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E-BOOK

PSICOLOGIA
HOSPITALAR:
Estratégias de Avaliação e
Intervenção frente ao adoecimento
PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

INTRODUÇÃO
No decorrer das últimas décadas, a prevalência de doenças de saúde. Ela desempenha um papel fundamental na
crônicas não transmissíveis (DCNT) tem aumentado promoção do bem-estar emocional e mental dos pacientes,
progressivamente em decorrência de fatores como bem como na melhoria da qualidade dos cuidados de
urbanização, envelhecimento da população e estilos de vida saúde em geral.
não saudáveis. A intervenção da psicologia pode auxiliar o tratamento
Atualmente, as DCNT são responsáveis por grande parte dos médico, pois, à medida que sensibiliza a equipe para
óbitos em países desenvolvidos, e as doenças cardíacas, aspectos psicossociais que dificultam a comunicação
oncológicas e renais têm principal destaque. Nesses casos, com o paciente, facilita a implicação do paciente em seu
são necessárias intervenções terapêuticas mais intensivas e, tratamento e reabilitação e oferece um acolhimento para a
também, um maior número de hospitalizações. família.
Já é apontado na literatura da área da Psicologia Neste conteúdo exclusivo, você encontrará os principais
Hospitalar que essas doenças acarretam sintomas graves conceitos da Psicologia Hospitalar, além de aprofundar
e debilitantes, com consequente prejuízo da qualidade de conhecimentos em temas como o impacto do adoecimento,
vida (QDV). Esta última é relacionada, por sua vez, com a a família no contexto hospitalar, adesão e engajamento
percepção do paciente sobre sua doença, ou a forma como do paciente e as diretrizes para a avaliação psicológica no
ele se posiciona frente à efermidade, seu tratamento e sua hospital.
vida.
É nesse contexto que está em jogo não apenas a saúde Boa leitura!
física, mas também a saúde mental do paciente. O ambiente
hospitalar é local em que corpo e emoção se intercalam
mais vigorosamente. É no hospital, principalmente, que
o indivíduo corre o risco de morte, risco de perda da
integridade (procedimentos invasivos) e risco de perda de
potência (limitações).
Assim, consolida-se a Psicologia Hospitalar, uma
subdisciplina da Psicologia que se concentra na aplicação de
princípios e técnicas psicológicas no contexto de cuidados
de saúde, especificamente em hospitais e ambientes
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PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

O IMPACTO DO ADOECIMENTO
E DA HOSPITALIZAÇÃO
NO INDIVÍDUO
Para que se estude a Psicologia Hospitalar em todo seu
potencial, é preciso relembrar dos conceitos de saúde-doença
e seus marcadores sociais, ambientais, culturais, entre outros.
Ou seja, para além da doença e do corpo, precisamos lembrar
que existe um sujeito: alguém que sofre, tem família, história
e afetos. Cuidar desse indivíduo é colocar em evidência todos
esses fatores; ganhar confiança e criar vínculo, respeitar a
singularidade daquele que está em sua frente e compreender o
ser biopsicossocial.
Sabemos que, ao longo da vida, existem tensões e mudanças
que podem gerar conflitos e desequilíbrios advindos de fatores
biopsicossociais e que podem gerar o que é denominado de
crise. Nesta, especificamente, uma pessoa vivencia variados
graus de estresse, tornando-se necessárias uma reorganização
emocional e a busca de estratégias para enfrentamento. Outra
definição possível para crise está nos acontecimentos que
ameaçam o senso de segurança do sujeito.

LEMBRAR
A doença é modificadora da vida, ou seja, ela não finaliza
dentro da internação. Aqui estamos falando de desdobramen-
tos que você poderá identificar e até auxiliar seu paciente
a enfrentar.

Confira no mapa mental do processo de compreensão entre


saúde e doença.
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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

