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DESENVOLVIMENTO INICIAL DE HYMENAEA COURBARIL L.

(LEGUMINOSAE-CAESALPINIOIDEAE)
Patrícia Umeda Grisi¹, Marli Ranal1, André Rosalvo Terra Nascimento1, Denise Garcia
Santana2 (1Universidade Federal de Uberlândia, Caixa Postal 593, Uberlândia, MG, CEP
38400-902. E-mail: patriciaumeda@hotmail.com 2Instituto de Ciências Agrárias,
Universidade Federal de Uberlândia, Caixa Postal 593, Uberlândia, MG, CEP 38400-902)

Termos para indexação: fases de desenvolvimento; dormência, sementes, Hymenaea

Introdução
O gênero Hymenaea L., com cerca de 20 espécies, tem como centro de distribuição
a Amazônia. As árvores fornecem madeiras valiosas, frutos comestíveis, resinas e casca
com tanino. A espécie mais conhecida é Hymenaea courbaril L., encontrada desde o
México, Índias Ocidentais até a Bahia. No Brasil Central e florestas secas do nordeste, além
de H. courbaril, destacam-se H. stilbocarpa Hayne e H. stigonocarpa Mart. (Marchiori,
1997).
Em Hymenaea o fruto é lenhoso, com pontuações resinosas. Na fase jovem de
desenvolvimento a parte interna é ocupada por duas lâminas de tecido carnoso, alvo e
densamente coberto por glândulas diminutas, entre as quais se localizam as sementes. Na
fase posterior de desenvolvimento as porções carnosas se desfazem em massa farinhosa e
compacta, de odor penetrante, e as sementes ficam completamente envolvidas por um arilo
de consistência seca (Barroso et al., 1999).
Hymenaea courbaril pode ser classificada como espécie tolerante à sombra ou
climácica, ocorrendo em baixa densidade populacional e, portanto, na forma de pequenas
populações em ambientes fragmentados (Toledo, 2005). Essas características populacionais
e o pequeno estoque de indivíduos adultos reprodutivos em ambientes naturais podem
comprometer a conservação in situ dos recursos genéticos inerentes à espécie (Leite, 2001).
Neste sentido, o desenvolvimento de técnicas de conservação ex situ são de suma
importância para a recomposição de áreas degradadas e para programas de regeneração de
áreas onde a espécie tornou-se rara ou inexistente.
Em função da dormência tegumentar das sementes, física e mecânica, e da
conseqüente dormência relativa (Ranal el al., no prelo), o propósito deste trabalho foi testar
a participação desse tipo de dormência múltipla no crescimento de plantas jovens de
Hymenaea courbaril em condições de viveiro.

Material e Métodos
Sementes de jatobá foram coletadas no vale do rio Araguari, MG, em agosto e
setembro de 2005. A região é caracterizada pelo tipo climático Aw, segundo o sistema de
classificação de Köppen (1948), considerado tropical úmido com inverno seco (abril a
setembro) e verão chuvoso (outubro a março).
Sementes oriundas de 10 matrizes, armazenadas por seis a sete meses, foram
semeadas no dia 30 de março de 2006 em bandejas multicelulares de poliestireno
expandido com 72 células, preenchidas com vermiculita e substrato comercial Plantmax®
na proporção 1:1, sob dois tratamentos pré-germinativos (sementes intactas e escarificadas
em esmeril). A semeadura foi feita a 2 cm de profundidade, utilizando-se uma semente por
célula. Cada tratamento foi constituído por uma amostra de 72 sementes, totalizando 20
amostras distribuídas casualmente sob o sombreamento de árvores no Jardim Experimental
do Instituto de Biologia, Universidade Federal de Uberlândia, sendo irrigadas diariamente.
As médias das temperaturas mínima e máxima durante o período experimental foram de 18
e 25,4 °C, respectivamente.
Plantas jovens, com 28 dias de idade começaram a ser avaliadas diariamente quanto
às fases de desenvolvimento, em seis censos, no período de 27 de abril a 2 de maio de
2006. Foram determinadas 13 fases, na seqüência de seu aparecimento e de acordo com a
morfologia das plantas (Tabela 1).
Com os dados obtidos foram calculadas a porcentagem de plantas em cada fase de
desenvolvimento, nos seis censos realizados, em relação ao total produzido. Os resultados
foram comparados graficamente, utilizando-se valores do erro padrão da média em função
da falta de normalidade para a maioria das amostras analisadas. A eficiência da
escarificação das sementes na aceleração do desenvolvimento das plantas foi medida
indiretamente, comparando-se a porcentagem das fases nos diferentes censos entre os dois
tratamentos, por meio do teste de Mann-Whitney (α = 0,05).
Tabela 1. Morfologia de plantas jovens de Hymenaea courbaril L. nas diferentes fases de
desenvolvimento, entre 28 e 34 dias após a semeadura.

