TRANSFORMAÇÃO DOS PROCESSOS DE
APRENDIZAGEM DISCENTE

O século XXI apresenta desafios para a formação do indivíduo para o mercado


de trabalho. São exigidos conhecimentos e competências que o coloquem em
condições de se adequar aos avanços constantes dessa sociedade da informação. O
sujeito do século XXI deve apresentar domínios em diferentes áreas, superando as
concepções vigentes no século anterior desde o Taylorismo e Fordismo que
demandavam a especialidade e a linha de montagem respectivamente.

O olhar sobre o mundo sofreu significativas alterações com a globalização.


Nessa unidade conheceremos linhas de pensamento que se apoiam em uma
concepção de interdependência entre as pessoas e o universo, e as repercussões no
campo educacional.

4.1 A pedagogia de resolução de problemas como aliada à construção do


conhecimento do aluno adulto

Os processos de ensino/aprendizagem conduzem o indivíduo a uma


determinada perspectiva para a vida social e profissional. Processos escolares do
chamado ensino tradicional traduziam o ideal de indivíduo que se adequasse às
demandas impostas por uma realidade profissional inspirada no Taylorismo e no
Fordismo no início e decorrer do século XX.

É importante lembrar que o modelo taylorista defendia o princípio da


especialização, a ideia de que o funcionário deveria exercer sua função no menor
tempo possível dentro do processo produtivo. Essa concepção trazia a ideia de que
não havia necessidade de conhecimento do processo produtivo todo, mas apenas de
uma parte, a qual o trabalhador se especializava. Vigorava o modelo de maximização
de produção e de lucro.

O modelo fordista, ao mesmo tempo, desenvolveu uma maior sistematização


dessa divisão de trabalho, incorporando as chamadas linhas de montagem, em que
cada funcionário ficava em um local pré-determinado, realizando uma tarefa
específica, enquanto o automóvel (produto fabricado) se deslocava pelo interior da
fábrica em uma espécie de esteira.

Os modelos taylorista e fordista influenciaram o campo educacional desde a


organização do currículo disciplinar, em uma formulação fragmentada de disciplinas
estanques, até a prática da avaliação que se voltava especificamente à ideia de

62
verificação do atingimento de objetivos estipulados no início do processo, ignorando
especificidades do contexto escolar e origem de seus alunos, cujas lacunas de
aprendizagem não eram levadas em conta para a organização de processos de
ensino/aprendizagem mais formativos.

O ensino baseado no modelo tradicional recebeu influência direta da


concepção taylorista e fordista, uma vez que não havia articulação entre as diferentes
áreas do saber, além da inexistência de qualquer relação entre as disciplinas e a
realidade mais ampla cotidiana.

Tal modelo vigorou até o início dos anos 1990, no Brasil, superado a partir da
redemocratização do país, momento em que reformas educacionais tiveram início,
sendo o marco internacional a Conferência Mundial de Educação para Todos e no
Brasil a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96 foi o destaque.

A LDB 9394/96 reverberou no currículo prescrito influenciando o


desenvolvimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), em 1997.

Os PCN, por sua vez, são de clara inspiração construtivista, pois defendem a
ideia de protagonismo e autonomia do aluno, algo impensável em um modelo que
privilegiava a repetição, especialização, memorização e reprodução. Um avanço,
portanto, se pensarmos nos processos escolares antes focados no professor, agora
voltados ao aluno. Com essa guinada na forma de perceber o papel tanto do aluno
quanto do professor abre-se um espaço importante a que se valorize a bagagem do
aluno constituída por inúmeras interações ao longo da trajetória de vida do mesmo.
Abre-se espaço também a que se valorize os conhecimentos prévios desse aluno,
trazendo para o centro do processo de ensino/aprendizagem a visão de mundo que
tem o aluno, formada por sua vez a partir de seu histórico de vida

Na atualidade, a valorização dos conhecimentos prévios dos alunos nas séries


iniciais da trajetória escolar é uma realidade formada, sobretudo, pelas contribuições
ímpares da teoria piagetiana. Essa visão progressista, contudo, não foi totalmente
aplicada no ensino relacionado ao adulto. Muito se critica a postura ainda fragmentada
e estanque com que se apresenta o professor em processos escolares e acadêmicos
com alunos adultos.

Existe ainda a tendência a uma postura docente tradicional de ensino que


pouco uso faz da experiência pregressa do aluno adulto. Entretanto, é necessário
considerar os inúmeros desafios impostos à sociedade no século XXI.