O modelo biopsicossocial (que foca em aspectos emocionais


em torno do processo de saúde-doença) de saúde ampliou a
compreensão do processo de saúde-doença e colocou o paciente
como elemento central do cuidado. A partir dessa mudança,
diversas outras disciplinas do campo da saúde ganharam
impulso para se desenvolver, culminando com o reconhecimento
da multiprofissionalidade como fundamento das práticas de
cuidado.
Outro paradigma da compreensão do tema vem da Organização DOENÇA
Mundial da Saúde (OMS), que, desde 1998, ampliou ainda mais a
noção de saúde, passando a incluir a dimensão espiritual como
um de seus elementos. Isso trouxe impactos diretos nas práticas
Condição que afeta o
em saúde, que, progressivamente, vêm reconhecendo os efeitos corpo de forma negativa
da espiritualidade na promoção do bem-estar e da qualidade
de vida, bem como na colaboração do atravessamento da
experiência de adoecimento.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2003), esse
estado não se refere apenas à ausência de transtornos mentais.
ADOECER
Define-se como um estado de bem-estar, no qual o Experiência que envolve
indivíduo é consciente de sua própria capacidade, pode
enfrentar tensões normais da vida, pode trabalhar de
como o sujeito vive a doença
forma produtiva e frutífera. forma produtiva e frutífera.

Esta é uma das raízes históricas do desenvolvimento da


Psicologia Hospitalar. Ao reconhecer os aspectos psicológicos
como elementos componentes do processo saúde-doença,
a subjetividade passou a ganhar uma visibilidade antes
negligenciada pelo modelo biomédico.

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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

SAÚDE MENTAL NO
CONTEXTO HOSPITALAR

O paciente que procura o pronto-socorro geralmente teve Afinal, quanto mais precoce a intervenção, menores as
sua vida desestruturada a partir da instalação abrupta de um possibilidades de agravamento e maiores as expectativas
processo mórbido, da vivência de um acidente ou de uma de recuperação psíquica dos pacientes.
descompensação em casos de doenças crônicas. - (ROMANO, 1999)

LEMBRAR
Exemplo:
Quando chega ao pronto-socorro, o paciente se vê imerso em
Após ser diagnosticado como cardiopata, como o sujeito
uma situação de desamparo e, de certa forma, perde sua dig-
passa a se sentir? Sente-se diferenciado ou estigmatizado
nidade quando deixa sua posição de sujeito passando a objeto
diante das pessoas? Pesquisas mostram que alguns pacientes
de intervenção.
se sentem inferiores às outras pessoas por não poderem
mais exercer a sua profissão e por sofrerem mudanças
Estudos apontam a intervenção psicológica após a exposição significativas no seu estilo de vida. Foi constatado que o
a situações traumáticas, como cirurgias, adoecimento abrupto estigma está presente na vivência do cardiopata através de
ou internações prolongadas, como uma medida importante suas relações sociais, em que amigos e familiares tendem a
para atenuar o desenvolvimento de transtornos. A Terapia considerá-lo como fragilizado, diminuído ou menos capaz.
Cognitiva-Comportamental Focada no Trauma (TCC-FT)
aparece como principal recurso nesses casos.
Aqui, portanto, estamos pensando no cuidado para além
do primeiro contato com o paciente; estamos integrando o Considerando o impacto e a simbologia do coração, o
tempo concreto com o tempo psíquico, visando promover psicólogo deve compreender as repercussões do adoecer para
a prevenção de consequências negativas. Essa é uma o sujeito, acolher e facilitar a adaptação e enfrentamento do
constatação que vem sendo reafirmada ao longo dos anos, adoecimento.
principalmente na Psicologia Hospitalar.

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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

Um primeiro passo nessa abordagem é compreender em qual


O DESAFIO DA ADESÃO estágio de prontidão para mudança o paciente se encontra.
AO TRATAMENTO E O Esse passo ajudará a compreender a motivação subjacente ao
paciente e como podemos auxiliá-lo. É importante lembrar que a
ENGAJAMENTO DO PACIENTE motivação é algo dinâmico e que pode flutuar ao longo do tempo
e de uma situação para outra.

Modelo Transteórico de Prontidão para Mudança

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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

