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DIDÁTICA

autor do original
LETICIA FONSECA R. F. DE CASTRO

1ª edição
SESES
rio de janeiro 2015
Conselho editorial magda maria ventura gomes da silva, lucia ferreira sasse, marília
gomes godinho

Autor do original leticia fonseca r. f. de castro

Projeto editorial gladis linhares

Coordenação de produção rodrigo azevedo de oliveira

Projeto gráfico paulo vitor bastos

Revisão linguística aderbal torres bezerra

Imagem de capa shutterstock

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2015.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

C355d Castro, Leticia Fonseca R. F. de


Didática / Leticia Fonseca R. F. de Castro.
Rio de Janeiro : SESES, 2015.
120 p. : il.

ISBN 978-85-5548-059-1

1. História da didática. 2. Tendências pedagógicas.


3. Planejamento. 4. Práticas pedagógicas. I. SESES.
II. Estácio.
CDD 371.3

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário

Prefácio 7

1. Didática: evolução histórica e pensamentos


pedagógicos 10

O que é didática? O que a didática estuda? 10


Desenvolvimento histórico da Didática: principais teóricos e evolução
das ideias pedagógicas 12
Da Didática Instrumental para Didática Fundamental 21
Didática Inter/Multicultural 23

2. Tendências pedagógicas e ações educativas 32

As tendências pedagógicas na educação escolar no Brasil: aspectos


e perspectivas de ensino e aprendizagem 33
O ensino e a aprendizagem escolar: a abordagem Sócio-Interacionista
de Vygotsky e suas contribuições para a educação 42

3. Desigualdades na escola - A Didática e algumas


possibilidades para a democratização do ensino 51

Desigualdades na escola – a Didática e algumas possibilidades para


a democratização do ensino 51
O trabalho docente no contexto das desigualdades: algumas
considerações 55
Sala de aula: componentes indispensáveis ao processo didático 60

4. A didática na formação de professores - repensando


o processo de ensino e aprendizagem 70

A didática e o processo ensino-aprendizagem: pontuações necessárias


à formação de professores 71
A formação de professores inicial e continuada – o professor reflexivo 72
O processo de ensino e aprendizagem e as metodologias de ensino:
estruturando o processo 80
Recursos didático-metodológicos para a efetivação do processo de
ensino e aprendizagem 83

5. Planejamento do trabalhao pedagógico 102

Planejamento: definição e relevância no trabalho pedagógico 102


Planejamento educacional: tipos e especificidades 103
Organização curricular: planejando o currículo 106
Prefácio
A disciplina de Didática tem como propósito central apresentar e analisar
um conjunto de conhecimentos específicos dessa área de estudos. Apresenta-
mos o desenvolvimento histórico da Didática, evidenciando os principais teó-
ricos e a evolução das ideias pedagógicas e o conceito de Didática e os estudos
por ela desenvolvidos. Também, discorremos sobre a evolução das principais
tendências pedagógicas no Brasil, focalizando seus aspectos educacionais e de
aprendizagem, bem como algumas considerações em relação às ações desen-
volvidas pelos professores. Tecemos, também, algumas considerações sobre o
trabalho docente no contexto das desigualdades, a formação de professores na
atualidade, o planejamento educacional e a importância das metodologias de
ensino para o processo ensino-aprendizagem.
Assim, esperamos que as temáticas aqui desenvolvidas possam auxiliálos a
organizar o trabalho didático de forma crítica e reflexiva, atendendo às perspec-
tivas atuais da educação.
Em cada capítulo vocês poderão entrar em contato com especificidadese
importantes pontos que envolvem o processo de ensino e de aprendizagem,de
modo a articular as teorias que embasam a prática didática de forma reflexiva
e crítica.

7
1
Didática: evolução
histórica e
pensamentos
pedagógicos
1 Didática: evolução histórica e pensamentos
pedagógicos

Nesse primeiro capítulo, vamos estudar o desenvolvimento histórico da Di-


dática, evidenciando os principais teóricos e a evolução das ideias pedagógicas,
e o conceito de Didática e os estudos por ela desenvolvidos. Também, apresen-
taremos propostas de revisão da Didática: da Didática instrumental para a Di-
dática fundamental.

OBJETIVOS
A finalidade é que você possa conhecer o surgimento e o desenvolvimento histórico da Didá-
tica e seus principais teóricos, bem como descrever e analisar os pensamentos pedagógicos
de cada dos teóricos apresentados, destacando suas influências no trabalho docente na
atualidade. Você deverá, também, conceituar a Didática e descrever seu objeto de estudo e,
ainda, apresentar e evidenciar as características da proposta da Didática Fundamental e
compreender os conceitos que envolvem a proposta da Didática Multi-Intercultural.

REFLEXÃO
Você se lembra de como seus professores lhe ensinavam as lições? Que pensamentos per-
meavam o trabalho docente de seus professores? É importante pensar nisso para que pos-
samos compreender o desenvolvimento histórico da Didática, seu campo de estudo e até
mesmo analisar sua influência no pensamento e na realização do trabalho docente ao longo
do processo de escolarização, inclusive nos dias atuais.

1.1 O que é didática? O que a didática estuda?

A palavra Didática deriva da expressão grega (didaktiké), que se traduz como


arte ou técnica de ensinar. Durante muito tempo, seu conceito ficou restrito
ao ato de ensinar, mas, nos dias de hoje, os estudos dessa área interligam o ato
de ensinar ao ato de aprender, ou seja, preocupam-se em desenvolver teorias e
práticas, buscando subsidiar e orientar a atuação dos professores para a eficá-

10 • capítulo 1
cia do processo de ensino e de aprendizagem.

A Didática é o estudo do processo de ensino e aprendizagem e, nesse sentido, ela


enfatiza a relação professor-aluno (HAYDT, 2006, p 13).

A partir da trajetória de surgimento da Didática, é possível perceber que sua


temática central se traduziu (e se traduz) em torno de estudos, discussões e
análises para nortear e/ou instrumentalizar o processo de ensino-aprendiza-
gem em que estão envolvidos aluno e professor (ALVITE apud DAMIS, 2007). As
preocupações centravam-se (e centram-se), ainda, no estudo de um conjunto
de normas, recursos e procedimentos que deveriam informar e orientar o tra-
balho docente.
Nessa trajetória de evolução, é possível observar que, além da produção de
conhecimentos sobre o ato de ensinar, a escola se organizou e se legitimou
como uma instituição social. Nesse contexto, foram identificadas relações
entre as práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores e a finalidade
social da escola. Então, como reflexão sistemática (aquela que estuda as teo-
rias de ensino e aprendizagem e seus resultados), a Didática, segundo Masetto
(1997, p. 13) vai pensar e refletir sobre questões relacionadas à escola e à sala da
aula, dentre as quais, destacamos:
• Como a criança e o adolescente aprendem?
• Como é a atividade do professor em aula?
• Como o professor ajuda os alunos a aprender?
• Como organizar o currículo de uma escola?
• Como desenvolver a capacitação dos professores?
• Como motivar os alunos?
• Como fazer o processo de avaliação?

Tendo pensado e refletido sobre o processo ensino-aprendizagem que


acontece na escola e na sala de aula, na atualidade, a Didática é reconhecida
como um campo de estudo que se dedica a compreender as práticas pedagó-
gicas, bem como a buscar alternativas e caminhos para que a aprendizagem se
realize de forma ativa e significativa. Também investiga as condições materiais
e sociais que permeiam as relações entre a docência e a aprendizagem e, ainda,
se preocupa em conhecer e estudar as teorias da educação, as quais norteiam
as diretrizes da atividade profissional dos professores (LIBÂNEO, 1994). Ainda

capítulo 1 • 11
conforme o autor:

[...] a ela cabe converter objetivos sociopolíticos e pedagógi-


cos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos e métodos
em função desses objetivos, estabelecer os vínculos entre o
ensino e aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento
das capacidades mentais dos alunos (LIBÂNEO, 1994, p. 26).

Nesse sentido, é importante que o professor organize o processo de ensino


-aprendizagem a partir da concepção atualizada de Didática – a compreensão
de que ensinar e aprender são processos que caminham juntos, pois têm como
princípio básico uma dinâmica de ações pedagógicas que visa às atividades dos
alunos e não à passividade.

1.2 Desenvolvimento histórico da Didática: principais teóricos e


evolução das ideias pedagógicas

Estudos realizados por Haydt (2006) e Libâneo (1994-2002) revelam que a


história da Didática está relacionada ao aparecimento do ensino – no decorrer
do desenvolvimento da sociedade, da produção e das Ciências – como uma ati-
vidade planejada e intencional, destinada à instrução.
Desde os primeiros tempos existem indícios de formas elementares de
instrução e aprendizagem, porém não como forma organizada de ensino, por
exemplo, nas comunidades primitivas a aprendizagem acontecia a partir da
convivência diária entre as pessoas, bem como das diferentes situações e ativi-
dades vivenciadas umas com as outras. Na realização dessas atividades, o saber
era transmitido de maneira informal, ou seja, ainda existia não o caráter “didá-
tico”, o ensino formal (LIBÂNEO, 1994).
Na chamada Antiguidade Clássica (gregos e romanos) e no período medie-
val, também se desenvolveram formas de ação pedagógica em escolas, mos-
teiros, igrejas, universidades. Entretanto, até meados do século XVII, não po-
demos falar de Didática como teoria do ensino que sistematiza o pensamento
didático e o estudo científico das formas de ensinar.
O termo “Didática” teve origem quando os adultos começaram a intervir,
de forma organizada e planejada, na atividade de aprendizagem de crianças e
jovens, por meio do agrupamento dos conhecimentos pedagógicos e da atribui-

12 • capítulo 1
ção da atividade de ensinar com intenção pedagógica. “A escola se torna uma
instituição, o processo de ensino passa a ser sistematizado conforme níveis,
tendo em vista a adequação às possibilidades das crianças, às idades e ritmo de
assimilação dos estudos” (LIBÂNEO, 1994, p. 58).
Foi no século XVII que a Didática emergiu formalmente como uma área de
conhecimento que visa à investigação da ligação entre ensino e aprendizagem.
Nesse século, João Amós Comênio (1592-1670) escreveu a primeira obra clássi-
ca sobre Didática1, A Didática Magna, a qual é uma de suas obras mais expres-
sivas.
Suas ideias foram formuladas em uma época em que surgiram novidades
no campo da Filosofia e das Ciências e grandes transformações nastécnicas de
produção se iniciaram. Nesse contexto, Comênio desenvolveu ideias avançadas
para a prática educativa nas escolas, opondo-se às ideias conservadoras da no-
breza e do clero.
Na sua obra A Didática Magna, Comênio propõe a reforma da escola na bus-
ca pelo ensino, pela aprendizagem e por um método para preparar o indivíduo
para a cidadania, partindo da vida religiosa-comunitária, fundamentado nas
leis e estruturas da natureza. Assim, na abertura desta obra revela como propó-
sito que:

a proa e a popa da nossa Didática sejam: buscar e encontrar


um método para que os docentes ensinem menos e os dis-
centes aprendam mais; que nas escolas, haja menos con-
versa, menos enfado e trabalhos inúteis, mais tempo livre,
mais alegria e mais proveito; na república cristã, haja menos
trevas, menos confusão, menos dissídios e mais luz, mais
ordem, mais paz e mais tranquilidade (COMENIUS, 1997,
p.13).

É possível observar que, nesse trecho, o autor, ao expor uma proposta para
a Didática, registra, ao mesmo tempo, uma crítica em relação aos métodos de
ensinar, denunciando uma escola pouco ativa, pouco instrutiva e cansativa, já
que o professor estava no centro e os alunos eram meros espectadores. Ainda
da obra (A Didática Magna), recortamos um trecho em que justifica a necessida-

1 Didática da vida, por isso chamada magna.

capítulo 1 • 13
de de escolarização aos seres humanos, ao dizer que:

[...] como tanto homens quanto as questões humanas se mul-


tiplicaram, raros são os pais que sabem ou podem educar os
filhos e que têm tempo suficiente para isso: infelizmente, já
há tempos firmou-se o hábito de confiar muitos filhos em
conjunto a pessoas escolhidas para instruí-los, pessoas emi-
nentes pela cultura e pela austeridade dos costumes. Esses
educadores são chamados de preceptores, pedagogos, mes-
tres e professores: os locais destinados a esse ensino comum
são chamados escola, institutos, auditórios, colégios, giná-
sios, academias etc (COMENIUS, 1997, p.84).

Comênio (apud LIBÂNEO, 1994) foi o primeiro educador a formular a ideia


de que os conhecimentos deveriam ser difundidos a todos, a criar princípios
e regras do ensino. Ao lutar para que a educação fosse direito de todos, reve-
lou sua indignação em relação ao sistema educacional de sua época, no qual a
educação era discriminatória e privilégio de poucos. Outro aspecto que merece
destaque na Didática defendida por Comênio é a proposta de uma educação de
uso prático e contextualizada, na qual o homem deixa de ser mero espectador.
A Didática se fundamentou nos seguintes princípios:

A finalidade da educação é conduzir o ser humano à felici-


dade eterna com Deus, pois é uma força poderosa de rege-
neração da vida humana. Todos os homens merecem a sabe-
doria, a moralidade e a religião. Objetivando a aproximação
do homem a Deus, seu objetivo central é tornar os homens
bons cristãos – sábios no pensamento, dotados de fé, capa-
zes de praticar ações virtuosas. Assim, a educação é direito
de todos.

O homem deve ser educado de acordo com seu desenvolvi-


mento natural, isto é, de acordo com as características de
idade e de capacidade para o conhecimento. Conseqüente-
mente, a principal tarefa da Didática é estudar essas caracte-
rísticas e os métodos de ensino correspondentes, de acordo

14 • capítulo 1
com a ordem natural das coisas. Salientava a importância da
educação formal nas crianças pequenas e preconizou a cria-
ção de escolas maternais, pois essas teriam, desde cedo, a
oportunidade de adquirir as noções elementares do que de-
veria ser aprofundado mais tarde.

Os conhecimentos devem ser adquiridos e assimilados pelos


alunos a partir da observação das coisas e dos fenômenos,
utilizando e desenvolvendo sistematicamente os órgãos dos
sentidos. A educação deveria começar pelos sentidos, pois as
experiências sensoriais obtidas por meio dos objetos seriam
internalizadas e, mais tarde, interpretadas pela razão.

O método intuitivo, que consiste na observação direta, pelos


órgãos dos sentidos, das coisas, para o registro das impres-
sões na mente do aluno, deve ser valorizado como uma for-
ma mais adequada para se atingir o conhecimento generali-
zado (LIBÂNEO, 1994).

Comênio defende também, na sua obra, A Didática Magna, que o professor,


ao ensinar sobre um assunto, deveria preencher as seguintes etapas:
1. Apresentar o objeto ou ideia diretamente, fazendo demonstração, pois
o aluno aprende através dos sentidos, principalmente vendo e tocando.
2. Mostrar a utilidade específica do conhecimento transmitido e a sua
aplicação na vida diária.
3. Fazer referência à natureza e [à] origem dos fenômenos estudados, isto
é, às suas causas.
4. Explicar primeiramente os princípios gerais e só depois os detalhes.
5. Passar para o assunto ou tópico seguinte do conteúdo apenas quando
o aluno tiver compreendido o anterior (COMÊNIO apud HAYDT, 2006,
p.17).
As ideias apresentadas e defendidas por Comênio impulsionaram o surgi-
mento de uma teoria do ensino, influenciando diretamente o trabalho docente,
mas, mesmo assim, Comênio não conseguiu retirar algumas crenças usuais da
época, sobre o ensino, pois, mesmo partilhando um ensino a partir da obser-
vação e da experiência sensorial, manteve seu caráter transmissor; e, apesar de

capítulo 1 • 15
defender a adaptação do ensino às fases do desenvolvimento infantil, conser-
vou, ao mesmo tempo, um método único e o ensino simultâneo a todos.
Verificamos que são inegáveis as contribuições e influências de Comênio no
processo de ensino, já que formulou ideias e propostas inovadoras para a sua
época. Entretanto, sabemos que, na história, as ideias, principalmente quando
são muito inovadoras para a época, geralmente demoram a ter efeito prático.
Por isso, as ideias de Comênio só começa ram a vigorar depois do século XVII,
após modificações no modelo da sociedade. Assim, tanto no século XVII como
nos séculos seguintes, ainda predominavam práticas escolares da Idade Média,
tais como: “ensino intelectualista, verbalista e dogmático, memorização e re-
petição mecânica dos ensinamentos dos professores” (LIBÂNEO, 1994, p. 59).
Enquanto isso, mudanças intensas nas formas de produção da sociedade
foram ocorrendo, resultando em grande desenvolvimento da ciência e da cultu-
ra. Foi diminuindo o poder do clero e da nobreza, aumentando o da burguesia,
que se fortaleceu como classe social. Logo, foi crescendo também a necessida-
de de um ensino ligado às exigências do mundo da produção e dos negócios e,
ao mesmo tempo, um ensino que contemplasse o livre desenvolvimento das
capacidades e interesses individuais.
Assim, demarcamos outro grande nome da Didática: Jean Jacques Rousse-
au (1712- 1778), filósofo iluminista, considerado um dos principais pensadores
franceses do século XVIII, que, procurando atender aos anseios da época, pro-
pôs uma nova concepção de ensino, a qual se fundamentava diretamente nas
necessidades e nos interesses da criança. Suas ideias mais importantes eviden-
ciam justamente que o processo de ensino, sendo determinado pelos interes-
ses e pelas necessidades imediatas do aluno, deve ser organizado e desenvolvi-
do a partir de tais determinações.
Vejamos, então, as principais ideias de Rousseau (apud LIBÂNEO, 1994, p.
60):
1. A preparação da criança para a vida adulta deve basear-se no estudo das
coisas que correspondem às suas necessidades e interesses atuais. An-
tes de ensinar as ciências, elas precisam ser levadas a despertar o gosto
pelo estudo. Os verdadeiros professores são a natureza, a experiência
e o sentimento. O contato da criança com o mundo que a rodeia é que
desperta o interesse e suas potencialidades naturais.
2. A Educação é um processo natural, ela se fundamenta no desenvolvi-

16 • capítulo 1
mento interno do aluno. As crianças são boas por natureza; elas têm
uma tendência natural para se desenvolver.
Estudos revelam que Rousseau não colocou suas ideias em prática e nem
elaborou uma teoria de ensino. Essa tarefa foi realizada por outro grande nome
da Didática, o pedagogo João Henrique Pestalozzi (1746-1827), que trabalhou
na educação de crianças pobres, em instituições que ele próprio dirigiu. Atri-
buía grande importância ao ensino como meio de educação e desenvolvimento
das capacidades humanas, cultivando o sentimento, a mente e o caráter.
Para Pestalozzi (apud LIBÂNEO, 1994, p. 60), a educação escolar, sendo de-
senvolvida a partir do método intuitivo, poderia conduzir os alunos a desenvol-
ver “o senso de observação, análise dos objetos e fenômenos da natureza e a
capacidade de linguagem, através da qual se expressa em palavras o resultado
das observações”.
A educação era entendida por Pestalozzi como um instrumento de reforma
social, ou seja, uma possibilidade que poderia mudar as condições precárias
de vida do povo. Defendeu a democratização da educação e o acesso à educa-
ção escolar para todas as crianças, independentemente de sua condição social
(HAYDT, 2006).
O método de ensino elaborado por Pestalozzi (apud HAYDT, 2006, p. 19)
trouxe à educação intelectual vários aspectos inovadores: “o emprego do cálcu-
lo mental, o uso de técnicas e fonéticas na linguagem e o estudo da Geografia e
das ciências feito em contato direto com o ambiente natural”.
Os princípios educacionais formulados por Pestalozzi (apud HAYDT, 2006)
podem ser resumidos nos seguintes tópicos:
• O estabelecimento de uma relação de amor e respeito mútuos entre
professor e aluno.
• O professor deve respeitar a individualidade do aluno.
• A finalidade da educação é favorecer o desenvolvimento físico, intelec-
tual e moral.
• O objetivo do ensino não é a exposição dogmática2 e a memorização,
mas sim o desenvolvimento das capacidades intelectuais do aluno.
• A instrução escolar deve favorecer tanto o desenvolvimento físico como

2 Importante esclarecer o sentido da palavra dogmático. De acordo com o Dicionário Houaiss (2008, p. 260), a
palavra dogmático, significa: “que apresenta opiniões de modo convicto, não admitindo contradições e discussão”.
Logo, Pestalozzi, ao formular os propósitos para educação, retira da prática pedagógica do professor a exposição
dogmática, ou seja, aquela em que o conhecimento era apresentado como uma verdade totalmente certa e
inquestionável.

capítulo 1 • 17
o intelectual.
• A aprendizagem escolar não deve corresponder apenas à aquisição de
conhecimentos, mas principalmente ao desenvolvimento de habilida-
des e ao domínio de técnicas.
• O método de instrução deve ter por base a observação ou percepção sen-
sorial e começar pelos elementos mais simples.
• O ensino deve seguir a ordem psicológica e respeitar o desenvolvimento
infantil.
• O professor deve desenvolver cada tópico do conteúdo de tal forma gra-
dual, considerando que a aquisição dos conhecimentos se dá forma
gradativa.