Processos de ensino/aprendizagem não podem ignorar as transformações da


sociedade. Vivemos um paradoxo no contexto escolar e universitário, por um lado
temos os avanços da tecnologia que transformaram a vida das pessoas em vários
sentidos, desde as interações pelas redes sociais que favoreceram a aproximação
sem limites e a quebra de fronteiras; por outro lado, os processos de

63
ensino/aprendizagem, em sua maioria, se encontram estagnados no século XX,
permanecendo o modelo diretivo de educação bancária, como explicitou Paulo Freire.
Ignora-se ainda a capacidade de construção autônoma e dinâmica do conhecimento
por parte do aluno.

Entre as poucas, mas bem-sucedidas propostas de ensino dialógico


encontram-se aquelas que envolvem resolução de problemas. Focadas na
aprendizagem significativa, elas representam situações em que seja preciso recorrer
a conhecimentos prévios de conceitos e teorias e outros a construir através de
investigações autônomas e em grupo para resolução do problema que se apresenta.
Estimulando a pesquisa, trata-se de metodologias que instigam a curiosidade e
desafiam o estudante.

Nesse tipo de abordagem são estimulados o dinamismo e a pró atividade dos


jovens que, a partir de um tema proposto pelo(s) professor(es) são levados a
pesquisar e intervir na realidade a partir de um problema particular relacionado ao
tema de estudo. Importante que sejam divididos em grupos de interesse a fim de
pesquisarem, discutirem e analisarem o problema elaborando um plano de ação que
envolva cronograma, divisão de tarefas/responsabilidades, objetivos e produto final.

Uma vez elaborado o plano é importante que o grupo vá a campo para executá-
lo e também avaliá-lo ao longo do processo e ao final. Na avaliação que ocorre ao
longo do processo, eventualmente podem ocorrer ajustes no projeto e novas ações
podem ser elaboradas. O importante é que o projeto seja flexível, proposto
antecipadamente, mas sem tornar-se engessado por isso.

A flexibilidade do projeto potencializa a autonomia na tomada de decisões que


se fará necessária ao longo do processo investigativo. Espera-se que o grupo, ao
elaborar o plano de ações, se lance a campo para realizar as tarefas previstas, avalie
os resultados e, talvez volte a fazer um novo trabalho de pesquisa para uma nova
análise do problema, possivelmente elaborando um novo plano de ação e posterior
execução em um ciclo constantemente renovado.

Outra proposta de trabalho que objetiva desenvolver a autonomia do aluno é o


trabalho em grupos para investigação autônoma, plano de ações e a intervenção
sobre a realidade, é importante desenvolver atividades que envolvam a realização de
procedimentos de pesquisa com vistas a construção do conhecimento científico.

Desenvolver procedimentos de pesquisa, a partir de atividades experimentais


possibilita tornar significativos os conteúdos teóricos trabalhados nas aulas. O uso de
atividades experimentais pode ser um facilitador de uma atividade significativa, pois a
partir de uma situação-problema, o professor conduz os alunos ao levantamento de
hipóteses, à realização de um experimento e ao registro dos resultados.

64
Na sequência, os alunos poderão realizar pesquisas em diferentes fontes
comprovando ou não a sua hipótese inicial e, com os resultados obtidos, poderão
estabelecer relações e tirar conclusões. Trata-se de uma forma interativa e dinâmica
de se relacionar com o objeto do conhecimento. Isso permite que o aluno se aproxime
dos conteúdos estudados na teoria aproximando-os de situações concretas; além
disso, favorecer o uso de relatórios de acompanhamento dos experimentos é uma
forma de levar os alunos à auto-avaliação, fundamental para a construção do
conhecimento.

Entre as sugestões de atividades que promovam a aprendizagem significativa,


encontramos ainda aquelas que se baseiam na utilização de novas tecnologias em
sala de aula. Destacam-se sequências didáticas que utilizam tecnologias digitais
desenvolvendo-se em ambientes físicos e virtuais de aprendizagem. Vivemos na era
da informação e é natural que isso interfira em ambientes de ensino, sejam eles reais
ou virtuais.

O artigo “A análise do impacto da integração da plataforma Khan Academy


na prática docente de professores de matemática” faz uma pertinente
abordagem de uma proposta inovadora que se configura na atualidade uma
excelente ferramenta para promover a aprendizagem de alunos por meio da
interação com um instrumento digital. Apresenta resultados de pesquisa com o
uso da plataforma como material para formação continuada de professores.

MENEGAIS, D. A. F. N.; FAGUNDES, L. da C.; SAUER, L. Z. A análise do


impacto da integração da plataforma Khan Academy na prática docente de
professores de matemática. Revista Novas Tecnologias na Educação, v. 13,
n. 1, p. 1-11, 2015.