Fase Morfologia
1 Plantas com qualquer porção do hipocótilo exposto acima do substrato; cotilédones
sob o substrato
2 Plantas com ângulo menor que 90° entre cotilédones e hipocótilo
3 Plantas com ângulo de 90° entre cotilédones e hipocótilo
4 Plantas com ângulo maior que 90° entre cotilédones e hipocótilo
5 Plantas com cotilédones e hipocótilo no mesmo alinhamento
6 Plantas com cotilédones em ângulo de 90° com o hipocótilo e com até 50% da lâmina
foliar expandida
7 Plantas com cotilédones e hipocótilo no mesmo alinhamento e com menos de 50% da
área foliar expandida
8 Plantas similares à fase 7, mas com 50% da área foliar expandida
9 Plantas similares à fase 7, mas com mais de 50% da lâmina foliar expandida
10 Plantas similares à fase 7, com a área foliar totalmente expandida
11 Plantas com ângulo maior que 90° entre cotilédones e hipocótilo e com menos de
50% da lâmina foliar expandida
12 Plantas com lâmina foliar expandida e epicótilo em desenvolvimento
13 Plantas com ângulo menor que 90° entre cotilédones e hipocótilo e com lâmina foliar
expandida

Resultados e Discussão
A emergência das plântulas de Hymenaea courbaril é do tipo epígeo
fanerocotiledonar-armazenador. Cotilédones no ápice do hipocótilo, inseridos em um nó
cotiledonar, sésseis, bilaterais, opostos, isófilos e carnosos também foram reportados para
H. intermedia Ducke var. adenotricha (Melo et al., 2004).
Tabela 2. Porcentagem de plantas de Hymenaea courbaril L. em cada fase de
desenvolvimento, nos seis censos realizados (27 de abril a 2 de maio de 2006),
para os dois tratamentos aplicados às sementes, entre 28 e 34 dias após a
semeadura.
Fas Situação da Censo
1 2 3 4 5 6
e semente
Intacta 17,435 a 14,743 a 11,163 a 7,457 a 4,376 a 4,194 a
1 Escarificada 11,312 a 9,952 a 5,037 a 4,025 a 2,555 a 2,883 a
Intacta 6,420 b 5,956 a 7,762 a 7,387 a 4,649 a 5,329 a
2 Escarificada 24,172 a 17,856 a 13,754 a 7,569 a 3,692 a 2,958 a
Intacta 2,694 b 2,024 a 1,019 b 2,079 a 3,642 a 1,779 a
3 Escarificada 17,074 a 9,967 a 9,598 a 7,871 a 3,684 a 1,748 a
Intacta 6,232 b 4,578 b 3,466 b 2,256 b 3,484 a 3,963 a
4 Escarificada 20,891 a 13,617 a 12,747 a 9,812 a 6,041 a 3,182 a
Intacta 1,782 b 0,746 a 1,036 a 1,021 a 1,658 a 1,248 b
5 Escarificada 6,007 a 2,581 a 2,362 a 1,071 a 3,182 a 4,206 a
Intacta 0,705 a 0,588 a 0,588 a 0,000 b 1,499 a 0,179 a
6 Escarificada 1,008 a 1,229 a 1,533 a 1,514 a 1,705 a 0,346 a
Intacta 1,803 b 1,633 b 2,379 b 3,251 b 4,502 b 4,468 a
7 Escarificada 10,356 a 8,255 a 12,129 a 10,055 a 12,626 a 10,428 a
Intacta 2,059 a 1,948 a 1,516 b 1,878 b 2,164 b 1,364 b
8 Escarificada 4,153 a 6,084 a 7,041 a 8,632 a 9,773 a 8,881 a
Intacta 0,767 a 2,826 a 3,681 a 2,255 b 3,092 b 4,452 b
9 Escarificada 3,432 a 5,381 a 8,037 a 16,555 a 22,879 a 20,614 a
Intacta 0,000 a 0,000 a 1,798 a 4,153 a 3,718 a 2,965 b
10 Escarificada 0,517 a 1,718 a 5,162 a 7,309 a 8,567 a 15,616 a
Intacta 0,000 a 4,015 a 4,113 b 4,504 b 1,172 b 3,846 a
11 Escarificada 0,000 a 12,046 a 16,324 a 18,003 a 12,786 a 7,917 a
Intacta 0,000 a 0,000 a 0,000 b 0,588 a 2,386 a 5,221 b
12 Escarificada 0,000 a 0,000 a 2,944 a 3,991 a 8,747 a 18,676 a
Intacta 0,000 a 0,000 a 0,294 a 0,294 a 0,149 a 0,149 a
13 Escarificada 0,000 a 0,000 a 0,385 a 1,186 a 1,323 a 0,321 a
Médias seguidas da mesma letra na coluna, dentro de cada fase, não diferem
significativamente pelo teste de Mann-Whitney (P > 0,05).