Esses princípios foram formulados no final do século XVIII e tiveram início


no século XIX, influenciando o pensamento educacional.
Na sequência, encontramos Johann Friedrich Herbart (1776-1841), peda-
gogo alemão que também exerceu grande influência na didática e na prática
docente. Hebart (apud HAYDT, 2006) atribuía grande importância à educação,
considerando-a como fator determinante no desenvolvimento do intelecto e do
caráter. Destacou a educação como responsável pela formação das representa-
ções e pela forma como essas representações são combinadas nos mais elabo-
rados processos mentais.
Para Hebart (apud LIBÂNEO, 1994), a atividade educativa deve orientar o ho-
mem para querer bem, possibilitando que aprenda a comandar a si próprio. O
método de ensino do professor tem a função de introduzir ideias corretas na
mente dos alunos e de provocar-lhes a acumulação de ideias. Tentou formular
um método único de ensino, com base nos parâmetros das leis psicológicas do
conhecimento. Assim, determinou quatro passos didáticos que deveriam ser
rigorosamente seguidos pelo professor:
• A preparação e a apresentação da matéria de forma clara e completa, às
quais denominou clareza.
• A associação entre as ideias antigas e as novas.
• A sistematização dos conhecimentos, tendo em vista a generalização.
A aplicação do uso dos conhecimentos adquiridos por meio de exercícios,
denominado de método.
Podemos dizer que o sistema pedagógico de Hebart auxiliou na organização
da prática docente, trazendo alguns esclarecimentos importantes, tais como: a

18 • capítulo 1
necessidade de estruturação e ordenação do processo de ensino, a exigência de
entendimento dos assuntos estudados e não apenas a memorização. Mesmo
assim, o ensino não deixava de ser entendido como repasse de ideias do profes-
sor para a cabeça do aluno, que deveria entender o que o professor transmitia,
mas apenas com a finalidade de reproduzir a matéria transmitida. Com isso, a
aprendizagem torna-se mecânica, automática, desprovida de mobilização da
atividade mental, ou seja, da reflexão e do pensamento independente e criativo
dos alunos (LIBÂNEO, 1994).
As ideias pedagógicas dos pensadores Comênio, Rousseau, Pestalozzi e
Herbart, bem como de outros pensadores que não mencionamos, formam as
bases do pensamento pedagógico europeu, disseminando-se posteriormente
por todo o mundo e definindo as concepções pedagógicas, que na atualidade
são conhecidas como Pedagogia Tradicional e Pedagogia Renovada (assunto de
que trataremos no próximo capítulo).
Após Hebart, entre o século XIX e a primeira metade do século XX, traze-
mos John Dewey (1859-1952), que se opôs à concepção defendida por Hebart
– a educação para a instrução –, defendendo a educação pela ação. Para ele, “o
homem é um ser eminentemente social. Assim sendo, são as necessidades so-
ciais que norteiam sua concepção de vida e educação” (HAYDT, 2006, p. 21-22).
O conceito central de seus pressupostos é a experiência, a qual, para ele, é
o que impulsiona e dirige o conhecimento. Então, a escola não é a preparação
para a vida, é a própria vida. Por isso, deve direcionar o ensino para o cresci-
mento da criança, possibilitando o significado do que é aprendido, bem como
o desenvolvimento de habilidades para suprir as necessidades atuais da vida
individual e social do aluno.
O professor deverá criar situações estimuladoras para instigar, nos alunos,
reações e respostas que garantam a formação de atitudes intelectuais e senti-
mentais adequadas. Para isso, o ensino deve ser desenvolvido pelo professor,
a partir de centros de interesses diretos e práticas com significação para a vida
do aluno (DEWEY apud DAMIS, 2007). Nessa perspectiva, é um grande defensor
dos métodos de ensino ativos.

capítulo 1 • 19
ATENÇÃO
Métodos de ensino ativos são aqueles que permitem a participação efetiva dos alunos no pro-
cesso ensino-aprendizagem, propiciando-lhes a construção de novos significados.

A pedagogia de Dewey trouxe aspectos inovadores, diferenciando-se espe-


cialmente pela oposição à escola tradicional. Difundiu, em sua proposta, a ne-
cessidade de a escola criar condições e meios para estimular o pensamento e a
reflexão dos alunos, suscitando críticas sobre a função específica da escola na
educação formal do aluno para a vida social, mas não questiona a sociedade e
seus valores como estão propostos no seu tempo; sua teoria representa plena-
mente os ideais liberais, sem se contrapor aos valores burgueses, acabando por
reforçar a adaptação do aluno à sociedade.
É possível observar que a evolução dos pensamentos sobre a Didática se
fundamenta em pressupostos teóricos, bem como em ideias pedagógicas que
caminharam em direção à necessidade de se reverem os processos de ensino e
de aprendizagem. Tais pressupostos teóricos muito contribuíram para a orga-
nização do espaço escolar, bem como para a reforma dos métodos de ensino
e de sua aplicação, ao longo do desenvolvimento do ensino formal. Também
merece destaque o fato de que as ideias pedagógicas expostas pelos teóricos
aqui citados são fundamentadas por concepções diferentes, porém é possível
visualizar um aspecto comum mencionado por todos esses teóricos: a tentativa
de ampliar o ensino a uma parcela significativa da população, pois acreditavam
na educação popular.
Verificamos, ainda, que os estudos sobre Didática foram se fundamentan-
do em novos pressupostos, os quais deixaram de considerar apenas aspectos
filosóficos, passando a incorporar fundamentos da Psicologia, ciência que co-
meçou a vigorar no final do século XIX, contribuindo, assim, com novos pensa-
mentos pedagógicos, os quais influenciaram o surgimento de tendências peda-
gógicas sobre o processo de ensino e aprendizagem.

20 • capítulo 1
1.3 Da Didática Instrumental para Didática Fundamental

Desde 1980, estudos como os de Candau (1997, 2002) anunciam a neces-


sidade de a Didática assumir uma perspectiva crítica, visando à superação de
uma Didática exclusivamente instrumental. Antes de prosseguirmos, é impor-
tante responder à seguinte questão: O que é uma didática exclusivamente ins-
trumental?

A Didática, numa perspectiva instrumental, é concebida


como um conjunto de conhecimentos técnicos sobre o
“como fazer” pedagógico, conhecimentos estes apresenta-
dos de forma universal e, conseqüentemente, desvinculados
dos problemas relativos ao sentido e aos fins da educação,
dos conteúdos específicos, assim como do contexto socio-
cultural concreto em que foram gerados (CANDAU, 2002,
13-14).

Para a autora, nessa proposta (a Didática exclusivamente instrumental) o


processo de ensino-aprendizagem é desenvolvido a partir de uma visão redu-
cionista e neutra. Por isso, propõe a construção de uma Didática fundamental,
a qual deve assumir a multidimensionalidade do processo ensino-aprendiza-
gem e promover uma articulação entre as dimensões humana, técnica e políti-
co-social no centro de sua discussão (CANDAU, 2002).
Vejamos, então, o que significa cada uma das dimensões mencionadas pela
autora.
Na abordagem humanista: a didática tem como centro a dimensão huma-
na no processo ensino-aprendizagem, preocupando-se, pois, com a aquisição
de atitudes como empatia, calor humano, etc. Considera a relação interpessoal
como centro do processo ensino-aprendizagem.
Na abordagem técnica: o processo ensino-aprendizagem é uma ação inten-
cional e sistemática, portanto precisa ser organizado da melhor maneira pos-
sível, considerando os objetivos instrucionais, o conteúdo programático, as es-
tratégias de ensino, o sistema de avaliação. Há uma busca pela organização de
condições que favoreçam a aprendizagem.

capítulo 1 • 21
Em relação à dimensão político-social, a autora explica que tal dimensão
está intimamente relacionada à organização social, evidenciando que a dimen-
são político-social impregna toda prática pedagógica, pois todo processo en-
sino-aprendizagem “[...] acontece sempre numa cultura específica, trata com
pessoas concretas que têm uma posição de classe definida na organização so-
cial em que vivem”. Então, toda prática pedagógica possui em si mesma uma
dimensão político-social (CANDAU, 2002, p. 14).
A Didática fundamental deve analisar, ainda, a prática pedagógica e seus
determinantes, aprofundando algumas questões tais como: “a natureza do sa-
ber escolar, a relação escola e sociedade, a competência do professor e suas di-
mensões” (CANDAU, 1984 apud CANDAU, 2002, p.15). Também discute as dife-
rentes “abordagens metodológicas, explicitando seus pressupostos, o contexto
em que foram geradas, a visão de homem, de sociedade, de conhecimento e de
educação que veiculam” (CANDAU, 2002, p.16). Além disso, elabora a reflexão
didática a partir da análise de experiências concretas, procurando trabalhar
continuamente a relação teoria-prática.
Podemos dizer, então, que a Didática fundamental se preocupa com os se-
guintes elementos: “como realizar a prática pedagógica”; “para que realizar a
prática pedagógica”; “por que realizar a prática pedagógica”. Deve-se lembrar
que, para a Didática fundamental, esses três elementos só têm sentido quando
desenvolvidos de forma articulada, pois sua proposta não almeja apenas a me-
canização e a manipulação de métodos e técnicas.
Para finalizar, queremos destacar que, na Didática instrumental, a Didá-
tica é concebida como “um conjunto de procedimentos e técnicas que o pro-
fessor deve dominar para promover um ensino eficiente. É a operacionalidade
do processo que constitui a preocupação central”. Já a Didática fundamental é
concebida como “um saber de mediação e garante sua especificidade pela pre-
ocupação com a compreensão do processo ensino-aprendizagem e a busca de
intervenção na prática pedagógica, concebida como prática social, articulando
sempre o ‘fazer’ com o sentido ético e político de todo projeto educativo” (CAN-
DAU, 2003, p. 74).

CONEXÃO
Para aprofundar seus conhecimentos sobre a perspectiva multicultural, leia o artigo: “Conver-
sas com... Sobre a Didática e a perspectiva Multi/intercultural” (CANDAU, Vera Maria). Nesse
artigo, a autora focaliza como a perspectiva multi/intercultural está sendo incorporada pelos

22 • capítulo 1
profissionais do campo da Didática. Traz contribuições para a construção de uma Didática
crítica.
Esse artigo encontra-se disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v27n95/a08v2795.pdf

Em seus estudos mais recentes, a autora aponta um novo ressignificar no


campo da Didática: a perspectiva multi/intercultural.
Em síntese, observamos que houve (e ainda está havendo) necessidade de
ressignificar a Didática e tal necessidade emergiu da investigação do ensino
como prática social, presente nos contextos sociais e nas instituições nos quais
ocorre. Na atualidade, essa permanece em decorrência dos novos desafios im-
postos pela sociedade contemporânea, como, por exemplo, a inclusão de alu-
nos com necessidades educacionais especiais, as diversidades de gênero, de
raça, entre outros.

1.4 Didática Inter/Multicultural

A perspectiva do multi/interculturalismo, é uma expressão contemporâ-


nea para as demandas atuais e para as novas exigências de trabalho docente e
discente. Em contrapartida a esta concepção encontra-se nos espaços escola-
res, por vezes, uma prática ancorada em uma didática monocultural, utilizada
quando a escola ao invés de propagar o respeito à diversidade tenta incultir ao
aluno um olhar único e portanto monocultural.
Dentro de uma perspectiva multi/intercultural de didática pode-se afirmar
que um novo desafio adentra os espaços das instituições escolares, de modo
especial, para os professores em sua ação docente.
Segundo Candau (2002, p.51-52), “urge ampliar este enfoque e considerar a
educação intercultural como um princípio orientador, teórica e praticamente,
dos sistemas educacionais na sua globalidade (...) a desconexão entre a cultura
escolar e a cultura social de referência dos alunos e alunas tem sido ultimamen-
te denunciada por inúmeros autores e evidenciada por diversas pesquisas”.
Deste modo, a importância de se considerar a temática cultural para com-
preender uma exigência que a sociedade vem travando ao longo do tempo se
faz a cada dia mais necessária para que possamos compreender e responder
às questões que envolvem o direito à diferença e o direito à igualdade, além
da compreensão das múltiplas razões que circunscrevem as dificuldades que
muitos alunos encontram nas expectativas escolares.
Portanto, para inserção de uma nova concepção de didática, que visa uma

capítulo 1 • 23
perspectiva multi/intercultural, faz-se necessário buscar estratégias onde as
diferenças culturais possam coexistir de forma democrática no cotidiano das
instituições, de modo que as práticas pedagógicas possam ser repensadas e/ou
reinventadas, incorporando criticamente, a questão das diferenças culturais,
na pluralidade de suas manifestações e dimensões.

ATIVIDADE
1. Em qual contexto a Didática surgiu? Quais são os pressupostos evidenciados pelos
grandes teóricos da Didática em relação ao processo de ensino e aprendizagem?
2. Qual(is) é(são) a(s) contribuição(ões) da Didática para o trabalho docente?
3. Leia a citação a seguir e a partir dela reflita sobre o tema: “um professor que tem didáti-
ca”. Em seguida, escreva um texto (no máximo 20 linhas) caracterizando esse professor.

Através do ensino criam-se as condições para a assimilação cons-


ciente e sólida de conhecimentos, habilidades e atitudes e, nesse pro-
cesso, os alunos formam suas capacidades e habilidades intelectuais
para se tornarem, sempre mais, sujeitos da própria aprendizagem (LI-
BÂNEO, 1994, p. 128).

4. Quais são as dimensões que integram a Didática fundamental? Comente cada uma
delas.

REFLEXÃO
O desenvolvimento histórico da Didática foi marcado por ideias pedagógicas de grandes
teóricos, os quais deixaram sua influência no pensamento didático até os dias atuais. Ob-
servamos a evolução dos pensamentos sobre a Didática, os quais se fundamentaram em
pressupostos teóricos, bem como em ideias pedagógicas que caminharam em direção à
necessidade de se reverem os processos de ensino e de aprendizagem. Tais pressupostos
teóricos muito contribuíram com a organização do espaço escolar, bem como com a reforma
dos métodos de ensino e de sua aplicação, ao longo do desenvolvimento do ensino formal.
Como vimos, na atualidade ainda observamos a necessidade de ressignificação da Didática
em decorrência dos novos desafios impostos pela sociedade contemporânea.

24 • capítulo 1
LEITURA RECOMENDADA
MASSETO, Marcos. Didática: a aula como centro. 4ª. edição. São Paulo: FTD, 1997.
Nesse livro, o autor apresenta informações e reflexões importantes sobre temas significati-
vos à educação tais como: buscando o significado da didática, a escola e o desenvolvimento
dos alunos, a sala de aula: espaço de vida?, o processo de ensino-aprendizagem, escola:
espaço de ‘inter-ações’, organização curricular da escola, planejamento: instrumento de ação
educativa, um plano e seus componentes, continuando a estrada.

CORDEIRO, Jaime. Didática. 1ª. Edição. Editora Contexto. São Paulo, 2007.
O autor aborda a didática de forma, clara e moderna. Conciso, agradável de ler e bem orga-
nizado, este livro é um cúmplice necessário e amistoso de professores e futuros professores.

Para aprofundar seus conhecimentos na temática desenvolvida nesse capítulo, leia o texto
abaixo: Crise na Educação: por quê? (Regina Célia Cazaux Haydt, thot, n. 22, p.45). Esse
trecho foi extraído na íntegra do site: http://eduol.uniceub.br/_temp/eduol.asp?id=EFE&-
sec=38.

LEITURA COMPLEMENTAR
Título: “As influências das raízes culturais no processo de ensino-aprendizagem”
Elisangela dos Santos Rodrigues
Resumo: A presente pesquisa aborda como tema principal as influências das raízes culturais
no processo de ensino-aprendizagem. Visto que cultura é um componente ativo na vida do
ser humano, e que não há indivíduo que não possua cultura, pelo contrário cada um é criador
e propagador da mesma, esta pesquisa busca em sua abordagem focalizar as diversas raízes
culturais que estão presentes em uma sala de aula, de ensino fundamental do município de
Espigão do Oeste. Ressalta também as dificuldades enfrentadas pelos professores ao lidar
com as manifestações culturais no ato de aprender, bem como os métodos que o educador
utiliza para contornar essas situações. Este estudo em um primeiro momento caracteriza-se
por uma pesquisa de cunho bibliográfico, onde a autora busca saber as mais diversas consi-
derações de autores que discutem a temática pesquisada. Para a concretização da pesquisa
se fará uso da pesquisa de campo quando serão entrevistados professores que convivem di-
retamente com essa realidade. A pesquisa de campo efetivar-se-á por meio de questionários

capítulo 1 • 25
e entrevistas, e os resultados obtidos serão analisados a partir do referencial teórico.
Palavras- chave: cultura, ensino-aprendizagem
Introdução:
O presente artigo está vinculado ao projeto interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão
do Departamento de Pedagogia- edição: 2006/2-2. O tema que se aborda na pesquisa é
a questão da diversidade cultural e suas influencias no processo de ensino-aprendizagem.
O reconhecimento da multiculturalidade da sociedade, leva a constatação da diversidade de
raízes culturais que fazem parte de um contexto educativo como uma sala de aula. Nesse
sentido, autores como Candau (2000;2002), Forquin (1993), entre outros autores, que en-
fatizam a relação existente entre escola e cultura, nos instiga a buscar uma melhor compre-
ensão acerca das influências das raízes culturais nas práticas pedagógicas.
Deste modo uma educação multicultural tem despertado uma série de discussões entre os
mais conceituados autores e pesquisadores. Que buscam questionar as incorporações de
pressupostos curriculares cooperativos para que assim o ambiente escolar seja um ambiente
favorável aos alunos de todos grupos sociais, étnicos e culturais.
A partir de um olhar situado em uma perspectiva intercultural crítica ,
que focaliza a valorização da diversidade cultural e a superação da equivocada dicotomia
entre educação e cultura, este estudo pretende discutir as seguintes questões: a compreen-
são das diversidades das raízes culturais que integram o ambiente escolar de uma das salas
de aula de uma das escolas de ensino fundamental do município de Espigão do Oeste-RO,
as dificuldades enfrentadas pelos professores em trabalhar a pluralidade das identidades
culturais dos educandos e as estratégias usadas por eles, em sala de aula, no processo de
ensino-aprendizagem.
Num primeiro momento o artigo fundamenta-se em uma pesquisa bibliográfica destinada a
focalizar as considerações sobre pluralidade cultural que antecede a investigação de campo
que está sendo realizada em uma escola de ensino fundamental que posteriormente forne-
cerá dados para formulação de uma compreensão do problema proposto.
A relação Cultura e Educação:
Cultura pode ser entendida como tudo que é produção humana, ou seja, é a maneira que
cada indivíduo possui de falar, vestir, comer, manifestar-se, etc; que por sua vez constituem
os elementos culturais que não são expressos apenas no consciente, mas no subconsciente
e inconsciente dos indivíduos. Candau (2003), afirma que cultura é um fenômeno plural,
multiforme que não é estático, mas que está em constante transformação, envolvendo um
processo de criar e recriar. É por sua vez um componente ativo na vida do ser humano e
manifesta-se nos atos mais corriqueiros da conduta do indivíduo e, não há indivíduo que não
possua cultura, pelo contrário cada um é criador e propagador de cultura.