65
4.2 Aprender praticando: desenvolvimento de habilidades a partir de sua
mobilização

Como vimos até aqui, a aprendizagem significativa é contrária à aprendizagem


mecânica e requer a mobilização de saberes prévios acumulados pela experiência do
sujeito em todos os ambientes de sua vida. Há uma base conceitual em cada
indivíduo, um local em que ele armazena informações que se constituem o seu ponto
de apoio para as diversas situações problema com que se depara espontaneamente
ou não, diariamente.

Para que seja significativa, a aprendizagem deve mobilizar o aluno em torno de


problemas que à primeira vista, ele não tem solução. Piaget vai chamar de
desequilíbrio cognitivo o estado em que o sujeito se coloca ao se deparar com um
novo objeto do conhecimento do qual não tem ainda um saber construído.

Apoiando-se em sua base conceitual, composta por sua vez, de saberes


adquiridos pelo senso comum (hipóteses em sua maioria) e também por conceitos
científicos já construídos, o aluno buscará solucionar o problema reunindo os
conhecimentos que já têm para tal. Portanto, quanto mais experiências desafiadoras
esse aluno vivenciar em ambientes escolares, maior será seu repertório de
conhecimentos e melhor será sua postura diante do novo.

Além da base já existente de conhecimentos, há que se pensar em outro


aspecto da aprendizagem significativa. O aluno aprende melhor quando pratica,
quando desenvolve procedimentos práticos para solucionar o problema colocado.
Nesse sentido, outra proposta metodológica que favorece a aprendizagem
significativa é o ensino baseado no desenvolvimento de competências. Assim como
outras metodologias de ensino/aprendizagem, a chamada Metodologia de
Desenvolvimento de Competências (MDC), proposta por Küller e Rodrigo (2013), está
fundamentada em uma concepção educativa.

No caso da MDC, há a percepção de que o ser humano aprende de forma ativa,


crítica e por construção. Trata-se de uma metodologia voltada especialmente, mas
não somente, para a educação profissional e tecnológica. Küller e Rodrigo (2013)
desenvolveram uma proposta metodológica baseada em cinco grandes teorias, quais
sejam, a Escola Nova, o Construtivismo, a Pedagogia Crítica, a Psicologia da
Criatividade e a Pedagogia das Competências.

Os conceitos inspirados pela Escola Nova se referem à valorização da atividade


e do interesse dos estudantes e não do professor que, nessa concepção, perde seu
protagonismo em favor do aluno, atuando agora como um mediador.

66
O trabalho como princípio educativo, também de origem escolanovista,
repercute na MDC assim como faz parte de documentos norteadores de currículo
como as DCN (Diretrizes Curriculares Nacionais) do Ensino Médio, da Educação
Profissional Técnica de Ensino Médio e do Ensino Superior. Essa orientação situa o
aluno como protagonista, coloca a atividade do aluno como central no processo de
ensino/aprendizagem. Para tal, é preciso que a atividade seja motivadora e que
combine teoria e prática.

Outra vertente inspiradora da MDC é o Construtivismo, cuja contribuição central


se apoia em duas ideias: a de que o conhecimento é algo a ser construído pelo próprio
sujeito e não recebido passivamente através do professor. A vertente construtivista
admite que todo o conhecimento é uma construção pessoal e autônoma, assim o
conhecimento acumulado pela sociedade deve ser reapropriado e ressignificado pelo
sujeito.

A segunda ideia que o Construtivismo defende e que a MDC se apropria é a de


que toda aprendizagem depende dos conhecimentos e vivências prévias que o
indivíduo acumula em sua trajetória de vida. De acordo com essa concepção, tais
experiências serviriam de base para posterior ampliação das estruturas cognitivas
com constantes processos de assimilação e acomodação para futuros
conhecimentos.

Da Pedagogia Crítica vem a percepção de que a consolidação do


conhecimento só se dá com o engajamento do indivíduo em uma ação transformadora
mediada pelo diálogo e pela reflexão. Nesse sentido, a MDC trabalha em sua
sequência didática a noção de ação-reflexão-ação, por isso, o aluno que vivencia uma
atividade na perspectiva de desenvolvimento de competência começará o seu
processo de aprendizagem pela ação, voltando-se a seguir para a reflexão,
retornando posteriormente à ação de forma refletida e, portanto, aprimorada num ciclo
marcado pela ação construtora, pela reflexão e finalmente pela ação retificadora
constituindo-se o caminho para a aprendizagem significativa.

A Psicologia da Criatividade agrega à MDC a noção de que o espaço em que


se desenvolve o processo de ensino/aprendizagem deve ser inovador e criativo,
ressaltando a necessidade cada vez maior exigida pelo mercado de trabalho de
criatividade do trabalhador. Na visão de Küller e Rodrigo (2013), é preciso conjugar o
pensamento e a percepção com o sentimento e a intuição, combinando o instintivo e
o real para o sucesso de processos de construção do conhecimento. Uma
aprendizagem criativa privilegia a focalização, a amplificação, a análise e a síntese
em um processo em rede.