Exemplo:
DICA
Um exemplo prático é a solicitação de suporte psicológico para
pacientes que recusam algum tratamento ou apresentam sérias Precisamos também, enquanto psicólogos, lembrar que, a
dificuldades em aderir às orientações das equipes de saúde. O partir da alta hospitalar, os outros pacientes continuarão com
que a equipe nos solicita: a compreensão de fatores subjetivos uma doença crônica. Precisarão de tratamento, cuidado e
que podem estar sustentando essa resistência ao tratamento ou mudanças de estilo de vida. Esses aspectos implicam também
uma solução “pedagógica” para o paciente, tornando-o menos o envolvimento da família.
“difícil”? Essa é uma reflexão imprescindível em nosso cotidiano
para evitar a posição de “ortopedistas do Eu” em nossa prática
profissional.
Como profissionais de saúde mental, podemos ser confrontados
cotidianamente com novas formas de sofrimento que colocam
em xeque os limites entre o normal e o patológico e o quanto
as preocupações com prevenção podem se tornar traços
hipocondríacos. Como nos posicionaremos nessas situações?
Respeitaremos que o normal e o patológico são zonas cinzas
e autodeterminadas, ou faremos parte do corpus que busca o
controle excessivo e não a promoção e defesa da vida, em suas
mais variadas formas?
Há de se considerar, ainda, que efeitos indesejáveis na saúde
podem advir justamente desse excesso de investigação e
intervenção, como se discute em relação às iatrogenias e
sobretratamentos. Por fim, ao intervir sobre a adesão e o
engajamento do paciente, conforme salientado anteriormente,
ainda que tenha como foco os indivíduos, não pode deixar de
considerar em seu horizonte as dimensões coletivas que afetam
o processo de saúde e doença, como os determinantes sociais
de saúde.

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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

matrimonial, família simultânea, família homoafetiva, família


A DOENÇA ALTERA FUNÇÕES poliafetiva, família monoparental, família parental, família
EM TODOS OS NÍVEIS: FAMILIAR, unipessoal, entre muitas outras.

SOCIAL E ECONÔMICO LEMBRAR


No contexto hospitalar, a família se apresenta como principal
A família, como núcleo mais próximo, é diretamente envolvida núcleo de relação e vínculo, com o papel de oferecer
e afetada, tornando-se rede de suporte para o paciente suporte emocional e prático ao paciente no momento de sua
nos momentos de fragilidade. A compreensão da estrutura fragilidade. Portanto, compreender a dinâmica apresentada
da instituição familiar nos auxilia no entendimento da por essa instituição nos permite identificar necessidades e
complexibilidade dos fenômenos que ocorrem no momento do atuar sobre elas.
adoecimento de um de seus membros, instrumentalizando-nos
para acolhimento e manejo de demandas familiares presentes no
Conhecer e refletir acerca desse conceito, amplo e fluido, nos
contexto hospitalar.
auxilia na compreensão da constituição das dinâmicas familiares
Inclui-se a concepção de que esta seja formada por um grupo que podem ser encontradas no contexto de adoecimento e
de pessoas com o mesmo sangue, ascendência, linhagem hospitalização de um de seus membros.
em comum ou formada por doação (PRADO, 2001). Dentro
Ou seja, a condição de saúde, em muitos casos, culmina em
das concepções mais populares, encontram-se as estruturas
crise para além do individual, perpassando a família: a doença é
baseadas em graus de parentesco: a família nuclear e a família
vivida de forma coletiva, pois também existirá o impacto cultural
extensa:
vivenciado pela família. Ao falarmos de um momento de crise,
• Família nuclear: refere-se àquela que inclui membros de queremos dizer que a família e o paciente, no momento do
parentesco mais próximo, como pais e filhos, que comumente adoecimento e hospitalização, vivenciam involuntariamente um
vivem sob o mesmo teto. processo de adaptação frente às perdas experimentadas com
• Família extensa: compreendida pelos graus de a doença, que se instala de forma central na vida dos indivíduos
parentesco mais distantes e pode ser composta também por envolvidos.
avós, tios, primos e outras relações de parentesco.
Há, entretanto, uma diversidade de composições familiares,
as quais representam a característica fluida que esse conceito
possui. São exemplos de estruturas familiares: família
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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

Podemos caracterizar uma situação de crise pela presença de DICA


mudanças não buscadas ou desejadas e rupturas abruptas
no estilo de vida. Essa ruptura abrupta gera sentimentos de No contexto familiar, há ainda a abordagem da Psicologia
desproteção e desagregação da dinâmica da família, e da Hospitalar no cuidado à criança, que exige manejo específico
estrutura subjetiva de cada componente. e, mais do que nunca, colaboração familiar. Para saber mais,
assista à videoaula Quando o sistema desestrutura.
Repercussões contextualizadas ao momento de crise adaptativa A criança no hospital.
podem ser observadas como demandas familiares pela equipe
de saúde. Por exemplo: ASSISTIR AULA GRÁTIS

• dificuldade de compreensão do quadro e sobre o


processo de adoecimento do membro familiar;
• ritmo de vida incompatível com as necessidades de Destaca-se que as repercussões do adoecimento de um
cuidado e suporte ao membro durante a hospitalização; membro familiar ocorrem de modo subjetivo para cada indivíduo
• participação em tomadas de decisões por vezes da família, dependendo de aspectos relacionados ao próprio
angustiantes; adoecimento e pregressos a ele, tais como:

• aceitação da fragilidade e finitude de um de seus • do papel do paciente dentro da dinâmica familiar;


membros; • do diagnóstico e prognóstico da doença;
• perda da privacidade e individualidade; • das necessidades de intervenção no tratamento.
• entristecimento acentuado;
• fragilidade e sensibilidade emocional;
• fadiga emocional diante dos cuidados ofertados;
• regressão de fases do desenvolvimento;
• aumento da dependência;
• culpa e remorso;
• ansiedade e oferta excessiva de cuidados.