26 • capítulo 1
Quando se trata educação e cultura pode dizer que estão relacionados e ligados organica-
mente, pois se partir do pressuposto de que educar é formar e socializar o indivíduo, ou se
ver a educação como maneira de dominação escolar, sempre essa educação será de alguém
para alguém, que para acontecer necessita da comunicação, transmissão e aquisição do
conteúdo da educação (crenças, valores, conhecimentos, hábitos, etc;). Afirma-se ainda que
o conteúdo educacional que faz com que o indivíduo se transforme, ou seja, saia da sua
condição natural e seja estabelecido sujeito humano, pode ser denominada cultura. Forquin,
2003 afirma essa ideia:
Educar, ensinar , é colocar alguém em presença de certos elementos de cultura a fim de que
este alguém deles se nutra, os incorpore à sua substância e construa sua identidade intelec-
tual e pessoal em função deles.(p. 24)
O cotidiano escolar revela um amplo desenvolvimento de aprendizagem e uma afetiva re-
construção do conhecimento quando se dá espaço para a integração entre as diferenças
e possibilidades de expressão, abrindo possibilidades da escola reconhecer efetivamente o
aluno como sujeito da reconstrução do conhecimento.
Portanto, quando se refere à questão de considerar os conteúdos escolares como cultura,
deve-se atentar para o fato de que toda educação antes de se apegar a uma ideia, faz uma
seleção e reelaboração dos conteúdos , para que assim possa transmitir as novas gerações.
Como cita Forquin, 2003,
[...] a educação escolar não se limita a fazer uma seleção entre os saberes e os materiais
culturais disponíveis num dado momento, ela deve também, para torná-los efetivamente as-
similáveis às jovens gerações, entregar-se a um imenso trabalho de reorganização, de rees-
truturação, ou de “transposição didática”[...](p.16 grifo do autor).
Todos os conceitos educacionais são renovados a cada geração, visto que em cada momento
e época histórica os indivíduos têm uma determinada visão de mundo, bem como um con-
junto de conhecimentos e de valores. Essa renovação não quer dizer que se esqueça o velho
conceito, mas que esteja considerando as novas maneiras de viver que caracteriza um grupo
ou sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CANDAU, Vera Maria. A revisão da Didática. In: CANDAU, Vera Maria (org.). Rumo a uma
nova Didática. 13ª. Edição. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.

_______. Da Didática fundamental ao fundamental da Didática. In: ANDRÉ, Marli Eliza D.

capítulo 1 • 27
A.; OLIVEIRA, Maria Rita N. S. (orgs.). Alternativas no ensino de didática. 5ª. Edição. São
Paulo: Papirus, 2003.

CANDAU, Vera Maria (Org.). Sociedade, Educação e Cultura(s): questões e propostas. Pe-
trópolis, RJ: Vozes, 2002.
Reinventar a Escola. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

COMENIUS. A Didática Magna. São Paulo: Martins fontes, 1997.

CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o Conhecimento: Fundamentos epistemológicos e po-


líticos.6 ed. São Paulo: Cortez: Instituto Pulo Freire, 2002.

DAMIS, Olga Teixeira. Didática e Ensino: Relações e pressupostos. In: VIEGA, Ilma Passos
Alencastro (coord.). Repensando a didática. 25ª. Edição. Campinas: Papirus, 2007, p. 13-
32.

FORQUIN, Jean Claude. Escola e Cultura: as bases sociais e epistemológicas do conheci-


mento escolar. Porto Alegre: Artes Medicas Sul, 1993.
Este texto foi extraído na íntegra do site: http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/as-in-
fluencias-das-raizes-culturais-no-processo-ensinoaprendizagem.htm

HAYDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 8ª. edição. São Paulo: Ática, 2006.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

______. A democratização da escola pública. São Paulo: Loyola, 2002.

MASSETO, Marcos. Didática: a aula como centro. 4ª. Edição. São Paulo: FTD, 1997.

CANDAU, Vera Maria (Org.). Sociedade, Educação e Cultura(s): questões e propostas.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

28 • capítulo 1
NO PRÓXIMO CAPÍTULO
Os estudos sobre o desenvolvimento da Didática trouxeram contribuições em relação aos
pensamentos pedagógicos, os quais influenciaram o surgimento de tendências pedagógicas
sobre o processo de ensino e aprendizagem, assunto que será discorrido no capítulo a seguir.

capítulo 1 • 29
2
Tendências
pedagógicas e ações
educativas
2 Tendências pedagógicas e ações
educativas

Neste segundo capítulo, vamos estudar a evolução das principais tendên-


cias pedagógicas no Brasil, focalizando seus aspectos educacionais e de apren-
dizagem, bem como algumas considerações em relação às ações desenvolvidas
pelos professores.
Apresentaremos, ainda, considerações importantes sobre a abordagem de
ensino construtivista e/ou cognitivista, focalizando as contribuições da teoria
sociointeracionista de Vygotsky para a educação.

OBJETIVOS
A finalidade é que você possa refletir sobre as principais tendências pedagógicas e suas im-
plicações nas ações desenvolvidas pelos professores; que possa, ainda, analisar os aspectos
educacionais e de aprendizagem que permearam as tendências pedagógicas, bem como co-
nhecer alguns proposições acerca do processo de ensino-aprendizagem à luz da abordagem
sócio-interacionista de Vygotsky.

REFLEXÃO
Você se lembra das atividades que fazia nos seus cadernos, nos anos iniciais de sua educa-
ção básica? Você guardou algum dos materiais utilizados nesta época? Eles contêm muitas
informações sobre as práticas e concepções presentes na educação, no período em que
você estudava. As concepções das práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores
estão intimamente relacionadas com o conhecimento e a reflexão das tendências pedagó-
gicas, norteando as ações educativas desenvolvidas pelos professores. Vamos conversar
sobre isso?

32 • capítulo 2
2.1 As tendências pedagógicas na educação escolar no Brasil:
aspectos e perspectivas de ensino e aprendizagem

O surgimento da educação formal trouxe uma série de preocupações em


relação à organização e efetivação do processo de ensino e aprendizagem. Tais
preocupações são explicadas a partir do momento histórico, social e político
da escola, originando explicações em relação ao processo ensino-aprendiza-
gem.
Nesse contexto, alguns autores como Mizukami (1986) e Libâneo (1994)
apresentam uma análise acerca das abordagens do processo de ensino e
aprendizagem que permearam a educação escolar ao longo de sua trajetória
histórica.
Mizukami (1986) focaliza e analisa as relações de ensino e aprendiza-
gem, dividindo os diversos períodos da educação em abordagens de ensino,
ressaltando pressupostos que nortearam esse processo. Já Libâneo (1994) traz
uma análise das várias tendências e/ou propostas pedagógicas, indicando seus
pressupostos e fundamentos filosóficos, bem como as práticas educativas a
elas relacionadas. O autor aborda o assunto a partir do enfoque das tendências
pedagógicas.
Daremos destaque, neste capítulo, à apresentação e discussão das
tendências pedagógicas descritas por Libâneo (1994), focalizando a análise e
caracterização de cada tendência a partir dos seguintes aspectos: a função da
escola, o professor, o aluno, a metodologia e a avaliação.
Estudos sobre a Didática no Brasil, de acordo com Libâneo (1994, 2002),
revelam as relações existentes entre a história da Didática e as tendências pe-
dagógicas. Segundo o autor, essas tendências podem ser classificadas em duas
correntes: a liberal e a progressista.
As tendências da corrente liberal agruparam a pedagogia tradicional, a
pedagogia renovadora e o tecnicismo educacional. Já as tendências da corren-
te progressista, agruparam a pedagogia llibertadora e a pedagogia crítico-so-
cial dos conteúdos.
As pedagogias liberais adotam a ideia de que a função da escola é pre-
parar os indivíduos para desempenhar papéis sociais, de acordo com suas
aptidões individuais. Isso significa que se parte do pressuposto de que o indi-
viduo precisa adaptar-se aos valores e normas vigentes e, além disso, divulga

capítulo 2 • 33
a igualdade de oportunidades, possibilitando a cada indivíduo a busca de seu
aperfeiçoamento (LIBÂNEO, 2002).
Consideradas como referências norteadoras da prática educativa, é
preciso ter em mente que os movimentos sociopolíticos e filosóficos exercem
intensa influência sobre as tendências pedagógicas. As intenções pedagógicas
disseminadas em cada tendência pedagógica oportunizam uma ligação entre
as práticas pedagógicas, favorecendo ao professor o conhecimento, sem ter a
pretensão de se configurar como uma verdade única e irrestrita.
Nesse sentido, conhecer e se apropriar das teorias e tendências pedagó-
gicas é de extrema importância para que os professores possam refletir sobre
sua prática, sem, no entanto, estar constantemente vinculados apenas a uma
delas. É preciso lembrar que, antes de adotar e/ou utilizar uma delas, é neces-
sário refletir sobre suas características, investigando aquela que mais convém
ao seu desempenho acadêmico, procurando em sua operacionalização avaliar
sua competência e qualificação, buscando agir com eficiência e atuar com qua-
lidade.

2.1.1 Pedagogia tradicional

No Brasil, durante todo o período colonial, os responsáveis pela educação


foram os jesuítas. O ideal da época era a formação do homem universal, huma-
nista e cristão, havendo predomínio de um ensino clássico, de cultura geral,
desvinculado da realidade da Colônia. Pode-se dizer que, em meio a esse cená-
rio, teve início a chamada pedagogia tradicional.
Segundo Libâneo (1994), a pedagogia tradicional é uma proposta de educa-
ção que apresenta um conjunto de princípios e de regras para o funcionamen-
to do ensino. Nessa tendência pedagógica, a função da escola é a transmissão
dos conhecimentos, visando à preparação intelectual e moral dos alunos, para
cumprirem seu papel na sociedade.
O professor representa o papel da autoridade intelectual, aquele que detém
o saber e, portanto, o único responsável pela condução do processo educativo.
Assume funções de controlar e punir os alunos, bem como de ensinar e cor-
rigir a matéria. Desconsidera as diferenças individuais. Pode-se dizer que as
perspectivas de ensino são caracterizadas pela preocupação com a quantidade
e variedade de noções, conceitos, informação, em detrimento da formação do
pensamento reflexivo.

34 • capítulo 2
O aluno é considerado como um ser humano que chega à escola sem ne-
nhum conhecimento (uma “tábula rasa”), um ser passivo, que recebe as infor-
mações previamente selecionadas e decididas pelo professor. É o receptor pas-
sivo, alguém que ouve e aprende, que aceita os conhecimentos transmitidos
pelo professor como algo de fora para dentro. Deve, portanto, prestar atenção
aos conteúdos ensinados para registrá-los e memorizá-los.
A metodologia utilizada pelo professor é a exposição oral dos conteúdos,
cumprindo passos predeterminados e fixados para todos e qualquer contexto
escolar. Valoriza o conteúdo livresco e a quantidade. Os conteúdos são desen-
volvidos de maneira fechada, utilizando-se de exercícios repetidos, para garan-
tir a memorização. Essa maneira de conduzir o processo ensino-aprendizagem
não propicia ao aluno papel ativo na construção de sua aprendizagem. Ao con-
trário, considera a educação como um “produto”, já que os modelos de ensino
já foram predeterminados e os conteúdos já são trazidos prontos, não havendo,
assim, ênfase no processo.
Em relação à avaliação, geralmente é realizada de forma individual, susci-
tando individualidade, rivalidade e competição entre os alunos. Seu propósito
é a reprodução dos conteúdos transmitidos em sala de aula, focalizando a ave-
riguação intelectual de um percentual mínimo de aprendizagem dos alunos. A
perspectiva de aprendizagem é de memorização e acúmulo de conhecimento,
desconsiderando as características próprias de cada faixa etária.
De modo geral, conforme expõe Libâneo (1994), ainda é possível observar
que, na maioria das escolas, a pedagogia tradicional tem resistido ao tempo,
pois as ações educativas (a prática pedagógica) desenvolvidas pelo professor se
evidenciam na sobrecarga de informações disponibilizadas aos alunos, redu-
zindo-se em práticas de memorização, o que se reflete, na maioria das vezes,
em um processo de ensino-aprendizagem burocrático e sem significação. As-
sim, desenvolver a prática escolar dessa maneira empobrece as “boas intenções
da pedagogia tradicional que pretendia, com seus métodos, a transmissão da
cultura geral, isto é, das grandes descobertas da humanidade, e a formação do
raciocínio, o treino da mente e da vontade” (LIBÂNEO, 1994, p. 65).

2.1.2 Pedagogia renovadora e/ou pedagogia da Escola Nova

A pedagogia renovadora é uma concepção que inclui várias correntes que,


de alguma forma, estão ligadas ao movimento da Escola Ativa ou Escola Nova.

capítulo 2 • 35
Tais correntes, mesmo admitindo divergências, apresentam um mesmo princí-
pio norteador de valorização do indivíduo como ser livre, ativo e social.
Foi no final do século XIX que a pedagogia renovadora teve início no contex-
to internacional. Dewey (apud LIBÂNEO) foi o principal representante do mo-
vimento escolanovista. Suas ideias exerceram influência significativa no Brasil,
com a liderança de Anísio Teixeira e outros educadores, que na década de 1930
formaram o Movimento dos Pioneiros da Escola nova. Esse movimento se opu-
nha às práticas pedagógicas tidas como tradicionais, propondo uma educação
que pudesse integrar o indivíduo à sociedade e, ao mesmo tempo, ampliar o
acesso de todos à escola.
De acordo com Soares (apud CANDAU, 1997, p. 16), a perspectiva da Escola
Nova se apresentou “[...] como um conjunto lógico e coerente de ideias e valo-
res, capaz não só de explicar a prática pedagógica como também e, sobretudo,
de regulá-la, fornecendo regras e normas para que ela se desenvolvesse de for-
ma ‘científica e “justa”.
Na tendência pedagógica da Escola Nova, o centro da atividade escolar não
é o professor nem a matéria, é o aluno. Valoriza o processo de aprendizagem e
os meios que possibilitam o desenvolvimento das capacidades e habilidades
intelectuais dos alunos “A didática não é a direção do ensino, é a orientação da
aprendizagem” (LIBÂNEO, 1994, p. 66). Logo, o mais importante não é o ensi-
no, mas, sim, o processo de aprendizagem. A perspectiva de aprendizagem se
baseia na motivação e na estimulação de problemas.
Na pedagogia da Escola Nova, a função da escola é de adequar as necessida-
des individuais do aluno ao meio social vigente, reconhecendo a atividade da
vida humana, principalmente do ponto vista psicológico.
O professor exerce o papel de orientador e facilitador da aprendizagem. É
responsável por incentivar, organizar e coordenar situações de aprendizagem,
adaptando suas ações às características individuais dos alunos. Exercendo essa
função, possibilitará o desenvolvimento das capacidades e habilidades intelec-
tuais de cada um. A perspectiva é de que o processo de ensino seja desenvolvido
para propiciar um ambiente favorável ao autodesenvolvimento e à valorização
interior do aluno.
O aluno é considerado o centro da aprendizagem, um sujeito ativo e investi-
gador, capaz de buscar, por si próprio, conhecimentos e experiências, partindo
de suas necessidades e de seus próprios interesses.
A metodologia utilizada pelo professor leva em conta os interesses dos alu-
nos e é representada por um conjunto de métodos ativos, tais como: pesquisa,

36 • capítulo 2
projetos, experimentações, trabalhos individuais, trabalhos em grupo, ativi-
dades cooperativas, entre outras. Dessa forma, as metodologias desenvolvidas
para promover a aprendizagem dos alunos partem do princípio da descoberta,
isto é, do aprender fazendo.
A avaliação é compreendida como o processo que utilizado para verificar os
esforços e êxito dos alunos, valorizando as trocas de aprendizagens. Busca as
atitudes e aquisições de habilidades, substituindo a competição pela coopera-
ção e solidariedade.
Finalizamos essa tendência pedagógica, trazendo uma consideração im-
portante a respeito de uma ideia defendida pela Escola Nova: a de que o ensino
é guiado pelo interesse dos alunos. De acordo com Libâneo (2002), ao partir
dessa ideia, o professor não pode desconsiderar a necessidade de desenvolver
seu trabalho a partir de um planejamento (planejar o que deve ser ensinado e
aprendido).

2.1.3 Pedagogia tecnicista

A pedagogia tecnicista surgiu no Brasil entre as décadas de 1960-70 (século


XX), fundamentando-se na teoria behaviorista da aprendizagem e na aborda-
gem sistêmica do ensino. A escola deveria ser produtiva, racional e organizada
para formar indivíduos para ingressar rapidamente no mercado de trabalho.
O ensino é voltado para a aquisição de técnicas. Nesse contexto, a educação se
fundamenta no modelo empresarial, adequando o ensino às exigências da so-
ciedade industrial e tecnológica (LIBÂNEO, 1994).
Nessa tendência pedagógica, a função da escola é a transmissão de conhe-
cimentos para moldar comportamentos éticos e práticas sociais para garantir a
manipulação e o controle do ambiente.
O professor é um administrador e executor do planejamento, tendo como
propósito assegurar comportamentos desejáveis. Sua comunicação com os
alunos se dá no sentido técnico, ou seja, a intenção é simplesmente transmitir
conhecimentos de ordem técnica de maneira eficiente, para ensinar técnicas e
moldar comportamentos. A técnica se sobrepõe à figura do professor que passa
ser a visto como mero especialista na aplicação de manuais, ficando restrito
aos limites das técnicas utilizadas.
O aluno é um ser estimulado a executar tarefas previamente planejadas, de-
vendo simplesmente receber e fixar os conhecimentos transmitidos. Para ter

capítulo 2 • 37
êxito e avançar, ele deve simplesmente responder às respostas esperadas pela
escola. Seus interesses são desconsiderados.
A metodologia é desenvolvida com ênfase ao uso de estratégias de ensino
que assegurem a transmissão e recepção de informações. São utilizados proce-
dimentos e técnicas específicas para garantir o controle do ambiente da apren-
dizagem. Utiliza, ainda, material didático ligado à tecnologia (slides, vídeos,
computadores).
A avaliação é realizada a partir de objetivos previamente definidos, para ga-
rantir a verificação e o cumprimento das metas propostas, portanto ela deve
apresentar caráter objetivo e mensurável.
Verificamos que o processo ensino-aprendizagem, nessa tendência peda-
gógica, acentua-se por seu caráter teórico-prático em que teoria e prática estão
justapostas. Assim, a tendência da dependência exclusiva de especialistas e de
técnicas é alvo de grandes críticas. Além disso, a supervalorização do uso de téc-
nicas faz emergir a falsa ideia de que a aprendizagem não é um característica
natural do ser humano.
Segundo Weiss (2009):
Ao colocar o foco exclusivamente no processo de aprendizagem, o mo-
vimento da Escola Nova deixou de lado o produto dessa aprendizagem. Essa
posição derivava, entre outros motivos, de uma crítica bastante pertinente à
aprendizagem não significativa, de pura memorização sem sentido. Mas, ten-
tando mudar essa realidade, o que se acabou fazendo foi “entortar a vara para
o outro lado”: de uma situação em que o aluno deveria receber o conteúdo por
pura transmissão, evoluiu-se para uma outra, na qual o conteúdo a ser apren-
dido deixava de ter importância (...) Por não privilegiar os conteúdos escolares,
a Escola Nova foi profundamente criticada no Brasil, especialmente nos anos
1970 (p. 31).