Por fim, os autores recorrem à Pedagogia das Competências para compor a


base da MDC. Em clara oposição à pedagogia dos conteúdos, a teoria de
desenvolvimento de competências adota a ideia de competência como práxis

67
(atividade reflexiva e transformadora) que articula conhecimento teórico e práticas
laborais.

O ciclo novamente se ampara na ação-reflexão-ação e considera que a


primeira atividade (ação) deve ser realizada a partir da mobilização e troca dos
conhecimentos prévios. Na sequência, essa ação é submetida à reflexão
(pensamento) durante e após a sua realização. Ao final, o ciclo se encerra em outra
ação que incorpora o conhecimento dos momentos anteriores ampliando-os.

Dada a polissemia do termo competência, Küller e Rodrigo (2013) esclarecem


que a MDC se ampara na concepção de competência como a capacidade
comprovada de utilizar saberes conceituais, procedimentais e atitudinais em situações
profissionais caracterizadas por rápidas e constantes transformações.

Recorrendo a Fleury e Fleury (2001), os autores definem que competência seria


um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que justificam um alto
desempenho. Existem competências gerais (aritmética, leitura e escrita, por exemplo)
e competências ocupacionais, esclarecem os autores. Nesse sentido, na formação do
adulto, é necessário priorizar competências observadas e identificadas no mercado
de trabalho.

É importante destacar o fato de que desenvolver competências não significa


tornar o aluno um ser exclusivamente técnico, desprovido de senso crítico, ao
contrário, espera-se, com o desenvolvimento de competências emancipar o indivíduo
de modo que ele possa agir espontaneamente sobre o meio com saberes capazes de
transformar a realidade.

Nesse quadro, a MDC apresenta como características:

 O trabalho como princípio educativo;


 A pesquisa como princípio pedagógico;
 A indissociabilidade entre educação e prática social;
 A indissociabilidade entre teoria e prática
 A utilização de estratégias educacionais que combinem aprendizagem
significativa, integração entre teoria e prática e vivência da prática
profissional.

No ensino superior é de suma importância a emancipação do estudante e a


proximidade entre o ambiente de ensino/aprendizagem e o mundo do trabalho. O
conhecimento pertinente ao exercício da profissão desejada passa pela aprendizagem
teórica e prática, elementos essenciais para o exercício profissional.

Nesse sentido, qualquer que seja o campo profissional, o desenvolvimento de


competências é essencial para a inserção em um mercado cada vez mais competitivo.
Em se tratando de docência no ensino superior, é possível transitar por universos

68
profissionais os mais variados, por isso, a MDC tem potencial para se tornar um
importante instrumento pedagógico para o professor. Alguns princípios, no entanto,
são fundamentais para o desenvolvimento de uma prática docente ancorada na MDC.

O primeiro, voltado à aprendizagem do aluno, nega a transmissão de


informações e assegura ao aluno a vivência de situações de aprendizagem e não mais
de uma “aula”.

As situações de aprendizagem, por sua vez, constituem-se o segundo


princípio, e devem estar focadas nas atividades discentes e não nas atividades
docentes.

O terceiro princípio refere-se às atividades propostas que deverão assegurar


que as competências a serem desenvolvidas sejam requeridas, exercitadas,
submetidas à reflexão e novamente mobilizadas. O desenvolvimento de competência,
portanto, demanda o exercício da própria competência em um ciclo de ação-reflexão-
ação.

Como quarto e último princípio para a consecução da MDC deve-se voltar a


atenção à situação de aprendizagem proposta. Esta deve se dar em um contexto
muito próximo daquele que será requerido para o exercício profissional, isto é, deve-
se requerer do estudante o enfrentamento concreto dos problemas que demandam
determinada competência em um ambiente que simule os desafios reais enfrentados
na vida, na sociedade e no trabalho.

A proposta apresenta, ainda, sete passos metodológicos que devem ser


seguidos a fim de garantir que o ciclo ação-reflexão-ação seja cumprido. São
considerados passos fundamentais:

1. Contextualização e Mobilização;
2. Atividade de Aprendizagem;
3. Organização da Atividade de Aprendizagem;
4. Coordenação e Acompanhamento;
5. Análise e Avaliação da Aprendizagem;
6. Outras Referências;
7. Síntese e Aplicação.

O primeiro passo, “contextualização e mobilização” inicia o ciclo de ação-


reflexão-ação e prepara, portanto, o aluno para a ação por meio uma visão global e
sintética da competência a ser desenvolvida.

O passo dois se refere à definição da “atividade de aprendizagem” que será a


referência central da situação de aprendizagem. Consiste na proposição da primeira
ação do ciclo ação-reflexão-ação. Chama-se de “situação de aprendizagem” em
contraposição à ideia corrente de “situação de ensino”.