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PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

Logo, enquanto psicólogo hospitalar, você precisará refletir,


para além do encontro com o paciente e com sua família na
instituição. Você deverá também levar em consideração o todo:
• possíveis demandas emocionais para o pós-alta;
• dificuldades de enfrentamento do paciente e da família
no tratamento;
• necessidade de encaminhamento e/ou seguimento
ambulatorial.

DICA
Muitos pacientes necessitam de cuidados específicos que
exigem profissionais de diversas áreas. Compreenda o
papel da Psicologia Hospitalar com a videoaula O Trabalho
Multiprofissional: manejo com a equipe e com o cuidador
profissional.

ASSISTIR AULA GRÁTIS

Diante disso, o psicólogo tem o papel de atenuar e compensar


implicações fantasiosas ou projetadas entre equipe, paciente
e família. Assim, o psicólogo hospitalar possui o papel de
cuidar dos aspectos que envolvem as relações construídas
na hospitalização. Podemos auxiliar esses pacientes e seus
familiares oferecendo acolhimento, espaço para escuta e
escoamento emocional.

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PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA quando o paciente pode expressar seu sofrimento, realizar refle-
xões e ponderações. O momento da avaliação também se mostra
NO HOSPITAL estrategicamente interventivo, ofertando alívio e ajustamento
diante da situação estressante.
A avaliação psicológica no contexto hospitalar é umatarefa Mas, quais seriam os motivos que tornam mais
complexa que exige preparação especial para o exercício evidente para a equipe multidisciplinar que o
profissional. No ambiente hospitalar, a avaliação psicológica paciente se beneficiaria de avaliação psicológica?
auxilia o psicólogo na construção de pareceres que sustentam
condutas e decisões. Os pedidos de avaliação psicológica em unidades de internação
geralmente decorrem de demandas observadas pelos profissio-
LEMBRAR nais de saúde, tais como:
• dificuldades objetivas e subjetivas do paciente com
O diagnóstico psicológico busca compreender dinamicamente
relação à doença, ao tratamento e à hospitalização;
o significado do adoecimento na vida do paciente/familiares
e, com isso, é possível construir intervenções em conjunto • parcos recursos cognitivos e psicológicos para enfrenta
com a equipe multiprofissional para ofertar o melhor plano de mento e manejo das dificuldades; crises de ansiedade;
cuidado ao paciente. • crises de ansiedade;
• desorganização cognitiva e/ou emocional;

IMPORTANTE • rede de apoio inexistente ou conflitante;


• resistência aos cuidados ou a seguir orientações/
A avaliação psicológica é uma atribuição exclusiva do
normas;
psicólogo, definida pela lei que regulamentou a profissão no
Brasil em 1962 (CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA 6ª • demandas emergentes como crise suicida e comporta-
REGIÃO – CRP06, 2005). mentos disruptivos/agressivos.

Durante a hospitalização, percebemos que muitos pacientes se


mostram agudamente mobilizados pelo diagnóstico, tratamento
ou agravamento do quadro clínico. Em grande parte dos casos,

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PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