2.1.4 Pedagogia libertadora

A pedagogia libertadora é um das novas tendências pedagógicas que apre-


sentam caráter progressista. Estabeleceu-se a partir dos movimentos de educa-
ção popular que ocorreram entre o final da década de 50 (século XX) e início dos
anos 60 (século XX). Foi interrompida pelo golpe militar em 1964 e retomada no
final dos anos 70 (século XX) e início dos anos 80 (século XX) (LIBÂNEO, 1994).
Nesse contexto, a pedagogia libertadora floresceu a partir das experiên-

38 • capítulo 2
cias de Paulo Freire. Essa pedagogia se caracteriza como uma educação “não
formal”; a construção do conhecimento é realizada a partir do diálogo entre
professor e alunos, mediada pela realidade concreta em que vivem, bem como
pela autossugestão dos alunos. Logo, os conteúdos são extraídos e apreendidos
dessa realidade e retornam a ela no sentido de suprir as necessidades do aluno
e de transformar sua realidade.
Na tendência pedagógica da pedagogia libertadora, a função da escola é
transformar a sociedade em função das necessidades do homem.
O professor é o coordenador das atividades e atua conjuntamente com os
alunos.
O aluno é o sujeito da aprendizagem: ele irá dialogar opinar, participar.
Professor e aluno analisam problemas e a realidade imediata da sociedade e,
assim, os conteúdos surgem como “temas geradores” do trabalho educativo.
A metodologia prioriza discussões, assembleias, pesquisas participantes,
trabalhos em grupo etc. Nesse contexto, a avaliação não tem caráter mensurá-
vel, pois os alunos se auto-avaliam, e aluno e professor avaliam juntos a prática
educativa.
De modo geral, a pedagogia libertadora defendida por Paulo Freire se opõe
fortemente à educação tradicional, a qual denomina de “educação bancária”.
Suas principais oposições dizem respeito à concepção de aluno (aquele que re-
cebe e deposita passivamente os conhecimentos) e à metodologia (exposição
oral como forma de depositar conhecimentos).

Paulo Freire (2005) utilizou o termo – educação bancária – para criticar o modelo
educacional da escola tradicional. Ao criticar tal modelo, revela que nele o professor é
o único que fala e o único que pensa, enquanto o aluno é aquele que apenas recebe
as informações (aquilo que o professor fala) e só pode “pen-sar” a partir daquilo que
o professor disse. Assim, Freire destaca que, nesse modelo educacional, a mente
dos alunos pode ser comparada a depósitos ban-cários, já que aos professores cabe
depositar informações na mente dos alunos e a esses (os alunos) cabe apenas rece-
ber as informações e armazená-las em sua mente (da mesma forma que se efetuam
depósitos bancários).

Nessa proposta educacional, os alunos são conduzidos a aceitar as situa-

capítulo 2 • 39
ções como elas são, assim, é-lhes negada a possibilidade de exercer seu poder
criativo e transformar o mundo. A partir dessa crítica, Freire propôs e defendeu
a pedagogia libertadora.
Assim sendo, o cerne da proposta da pedagogia libertadora de Paulo Freire
é a transformação social do homem, pois ela contém intrinsecamente a preocu-
pação com a educação para as classes sociais menos favorecidas. Essa pedago-
gia tem sido empregada com muito êxito em vários países do mundo.

2.1.5 Pedagogia Cognitivista e Sócio Interacionista (Construtivista)

Tendo ficado claro que as tendências pedagógicas não são sistemas fecha-
dos e, por isso, sofrem modificações em função do contexto sociopolítico-pe-
dagógico e filosófico, trazemos, nesse momento, uma tendência de ensino que
ganhou grande repercussão a partir do movimento da Escola Nova – a pedago-
gia (LIBÂNEO, 1994).
A pedagogia contrutivista se fundamenta nos estudos desenvolvidos pela
psicologia acerca da cognição do ser humano, procurando explicar como o in-
divíduo absorve e processa as informações, dando-lhes significado. A aprendi-
zagem é entendida como resultado das interações entre as pessoas e de fatores
externos ao aluno (MIZUKAMI, 1986).
Alguns nomes de destacam na teoria CONSTRUTIVISTA, dentre os quais
destacamos dois que influenciaram (e influenciam) o processo educacional:
Piaget (defende a teoria COGNITIVISTA) e Vygotsky (defende a teoria Sócio-In-
teracionista).
Na pedagogia construtivista, a função da escola é estimular a inteligência e
a autonomia intelectual dos alunos. Para isso, a escola deverá oferecer possibi-
lidades de aprendizagem ao aluno.
O professor deve planejar variadas situações de ensino e aprendizagem,
como, por exemplo, propor problemas sem ensinar soluções, promovendo si-
tuações de equilíbrio e desequilíbrio, pois o objetivo é que os alunos aprendam,
que verifiquem a veracidade das informações trabalhadas e, ao mesmo tempo,
que pensem e repensem sobre elas. Logo, o aluno é sujeito ativo do processo de
ensino e aprendizagem, devendo integrar e processar a informação e trabalhar
o mais independentemente possível.A relação entre os homens e desses com a
natureza.
As metodologias utilizadas devem partir de métodos ativos (pesquisa em

40 • capítulo 2
grupo, experimentação), propondo discussões como condição de desenvolvi-
mento da aprendizagem. A dinâmica ensino-aprendizagem caracteriza-se por
situações que estimulem a atividade e a iniciativa dos alunos por meio das inte-
rações estabelecidas entre alunos/alunos e alunos/ professor.
Em relação à avaliação, a teoria construtivista rejeita a utilização de procedi-
mentos de ensino e avaliações padronizadas. Os critérios de avaliação são varia-
dos, pois a avaliação é qualitativa. Nesse contexto, a avaliação não tem caráter
punitivo e/ou de exclusão.

2.1.6 Pedagogia crítico-social dos conteúdos

Essa tendência pedagógica surgiu após o final do regime militar, no final


dos anos 70 (século XX) e início dos anos 80 (século XX), trazendo reivindica-
ções para a efetivação de mudanças na escola pública, almejando uma educa-
ção crítica e capaz de superar as desigualdades sociais (LIBÂNEO, 1994, 2002).
Ainda, segundo o autor de caráter progressista, a pedagogia crítico-social
dos conteúdos defende a função social e política da escola, a partir do trabalho
com conhecimentos sistematizados, com o intuito de subsidiar a participação
ativa das classes populares na sociedade.
Nessa tendência, a função da escola é socializar e difundir o saber, levando
em conta as realidades sociais, pois valoriza a transmissão desse saber às clas-
ses populares.
O professor é uma autoridade competente, que está à disposição do aluno.
È mediador entre os conteúdos e os alunos. Empenha-se em conhecer o coti-
diano dos alunos, auxiliando-os a conhecer as realidades sociais e fornecen-
do-lhes uma estrutura de conhecimentos indispensáveis à sua transformação
social. Os conhecimentos são construídos pela experiência pessoal e subjetiva.
O aluno deve processar e organizar todas as informações disponíveis na sua
cultura, pois suas experiências de vida são levadas em conta desde o início do
processo ensino-aprendizagem. Dessa forma, ele é orientado a participar ativa-
mente da sociedade.
A metodologia dá ênfase à livre-expressão, ao contexto cultural, partindo de
uma relação direta da experiência do aluno, confrontando-se com o seu saber
sistematizado. É desenvolvida a partir da unicidade entre teoria e prática, pois
almeja proporcionar a apropriação ativa dos conteúdos, proporcionando aos
alunos o desenvolvimento da consciência crítica perante o contexto social.
A avaliação valoriza os resultados da aprendizagem significativa dos alunos.

capítulo 2 • 41
Observa-se nitidamente que, de modo geral, a pedagogia crítico-social dos
conteúdos denuncia a importância de se desenvolver um processo de ensino
e aprendizagem, no qual os conteúdos de ensino sejam constantemente rea-
valiados de acordo com as realidades sociais, pois devem ser significativos na
razão humana e social. Nesse sentido, revela a preocupação central com o como
ensinar e não apenas com o que ensinar, evidenciado na pedagogia tradicional.
Destacamos dentre outros estudiosos da pedagogia crítico-social dos conte-
údos Dermerval Saviani, José Carlos Libâneo, Carlos Jamil Cury, entre outros.
Finalizamos evidenciando que cada tendência pedagógica expressa uma
representação de homem e de sociedade, a partir de um contexto histórico.
Além disso, os pensamentos pedagógicos que permearam (e permeiam) as ten-
dências pedagógicas permitem a compreensão de que seu processo histórico
produziu conhecimentos sobre os elementos que integram a educação formal,
mais especificamente o ato de ensinar. Nesse processo, a escola se organizou e
se legitimou como uma instituição social que desenvolve seu trabalho de forma
articulada, com uma prática social mais ampla.
Tais considerações incidem sobre a prática pedagógica desenvolvida na
escola, pois, conforme revela Damis (2007), se os professores, em sua prática
pedagógica, agirem sem compreender o significado social das decisões que de-
finem as relações entre os elementos que a constituem (o professor, o aluno,
os conhecimentos, os procedimentos, os recursos e as tecnologias utilizadas),
apenas estarão executando práticas pensadas e decididas por outros, desprovi-
das de uma linguagem teoricamente significativa para fundamentar sua ação.

2.2 O ensino e a aprendizagem escolar: a abordagem Sócio-


Interacionista de Vygotsky e suas contribuições para a educação

A Didática tem enfatizado a investigação de práticas pedagógicas diferen-


tes daquelas que apresentam os conhecimentos sistematizados como verdades
acabadas, e a teoria Sócio-Interacionista tem se revelado um caminho para a
promoção de uma ação transformadora de ensinar e aprender. Nessa teoria,
a perspectiva predominante é possibilitar aos alunos apropriação de conheci-
mentos, bem como oportunizar-lhes condições para elaborar novos conheci-
mentos. Nesse contexto, é tarefa do professor criar um ambiente na sala de aula
propício ao diálogo, levando os alunos a refletir sobre os porquês e os como da
ação, por meio de um processo de interação.

42 • capítulo 2
Vygotsky defende a teoria Sócio-Interacionista de desenvolvimento e apren-
dizagem, a partir de uma perspectiva histórico-cultural de educação, na qual
se considera o impacto decisivo da interação social humana sobre a aprendiza-
gem e o desenvolvimento.
Pela abordagem histórico-cultural, o autor explica que a formação do indi-
víduo se dá a partir das relações sociais, sendo que os processos humanos ocor-
rem por meio da interação do indivíduo com um meio/mundo humanizado
(VYGOTSKY, 2000 apud CHINALIA, 2006).
Tendo se dedicado à compreensão da origem e funcionamento das fun-
ções mentais superiores, Vygostky aponta que essas não são formadas exclusi-
vamente pelo organismo biológico, ressaltando o papel dos processos sociais
como fatores imprescindíveis para o desenvolvimento de tais funções. Logo,
pela perspectiva sócio-histórica, as funções mentais superiores são construí-
das socialmente, pelo processo de internalização: os conteúdos presentes na
situação interpessoal (entre as pessoas) tornam-se intrapessoais (no interior
da pessoa), ao consistir inicialmente em objeto de imitação e cumprir funções
sociais, até serem integrados ou apropriados pelo indivíduo (VYGOTSKY, 2000
apud CHINALIA, 2006).
Isso significa que, na ótica do autor, a relação do indivíduo com o mundo
é mediada por meios que se constituem “ferramentas auxiliares” da atividade
humana. A linguagem, por exemplo, é um instrumento de mediação – o pro-
cesso de mediação é realizado pela linguagem (fala, escrita, gestos, comporta-
mentos) e transforma processos interpessoais em intrapessoais. “Através dos
diferentes processos de mediação social, a criança se apropria dos caracteres,
das faculdades, dos modos de comportamentos e da cultura, representativos
da história da humanidade” (NOGUEIRA, 1993 apud CHINALIA, 2006).
Para Vygotsky (2000 apud CHINALIA, 2006), a relação estabelecida entre
aprendizagem e desenvolvimento supõe necessariamente a participação do ou-
tro, já que é na interação social, experienciando condições de aprendizagem,
que esta impulsiona o desenvolvimento. As transformações no processo de
desenvolvimento são, portanto, ensejadas pelos processos de aprendizagem.
Sendo assim, o autor introduz em sua teoria, o conceito de Zona de Desenvolvi-
mento Potencial (ZDP), segundo o qual a interação social cria possibilidades de
avanço superiores àquelas que seriam observadas individualmente.
Levando-se em consideração os pressupostos da perspectiva histórico-so-
cial, fica claro que, nela, a educação é um elemento que influencia diretamente

capítulo 2 • 43
o desenvolvimento humano.
Essa perspectiva traz para os professores orientações importantes em re-
lação ao desenvolvimento humano, ao indicá-lo como um processo contínuo
ao longo de toda a existência humana, não implicando rupturas. Em relação à
aprendizagem, ao explicá-la como uma condição que impulsiona o desenvolvi-
mento, evidencia-se a educação como elemento indispensável a esse processo.
Esta ideia está fortemente ligada à defesa da valorização da interação social em
educação.
Portanto, no que diz respeito à aplicação dos conhecimentos sistematiza-
dos, permite ao professor, a realização de uma prática pedagógica mediadora,
na qual o professor desenvolve o processo ensino-aprendizagem, levando em
conta as potencialidades dos alunos e propiciando situações desafiadoras de
apropriação de conhecimentos. Ao realizar a função de mediador, permitirá
que os alunos executem as atividades com e/ou sem auxílio, conduzindo-os à
compreensão e, ao mesmo tempo, aproximando-os da realização de ações cada
vez mais independentes, já que, nessa perspectiva, o professor tem em mente
que o objetivo de seu trabalho é levar o aluno adiante, pois, quanto mais ele
aprende, mais se desenvolve mentalmente.

44 • capítulo 2
Desse modo, ao reconhecer o papel da aprendizagem ou das mudanças
decorrentes da experiência no meio social para o desenvolvimento humano,
podemos atentar para a relevância do trabalho educacional formal e informal
em que são inseridos os seres humanos. Nesse sentido, a abordagem históri-
co-cultural destaca a educação como consubstancial ao desenvolvimento, pois
cada novo ser, à medida que, por meio das atividades educacionais, interiori-
za a memória cultural, também exercita o uso de seus códigos até apropriar-se
deles, construindo socialmente as funções mentais superiores, típicas do ser
humano.
Destaca, ainda, a importância de o professor conhecer as teorias de apren-
dizagem no sentido de integrar os conhecimentos teórico-práticos na organiza-
ção de seu trabalho docente.

CONEXÃO
De acordo com Kolh (1992) desde que houve a democratização do ensino, a escola vem
enfrentando grandes desafios para atender a todos os alunos que nela ingressam. Segundo
a autora, para o enfrentamento desse desafio, alguns sub-sídios podem ser buscados na
psicologia cognitiva, no sentido de aprofundar as reflexões a respeito da criança como um
ser ativo que elabora e verifica hipóteses e constrói conhecimento. Então, para aprofundar
seus conhecimentos sobre tais reflexões, leia o artigo: Algumas contribuições da psicologia
cognitiva. Nele, a autora, baseando-se principalmente nas ideias de Vygotsky, destaca o pa-
pel da escola no processo do desenvolvimento intelectual infantil.
Disponível em: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_06_p047-051_c.pdf .

Por fim, entendemos que a ação integradora entre o ensino e a aprendi-


zagem deve ser concebida na educação como um processo que se constitui a
partir das relações didáticas, as quais, ao se desenvolverem no decorrer dessa
relação, propiciam a elaboração e a reelaboração de novos saberes, uma das
finalidades básicas da escola.

ATIVIDADE
1. Qual é o papel da educação formal ao longo de sua trajetória histórica?
2. Qual é a concepção de ensino-aprendizagem evidenciada em cada tendência pedagó-
gica? E qual é a metodologia utilizada para propiciar tal aprendizagem?

capítulo 2 • 45
3. Quais as contribuições da teoria sociointercionista à educação? Quais são os principais
conceitos destacados por Vygostsky em relação ao processo de aprendizagem?

REFLEXÃO
Cada uma das tendências pedagógicas aqui apresentadas expressa uma representação de
homem e de sociedade, a partir de um contexto histórico. Conforme vimos, os pensamentos
pedagógicos que permearam (e permeiam) as tendências pedagógicas permitem a com-
preensão de que seu processo histórico produziu conhecimentos sobre os elementos que
integram a educação formal, mais especificamente o ato de ensinar. Nesse processo, é nítido
que a escola se organizou e se legitimou como uma instituição social que desenvolve seu
trabalho de forma articulada com uma prática social mais ampla. Tais considerações revelam
a importância de o professor constituir, na contemporaneidade, uma prática pedagógica arti-
culada com as determinações das políticas educacionais, assim como com as necessidades
de seu público-alvo (seus alunos) e não apenas a execução de ações e práticas pensadas e
decididas por outros, desprovidas de uma linguagem teoricamente significativa para funda-
mentar sua ação. Temos que considerar as evoluções ocorridas nos diversos âmbitos sociais
e as “exigências” da escola contemporânea no que diz respeito aos propósitos da educação
nacional, dentre os quais destacamos a formação de um sujeito crítico, participativo e autô-
nomo.

LEITURA RECOMENDADA
VEIGA, Ilma Passos Alencastro (coord.). Repensando a didática. 25ª. Edição. Campinas:
Papirus, 2007.
A proposta da autora, nessa obra, é repensar o papel da didática na formação de professores
de 1º e 2º graus. Essa discussão visa estimular a busca de uma proposta didática voltada
para a efetivação da prática pedagógica crítica.

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública. São Paulo: Loyola, 2002.
Libâneo é um grande estudioso da educação. Insere-se no movimento dos educadores in-
teressados em discutir e viabilizar políticas e ações em torno da escola pública democrática,
enquanto instância ligada ao esforço coletivo de democratização da sociedade como um
todo. Nesse livro, a proposta apresentada pelo autor é enfatizar a importância do trabalho

46 • capítulo 2
docente na escola, o que requer o esforço de juntar a teoria e a pesquisa à prática dos pro-
fessores, de modo que esta traduza a crítica em respostas necessárias à democratização da
escola pública.

O texto abaixo é um fragmento do artigo: Tendências educacionais: concepção histórico-


cultural e teoria histórico-crítica (Vera Regina Oliveira Alves). Você poderá, a partir dessa
leitura, aprofundar seus estudos sobre a pedagogia histórico-crítica. Esse texto poderá ser
encontrado na íntegra em: http://www.unir.br/html/pesquisa/Pibic_XIV/revista%20III2005.
pdf#page=113
WEISS, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2009.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CANDAU, Vera Maria. A didática em questão. Petrópolis: Vozes, 1997.

CHINALIA, Fabiana. Relações pedagógicas no contexto escolar inclusivo: um olhar


sobre a deficiência mental. 2006. 155f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universi-
dade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2006.

DAMIS, Olga Teixeira. Didática e ensino: relações e pressupostos. In: VEIGA, Ilma Passos
Alencastro (coord.). Repensando a didática. 25ª. edição. Campinas: Papirus, 2007, p. 13-
32.

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública. São Paulo: Loyola, 2002.

______. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU,
1986.

NOGUEIRA, A. L. H. Eu leio, ele lê, nós lemos: processos de negociação na construção da


Leitura. In: SMOLKA, A. L.; GÓES, M. C. R. (Org.) A Linguagem e o outro no espaço es-
colar. Campinas: Papirus, 1993, p.15-34.

VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

capítulo 2 • 47
WEISS, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2009.

NO PRÓXIMO CAPÍTULO
A escola se organizou e se legitimou como uma instituição social que desenvolve seu traba-
lho de forma articulada com uma prática social mais ampla. Nesse contexto, a ação integra-
dora entre o ensino e a aprendizagem deve ser concebida na educação como um processo
que se constitui a partir das relações didáticas de ensinar e aprender, no sentido de propiciar
a elaboração e a reelaboração de novos saberes, uma das finalidades básicas da educação
escolar. Tal afirmativa nos conduz a refletir acerca da realização do trabalho didático no con-
texto da democratização do ensino, assunto esse que traremos a seguir.