69
A “organização da atividade de aprendizagem”, terceiro passo da MDC, é o
momento de planejamento da situação de aprendizagem e consiste na previsão e
disponibilização das etapas, dos procedimentos, dos comportamentos, das
condições, estratégias e recursos didáticos, sempre com a mínima intervenção do
professor.

O quarto passo se refere à “coordenação e acompanhamento”. Nele serão


previstos os meios e as formas de acompanhamento por parte do professor “sem
ensinar”, acompanhando, coordenando, isento, portanto, de uma postura dialógica.

O quinto passo “análise e avaliação das atividades de aprendizagem”


representa o primeiro momento de reflexão na perspectiva da ação-reflexão-ação. O
objetivo deste passo é verificar se a atividade foi adequada, eficiente e eficaz, e se
atingiu os objetivos de aprendizagem propostos.

O passo seis de acesso a “outras referências” representa o segundo momento


de reflexão sobre a ação e tem o propósito de garantir ao aluno o acesso ao
conhecimento humano sistematizado produzido a respeito do tema. Trata-se de um
momento rico em possibilidades de construção de conhecimentos, pois visa atualizar
os fundamentos científicos do aluno.

Por fim, o sétimo passo “síntese e aplicação” encerra o ciclo ação-reflexão-


ação, uma vez que propõe o retorno à prática por parte do aluno. Neste passo, todas
as referências ligadas ao exercício da competência são integradas e sintetizadas
numa nova proposta concreta de ação retificadora.

A Metodologia de Desenvolvimento de Competências (MDC) é uma proposta


desenvolvida por José Antonio Küller e Natália de Fátima Rodrigo e
apresentada na obra “Metodologia de Desenvolvimento de Competências”,
pela Editora Senac. Voltado ao público adulto e a cursos de formação
profissional, é uma leitura atual e pertinente para o futuro professor que atuará
com o público jovem e com o adulto. A proposta mobiliza saberes prévios e
privilegia processos de autonomia do sujeito que aprende. O livro apresenta o

70
passo a passo para a aplicação de situações de aprendizagem que mobilize
competências para o exercício profissional.

KÜLLER, J. A.; RODRIGO, N. de F. Metodologia de desenvolvimento de


competências. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2013.

A proposta de Küller e Rodrigo vai ao encontro da concepção de aluno como


autor de seu processo de desenvolvimento baseado em atividades que o tomam como
protagonista capaz de criar, refletir e recriar aprimorando-se constantemente
transformando a realidade que o cerca.

4.3 O espaço da interação planejada na sala de aula de um professor


interacionista

Várias são as propostas para privilegiar um ambiente escolar ou universitário


com foco no aluno. Algumas dessas propostas nos foram apresentadas até aqui e têm
em comum o fato de considerar o aluno um ser ativo em seu processo de construção
de conhecimento.

Para um professor mediador, de base interacionista, a organização dos


espaços de ensino/aprendizagem são parte fundamental para o sucesso da
aprendizagem dos alunos.

 Planejar espaços requer clareza quanto aos objetivos de aprendizagem


que se tem em mente. O planejamento, contudo, necessita romper com
automatismos que uma visão tradicional de ensino acarreta. É preciso
disponibilidade do docente em compreender o processo produtivo de
saberes de forma global, isto é, vislumbrar antecipadamente o que se
objetiva em matéria de conhecimentos com dada situação de
aprendizagem. Planejar implica organização, mas também a percepção de
que a situação de aprendizagem se encontra em aberto e sujeita, inclusive,
a modificações que se fizerem necessárias ao longo do desenvolvimento
das aprendizagens.

 Favorecer ao máximo o ingresso de novas tecnologias na sala de aula é


condição para o sucesso de processos de aprendizagem que se dão em

71
contextos cujos indivíduos se deparam constantemente com soluções
criadas por boa parte dessas mesmas tecnologias.

 Trazer ou permitir que adentre na sala de aula instrumentos tecnológicos


do dia a dia das pessoas do século XXI é essencial. Aplicativos por meio
de telefones celulares são uma forma pertinente e acolhedora de se inserir
metodologias focadas no aluno.

A construção de um espaço de interação no plano pedagógico é potencializada


quando se utilizam instrumentos transformadores da realidade que já fazem parte da
vida das pessoas, da vida dos alunos.

A realidade digital exige que se abram possibilidades de adaptações e de


inclusões de situações, ferramentas, estímulos de um modo geral, que se aproximem
mais da vida real, que aproximem a instituição de ensino e seus espaços de ensino e
de aprendizagem à concretude da vida real.

