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Faculdade de Letras
Disciplina: Romance Brasileiro
Docente: Michael Silva
Discente: Nathália Mendes Silva
Matrícula: 201906530
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A fortuna crítica mencionada nesse trabalho está reunida na 119ª edição de O Quinze, impressa
em 2023 pela editora José Olympio.
cidade e um vaqueiro que vivem uma tensão romântica não resolvida. Os dois, juntos, são
padrinhos do filho de um dos funcionários da fazenda onde Vicente vive com a família,
que é Josias. Chico Bento, junto à sua esposa Cordulina e agregados, são dispensados da
fazenda junto com o gado quando os patrões percebem que a criação não iria resistir à
seca, e a família de trabalhadores se tornariam dispensáveis. Neste momento, eles decidem
partir de Quixadá, onde trabalhavam perto de Vicente, e migrar para a cidade, onde
Conceição era voluntária no “campo de concentração” de centenas de outros retirantes que
tomaram a mesma decisão.
A narração da dispensa dos trabalhadores junto às vacas e bois demonstra, de certa
forma, como eles eram vistos por seus empregadores e pessoas de hierarquias mais altas.
São colocados no mesmo nível que os animais da fazenda, e, se eles morrerão de fome e
sede, aqueles que os tratam e recebem por isso se tornam dispensáveis, mesmo que seja
para igualmente morrer de fome e sede da porteira para fora junto à criação. À medida em
que os animais na estrada vão emagrecendo, como a fraca burra que carregava as poucas
coisas da família de Chico Bento, as pessoas também começam a perder sua vitalidade. No
meio da estrada, eles encontram até mesmo homens preparando uma novilha morta
apodrecida pela doença para que sirva de alimento antes da chegada de urubus, e Chico
Bento, enojado, compartilha com os famintos com o que sobrava na miséria de seu grupo,
que repartiam tacos de rapadura e carne salgada.
– Por isso, não! Aí nas cargas eu tenho um resto de criação
salgada que dá para nós. Rebolem essa porqueira pros
urubus, que já é deles! Eu vou lá deixar um cristão comer
bicho podre de mal, tendo um bocado no meu surrão!
(p.49)
Aqui, o ambiente pode ser alvo de reflexão das diversas situações que atravessam a
narrativa. Em O Quinze, a complexidade das relações humanas são desveladas diante da
seca, contando com riqueza de detalhes da realidade sertaneja da época expressas através
da linguagem. Rachel de Queiroz entregou à literatura regionalista e nacional uma obra
inestimável que se trata da tribulação e resiliência de um povo que não lhes restaram
muitas opções a não ser se adaptar ao trauma, adversidade e dificuldades, criando seu
ambiente. Essa reflexão final encerra a elaboração de todos os personagens que, mesmo
pertencentes à mesma comunidade, são de histórias e níveis sociais diferentes, mas todos
se recriando diante da complexidade de suas relações e afazeres.
Em conclusão, o romance de Rachel de Queiroz, através de uma prosa envolvente e
crua, nos traz a trama de uma comunidade cearense que enfrenta a devastadora seca de
1915, cujas vidas dos personagens são definidas a partir daí pelas condições dispostas a
eles diante de suas posições sociais. A complexidade de suas relações são guiadas ao longo
da narrativa abordando o amor, a perda, a sobrevivência e as decisões – todos guiando-os
por um caminho de resiliência, característica que, desde então, é marcante ao pensar na
identidade social do sertanejo nordestino.
Referências
Baudelaire, Charles. O Pintor da Vida Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Queiroz, Rachel de. O Quinze. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 2023.