48 • capítulo 2
3
Desigualdades
na escola - A
Didática e algumas
possibilidades para
a democratização
do ensino
3 Desigualdades na escola - A Didática
e algumas possibilidades para a
democratização do ensino
Neste terceiro capítulo, abordaremos sobre as desigualdades na escola e
suas implicações no processo de ensino e de aprendizagem. Também, tecere-
mos algumas considerações sobre o trabalho docente no contexto das desigual-
dades e apresentaremos, ainda, a sala de aula e os componentes indispensáveis
ao processo didático.

OBJETIVOS
A finalidade é que você possa refletir sobre as desigualdades na escola e analisar o proces-
so de ensino-aprendizagem na escola contemporânea; que você possa, também, apreender
informações importantes acerca de ações pedagógicas relevantes à realização do trabalho
docente no contexto das desigualdades e que possa, ainda, conhecer os componentes do
processo didático, a interligação existente entre eles, bem como alguns aspectos que per-
meiam seu processo de escolha e organização.

REFLEXÃO
Você já passou por uma situação em que foi excluído? Na escola, você já recebeu algum
apelido que o desqualificasse? Sociedade e escola não existem de forma isolada, por isso, o
que acontece na sociedade refletese nas escolas, que realizam em seu contexto um trabalho
a partir dos valores, das crenças e das prioridades que circulam na sociedade. Tendo em vista
que, na atualidade, a escola deverá atender à diversidade humana, dentro da lógica de igual-
dade e de direitos sociais, esse é o assunto que estudaremos nesse capítulo.

3.1 Desigualdades na escola – a Didática e algumas possibilidades


para a democratização do ensino

A Didática, na atualidade, tem buscado repensar e ressignificar os novos


desafios impostos pela sociedade contemporânea. Esses desafios se dividem
entre a preocupação com o cotidiano escolar, com a formação de professores

capítulo 3 • 51
e com o currículo escolar, entre outros que se impõem periodicamente. Nesse
contexto, uma discussão que vem causando já há algum tempo grandes deba-
tes é a realização de um processo de ensino que atenda a todos, visando à demo-
cratização do ensino. Assim, é importante trazer à tona algumas reflexões sobre
as desigualdades na escola e suas implicações no trabalho docente.
A sociedade em que vivemos se diz democrática, mas os privilégios perma-
necem favorecendo um grupo de pessoas. Em seus processos, os homens em
grupo “enquadram” as pessoas nos modelos que determinam como certos e
errados e acabam privilegiando apenas alguns de seus segmentos. Com isso,
estabelecem algumas categorias e são elas que definem as relações para a ex-
clusão, dependendo das relações que o contexto cria naquele momento (CHI-
NALIA, 2006).
Lembrando que sociedade e escola não existem de forma isolada, o que
acontece na sociedade reflete-se nas escolas, que realizam em seu contexto
um trabalho a partir dos valores, das crenças e das prioridades que circulam
na sociedade. Os profissionais que trabalham na escola são cidadãos de uma
determinada sociedade e da comunidade local em que vivem, possuindo um
conjunto de crenças ou atitudes como qualquer outro grupo de pessoas (MI-
TLER, 2003 apud CHINALIA, 2006).
As desigualdades têm origem nos modos de organização das sociedades, le-
vando-se em conta seus processos históricos, políticos e econômicos, nos quais
o homem está inserido. Os indivíduos formam a sociedade e, possuindo suas
particularidades, tentam na medida do possível se adequar aos modelos que
ela determina. A sociedade é construída pela diversidade humana e, por isso
mesmo, acaba privilegiando apenas alguns de seus segmentos.

[...] Os indivíduos são categorizados segundo o problema


que causam à sociedade: pobreza, delinquência, loucura,
deficiência e tantos outros. A designação desses tipos de “di-
ferenças” resulta da aplicação, por outras pessoas, de regras
ou sanções ao diferente; não é uma qualidade do ato em si
mesmo (BIANCHETTI; FREIRE, 1998, p. 114).

Essa citação deixa claro que a questão das diferenças entre as pessoas e das
desigualdades delas resultantes não se restringe, apenas, às suas característi-
cas individuais. É bem mais complexa, envolvendo a cultura e as condições em
que vivem, segundo regiões e países.

52 • capítulo 3
No contexto escolar, as análises de Bourdieu (2002 apud CHINALIA, 2006)
ajudam-nos a compreender alguns dos critérios utilizados pela escola em rela-
ção à sua organização e ao seu funcionamento, que são fornecedores das desi-
gualdades e da exclusão. O autor explica que, durante muito tempo, a escola foi
reconhecida como um local destinado às pessoas pertencentes à classe social
dominante. Isso fez com que, por um longo período, a escola reproduzisse no
seu interior a cultura e a linguagem de uma classe social dominante, ou seja,
daqueles que possuem uma condição econômica favorecida e que, com isso,
são detentores que um capital cultural ampliado. Alicerçado nesses critérios
(classe social, cultura, linguagem, entre outros), a escola se constituiu em um
espaço de exclusão daqueles que não correspondem aos seus critérios e expec-
tativas, reforçando ainda mais as desigualdades sociais e acadêmicas.

Conforme destaca Mitler (2003 apud CHINALIA, 2006, p. 46) “os profissionais que
trabalham na escola são cidadãos de uma determinada sociedade e da comunidade
local em que vivem, possuindo um conjunto de crenças ou atitudes como qualquer
outro grupo de pessoas” (MITLER, 2003 apud CHINALIA, 2006, p. 46). Nesse sentido,
é preciso, antes de tudo, alterar visões reducionistas visões reducionistas sobre o de-
senvolvimento humano e a aprendizagem. Isso significa, dentre outras providências, é
preciso um olhar no plano da coletividade, atendendo-se a especificidade da diferença,
questionando modelos predeterminados, ideias preconcebi-das, constituindo caminhos
verdadeiramente democráticos.

Tais critérios produziram um conjunto de problemas, indefinições e ques-


tionamentos em relação à forma como a escola se organizou, surgindo a ne-
cessidade de inverterem índices de evasão e repetência escolar, por exemplo,
já que esses produziram uma exclusão significativa de acesso ao saber escola-
rizado.
Vimos, no capítulo 1, em que apresentamos o surgimento da educação for-
mal, culminando com o surgimento da Didática, que, desde Comênio, já se de-
fendia um processo de escolarização para todas as pessoas. Assim, na trajetória
de evolução da educação, a escolarização foi exaltada como um dos requisitos
fundamentais indispensáveis em todas as sociedades. Nessa trajetória, cada vez
mais a educação escolar foi se destacando como uma possibilidade às crianças,
aos jovens, bem como à população em geral, de domínio de conhecimentos

capítulo 3 • 53
culturais e científicos, além de promover a socialização do saber sistematizado
e, ainda, desenvolver capacidades cognitivistas e operativas que auxiliam para a
atuação no trabalho e nas lutas sociais pela conquista dos direitos de cidadania
(LIBÂNEO, 1994).
Então, desde o final do século XX, as exigências educacionais recaem forte-
mente sobre um “modelo” de escola que atenda a todos, uma escola que respei-
te as desigualdades sociais, culturais, econômicas, enfim as diferenças, uma
escola que promova um ensino de qualidade, atendendo às necessidades de
todos os seus alunos, inclusive daqueles que, diante da sociedade, ainda per-
tencem a grupos sociais considerados marginalizados e/ou minoritários.
Para ampliar o assunto, trazemos a discussão de Mello (1987 apud LIBÂ-
NEO, 1994, p. 35), que sobre essa questão revela que:

A escolarização básica constitui instrumento indispensável


à construção da sociedade democrática, porque tem como
função a socialização daquela parcela do saber sistematiza-
do que constitui o indispensável à formação e ao exercício da
cidadania. Ao entender dessa forma a função social da esco-
la, pressupõe-se que não é nem redentora dos injustiçados
nem reprodutora das desigualdades sociais, e, sim, uma das
mediações pelas quais as mudanças sociais em direção da
democracia podem ocorrer.

Entretanto, sabemos que a escola ainda continua reproduzindo desigualda-


des e, diante disso, ainda estamos buscando uma proposta de ensino de quali-
dade, que possa verdadeiramente ampliar a participação efetiva do povo nos vá-
rios segmentos de decisão da sociedade, desde a década de 60-70 do século XX.
Durante muito tempo, o fracasso escolar, por exemplo (uma grande pro-
blemática das escolas, inclusive nos dias atuais), foi visto como um problema
individual dos alunos que não conseguiam aprender. Posterior mente, as ex-
plicações recaíram sobre múltiplos fatores, tanto intraescolares como extraes-
colares. Nessa perspectiva, os professores experimentaram (e experimentam)
uma série de sensações em relação ao seu papel, bem como em relação à eficá-
cia de seu trabalho.

O paradigma da qualidade da educação que deseja promover

54 • capítulo 3
a pedagogia da inclusão não excludente e abolir a pedagogia
da exclusão dos currículos escolares somente poderá ser ma-
terializado se pensado-executado em função do pleno desen-
volvimento do ser humano e não em função das estruturas
dominantes. A qualidade educacional somente terá resulta-
dos significativos se seu processo de implementação for or-
ganizado política e pedagogicamente para enfrentar, satisfa-
toriamente, as necessidades emergentes da população, com
vistas a uma cidadania efetiva. Uma educação de qualidade
não se distancia, assim, da promoção da qualidade de vida
da totalidade da população (RAYS, 2007, p. 94).

Isso significa que a escola não pode mais ser organizar como espaço de ex-
clusão. É preciso construir uma teoria e uma prática docente

[...] no sentido da transformação das persistentes condições


de ensino e aprendizagem seletivas e excludentes; da gesta-
ção de práticas pedagógicas capazes de criar, nos âmbitos
escolares, as condições de emancipação e desenvolvimento
social, cultural e humano dos alunos pertencentes aos seg-
mentos desfavorecidos da sociedade e que, por isso, sofrem
o processo de marginalização nas nossas escolas (PIMENTA,
1997, p. 24).

Assim, a escolarização para a cidadania, ao contrário da escolarização para


a exclusão e para a submissão, requer (dentre outras) algumas reflexões sobre
as ações que permeiam o trabalho docente. Destacamos, aqui, a compreensão
de que esse trabalho não se fundamenta simplesmente em ações para ensinar
(conforme já evidenciamos nos capítulos anteriores).

3.2 O trabalho docente no contexto das desigualdades: algumas


considerações

Nas sociedades contemporâneas, o ser humano, ao nascer, traz consigo o


direito à educação escolar includente. Tal direito implica a inserção de todos,

capítulo 3 • 55
sem distinção de condições linguísticas, sensoriais, cognitivas, físicas, emocio-
nais, étnicas, socioeconômicas ou outras, e requer sistemas educacionais pla-
nejados e organizados que dêem conta da diversidade dos alunos e ofereçam
respostas adequadas às suas características e necessidades. “Entretanto, nem
sempre a educação escolar tem contribuído para a formação plena desse ser,
com base em suas necessidades biopsicossociais3”(RAYS, 2007, p. 95).
As ideias e reflexões que apresentaremos a seguir se fundamentam na con-
tribuição da Didática em relação ao fazer pedagógico, mais precisamente ao
“como fazer”, pois frequentemente, na realização do trabalho docente, emerge
uma série de dúvidas, tais como:
- Como motivar os alunos para que eles estudem?
- Como resolver o caso dos alunos indisciplinados e descontentes?
- Como despertar e manter sua atenção?
- Como avaliar os alunos?
- Como nos comunicarmos com eles para que eles nos entendam? (MAZET-
TO, 1997, p. 15)
Tais dúvidas se configuram em preocupações e, por isso, é importante pen-
sar e refletir sobre as relações pedagógicas que permeiam o contexto escolar,
integrando o trabalho docente. Diante dessa consideração, trazemos para essa
discussão algumas possíveis análises sobre a questão de que o trabalho docen-
te envolve relações interpessoais entre professor e alunos e entre alunos/alu-
nos, bem como ações pedagógicas mediadoras, ou seja, aquelas que provêm
condições e meios para os alunos se tornarem sujeitos ativos no processo de
apropriação dos conhecimentos sistematizados.

Vejamos, então, alguns pontos assinalados por Libâneo


(1994, p. 39) em relação ao trabalho docente.

[...] o trabalho pedagógico na escola requer a sua adequação


às condições sociais de origem, às características individu-
ais e socioculturaiss e ao nível de rendimento escolar dos
alunos. A democratização do ensino supõe o princípio da

3 As necessidades biopsicossociais do ser humano dizem respeito ao seu desenvolvimento integral, ou seja, à
promoção de ações que favoreçam seu desenvolvimento orgânico (biológico), afetivo e cognitivo (psicológico) e
social (interações com as pessoas nos diferentes ambientes).

56 • capítulo 3
igualdade, mas, junto com seu complemento indispensável,
o princípio da diversidade. Para que a igualdade seja real e
não apenas formal, o ensino básico deve atender à diversifi-
cação da clientela, tanto social quanto individual. Isto impli-
ca ter como ponto de partida conhecimentos e experiências
de vida, de modo que estes sejam as referências para os ob-
jetivos, conteúdos e métodos; implica que a escola deve inte-
ragir continuamente com as condições de vida da população
para adaptar-se às suas estratégias de sobrevivência, visando
a impedir a exclusão e o fracasso escolar.

O professor, ao desenvolver sua ação docente, precisa abandonar as aulas


baseadas simplesmente na memorização de nomes, informações e conceitos,
relacionando-as aos conhecimentos e conceitos do cotidiano diário dos alunos.
Dentre as várias reflexões e organizações que integram a ação docente, uma
delas é relacionar os conteúdos de ensino a partir daquilo que têm significân-
cia para o aluno, no sentido de facilitar sua aprendizagem.
Assim, em termos de expectativas de desempenho, a responsabilidade pela
aprendizagem deixa de ser entendida como uma preocupação e responsabili-
dade exclusiva do aluno e passa a integrar o conjunto de reflexões e ações ne-
cessárias para a realização do trabalho docente.
Outro aspecto que merece reflexão é o incentivo às atividades de cognição
dos alunos. É preciso lembrar que o incentivo deve estar presente nas ações
pedagógicas desenvolvidas pelo professor, pois esse se dá a partir das ações ex-
teriores, despertando no aluno um motivo para aprender, propiciando, assim,
condições favoráveis para a aprendizagem de todos. Para incentivar atividades
de cognição dos alunos, é importante conhecer um pouco das condições socio-
culturais que permeiam a vida familiar dos alunos, bem como suas expectati-
vas em relação à escola e ao futuro. Tais informações são importantes e, sem
dúvida alguma, poderão auxiliar os professores a articularem as experiências e
os conhecimentos prévios dos alunos no desenvolvimento dos conhecimentos
sistematizados.

O ensino não pode deixar de apoiar-se na experiência e no


senso comum das crianças, cultivando-o e livrando-o dos
equívocos e dos conhecimentos não científicos; mas sua ta-

capítulo 3 • 57
refa fundamental é assegurar o trânsito do senso comum aos
conhecimentos científicos (LIBÂNEO, 1994, p. 115).

Nessa citação, reafirma-se a importância de se considerarem os conhe-


cimentos prévios dos alunos, incentivando-os a participar do processo ensi-
no-aprendizagem e, ao mesmo tempo, oferecendo-lhes a oportunidade de ter
acesso a um conjunto de saberes, costumes e valores que já possuem, pois a
motivação pelo estudo geralmente está relacionada às suas condições reais de
vida e, diante disso, muitas vezes, acaba se sobrepondo à sua individualidade.
Logo, “[...] a autêntica aprendizagem ocorre quando o aluno está interessado e
se mostra empenhado em aprender. É a motivação interior do aluno que impul-
siona e vitaliza o ato de estudar e aprender” (HAYDT, 2006, p. 75).
À luz das explicações da psicologia, temos conhecimento de que a motiva-
ção é um processo psicológico pessoal e interno, que depende das diferenças,
experiências anteriores e aspirações de cada um. Diante disso, não queremos
de forma alguma dizer que a motivação do aluno depende totalmente do pro-
fessor. Ao contrário, queremos ressaltar que o professor pode incentivar os alu-
nos, isto é, despertar e atrair seu interesse para fontes de motivações positivas
(HAYDT, 2006).
Ainda de acordo com a autora, mesmo que não seja possível à Didática tra-
çar uma estratégia didático-metodológica que garanta total eficácia para provo-
car e gerar em cada aluno a desejada motivação interior para a aprendizagem,
há uma busca incessante por metodologias e recursos didático-metodológicos
para gerar e estimular a motivação do aluno.
Um aspecto que merece ser observado e discutido em relação às ações peda-
gógicas desenvolvidas pelo professor é o fato de que é preciso respeitar e levar
em consideração a história pessoal dos alunos, pois, conforme destaca Haydt
(2006, p. 71), o professor pode evitar frustrações e desajustamentos “se consi-
derar as experiências anteriores dos alunos e sua história pessoal de vida e se
tratá-los com compreensão e respeito”.

CONEXÃO
Aprofunde seus conhecimentos sobre algumas das complexidades que emergem no contex-
to da escola para todos. Leia: FERREIRA, M. E. C.; GUIMARÃES, M. Educação inclusiva. Rio
de Janeiro: DP&A, 2003. Em dos capítulos dessa obra, as autoras revelam pontuações im-
portantes em relação à eliminação de pensamentos simplistas e reducionistas sobre a edu-

58 • capítulo 3
cação, destacando a necessidade de para compreendê-la sob uma ótica em que o acesso
e a permanência na instituição escolar façam-se em condições viáveis e satisfatórias para a
educação e formação de todo e qualquer aluno, constituindo um direito espontâneo e natural,
uma responsabilidade social e política do Estado e de cada cidadão.

Para ilustrar as considerações acima, trazemos um trecho de uma das aná-


lises de um estudo realizado por Chinalia (2006), em que a pesquisadora anali-
sou as ações pedagógicas realizadas por uma professora que atua em uma esco-
la que atende à diversidade humana (uma escola inclusiva). No caso específico
desse estudo, o foco foi a inclusão de uma aluna com deficiência intelectual.
Ao analisar o caderno da aluna, a pesquisadora encontrou informações
acerca de algumas ações que a professora em questão considera importantes,
especialmente no caso dessa aluna. Vejamos alguns pontos observados pela
pesquisadora:

Uma grande parte das correções que a professora [...] reali-


zou nos cadernos da aluna é marcada pela presença do sinal
de certo (C), bem como de palavras de elogio. Em trechos de
sua fala, acaba revelando que acredita que para Fran esse
tipo de ação é de extrema importância para seu desempenho
escolar. Acaba revelando, também, que vê necessidades de
que Fran seja estimulada para que possa ter um bom desem-
penho nos conteúdos a serem desenvolvidos.

“Com ela é necessário muito estímulo porque no começo do ano


eu escrevi no caderno: campeã, você é um show, parabéns, muito
bem! Então, percebo que ela está estimulada, que dá certo”.

Detectamos, nesse trecho de sua fala, que a professora em


questão acaba por reconhecer que vê necessidade de reali-
zar, no decorrer do processo de ensino da aluna, ações que
contribuam para a elevação da autoestima da aluna, consi-
derando que ela realiza com maior empenho as atividades
quando é elogiada. Isto nos indica que acredita que a forma
como procede com a aluna (a maneira como aborda a aluna;

capítulo 3 • 59
a forma como realiza as correções) favorece seu relaciona-
mento com ela, bem como estimula o bom desempenho da
aluna ao longo do ano letivo (CHINALIA, 2006, p. 116).