No modelo de assistência ambulatorial, de acordo com Brito, esperado de elaboração do adoecimento. Assim como um fami-
Schaab e Remor (2019) e Lopes e Amorim (2004), os motivos liar questionador pode ser o responsável perante toda a família
mais frequentes dos encaminhamentos para avaliação psicológi- por reportar as informações ou apresentar a necessidade de
ca podem se agrupar em: minimizar o estresse e ansiedade produzidos nessa experiência.
a) Avaliações de rotina: partem das clínicas médicas espe- Portanto, é pertinente entender com o solicitante como surgiu a
cializadas. Por exemplo: cirurgias bariátricas, transplantes, demanda, qual a finalidade da avaliação e se o paciente ou fami-
redesignação sexual, relacionadas à indicação ou contrain- liar está ciente da nossa entrada, porque podemos nos deparar
dicação do procedimento. com sua surpresa ou recusa quanto à avaliação. É possível iden-
b) Diagnóstico diferencial: ocorre quando a equipe médica tificar também com o solicitante se realmente há uma demanda
solicita auxílio para excluir hipóteses diagnósticas. Muito psicológica ou de outra ordem, como questões sociais ou jurídi-
comum diante de queixas difusas de saúde ou sintoma- cas da família, e evitar inserções desnecessárias do psicólogo.
tologia complexa que se evidencia por questões emocio- A partir dessa primeira investigação, o psicólogo pode planejar a
nais ou demandas neuropsicológicas. avaliação em si, analisando se utilizará algum teste psicológico
c) Dificuldades de adesão ao tratamento e suporte emo- além da entrevista inicial.
cional: nesses casos, o paciente pode apresentar recusas Para isso, é preciso considerar:
e não se engajar nas terapêuticas que comprometem sua • Se as condições clínicas do paciente são condizentes
recuperação, seja por histórico de transtornos psiquiátri- com o emprego de escalas e testes;
cos, seja por momentos de comunicação de notícia difícil
como diagnósticos, recidivas, tratamentos não responsi- • De acordo com sua faixa etária e escolaridade, se neces-
vos, curso agravado da doença, entre outros. sita da presença de cuidador ou familiar ou até mesmo
se a dinâmica hospitalar propicia a avaliação de forma
A forma como o profissional da equipe de saúde realiza a leitura privativa, protegendo o sigilo profissional;
de aspectos emocionais do paciente pode envolver mais uma
necessidade do profissional do que uma real demanda do pacien- • O tempo de que dispõe o psicólogo para a avaliação;
te. Por exemplo: a enfermeira pede ao psicólogo uma avaliação • O local (enfermarias coletivas ou leitos individuais);
porque o paciente está choroso ou porque o familiar/cuidador do
• A condição física do paciente (sentado, deitado, imobili-
paciente é muito questionador.
zado, com dor, com febre, conectado a equipamentos);
Nem sempre a queixa da equipe será a queixa ou demanda do
• Os horários de procedimentos, coletas de exames e me-
paciente. Nesse caso, o paciente pode ficar choroso como forma
dicações do paciente ou quaisquer outras possíveis inter-
de expressão daquilo que o acomete, o que compõe um processo
rupções

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E INTERVENÇÃO FRENTE AO ADOECIMENTO

Protocolos de avaliação
Quadro 1. Diretrizes para construção do protocolo de avaliação psicológica
Comumente, os serviços de Psicologia Hospitalar organizam o
processo de avaliação psicológica em formato de protocolos ou 1) Dados de identificação do paciente

roteiros, o que garante a fidedignidade dos registros de dados em 2) Clínica que encaminhou o paciente e motivo(s) para o encaminhamento
prontuário médico ou prontuário psicológico. A implantação de 3) Quadro clínico
protocolos para uma determinada clientela – como pacientes de
4) Queixa do paciente
cirurgia bariátrica ou aqueles em avaliação para transplante, entre
outros – pode ser um meio eficaz na sistematização dos dados 5) Histórico de doenças e tratamentos

coletados durante as avaliações realizadas. 6) Repercussões emocionais

Os protocolos podem atender a diferentes propósitos além 7) Grau de informações a respeito da doença e tratamento
da avaliação clínica pelo psicólogo. Por exemplo, o uso de
8) Antecedentes psiquiátricos
formulários padronizados pela psicologia pode facilitar a
identificação no prontuário médico, pois podem ser apresentados 9) História pessoal

em cores diferentes, no caso de prontuários físicos. Além 10) História familiar


disso, os protocolos auxiliam na formulação de indicadores 11) Rede de apoio familiar
assistenciais, caracterização e perfil da população atendida
12) Compreensão psicodinâmica (conflitos, defesas, recursos emocionais e cognitivos)
e dados de pesquisa científica, que veiculam e valorizam a
produtividade do serviço de psicologia na instituição. 13) Hipótese diagnóstica

14) Grau de motivação para mudanças e para o ingresso em psicoterapia, se houver indicação

DICA 15) Condutas

Não há um modelo ou forma de construção de protocolos 16) Resumo de discussões com a equipe

que prevaleça. É necessário que o profissional considere 17) Caso siga em acompanhamento psicológico: resumo das evoluções do caso
as características da instituição e as rotinas de trabalho
18) Alta/ecaminhamentos/abandono etc.
para se adequar às suas necessidades e às dos pacientes/
familiares. Mas, é interessante que conste no protocolo de Teste e escalas utilizados: (resultado ou síntese)
avaliação uma ordenação para registro das informações,
independentemente da dinâmica adotada pelo profissional
para a avaliação.