Nesse cenário, a utilização de metodologias ativas em que o aluno também


atua no processo de ensino/aprendizagem são extremamente bem-vindas, uma vez
que possibilitará ao aluno a iniciativa e o dinamismo para resolver situações problema
que muito se aproximam do ambiente profissional no qual este se inserirá no futuro.

Uma proposta nessa direção coloca o aluno ao mesmo tempo como sujeito que
aprende e que ensina. O uso de tecnologias digitais pode contribuir para a superação
de formas tradicionais de ensino e também expor os alunos a novas e diferentes
formas de aprendizagem, proporcionando, inclusive, oportunidades ao professor para
melhor entender os alunos, suas formas de aprender e interagir com o objeto do
conhecimento planejado.

Num cenário de constantes transformações e de exigências de compreensão,


por parte dos indivíduos, de relações entre diferentes partes de um mesmo processo,
ganha espaço nos processos de ensino uma outra forma de conceber o mundo e,
portanto, os processos institucionais de ensino, qual seja, a visão holística de
educação.

O termo educação holística designa o trabalho docente que diversifica e crê na


personalidade global de crianças, jovens, adolescentes e adultos. Uma visão holística
considera a experiência humana como mola propulsora para o pleno
desenvolvimento, um desenvolvimento não apenas racional e de experiências sociais
como responsabilidades de cidadania, mas também os aspectos físicos, emocionais
e psicossociais da natureza humana.

Metodologias baseadas na educação holística apresentam como objetivos de


aprendizagem o despertar da razão, mas também o despertar da sensação e do
sentimento, uma visão singular dos acontecimentos que ocorrem ao redor do
indivíduo, um olhar mais detido sobre os detalhes e sobre o todo.

72
Nessa concepção de ensino, de educação, habilidades voltadas à cooperação
e valores humanos são valorizadas e mobilizadas em constantes sequências didáticas
com este fim. Trata-se de um novo modo de relação do ser humano com o mundo,
com a sociedade, com o outro e com si mesmo.

Propostas derivadas dessa ideia são frequentes na atualidade, destaque para


o paradigma da complexidade, desenvolvido por Edgar Morin. O pensamento
complexo para Morin, defende a visão que a totalidade é sempre mais que a soma e
pode ser, inclusive, menos que a soma, pois as totalidades estão sempre abertas.
Morin resiste à ideia minimalista de totalidade fechada, por presumir que, se as
totalidades forem fechadas, elas serão sempre iguais à soma das partes, o que não
representaria a complexidade de que é revistado o universo.

O paradigma da complexidade prevê uma visão transdisciplinar para


compreensão e atuação no mundo contemporâneo. Como visão transdisciplinar
temos a ideia de construção de um “metaponto” de vista a respeito da vida, da Terra,
do cosmo, da humanidade, do homem, do conhecimento, das culturas adolescentes,
das artes, de um todo integrado. Propostas metodológicas apoiadas nessa vertente
desenvolvem constantes rodas de conversa em torno de metaplanos como terra, vida,
cultura, homem, humanidade, cosmo, etc.

No livro “A cabeça bem feita”, Morin defende uma reforma de pensamento e,


consequentemente, uma reforma de ensino, uma mudança de paradigma. Alerta que
as barreiras disciplinares de que são constituídos os processos tradicionais de ensino
levam ao perigo da hiperespecialização, sendo necessário interligar as diversas
disciplinas e ciências, numa troca constante de saberes e experiências, estimulando
a cooperação, a associação, transformando em algo sistêmico. No campo
educacional, especificamente, Morin assegura que a utilização de meios que
permitam assegurar a formação e o desenvolvimento do ser humano deve ser o
caminho tomado pelas instituições de ensino nas mais variadas modalidades.

Em outra obra, intitulada, “Os sete saberes necessários à educação do futuro”,


Morin centra suas atenções nos antagonismos que vivenciamos no século XXI como
por exemplo:

 O sábio e o louco;
 O trabalhador e o lúdico;
 O empírico e o imaginário;
 O econômico e o consumista;
 O prosaico e o poético.

A complexidade observada por Morin reflete no campo educacional como a


necessidade de se mostrar o destino multifacetado do ser humano, seu destino social,

73
individual e histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. A inspiração ao título da obra
diz respeito aos sete buracos negros da educação, ignorados, subestimados ou
fragmentados nos programas educativos na concepção do autor.

Trata-se de sete pontos, sete temas a serem explorados para a educação das
gerações futuras:

1. o conhecimento
2. o conhecimento pertinente
3. a identidade humana
4. a compreensão humana
5. a incerteza
6. a condição planetária
7. a antropo-ética

Os livros “A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento” e


“Os sete saberes necessários à educação do futuro” refletem o pensamento de
Edgar Morin no que se refere ao conhecimento e aos processos de
ensino/aprendizagem em vigor. Abarca o conceito acerca do paradigma da
Complexidade explorando análises sobre diferentes tópicos a fim de conceituar
sua linha de pensamento. Obras importantes para se compreender a atual
necessidade de mudanças nos processos de ensino/aprendizagem ainda
atados a uma visão minimalista do sujeito que aprende.

MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento.


Tradução de Eloá Jacobina. 12 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.

______. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de


Catarina Eleonora F. d Silva e Jeanne Sawaya: revisão técnica de Edgard de
Assis Carvalho. 2 ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: Unesco, 2000.

74
A escolha por processos de ensino baseados em novas metodologias sejam
elas de matriz técnica como o desenvolvimento de competências, seja de
matriz mais humana e universal, supera a concepção de ensino diretivo e retira
do professor o status de detentor pleno do conhecimento e acrescenta ao aluno
a qualidade de um ser ativo e protagonista que age sobre o meio, cria, constrói
e reconstrói estratégias que o auxiliam a transformar a realidade por meio da
constante ação-reflexão-ação. Tão desafiador quanto levar o aluno a esse
protagonismo é levar o professor a aceitar a necessária mudança em sua
postura de ensino. O primeiro passo, certamente, é compreender o quanto o
aluno é capaz de conduzir sua aprendizagem tendo a mediação do docente.

Um ensino flexível é o princípio que rege essa nova forma de conceber


processos de ensino por parte do professor. O planejamento prévio continua sendo
uma premissa do trabalho pedagógico, sem o quê, cairíamos em um voluntarismo que
em nada contribuiria para a emancipação do sujeito. Esse planejamento, entretanto,
se torna agora um instrumento de aprimoramento do próprio professor na medida em
que o coloca diante do desafio de inovar, reconstruir, mudar os rumos da aula a
depender dos rumos em que a classe, agora autônoma, protagonista, levar o
conhecimento a ser construído.

A vida em sociedade na atualidade requer do sujeito um senso criativo e pró-


ativo diante dos inúmeros e constantes desafios que se colocam no mercado de
trabalho e nas relações sociais de forma mais ampla. Essa realidade exige do sujeito
que aprende a vontade de aprender, pesquisar e saber e do profissional que ensina a
disponibilidade em rever suas metodologias e reaprender a ensinar.

A necessidade de uma mudança nos processos escolares e de ensino de modo


geral nunca foi tão urgente. É imprescindível que se instale na sala de aula processos
mais dialógicos e flexíveis, que concebam o aluno como alguém que aprende e
ensina, que constrói e reconstrói amparado pelos conhecimentos que o formam como
indivíduo.

Recuperar conceitos como o de Ausubel e a aprendizagem significativa é


necessário para que a transformação de fato ocorra. Transformação de processos e

75
de concepções há muito cristalizadas e que impedem que o novo, tão presente na
vida cotidiana, adentre nos processos escolares.

Atividades de aprendizagem devem se adequar à ideia de construção por meio


da utilização de diferentes e múltiplos recursos com vistas a atender os diferentes
perfis de aluno. A escolha de tais recursos não é tarefa fácil ao educador que não foi
educado, que não foi preparado para tal. Contudo, para facilitar essa escolha nos
apoiamos em Moreira (2006) para quem um material potencialmente significativo é
aquele que seja relacionável (ou incorporável) à estrutura cognitiva do aprendiz, de
maneira não arbitrária e não literal, onde os novos conhecimentos adquirem
significado para o aluno e os conhecimentos prévios que lhe serviram de base
adquiram maior estabilidade cognitiva.

Vale lembrar que a mudança de postura docente diante do conhecimento que


se desenvolverá no aluno não engessa sua prática, tampouco aliena seu aluno em
técnicas descontextualizadas, mas antes contribui para a necessária versatilidade do
aluno em adaptar-se a processos futuros que lhe exijam competências que serão
constantemente requeridas em ambientes de trabalho os mais variados. Como bem
retrata Freire (1997, p. 54), “todo fazer pedagógico nasce de um sonho. Sonho que
emerge de uma necessidade, de uma falta que nos impulsiona na busca de um fazer”

4.4 Considerações finais

É necessário repensar a forma tradicional de ensino nas diferentes etapas e


modalidades de ensino. A repetição, memorização e consequente reprodução de
conteúdos por parte do aluno não cabem em um contexto global de contínuas
transformações que afetam diretamente a vida das pessoas e exigem a capacidade
de adaptação frente a uma sociedade digital na qual se configuram desafios diários
rompendo as fronteiras do conhecimento com a globalização.

Metodologias que tenham o aluno como um ser estático, passivo e vazio de


conhecimento não encontram justificativa para seu uso em um universo digital e
dinâmico como a atualidade. O desinteresse demonstrado pelo aluno em inúmeras
salas de aula reforça o distanciamento entre o universo desses alunos e a abordagem
em sala de aula.