Esse trecho de análise do estudo vai ao encontro das discussões em torno


da importância de o professor conhecer as condições socioculturais e intelectu-
ais de seus alunos, para desenvolver ações pedagógicas que contribuam para a
motivação, a valorização da sua autoestima, pois, conforme destacamos acima,
a motivação é um atributo importante para o processo ensino-aprendizagem.
Além disso, conforme revela Poppovic (apud HAYDT, 2006, p. 69), o autoconcei-
to é a autoimagem de uma pessoa e essa influencia sua autoestima. Por isso, é
importante elogiar “[...] o empenho e o esforço do aluno, estimulando-o a pro-
gredir na aprendizagem”.
Não resta nenhuma dúvida de que respeitar e levar em consideração a histó-
ria pessoal do aluno é uma ferramenta que poderá auxiliar o professor na rea-
lização de um trabalho docente que oriente a conduta de seus alunos, que lhes
oportunize condições para que possam vislumbrar na educação escolar um ca-
minho para a superação das desigualdades, vivenciando, assim, experiências
na sala de aula que podem ser praticadas fora dela.
Então, refletir e buscar a efetivação de um trabalho docente que articule a
transmissão/assimilação dos conhecimentos sistematizados com as condições
externas da vida do aluno (seus interesses, suas necessidades, entre outros as-
pectos do indivíduo) oferecendo-lhes condições materiais, sociais, políticas,
culturais e afetivas, é uma condição necessária para possibilitar-lhes participa-
ção na construção de decisões políticas e governamentais. Por fim, sendo esse
um assunto de natureza complexa, sabe-se que as considerações aqui apresen-
tadas não se esgotam e, de forma alguma, tivemos a pretensão de dizer que a
responsabilidade pelo ensino é exclusivamente do professor.

3.3 Sala de aula: componentes indispensáveis ao processo didático

Tendo apresentado que a escola tem uma tarefa muito importante a cum-
prir em nossa sociedade – a democratização dos conhecimentos para garantir
uma cultura de base para todos os alunos, é importante trazermos, também,
algumas observações acerca dos componentes que integram o processo ensi-
no-aprendizagem.

60 • capítulo 3
Para muitos professores, são considerados componentes da ação didática:
a matéria, o professor e os alunos. Entretanto, sendo o processo de ensino uma
atividade complexa que envolve tanto condições externas como condições in-
ternas de situações didáticas, faz-se importante conhecer tais condições, pois
essas são imprescindíveis para a realização do trabalho docente (LIBÂNEO,
1994). Assim:

[...] o ensino com atividade específica da escola, em cujo


centro está a aprendizagem e o estudo dos alunos, isto é, a
relação cognoscitiva4 do aluno com as matérias de ensino; o
processo didático como mediação de objetivos e conteúdos,
tendo em vista a aprendizagem dos alunos (LIBÂNEO, 1994,
p. 127).

Segundo o autor, condições externas são aquelas vinculadas a determinan-


tes econômico-sociais, socioculturais, bem como a objetivos e normas estabe-
lecidas conforme interesses da sociedade e seus grupos, as quais afetam as de-
cisões didáticas. Condições internas dizem respeito à relação entre o aluno e a
matéria, com o objetivo deste apropriar-se dela com a mediação do professor.
Isso indica uma relação de reciprocidade entre:

4 Cognoscitivo - é um termo que deriva da palavra cognição, que significa: processo de aprender que envolve as
funções intelectuais dos alunos, tais como: atenção, memória, percepção, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento
e linguagem. Logo, Libâneo (1994) ao utilizar o termo relação cognoscitiva, está indicando a necessidade de existir
uma relação entre as funções intelectuais do aluno, dentre as quais se destaca o pensamento, com as matérias
selecionadas e organizadas pelo professor.

capítulo 3 • 61
Essa relação de reciprocidade entre matéria, professor e aluno não é suficien-
te, pois, conforme já descrevemos, as condições exteriores, por estarem
vinculadas às exigências da prática social, fazem com que sejam necessárias
algumas relações mais abrangentes entre professor e alunos, as quais não se
reduzem à sala de aula.
Nesse contexto, o processo de ensinar não se reduz simplesmente a uma
ação individual do professor, ao contrário, é organizado a partir das experiên-
cias do aluno, considerando suas necessidades e seus interesses. Além disso,
“o processo didático como totalidade abrangente implica vincular conteúdos,
ensino e aprendizagem a objetivos socio-políticos e pedagógicos e analisar cri-
teriosamente o conjunto de condições concretas que rodeiam cada situação di-
dática” (LIBÂNEO, 1994, p. 56).
Assim, o conteúdo:

[...] é o que está contido em um campo de conhecimento.


Envolve informações, dados, fatos, conceitos, princípios e
generalizações acumulados pela experiência do homem, em
relação a um âmbito ou setor da vida humana [...]. Os bens
culturais, quando adaptados, elaborados e organizados pe-
dagogicamente, compõem os conteúdos programáticos.
Estes constituem a fonte de onde o professor seleciona o
conjunto de informações que trabalhará com seus alunos
(TURRA, 1975 apud MARTINS, 2007, p. 78).

Então, para a realização do processo didático, é necessário que o professor


realize uma seleção e organização dos conteúdos. Sobre essa questão, Libâneo
(1994, p. 128) destaca que:

Não basta a seleção e organização lógica dos conteúdos para


transmiti-los. Antes, os próprios conteúdos devem incluir
elementos da prática dos alunos para torná-los mais signi-
ficativos, mais vivos, mais vitais, de modo que eles possam
assimilá-los ativa e conscientemente. Ao mesmo tempo, o
domínio de conhecimentos e habilidades visa, especifica-
mente, ao desenvolvimento das capacidades cognoscitivas

62 • capítulo 3
dos alunos, isto é, das funções intelectuais entre as quais se
destaca o pensamento independente e criativo.

[...]

Na escolha dos conteúdos de ensino, portanto, levam-se em


conta não só a herança cultural manifestada nos conheci-
mentos e habilidades, mas também a experiência da prática
social vivida no presente pelos alunos, isto é, nos problemas
e desafios existentes no contexto em que vivem. Além disso,
os conteúdos de ensino devem ser elaborados numa pers-
pectiva de futuro, uma vez que contribuem para a negação
das ações sociais vigentes, tendo em vista a construção de
uma sociedade verdadeiramente humanizada (LIBÂNEO,
1994, p. 130).

Com base nessa citação, é possível dizer que há uma amplitude e uma com-
plexidade em relação à organização e à seleção dos conteúdos. Diante disso, po-
demos dizer que a seleção e a escolha dos conteúdos exigem conhecimento do
assunto e do grupo de alunos, além de um embasamento seguro em termos da
estrutura da disciplina. Assim, para auxiliar o professor nessa tarefa complexa,
Martins (2007, p. 79), ressalta alguns aspectos que merecem ser considerados.
São eles: “a estrutura lógica da matéria, as condições psicológicas para a apren-
dizagem, bem como as necessidades socioeconômicas e culturais”.
Observamos, assim, que a matéria (a disciplina e seus conteúdos) é um com-
ponente do processo de ensino que não pode ser desenvolvido de forma isola-
da e/ou fragmentada, ou seja, apenas como um assunto que será apresentado
para o aluno como um saber sistematizado 5contemplado no currículo escolar.
É preciso desenvolvê-la de forma que haja articulação entre sua apropriação
como saber sistematizado e a reconstrução desse saber como aprendizagem
substancial para sua prática social. Faz-se, portanto, necessário propiciar aos
alunos, ao mesmo tempo, compreensão e significação das relações de uma
matéria (a disciplina) com os conhecimentos e as atividades que integram seu

5 Conhecimentos e/ou saberes sistematizados – correspondem a conceitos e termos fundamentais das ciências;
fatos e fenômenos da ciência e da atividade cotidiana; leis fundamen-tais que explicam as propriedades e as relações
entre os objetivos e fenômenos da realidade.

capítulo 3 • 63
cotidiano.
Mais uma vez, ressalta-se a necessidade de se desenvolver o processo didáti-
co mediante a ação recíproca de seus componentes (os objetivos, os conteúdos,
o ensino-aprendizagem, os métodos, os meios de organização, a avaliação),
bem como de estabelecer elos significativos com as experiências de vida dos
alunos, seus interesses e suas necessidades.

ATIVIDADE
1. A escola está produzindo um processo pedagógico que visa à superação das desigual-
dades?
2. Ao desenvolver o trabalho docente, os professores propiciam incentivos e condições
favoráveis para a aprendizagem? Como realizar ações como essas?
3. Leia o trecho a seguir (extraído do livro infantil: Vivinha, a baleiazinha, de Ruth Rocha).
Em seguida, elabore uma atividade em que você poderá trabalhar com seus alunos o
respeito às diferenças (de gênero, de raça, de intelectualidade, entre outras).

Vivinha, a baleiazinha
Vivinha, a baleiazinha vivia muito tristinha.
Escondidinha, coitadinha...
Não queria brincar, não queria folia.
Passava o dia na melancolia.
Mas, também, as outras baleias mexiam muito com ela. E por quê?
Veja você, porque Vivinha tinha nascido diferente. Vivinha tinha nascido estampadinha, cheia
de bolinhas, listrinhas, florzinhas.
A mãe de Vivinha dizia:
- Vai brincar, minha filha!
Mas, Vivinha ficava em casa curtindo sua mágoa.
Quando Vivinha aparecia na janela, as outras baleias buliam com ela:
- Olha a baleiazinha estampadinha...
- Olha a baleiazinha estampadinha...
Fragmento - Ruth Rocha

64 • capítulo 3
LEITURA RECOMENDADA
AQUINO, Julio Groppa. Diferenças e preconceitos na escola: alternativas teóricas e práti-
ca. Coordenação de Júlio Groppa Aquino. 2ª. edição. São Paulo: Summus, 1998.
Nesse livro, o autor discorre sobre a temática “preconceito versus cidadania”, a qual vem se
apresentando como uma das questões mais inquietantes da atualidade. Como proporcionar,
na trajetória escolar, uma convivência pacífica entre pessoas diferentes? Como compatibi-
lizar, na escola e na sala de aula, as igualdades democráticas com as particularidades hu-
manas e sociais, sejam elas de gênero, geração, étnicas, religiosas, cognitivas ou culturais?
Perante tais questões, esta coletânea de diferentes autores foi elaborada na tentativa de
instrumentalizar ações consequentes para se enfrentarem as diferenças e o preconceito no
dia a dia da escola.

ESTEBAN, Maria Teresa. O que sabe quem erra? Reflexões sobre avaliação e fracasso
escolar. 3ª. edição. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
A autora, nesse livro, apresenta um estudo que vai na contramão do projeto neoliberal he-
gemônico, travando uma discussão a favor da inclusão dos excluídos. Logo, desenvolve uma
discussão pedagógica e convida os envolvidos à ação, tornando complexas as leituras ma-
cropolíticas que não dão conta do que acontece no cotidiano das salas de aula. O ponto
inicial de discussão da autora nesse livro é que a avaliação é um dos maiores entraves ao su-
cesso escolar. É aí que aparece mais fortemente o processo de discriminação e exclusão do
qual são vítimas as crianças das classes populares, as afro-descendentes e demais minorias,
na verdade maiorias. São elas as reprovadas, as repetentes e as que “se evadem”. São elas
que vão sendo “encaminhadas” para o anunciado fracasso escolar. São elas as preparadas
para o futuro fracasso profissional e social, mas, em contrapartida, são elas também, que
denunciam o fracasso da sociedade que produz uma escola incapaz de lidar com a diferença.
Uma sociedade excludente não pode produzir uma escola includente.
Conforme evidenciamos nesse capítulo, a escola utilizou durante muito tempo (e ainda utili-
za) critérios para sua organização e seu funcionamento, os quais são fornecedores das desi-
gualdades e da exclusão. Entretanto, na atualidade, a escola deve atender a todos, fato esse
que traz a necessidade de refletir sobre as desigualdades no contexto escolar. Diante disso,
leia o texto abaixo e pense sobre a origem das desigualdades sociais e seus reflexos que
negativos no contexto escolar. Esse texto foi extraído na íntegra do site: http://www.unimeo.
com.br/artigos/artigos_pdf/2007/09_11_07/1.pdf. Acesso em: 20 de fevereiro de 2009.

capítulo 3 • 65
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BIANCHETTI, L., FREIRE I. M., Um olhar sobre a diferença: Interação, trabalho e cidadania.
Campinas, SP: Papirus, 1998.

CHINALIA, F. Relações pedagógicas no contexto escolar inclusivo: um olhar sobre a


deficiência mental. 2006. 155f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Meto-
dista de Piracicaba, Piracicaba, 2006.

FERREIRA, M. E. C.; GUIMARÃES, M. Educação inclusiva. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

HAYDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 8ª. edição. São Paulo: Ática, 2006.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

MARTINS, Pura Lúcia Oliver. Conteúdos escolares: a quem compete a seleção e a orga-
nização. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro (coord.). Repensando a didática. 25ª. edição.
Campinas: Papirus, 2007, p. 75-92.

MASSETO, Marcos. Didática: a aula como centro. 4ª. edição. São Paulo: FTD, 1997.

PIMENTA, Selma Garrido. Para uma ressignificação da didática In: PIMENTA, Selma Garrido.
(org.) Didática e a formação de professores. São Paulo: Cortez, 1997, p. 19-76.

RAYS, Oswaldo Alonso. Metodologia do ensino: cultura do caminho contextualizado. In: VEI-
GA, Ilma Passos Alencastro. Repensando a didática. 25ª. edição. Campinas, SP: Papirus,
2007, p. 93-108.

NO PRÓXIMO CAPÍTULO
A escolarização para a cidadania, ao contrário da escolarização para a exclusão e para a sub-
missão, requer (dentre outras) uma formação profissional eficiente e comprometida. Logo,
a formação de professores também é assunto de estudo e reflexões da Didática, pois a
educação escolar, ao acompanhar o processo de mudanças que a sociedade exige para uma

66 • capítulo 3
formação atualizada e significativa, exige algumas reflexões sobre o processo de formação
de professores. Esse será o assunto do próximo capítulo: discussões atuais sobre a didática
e a formação de professores.

capítulo 3 • 67
4
A didática na
formação de
professores –
repensando o
processo de ensino
e aprendizagem
4 A didática na formação de professores
- repensando o processo de ensino e
aprendizagem
Nesse capítulo, vamos estudar a Didática e o processo ensino-aprendiza-
gem, enfatizando conhecimentos indispensáveis aos professores. Também va-
mos analisar a importância da formação de professores inicial e continuada: o
professor reflexivo e, ainda, vamos refletir acerca de algumas contribuições de
Paulo Freire à prática docente: focalizando saberes para a formação de profes-
sores.

OBJETIVOS
A finalidade é que você possa analisar pontuações importantes em relação ao estudo da
Didática e do processo ensino-aprendizagem na formação de professores, refletir sobre as
discussões acerca da formação de professores, focalizando a formação inicial e a formação
continuada, e também, ao final desse capítulo, compreender algumas contribuições de Paulo
Freire à prática docente, destacando aquelas em que o autor comenta os conhecimentos
necessários ao professor na sua formação e atuação docente.
• Refletir acerca de algumas metodologias de ensino para o trabalho pedagógico;
• Descrever alguns recursos didático-metodológicos, destacando seus objetivos e sua
funcionalidade.

REFLEXÃO
Quantas vezes você se lembra de sua opinião ter sido levada em conta na escola? Como
seus professores conduziam o processo de ensino-aprendizagem? A formação de profes-
sores é uma questão que merece reflexão, já que a postura de um docente está relacionada
com sua formação profissional, bem como com sua busca pela formação continuada.

70 • capítulo 4
4.1 A didática e o processo ensino-aprendizagem: pontuações
necessárias à formação de professores

A Didática é uma disciplina pedagógica que integra os cursos de formação


de professores. Assume, ainda, o compromisso de discutir a transformação so-
cial, a realidade cultural, a política educacional, bem como a permanência dos
alunos na escola, buscando práticas pedagógicas que atendam com eficiência
a diversidade humana.
Logo, antes de trazermos algumas considerações especificamente sobre a
formação de professores, cabe retomar um pouco a preocupação da Didática
com seu objetivo de estudo: o processo ensino e aprendizagem, destacando a
importância de concebê-lo como uma prática social, pois, como tal, “o proces-
so ensino-aprendizagem é um processo intencional, portanto, uma atividade
humana desenvolvida em ação conjunta pelos atores sociais nela envolvidos”
(CALDEIRA e AZZI, 2003, p. 99).
Segundo as autoras, no processo ensino-aprendizagem há uma relação
entre seus sujeitos: professor e aluno e essa relação não se esgota, pois há um
elemento básico que deve também ser considerado: o conhecimento. A autora
mostra-se atenta para o fato de que, na formação docente, é importante enten-
der que, no processo formal de ensino-aprendizagem (a educação escolar), en-
sina-se e aprende-se algo que é identificado como o conteúdo, ou seja, o saber
escolar (sistematizado e constituído cientificamente).
Ainda segundo as autoras, é importante considerar que o ato de ensinar não
propicia apenas a aprendizagem do conteúdo proposto no currículo escolar,
pois o professor parte de uma proposta de trabalho que visa não simplesmente
à reprodução do conteúdo (a simples transmissão do conteúdo), mas, sim, a
uma proposta em que o processo ensino-aprendizagem irá se traduzir para o
aluno em discussões e experimentações da própria realidade, estimulando a
aprendizagem democraticamente (CALDEIRA e AZZI, 2003).
Essa perspectiva de ensino vai ao encontro do desenvolvimento de uma prá-
tica pedagógica em que o professor articula o processo de ensino atendendo à
função social e educativa que a escola possui.
Fica evidente, portanto, a importância de os professores, em seu proces-
so de formação profissional, conhecerem e estudarem as teorias de aprendi-
zagem, no sentido de reunir informações sobre as teorias de aprendizagem e
sobre as atividades escolares, as quais são necessárias para a realização do tra-

capítulo 4 • 71
balho docente, além de analisarem os aspectos que envolvem a aprendizagem
escolar (as teorias de aprendizagem e as teorias de ensino), no sentido de elimi-
nar ações docentes descontextualizadas (aquelas em que o conteúdo é apenas
transmitido de forma passiva e desvinculado da vida cotidiana dos alunos).

4.2 A formação de professores inicial e continuada – o professor


reflexivo

Paralelamente às preocupações apresentadas, há muita discussão em rela-


ção à necessidade de se terem profissionais capacitados para a tarefa de edu-
car. Nesse sentido:

A formação do professor abrange, pois, duas dimensões: a


formação teórico-científica, incluindo a formação acadêmi-
ca específica nas disciplinas em que o docente vai especia-
lizar-se e a formação pedagógica, que envolve os conheci-
mentos da Filosofia, Sociologia, História da Educação e da
própria Pedagogia que contribuem para o esclarecimento do
fenômeno educativo no contexto histórico-social; a forma-
ção técnico-prática, visando à preparação profissional espe-
cífica para a docência, incluindo a didática, as metodologias
específicas das matérias, a psicologia da educação, a pesqui-
sa educacional e outras.

A organização dos conteúdos da formação do professor em


aspectos teóricos e práticos de modo algum significa consi-
derá-los isoladamente. São aspectos que devem ser articula-
dos. As disciplinas teórico-científicas são necessariamente
referidas à prática escolar, de modo que os estudos especí-
ficos realizados no âmbito da formação acadêmica sejam re-
lacionados com os de formação pedagógica que tratam das
finalidades da educação e dos condicionantes históricos,
sociais e políticos da escola. Do mesmo modo, os conteúdos
das disciplinas específicas precisam ligar-se às suas exigên-
cias metodológicas. As disciplinas de formação teórico-prá-
tica não se reduzem ao mero domínio de técnicas e regras,

72 • capítulo 4
mas implicam também os aspectos teóricos, ao mesmo tem-
po que fornecem à teoria os problemas e desafios da práti-
ca. A formação profissional do professor implica, pois, uma
contínua interpenetração entre teoria e prática, a teoria vin-
culada aos problemas reais postos pela experiência prática
orientada teoricamente. Nesse entendimento, a Didática se
caracteriza como mediação entre as bases teórico-científicas
da educação escolar e a prática docente. Ela opera como uma
ponte entre o “o quê” e o “como” do processo pedagógico
escolar. [...] Para isso recorre às contribuições das ciências
auxiliares da Educação e das próprias metodologias especí-
ficas. É, pois, uma matéria de estudo que integra e articula
conhecimentos teóricos e práticos obtidos nas disciplinas
de formação acadêmica, formação pedagógica e formação
técnico-prática, provendo o que é comum, básico e indispen-
sável para o ensino de todas as demais disciplinas de conte-
údo.