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Como escolher os testes


adequados para avaliação
psicológica hospitalar?
O resultado de testes e/ou escalas como instrumentos
de investigação, tanto objetiva quanto subjetiva, evidencia
para a equipe de saúde informações importantes acerca
da dinâmica e estrutura de personalidade do paciente. O
psicólogo, estrategicamente, abre caminhos para a discussão
e o reconhecimento das variáveis psicológicas próprias
do binômio saúde-doença, que se sobrepõem durante o
tratamento, a hospitalização e o relacionamento do paciente
com a equipe de saúde. Por isso, é importante analisar bem o
propósito de cada avaliação que você irá conduzir.
A escolha do teste deve seguir alguns critérios para não expor
o paciente.
O principal é o Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos
– SATEPSI (CFP; CONSELHOS REGIONAIS DE PSICOLOGIA,
2004), disponível no site do Conselho Federal de Psicologia.
O SATEPSI foi desenvolvido para avaliar a qualidade técnico-
científica de instrumentos psicológicos para uso profissional.
A Resolução CFP nº 009/2018 estabeleceu as diretrizes para a
realização de avaliação psicológica no exercício profissional do
psicólogo e regulamentou o SATEPSI, assim como estabeleceu
os requisitos mínimos e os instrumentos que devem
apresentar para serem reconhecidos como testes psicológicos
(testes de inteligência, de funções cognitivas, psicomotores,
neuropsicológicos, projetivos de personalidade, escalas de
rastreio para sintomas de ansiedade, depressão, inventários,
entre outros).

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PSICOLOGIA HOSPITALAR: ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO
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CONCLUSÃO
Neste e-book sobre Psicologia Hospitalar, exploramos médicas. Essa avaliação não apenas contribui para a saúde
profundamente os temas essenciais que permeiam esse mental dos pacientes, mas também para a eficácia geral do
campo multidisciplinar e crucial da psicologia. Ao longo tratamento médico.
das páginas, mergulhamos na compreensão do impacto do Em resumo, a Psicologia Hospitalar é um campo que
adoecimento na vida dos pacientes e nas estratégias que os abraça a complexidade do ser humano em sua totalidade,
psicólogos hospitalares empregam para promover o bem- reconhecendo que a saúde física e a saúde mental estão
estar emocional e mental durante essa jornada desafiadora. intrinsecamente interligadas. Os psicólogos hospitalares
Discutimos o papel da família no contexto hospitalar, desempenham um papel crucial na promoção do bem-estar
reconhecendo a importância de seu suporte e o impacto que e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes e suas
as doenças podem ter em suas próprias vidas. Aprendemos famílias.
como os psicólogos hospitalares trabalham em estreita Este e-book é apenas o começo de sua jornada na
colaboração com pacientes e familiares para ajudá-los compreensão desse campo em constante evolução, e
a navegar pelos momentos difíceis e fortalecer os laços esperamos que ele tenha fornecido uma base sólida para a
familiares em meio às adversidades. exploração e aprofundamento futuro. Lembre-se de que, no
A adesão e o engajamento do paciente emergiram como coração da psicologia hospitalar, está o cuidado, a empatia
tópicos cruciais, mostrando como a Psicologia Hospitalar e o compromisso com a melhoria do cuidado de saúde para
desempenha um papel vital na promoção da colaboração todos.
paciente-profissional e na maximização dos resultados de Lembre-se de que, no coração da Psicologia Hospitalar, está
tratamento. Através de estratégias de comunicação eficazes, o cuidado, a empatia e o compromisso com a melhoria do
apoio emocional e educação, os psicólogos hospitalares cuidado de saúde para todos.
capacitam os pacientes a serem parceiros ativos em seu
próprio cuidado.
Exploramos também a importância da avaliação psicológica Sucesso em sua jornada!
no ambiente hospitalar, revelando como essa prática é
fundamental para identificar e tratar questões emocionais
e mentais que podem surgir em decorrência de condições

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BIBLIOGRAFIA

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Este e-book faz parte do conteúdo da Pós-graduação em COORDENAÇÃO DO CURSO


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