As tecnologias são muitas e de fácil acesso e tem a possibilidade real de


favorecerem processos de aprendizagem significativa desde que adentrem no
universo das metodologias utilizadas pelo professor. A internet sem fio, os dispositivos
móveis e aplicativos dos mais variados temas e interesse representam uma porta de

76
entrada para a aprendizagem significativa, pois representam o cotidiano de alunos
das mais variadas idades, etapas e modalidades de ensino.

Universidades devem acompanhar as transformações e estimular seu corpo


docente a adequar seus processos de ensino inserindo as novas tecnologias no
ambiente de ensino.

Cabe ao professor a disposição e, até mesmo, a humildade em permitir-se


aprender, renovar seus conhecimentos e reconstruir sua prática junto aos alunos.

O desafio de potencializar o conhecimento prévio dos alunos a fim de


construir novos conhecimentos

Diante da importância de se desenvolver processos de ensino cada vez mais


voltados à autonomia do aluno, enfatizando o desenvolvimento de competências
essenciais para a vida em sociedade e para o mercado de trabalho, estabeleça uma
sequência didática que vise ao desenvolvimento da competência de trabalho em
equipe que privilegie a capacidade de tomar decisões e gerir conflitos.

Bom trabalho!

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Ao final desta unidade de estudo concluímos um processo de construção


conjunta de conhecimentos acerca do que significa “ser aluno” e ao mesmo tempo de
posturas requeridas para o “ser professor”. Conhecemos visões diferentes, mas
convergentes no que se refere ao perfil do aluno do século XXI e, ao mesmo tempo,
da conduta requerida para o professor com vistas ao atendimento das necessidades
de aprendizagem dos estudantes.

A mudança de comportamento discente a que nos referimos quando da


abertura desta unidade influencia diretamente a postura docente que não encontra
mais espaço para se denominar diretiva tradicional. Apresentamos as ideias que
influenciaram processos de ensino ao longo da história, com destaque para os
modelos taylorista e fordista que orientaram fortemente práticas docentes que se
cristalizaram em práticas até a atualidade.

78
Práticas que priorizam a centralidade do professor demonstrada na constante
exposição de conteúdos como a forma privilegiada de se trabalhar o conhecimento
acumulado. Práticas que ignoram o saber acumulado pelo sujeito que aprende em
sua história de vida, saberes que o capacitam a envolver-se com mais profundidade
nos conhecimentos a serem adquiridos.

Apresentamos as transformações que ao menos no discurso oficial foram


incorporadas e questionamos por que, após mais de vinte anos da promulgação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96) que já incorporava a
concepção de aluno como protagonista em seu desenvolvimento, ainda nos
deparamos com posturas docentes tão distantes da realidade do século XXI.

Urge a necessidade de transformar espaços de ensino em espaços de


aprendizagem, assim como é urgente repensar os modelos metodológicos de
ensino/aprendizagem que ainda se mantêm presos a modelos cuja figura central é o
professor. Propostas metodológicas de resolução de problemas, de produção do
conhecimento científico e de desenvolvimento de competências foram alguns
exemplos que abordamos para ampliar o olhar quanto às inúmeras possibilidades de
se enriquecer o ensino/aprendizagem para ambos os sujeitos professor e aluno.

A mobilização de saberes prévios é condição para a construção de novos


conhecimentos com vistas ao pleno exercício profissional e de cidadania para os
jovens e adultos.

O desenvolvimento de competências essenciais para a vida cotidiana e


profissional é o caminho para a aprendizagem significativa, exigência de um mundo
globalizado em uma sociedade do conhecimento que exige do indivíduo capacidade
de se adaptar a mudanças, mas também de criar e transformar a realidade.

Desafios que se colocam para as instituições de ensino e para os profissionais


que delas fazem parte, desafios que vão muito além de se pensar em processos de
desenvolvimento de competências de seus alunos, desafios que passam
obrigatoriamente pelo desenvolvimento de competências de seus professores para
que estejam aptos a mediar processos de construção de conhecimento com seus
alunos.

Esperamos ter contribuído para o seu aprendizado.

Até a próxima!

79
REFERÊNCIAS

ALEKSANDROWICK, AMC A extensão da impostura. Cadernos de Saúde Pública,


v16, no.4, p.893-902, 2000.

ANDERSON, L. W. et. al. A taxonomy for learning, teaching and assessing: a


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Longman, 2001. 336 p.

ANTUNES, Celso. A sala de aula de geografia e história: inteligências múltiplas,


aprendizagem significativa e competências no dia-a-dia. Campinas: SP, Papirus,
2001.

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