[...] o domínio das bases teórico-científicas e técnicas e sua


articulação com as exigências concretas do ensino permitem
maior segurança profissional, de modo que o docente ganhe
base para pensar sua prática e aprimore sempre mais a qua-
lidade do seu trabalho (LIBÂNEO, 1994, p. 27-28).

capítulo 4 • 73
Desde a década de 80 (do século XX), as discussões sobre a formação de pro-
fessores se intensificaram em decorrência das mudanças que permearam (e
ainda permeiam) o pensamento educacional e, consequentemente, a formação
de professores. Então, na atualidade (mais precisamente, desde a década de 90
do século XX), a formação de professores é considerada um processo contínuo
de profissionalização, sendo a forma ção inicial apenas o primeiro momento. A
profissão docente, nos dias de hoje, exige que o professor:

lide com um conhecimento em construção – e não mais


imutável – e que analise a educação como um compromisso
político, carregado de valores éticos e morais, que conside-
re o desenvolvimento da pessoa e a colaboração entre iguais
e que seja capaz de conviver com a mudança e a incerteza
(MIZUKAMI, 2002, p. 12).

Com base na citação, podemos dizer que o conhecimento profissional do


professor deve estar em constante construção e aperfeiçoamento, para que
acompanhe o desenvolvimento acelerado do conhecimento científico, na
cultura e na arte, bases do conhecimento escolar e das estruturas materiais e
institucionais da sociedade. Também deve “acompanhar a evolução dos co-

74 • capítulo 4
nhecimentos específicos da formação pedagógica, o que o capacita a intervir e
refletir sobre sua própria prática” (CALDEIRA e AZZI, 2003, p.104).
Outra consideração importante em relação à formação de professores é a
de que essa formação não pode ser considerada como um âmbito autônomo de
conhecimento e decisão, pois, conforme revela Perez Gómez (1992), a forma-
ção de professores é determinada profundamente por concepções de escola e
de ensino, de conhecimento e de sua produção, transmissão e aprendizagem,
de relação teoria-prática, de cultura e de sociedade.
De forma geral, a formação de professores que estamos buscando se fun-
damenta em uma perspectiva que amplia e ressignifica os modelos de forma-
ção profissionais iniciais (aqueles que visavam ao domínio dos conteúdos, das
disciplinas e as técnicas para transmiti-los) para aderir a uma formação profis-
sional contemporânea, que visa à formação de um profissional cidadão “nas
diversas instâncias em que a se cidadania se materializa: democrática, social,
solidária, igualitária, intercultural e ambiental” (MIZUKAMI, 2002, p 12).
Aprender a ser professor, nesse contexto, não é, portanto, tarefa que se con-
clua após estudos de um aparato de conteúdo e de transmissão deles. É uma
aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que sejam efeti-
vamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma prática reflexi-
va competente. Exige ainda que, além de conhecimentos, sejam trabalhadas
atitudes, as quais são consideradas tão importantes quanto os conhecimentos
(MIZUKAMI, 2002, p. 12).
Diante das considerações que apresentamos até aqui, é possível observar
que as discussões e propostas sobre a formação de professores têm permeado
a questão da defasagem existente entre a formação acadêmica (teoria) e a rea-
lidade escolar (prática), destacando a necessidade de se repensar a separação
entre a teoria e a prática, ainda presente em alguns cursos de formação de pro-
fessores.
Trazemos para essa conversa alguns estudos sobre a formação de professo-
res pesquisadores e reflexivos, focalizando a teoria e a prática como indissociá-
veis, ou seja, como elementos que se complementam.
O conceito de professor reflexivo remete à ideia de os professores buscarem
investigar e pesquisar a prática docente, visando à realização de uma prática
pedagógica que atenda às problemáticas da sala de aula, integrando sua criati-
vidade e seu conhecimento técnico. Logo:
O ensino reflexivo implica que os professores, em vez de refletirem apenas

capítulo 4 • 75
sobre a aplicação em suas salas de aulas das teorias geradas fora delas, criti-
quem e desenvolvam suas teorias práticas à medida que refletem, sozinhos e
em conjunto na ação e sobre ela, acerca de seu ensino e das condições sociais
que modelam suas práticas pedagógicas (ZEICHNER, 1993 apud MIZUKAMI,
2002, p. 18).
Segundo Zeichner (1993 apud MIZUKAMI, 2002), o termo prática reflexiva
teve origem com Dewey.
Na discussão sobre a formação de professores, destaca-se o nome de Donald
Schön, filósofo e pedagogo norte-americano. O autor discute dois modelos de
formação profissional, evidenciando a importância de formar professores re-
flexivos, propondo contribuições interessantes acerca de um repensar sobre a
concepção de formação de professores (SCHÖN apud CALDEIRA e AZZI, 2003).
Nessas contribuições, o primeiro modelo de formação profissional anali-
sado por Schön é o da racionalidade técnica, por meio da qual o autor explica
que a atividade profissional consiste na resolução de problemas instrumentais,
rigorosamente discutidos pela aplicação da teoria e da técnica científica. Ao
estudar esse modelo-formação, o autor revela que “a teoria consiste num con-
junto de princípios gerais e conhecimentos científicos, e a prática, na aplica-
ção rigorosa de teorias e técnicas científicas” (SCHÖN apud CALDEIRA e AZZI,
2003, p. 104). Nessa perspectiva, a teoria é colocada em primeiro plano, ou seja,
primeiro os professores adquirem os conhecimentos dos princípios, das leis
e das teorias que esclarecem o processo de ensino-aprendizagem. Apenas em
um segundo momento (no futuro, ou seja, após esse período de formação pro-
fissional), esses princípios, essas leis e essas teorias são empregadas na prática
escolar.

CONEXÃO
No Brasil, há vários estudos que abordam a formação de professores reflexivos. Nesse sen-
tido, leia o artigo: A construção da identidade do professor como profissional reflexivo. Nele,
o autor apresenta a referida temática, a partir da revisão de alguns dos autores mencionados
nesse capítulo, tais como: Zeichner (1993) e Schön (1995). Esse artigo encontra-se dispo-
nível em: http://www.ufpi.br/mesteduc/eventos/iiencontro/GT-1/GT-01-23.htm

Cabe ressaltar aqui que os limites desse modelo se concentram no fato de

76 • capítulo 4
que as teorias são encaradas como um instrumental eficiente, entretanto, no
cotidiano da sala de aula, o professor, muitas vezes, depara-se com situações
com as quais não aprendeu a lidar durante a formação, pois essas situações es-
tão além dos referenciais teóricos e técnicos. Também, “se encontram no fato
de não levar em conta os aspectos do contexto mais amplo em que as práticas
educativas estão inseridas” (MIZUKAMI, 2002, p. 14).
Outro modelo estudado por Schön (apud CALDEIRA e AZZI, 2003, p. 104),
é o da racionalidade prática, que, segundo o autor, “representa uma tentativa
de superar a relação linear e mecânica entre o conhecimento científico-técni-
co e a prática escolar”. Nessa perspectiva, analisa-se a prática dos professores,
buscando compreender como fazem uso do conhecimento científico, como
enfrentam as diferentes situações (complexas, singulares, imediatas, conflitu-
osas) que emergem na sala de aula.
Dessa forma, nesse segundo modelo, Schön destaca que a formação básica
(ou inicial) passa a ser vista como um dos momentos do processo formativo,
ressaltando a formação continuada como uma formação tão necessária quanto
a inicial. Logo, para Schön (1995), a formação do cente não deve ocorrer apenas
por acumulação de cursos e técnicas, mas também por meio da interligação
de um trabalho permanente de reflexão crítica e de construção de uma identi-
dade profissional docente. Para ele, a reflexão é vista como elemento capaz de
promover a interligação necessária entre a formação inicial, a continuada e as
experiências vividas pelos professores.
Assim, a concepção do desenvolvimento de uma prática reflexiva é explica-
da por Schön (1995) a partir de três diferentes aspectos que integram o pensa-
mento prático. São eles:
• Reflexão na ação: evidencia-se no saber fazer. Permeia os conhecimen-
tos que um professor possui e/ou alcança ao longo de sua experiência
ou reflexões profissionais vivenciadas ao longo da realização de seu tra-
balho.
• Reflexão sobre a ação: é pensar sobre o que faz ao mesmo tempo em
que atua.
• A reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação: é uma análise realiza-
da pelo professor, a posteriori, sobre sua ação. A partir dessa análise, o
professor pode analisar sua prática e reconstruí-la a partir da compre-
ensão de tal análise.
O autor destaca que a reflexão na ação proporciona ao professor a pesquisa

capítulo 4 • 77
no contexto prático (uma atuação como pesquisador) e que, agindo dessa for-
ma, ele reúne o pensar e o fazer, elaborando uma decisão que posteriormente
terá que converter em ação. Nesse contexto, podemos dizer que o professor re-
flexivo é aquele que reflete sobre as suas incertezas e sobre as incertezas cog-
nitivas de seus alunos, articulando complexidades e resolvendo problemas
práticos, integrando com criatividade o conhecimento técnico. Além disso, é
aquele que conduz seus alunos a refletirem sobre o conhecimento, despertan-
do a discussão, a curiosidade, bem como o interesse pela busca de novas ideias
e conceitos.
Não há dúvida de que as preocupações que envolvem a temática de forma-
ção de professores permeiam tanto a formação inicial quanto a formação con-
tínua. Então, recorrendo ainda a Schön (1995), o autor destaca que a formação
inicial apresenta alguns entraves (exigências de conhecimentos universitários
e burocracias curriculares) para a formação de um profissional prático refle-
xivo. Por isso, defende a formação contínua dos professores, acreditando que
nela os professores podem refletir e pensar criticamente sobre sua prática. Ex-
plica que, para isto, na formação contínua, as ativida des desenvolvidas devem
solicitar do profissional em ação a observação e o registro de suas ações peda-
gógicas, para que seja possível propor a reestruturação de estratégias de ações
diante dos problemas detectados.
Outro autor que também traz discussões importantes sobre a formação
continuada é Nóvoa (1992 apud PEREIRA, 2000, p. 48), ao revelar q ue para ele
“[...] é fundamental que se aborde a formação continuada a partir de três eixos:
a pessoa do professor e sua experiência; a profissão e seus saberes, a escola e
seus projetos”.
Ainda no que diz respeito especificamente à formação continuada, Candau
(1996 apud MIZUKAMI, 2002) menciona que, durante muito tempo, ela foi de-
senvolvida por meio de um modelo de ensino clássico – aquele em que o papel
da faculdade ou da universidade corresponderia à produção de conhecimentos,
os quais deveriam ser aplicados e socializados didaticamente pelos professores
do Ensino Fundamental e Médio. Tal modelo, ainda segundo a autora, caracte-
rizava-se, portanto, como uma reciclagem desses profissionais, entendida por
eles como uma atualização de formação. Mas, de acordo com as perspectivas
atuais, a formação continuada deve:

[...] buscar novos caminhos de desenvolvimento, deixando

78 • capítulo 4
de ser reciclagem, como preconizava o modelo clássico, para
tratar de problemas educacionais por meio de uma reflexibi-
lidade crítica sobre as práticas pedagógicas e de uma perma-
nente (re)construção da identidade do docente (MIZUKAMI,
2002, p. 28).

Além disso, segundo Pereira (2000), a formação continuada do professor,


com base nas perspectivas atuais, rompe com a visão anterior de cursos de reci-
clagem (conforme mencionamos no trecho acima), pois reforça “[...] a ideia de
legitimidade de um saber, o “saber docente”, que se constrói a partir do ingres-
so dos sujeitos no mercado de trabalho, ou seja, reafirma-se a autenticidade de
uma formação que se processa em um contexto prático” (PREREIRA, 2000, p.
50).
Ao mesmo tempo, cabe mencionar que apenas a inserção dos professores
nos cursos de formação continuada não garante uma prática reflexiva para a
formação de professores, pois “é preciso considerar os aspectos globais presen-
tes nas diferentes práticas sociais que ocorrem no âmbito escolar” (MIZUKA-
MI, 2002, p. 29).
Também conforme aponta os autores Carr e Kemmis (1988 apud CALDEI-
RA e AZZI, 2000) em seus estudos sobre a formação de professores, ainda há
grande desafio para a compreensão entre a teoria e a prática. Explicam que tal
desafio reside não apenas em melhorar a eficácia da prática dos produtos das
atividades teóricas, mas também em melhorar as práticas das teorias que os
professores utilizam para conceituar suas próprias atividades. Dessa forma,
consideram que há possibilidade de reduzir a distância entre a teoria e a prá-
tica, que é um dos objetivos centrais da formação de professores, ao dizerem
que:

Caminhar nessa direção implica, para nós, professores, uma


preocupação tanto com a natureza do conhecimento a ser
apropriado pelos alunos, futuros professores, como o desen-
volvimento de sua capacidade de reflexão, e envolve, pelo ca-
ráter intencional do processo de ensino-aprendizagem, tam-
bém preocupações com opções ético-políticas (CALDEIRA e
AZZI, 2000, p. 106).

capítulo 4 • 79
De modo geral, verificamos que, desde as últimas décadas do século XX,
a literatura vem apontando que a formação inicial é apenas um momento da
formação docente e não o único, como antes. Logo, adentramos o século XXI,
fortalecendo esse pensamento e ampliando a ideia de que a formação continu-
ada deve ser desenvolvida de modo a contribuir com o entendimento de que a
formação profissional do professor não termina com a sua diplomação na gra-
duação, mas completa-se na realização de seu trabalho docente. Além disso,
segundo Santos (apud PEREIRA, 2000, p. 49): “é de fundamental importância
compreender que a formação do professor começa antes mesmo de sua forma-
ção acadêmica e prossegue durante toda sua atividade profissional”.
Em suma, observamos a importância de os professores exercerem um pro-
cesso de reflexão sobre as ações pedagógicas que desenvolvem em sala de aula
para melhorar a eficácia delas, pois isso poderá possibilitar-lhes compreender,
interpretar e explicar a realidade da sala de aula, da escola e do ensino e, ao
mesmo tempo, intervir nela. Uma formação profissional que caminha nessa
direção pode contribuir para que seja possível reduzir distâncias entre a teoria
e a prática, que é um dos objetivos centrais da formação de professores. Além
disso, conforme ressalta Mizukami (2002, p.31):

Coerentemente com o novo perfil do professor, o conceito de


formação docente é relacionado ao de aprendizagem perma-
nente, que considera os saberes e as competências docentes
como resultados não só da transformação profissional e do
exercício da docência, mas também da aprendizagem reali-
zada ao longo da vida, dentro e fora da escola.

4.3 O processo de ensino e aprendizagem e as metodologias de


ensino: estruturando o processo

Daremos início à temática – planejamento – trazendo uma breve reflexão


sobre o seu conceito, num sentido amplo e geral.

O planejar foi uma realidade que acompanhou a trajetória


histórica da humanidade. O homem sempre sonhou, pen-
sou e imaginou algo na sua vida. O homem primitivo, no seu

80 • capítulo 4
modo e habilidade de pensar, imaginou como poderia agir
para vencer os obstáculos que se interpunham na sua vida
diária. Pensava as estratégias de como poderia caçar, pescar,
catar frutas e de como deveria atacar seus inimigos (MENEN-
GOLA e SANT’ANNA, 2002, p. 15).

Com base na citação acima, é possível observar que a ação de planejar está
presente na vida das pessoas nos seus mais variados momentos, constituindo-
se um referencial organizacional para suas ações (ao planejar, as pessoas pen-
sam sobre as possibilidades e/ou a inviabilidade para se executar algo). Além
disso, podemos dizer que, em qualquer setor da atividade humana, o trabalho
planejado contribui para atingir objetivos desejados, superar dificuldades e
controlar a improvisação.
De acordo com Menengola e Sant’Anna (2002), o planejamento na escola
vem sofrendo certo descrédito e insatisfação por parte dos professores. O autor
explica que tal essa situação pode estar relacionada, por um lado, ao fato de
existir carência de objetivos claros e bem definidos em relação à importância
do ato de planejar, fato esse que acaba dando margem para que os professores
percebam o planejamento apenas como algo burocrático ou como certos mo-
dismos pedagógicos e, por outro lado, pelo fato de as escolas solicitarem aos
professores planejamentos muito complexos e com pouca flexibilidade na sala
de aula.
Para evitar esses problemas, o autor alerta para a questão de que “o ato de
planejar deve estar destituído de sofisticações , para isso, ele deve exigir obje-
tividade, simplicidade, validade e funcionalidade”. Deve, ainda, ser entendido
como instrumento para o professor e para o aluno, em especial. Posteriormen-
te é preciso que o professor entenda que o planejamento visa ao atendimento
aos objetivos da escola ou dos seus setores pedagógico-administrativos (ME-
NENGOLA e SANT’ANNA, 2002, p.10).
Dessa forma, a educação, o ensino e toda a ação pedagógica devem ser pen-
sados e planejados, visando a propiciar melhores condições de vida às pessoas.
Nessa perspectiva, ainda segundo Menengola e Sant’Anna (2002, p.21), todo
planejamento requer alguns elementos, dentre os quais destacam-se:
• conhecimento da realidade, das suas urgências, necessidades e tendên-
cias;

capítulo 4 • 81
• definição de objetivos claros e significativos;
• determinação de meios e recursos possíveis, viáveis e disponíveis;
• estabelecimento de critérios e de princípios de avaliação para o proces-
so de planejamento e execução;
• estabelecimento de prazos e etapas para a sua execução.

Assim, planejar “é pensar sobre aquilo que existe, sobre o que se quer al-
cançar, com que meios se atingir e como avaliar o que se pretende atingir” (ME-
NENGOLA e SANT’ANNA, 2002, p.21).
O planejamento do processo educativo, segundo a análise de Menengola e
Sant’Anna (2002), envolve um processo de análise, reflexões, previsão e toma-
das de decisões no sentido de contribuir para a formação de pessoas autôno-
mas e críticas, tornando-as capazes de escolher seus caminhos e, embora parta
de uma realidade e seja dirigido pelas normas e necessidades da sociedade,
não pode instituir princípios mistificadores ou dominadores.

[...] podemos dizer que o planejamento educacional deve ter


como ponto de partida o homem como realidade primeira
e fundamental e a sociedade constituída de homens, carac-
terizada por toda uma problemática social. O planejamento
deve refletir sobre os princípios educacionais que são capa-
zes de orientar o homem, sendo este entendido como ser
que constitui e dá sentido ao universo. Deve refletir sobre
que tipo de educação é necessária para a integração e desen-
volvimento do homem e da sociedade. Uma sociedade que
se ajuste às necessidades dos seres humanos, respeitando e
defendendo os direitos dos homens. Um planejamento que
tente desenvolver nas pessoas o sentido da vida, o desejo de
querer viver e de permitir viver, que devolva a liberdade e o
espírito crítico, a consciência de viver e o auto-respeito. Um
planejamento que tenha, como ponto de apoio, o homem e
o seu viver, os valores e as necessidades humanas, os proble-
mas e o desejo de vencer, enfim, o homem como um ser que
vive a sua vida (MENENGOLA e SANT’ANNA, 2002, p.28).

De modo geral, os autores revelam a questão de que o planejamento educa-

82 • capítulo 4
cional não pode ser compreendido como algo desvinculado das relações entre
escola, educação e sociedade.
Abordada sob a perspectiva de um processo, a educação não pode ser desen-
volvida isoladamente, ou seja, fora do contexto nacional, regional e comunitá-
rio da escola na qual o aluno está inserido. Por isso, “todo processo educacional
requer um planejamento em termos nacionais, estaduais, regionais, comunitá-
rios e requer um outro específico de ensino relativo às diferentes disciplinas e
conteúdos” (MENENGOLA e SANT’ANNA, 2002, p.30).
Nesse contexto, o planejamento educacional é entendido como um instru-
mento necessário para se cumprirem as finalidades da educação. Isto porque é
o instrumento básico da educação, para que todo processo educacional desen-
volva sua ação, num todo unificado, integrando todos os recursos e direcionan-
do toda a ação educativa. Então:

[...] somente com a elaboração do planejamento se pode es-


tabelecer o que se deve realizar para que essas finalidades
possam ser atingidas e ver como atingir os objetivos a que
se propõe a educação (MENENGOLA e SANT’ANNA, 2002,
p.31).