Apenas as maiores diferenças entre tratamentos foram detectadas quanto ao efeito


da escarificação das sementes na aceleração do desenvolvimento das plantas (Tabela 2).
Sempre que foi detectada diferença significativa entre os tratamentos, sementes
escarificadas propiciaram o aparecimento da maior porcentagem de plantas na fase e censo
analisados. Isso mostra que quando os envoltórios das sementes deixam de representar
barreira ao desenvolvimento, a porcentagem de plantas nas diferentes fases é maior do que
a de plantas originadas de sementes cujos envoltórios permanecem no substrato intactos,
sujeitos à ação natural e lenta de fungos, bactérias, ácidos fracos do substrato e da oscilação
térmica.
As quatro fases iniciais analisadas predominaram nos quatro primeiros censos, com
maior porcentagem de plantas provenientes das sementes escarificadas, exceto para a
primeira fase em que não foram detectadas diferenças quanto aos tratamentos de sementes
(Figura 1). Poucas plantas passaram pelas fases 5 e 6 no período avaliado, chegando a 6%.
O que parece é que à medida que o hipocótilo se distende, os eófilos também crescem, de
tal forma que quando o hipocótilo e os cotilédones chegam ao mesmo alinhamento, a
expansão foliar está em pleno progresso, ultrapassando o limite físico dos cotilédones.
Certamente a atividade metabólica é intensa nesse período, às custas das reservas dos
cotilédones, para garantir que a planta jovem possa assumir com rapidez a posição ereta,
com os eófilos perpendiculares em relação à incidência de luz, o que pode maximizar a
atividade fotossintética no sub-bosque. Isso pode ser confirmado com os dados da fase
seguinte que retrata um padrão diferente em relação às demais, com o aparecimento da fase
7 nos diferentes censos, de forma relativamente equilibrada, ainda com predomínio das
plantas oriundas de sementes escarificadas. As fases 5 a 7, registradas entre 33 e 35 dias
após a semeadura, parecem representar importante transição da dependência das reservas da
semente (heterotrofia) para fontes externas, especialmente luz (autotrofia), e esse evento foi
mensurado pela alta correlação entre mobilização de xiloglucanos dos cotilédones e a
expansão dos eófilos em período similar (Santos & Buckeridge, 2004). Provavelmente a
baixa porcentagem de plantas nessas fases foi decorrente do intervalo entre as observações
ter sido de 24 horas.
As fases 8 a 10 e 12 predominam nos censos mais tardios, mostrando a evolução na
forma das plantas, também com predomínio das provenientes de sementes escarificadas. As
fases 11 e 13 representam mudança no padrão de desenvolvimento e provavelmente
estejam retratando plantas com emergência tardia, com expansão lenta e concomitante do
hipocótilo e dos eófilos. Certamente em microambientes com maior densidade de plantas
essas terão menor chance de sucesso, uma vez que a curvatura do hipocótilo não permite o
rápido posicionamento dos eófilos para maximizar a captura de luz. As fases 2, 4 e 9
alcançaram as maiores freqüências e as maiores diferenças entre tratamentos, em
contraposição às fases 5, 6 e 13.

32 32 32
Fase 1 Fase 2 Fase 3
28 28 28
24 24 24
20 20 20
16 16 16
%
%

12 12 12
8 8 8
4 4 4
0 0 0
0 1 2 3 4 5 6 0 1 2 3 4 5 6 0 1 2 3 4 5 6

32 32 32
Fase 4 Fase 5 Fase 6
28 28 28
24 24 24
20 20 20
16 16 16
%

12 12 12
8 8 8
4 4 4
0 0 0
Figura 1. Porcentagem de plantas jovens de Hymenaea courbaril L. em diferentes fases de
desenvolvimento, ao longo de seis censos realizados (27 de abril a 2 de maio de 2006),
entre 28 e 34 dias após a semeadura.

Conclusões
A superação da dormência das sementes de Hymenaea courbaril acelerou o
desenvolvimento inicial das plantas em relação ao tratamento controle, o que pode facilitar
o estabelecimento das plantas pela competição bem sucedida.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Helizângela Dourado da Silva e Marcelo S. de Almeida
pelo auxílio na coleta de dados.

Referências bibliográficas
BARROSO, G.M.; MORIN, M.P.; PEIXOTO, A.L.; ICHASO, C.L.F. Frutos e sementes:
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