Por isso, o sistema educacional envolve um planejamento em que são elabo-


rados Planos Nacionais, Estaduais e Regionais de Educação, os quais, ao serem
formulados, estabelecem as finalidades da educação, a partir de uma filosofia
de valores educacionais. Reflete, ainda, a política de educação adotada. É com
base na elaboração desse planejamento do sistema educacional que as escolas
devem elaborar e organizar o planejamento de currículo e de ensino (MENEN-
GOLA e SANT’ANNA, 2002; HAYDT, 2006).
Assim, na esfera educacional e do ensino, há vários níveis de planejamen-
tos, que variam em abrangência e complexidade. A seguir, veremos em que con-
siste a elaboração dos planos curriculares e de ensino, bem como suas caracte-
rísticas e complexidade.

4.4 Recursos didático-metodológicos para a efetivação do processo


de ensino e aprendizagem

Recorrendo a outra estudiosa do assunto, Haydt (2006), encontramos uma

capítulo 4 • 83
visão similar à de Menengola e Sant’Anna (2002). Para a autora, planejamen-
to pode ser definido como “um processo mental que envolve análise, reflexão,
previsão” (HAYDT, 2006, p. 94). Mais uma vez, observamos que o planejamento
contempla alguns aspectos, tais como: análise de uma dada realidade, reflexão
sobre as condições dessa realidade e a previsão de formas alternativas de ação
para superar dificuldades e/ou alcançar os objetivos esperados. Isso significa
que o planejamento educacional se constitui num processo contínuo, cuja pre-
ocupação é traçar diretrizes para possibilitar o desenvolvimento da educação,
bem como para buscar maneiras adequadas para seguir essas diretrizes, no
sentido de atender tanto aos alunos quanto à sociedade.
O resultado desse processo pode dar origem a um plano, que pode ser defi-
nido como o resumo inicial das ideias resultantes do processo mental de plane-
jar, podendo configurar-se ou não sob a forma escrita (HAYDT, 2006).
Temos, aqui, dois conceitos importantes e que não podem ser confundidos
pelos professores. Tanto Menengola e Sant’Anna (2002) como Haydt (2006)
explicam que o planejamento educacional é um processo e, como tal, é ativo
e dinâmico, pois, ao envolver algumas operações mentais, tais como análise,
reflexão, previsão, seleção, definição, estruturação e organização, resulta na
elaboração escrita de um plano educacional. Logo, o plano educacional pode
ser definido como o resultado dessas operações mentais de planejamento, ori-
ginando assim um esboço das conclusões desse processo, não sendo, portanto,
algo fechado e definitivo. “Cabe à escola, partindo de sua realidade e de suas
necessidades e possibilidades, estruturar e organizar os seus planos para aten-
der a seu público- alvo (MENENGOLA e SANT’ANNA, 2002, p. 36).

4.4.1 Planejamento escolar e planejamento curricular

Planejamento escolar
Para o bom funcionamento de uma escola, deve haver um planejamento
geral das atividades (previsão de objetivos e ações) que serão desenvolvidas tan-
to pelos profissionais que irão exercer as atividades pedagógicas, quanto por
aqueles que irão desenvolver ações administrativas (HAYDT, 2006).
O processo de tomada de decisões do planejamento escolar deve contar
com a participação de toda a comunidade escolar (professor, funcionários, pais
e alunos), pois resultará em um plano de ensino que deverá ser executado por
toda a equipe escolar. Logo, o planejamento escolar é um processo de decisão

84 • capítulo 4
sobre a atuação concreta dos professores, no cotidiano de seu trabalho pedagó-
gico, envolvendo ações e situações, em constantes interações entre professor e
alunos e entre os próprios alunos.
As etapas que geralmente são seguidas para o processo de planejamento ge-
ral das atividades de uma escola são:
1. Sondagem e diagnóstico da realidade da escola: é o momento de levan-
tamento de dados e fatos importantes da realidade em que a escola está
inserida, para que se possa chegar a um diagnóstico das conclusões so-
bre as suas reais condições. Para isso, são observadas as características
da comunidade; as características da clientela escolar; o levantamento
dos recursos humanos e materiais disponíveis e a avaliação da escola
como um todo.
2. Definição dos objetivos e das prioridades da escola.
3. Proposição da organização geral da escola no que diz respeito a:
• quadro curricular e carga horária dos diversos componentes do
currículo;
• calendário escolar;
• critério de agrupamentos dos alunos;
• definição do sistema de avaliação e seus critérios.
4. Elaboração e plano de curso contendo as programações das atividades
curriculares.
5. Elaboração do sistema disciplinar da escola, com a participação de to-
dos os seus membros, inclusive do corpo discente.
6. Atribuição de funções a todos os participantes da equipe escolar: dire-
ção, corpo docente, corpo discente, equipe pedagógica, equipe admi-
nistrativa, equipe de limpeza, e outros (HAYDT, 2006, p. 97).

Planejamento curricular
O planejamento curricular consiste na previsão dos diversos componentes
curriculares (as disciplinas), com a definição dos objetivos gerais e a previsão
dos conteúdos programáticos de cada componente (HAYDT, 2006).
Na elaboração do planejamento curricular, o primeiro passo é a definição
clara e precisa da concepção filosófica que irá nortear os fins e objetivos da ação
educativa, pois é a partir da proposta de definição dos objetivos desejados que
os critérios de seleção dos conteúdos serão selecionados. Um aspecto impor-
tante a ser lembrado é o de que os professo res, ao selecionarem os conteúdos,

capítulo 4 • 85
deverão pensar em conteúdos significantes e funcionais (conforme já mencio-
namos no capítulo três).
Outro aspecto a ser lembrado diz respeito à inter-relação entre os compo-
nentes (as disciplinas) que irão integrar o currículo escolar de uma mesmo ano
(ordenação horizontal) e a sequência desses componentes ao longo das diver-
sos anos, isto é, ao longo do curso (ordenação vertical). Reafirmando esse as-
pecto, nas palavras de Martins (2007, p. 79), para a organização sequencial dos
conteúdos, recomenda-se a observação de alguns critérios, tais como “sequên-
cia lógica e coerente com a estrutura e o objetivo da disciplina; gradualidade na
distribuição adequada em pequenas etapas, considerando a experiência ante-
rior do aluno; continuidade que proporcione a articulação entre os conteúdos;
interligação entre as diversas disciplinas do currículo”. Isso significa que os
componentes curriculares (as disciplinas e a complexidade de seu conteúdo)
desenvolvidos deverão permitir aos alunos evolução e reconstrução dos conhe-
cimentos de forma coerente, ou seja, do simples para o complexo.
A organização do plano curricular deve ser seguida pelas diretrizes fixadas
pelo Conselho Federal de Educação, observando-se os componentes (discipli-
nas) mínimos e os obrigatórios estabelecidos (núcleo comum). É por meio do
Conselho Estadual de Educação, no que se refere aos componentes, que a es-
cola pode selecionar as disciplinas que comporão seu currículo escolar (parte
diversificada do currículo).
A escola também pode propor ao Conselho Estadual de Educação de seu Es-
tado outros componentes para integrar a parte diversificada do currículo. Caso
sejam aprovados, poderão ser incluídos no currículo escolar.
Assim, na elaboração do plano curricular, devem-se considerar as diretrizes
básicas do sistema educacional a que pertence, bem como as características de
sua clientela e as condições de trabalho que se apresentam.

4.4.2 Planejamento didático ou de ensino

O planejamento de ensino consiste na previsão de ações e procedimentos


que o professor irá realizar com seus alunos. Envolve ainda a organização das
atividades docentes e das experiências de aprendizagem, no intuito de atingir
os objetivos educacionais estabelecidos.
No que se refere ao aspecto didático, o ato de planejar é constituído por um
processo que envolve operações mentais, permitindo ao professor prever for-

86 • capítulo 4
mas de agir e organizar a ação didática. Vejamos, então, quais são essas opera-
ções mentais, segundo Haydt (2006):
• analisar as características dos alunos em questão (suas aspirações, ne-
cessidades e possibilidades);
• estabelecer os objetivos educacionais considerados mais adequados
para os alunos em questão;
• selecionar e organizar os conteúdos a serem assimilados, distribuindo
-os de acordo com o tempo disponível para seu desenvolvimento;
• prever e organizar os procedimentos do professor, bem como as ativida-
des e experiências de construção do conhecimento consideradas mais
adequadas para atingir os objetivos pretendidos;
• prever e selecionar os recursos de ensino mais adequados para estimu-
lar a participação dos alunos nas atividades de aprendizagem;
• prever os procedimentos de avaliação mais condizentes com os objeti-
vos propostos.
Ainda, segundo a autora, o resultado do processo de planejamento da ação
docente é o plano didático, o qual geralmente assume a forma de um documen-
to escrito, pois é o registro de previsão das atividades dos professores e dos alu-
nos. É sempre importante que o professor registre por escrito as previsões de
suas atividades, pois, quando ficam apenas no plano mental (das ideias), ele
corre o risco de se perder ao executar o que planejou, podendo, assim, esquecer
os procedimentos previstos. Também descreve a necessidade de o professor
escrever seu próprio plano, entendendo que o plano feito por outros deve ape-
nas servir de fonte de ideias e não de copias na integrais do trabalho. Por fim,
é importante lembrar que o plano é um instrumento referencial, um roteiro,
cabendo ao professor que o esboçou enriquecê-lo com suas habilidades e cria-
tividade (HAYDT, 2006).
Tendo ficado clara a importância do planejamento didático, vejamos suas
funções:
• Prever as dificuldades que podem surgir durante a ação docente, visan-
do a superá-las em um curto espaço de tempo.
• Evitar a repetição de ações habituais e mecânicas de cursos e aula..
• Adequar o trabalho didático aos recursos disponíveis e às condições re-
ais dos alunos.
• Adequar os conteúdos, as atividades e os procedimentos de avaliação
aos objetivos desejados.

capítulo 4 • 87
Assegurar a distribuição adequada do trabalho em relação ao tempo dispo-
nível (HAYDT, 2006).
A autora destaca que o planejamento didático ou de ensino permeia três
tipos de planejamento, os quais serão definidos a seguir, de acordo com o seu
nível de especificidade. São eles:
Planejamento de curso: é a previsão dos conhecimentos e das atividades
que serão desenvolvidas com uma determinada turma ao longo de um semes-
tre ou durante o ano letivo. Para esse processo de previsão, deve-se considerar
a complexidade desses conhecimentos e dessas atividades mediante a série e/
ou ano escolar, a partir da faixa etária dos alunos, bem como de suas condições
de aprendizagem.
Em geral, o planejamento de curso segue os seguintes critérios:
1. Levantar dados sobre as condições dos alunos, fazendo uma sondagem
inicial.
2. Propor objetivos gerais e definir objetivos específicos a serem atingidos
durante o período letivo estipulado.
3. Indicar conteúdos a serem desenvolvidos durante o período.
4. Estabelecer atividades e procedimentos de ensino e aprendizagem ade-
quados aos objetivos e conteúdos a serem utilizados.
5. Selecionar e indicar recursos a serem utilizados.
6. Escolher e determinar as formas de avaliação mais coerentes com os
objetivos definidos e os conteúdos a serem desenvolvidos (HAYDT,
2006, p. 101).
Resulta em plano de ensino, o qual se configura na descrição das previsões
do trabalho dos professores e dos alunos, para o semestre ou para o ano letivo.

Planejamento de capítulo: diz respeito à organização das aulas a partir da


reunião de assuntos que se relacionam, interligam-se, constituindo-se em pro-
cesso significativo em que as inter-relações acontecem. É a previsão dos con-
teúdos que serão desenvolvidos, das atividades e dos materiais didáticos que
serão utilizados.
Esse planejamento estabelece três etapas:
1. Apresentação: nesse momento, o professor conhece seus alunos, visan-
do a identificar seus interesses o capítulo. Pode utilizar, nessa etapa,
diferentes atividades, tais como diálogos com a classe; aula expositiva

88 • capítulo 4
para introduzir um tema, dentre outros.
2. Desenvolvimento: momento em que o professor organiza e apresenta
situações de ensino-aprendizagem para estimular a participação ativa
dos alunos, visando a atingir os objetivos desejados (conhecimentos,
habilidades, atitudes). Entre as atividades utilizadas nessa etapa, des-
tacamos: solução de problemas, projetos, estudo de textos, trabalho em
grupo, entre outras.
3. Integração: nesse momento, os alunos são orientados a realizar uma
síntese (resumo) dos conhecimentos trabalhados durante o desenvolvi-
mento do capítulo. Para isso, geralmente, as atividades que o professor
solicita aos alunos são explicações orais ou por escrito, em que os alu-
nos descrevem os aspectos mais importantes do capítulo e/ou matéria
(conteúdo) desenvolvido (HAYDT, 2006).

Planejamento de aula: é a organização sequencial de tudo que será desen-


volvido pelo professor durante o período escolar diário; envolve a ordenação da
dinâmica de ensino-aprendizagem, as relações de interação entre professor e
o aluno. Na elaboração do plano de aula, devem-se levar em conta as caracte-
rísticas dos alunos e partir dos conhecimentos prévios que eles possuem em
dos temas que serão desenvolvidos. Devem, ainda, ser flexíveis. Geralmente, o
plano de aula assume a forma de um diário de classe.
Apresentamos, a seguir, um modelo dos itens que compõem a estrutura de
elaboração de um plano de aula. Trazemos, também, uma breve descrição de
seus itens.

Dados de identificação do professor e da escola

Instituição:
Professor (a):
Duração da atividade:
Ano:
Conteúdo (s):
Disciplinas envolvidas:

capítulo 4 • 89
Objetivos

– Geral (amplos e abrangentes; observáveis a longo prazo).


– Específicos (são concretos e delimitados; observáveis a médio e a curto prazo).

Metodologia(s)

Estudo, seleção e organização de procedimentos e recursos para desenvolver o processo en-


sino-aprendizagem.

Recursos

Utilizados para despertar o interesse, estimular discussões e debates que auxiliam o professor
e o aluno na interação do processo ensino-aprendizagem.

Avaliação

Seleção de instrumento e meios para avaliar adequadamente os objetivos educacionais, consi-


derando as condições intelectuais e emocionais e as habilidades intelectuais dos alunos.

Bibliografia

É importante informar as referências bibliográficas utilizadas na elaboração do Plano de Aula.

O planejamento das aulas propicia uma formação competente dos alunos,


pois a qualidade das aulas que serão ministradas pelo professor está intima-
mente ligada à qualidade de cada uma de suas aulas, dependendo diretamente
do empenho do professor no seu preparo, na sua execução e na sua avaliação.
De modo geral, vimos que o planejamento no setor educacional é um pro-
cesso que, além de permitir ao professor a organização antecipada da ação di-
dática, contribui para a melhoria tanto do trabalho docente como do discente.

90 • capítulo 4
Contribui, ainda, com o cumprimento dos objetivos desejados, com a otimiza-
ção de tempo e com a eficácia na ação didática.
Além disso, evita situações de improvisos constantes, as quais podem acon-
tecer esporadicamente, mas não podem virar regras.
Por fim, cabe salientar mais uma vez, que o planejamento didático, sendo
um processo ativo e dinâmico, resulta em um plano didático ou de ensino. E,
por isso, como tal não é neutro e tampouco rígido, ao contrário, ao ser utilizado
pelo professor, pode nortear novas ideias e ajustes às necessidades dos alunos,
tornando assim, o trabalho docente mais eficiente.

4.4.3 Tecnologia na educação

Estamos inseridos em uma sociedade que a cada dia nos mostra o quanto
a tecnologia é parte integrante de nosso cotidiano. Como parte disso encon-
tramos o computador (em suas variações: tablets/smartphones) e a Internet,
que são importantes instrumentos para inúmeras atividades e que podem ser
pensadas no contexto educativo.
De forma inegável o meio em que vivemos está permeado pelo uso de técni-
cas e recursos tecnológicos, sendo o computador um instrumento fundamen-
tal que se apresenta cada vez mais como um apoio importante para o processo
ensino/aprendizagem.
Há algum tempo estudiosos da área vem se perguntando: Como utilizar es-
tes recursos em favor da educação?
Podemos afirmar que os meios de comunicação são atualmente instrumen-
tos inseparáveis dos homens, assim é importante que desde a infância possa-
mos aprender a utilizá-lo num sentido construtivo. Para que isso ocorra, du-
rante a escolarização (da Educação Infantil até o Ensino Médio), é necessário
que o currículo da instituição escolar contemple a comunicação e expressão
por meio de tais recursos tecnológicos, visando assim, além da utilização para
fins específicos no que se refere aos conteúdos, e também a promoção do de-
senvolvimento integral por meio de uma educação voltada para a cidadania.
Assim, o uso da tecnologia tem proporcionado a todos uma nova forma de
pensar, interagir e aprender, transformando assim as práticas cotidianas dian-
te de um mundo globalizado e efêmero. Desta forma, no mundo todo, o rádio,
a TV e mais recentemente os computadores, por meio da internet, passaram a

capítulo 4 • 91
formar parte da bagagem instrumental da Com isso, o principal desafio da es-
cola hoje está voltado para o objetivo de preparar as crianças para enfrentarem
o mundo do trabalho em um espaço interativo e em constante transformação.
Lança-se nesta medida um grande desafio ao educador: Utilizar tais recur-
sos e incentivar o uso por uma via educativa sem neutralizar-se diante da forte
influência lançada pela mídia, afinal para que a tecnologia seja uma aliada da
educação é necessário ter o discernimento de que informação não é sinônimo
de conhecimento. Assim, torna-se necessário relacionar teoria e prática para
que possamos perceber nos mais diversos meios das tecnologias a importância
de avançarmos enquanto educadores e educandos.

ATIVIDADE
1. Os professores, em seu processo de formação profissional, estão discutindo as relações
que integram o processo ensino-aprendizagem?
2. Por que a formação de professores deve integrar a teoria e a prática? Os professores
estão buscando a formação continuada?
3. Leia a citação abaixo e reflita sobre a realização do trabalho docente. Nele, elabore
um comentário, respondendo à seguinte questão: quais são as contribuições da prática
reflexiva para a formação de professores?
O professor, ao ensinar, encontra-se constantemente monitorando
o que ocorre durante a aula e agindo com base em percepções e
interpretações do está acontecendo. As crenças, metas, objetivos e
conhecimentos dos professores se inter-relacionam, afetando-os uns
aos outros. Suas escolhas e decisões, além do contexto imediato, es-
tão submetidas às influências da história pessoal do professor e da
história deste com seus alunos (MIZUKAMI, 2002, p. 44).
4. Que saberes integram a formação de professores e consequentemente estão presen-
tes na prática docente, segundo Freire?

REFLEXÃO
A formação inicial é o primeiro momento da formação profissional docente, pois, conforme
revela Pimenta (2000, p. 17), é importante “ressignificar os processos formativos a partir
da reconsideração dos saberes necessários à docência, colocando a prática pedagógica e

92 • capítulo 4
docente escolar como objeto de análise”.
Logo, adentramos o século XXI, com um pensamento fortalecido e ampliado sobre a forma-
ção continuada, no sentido de entendê-la como uma formação necessária e importante para
complementar, ampliar e ressignificar a primeira formação com saberes e práticas necessá-
rios ao professor no desenvolvimento da docência. Nessa perspectiva, o cotidiano escolar é
considerado como um espaço de produção, criação e recreação de saberes, isto é, um local
em que o professor mobiliza e emprega saberes provenientes de sua prática cotidiana, “sabe-
res esses que dela provêm, de uma maneira ou de outra, e servem para resolver os problemas
dos professores em exercício, dando sentido às situações de trabalho que lhes são próprias”
(TARDIF, 2000, p. 58).

LEITURA RECOMENDADA
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
O livro discute os saberes que servem de base aos professores para realizarem seu trabalho
em sala de aula. Nele, o autor critica o enfoque anglo-americano que reduz o saber dos pro-
fessores a processos psicológicos, assim como certa visão europeia tecnicista que alimenta
atualmente a abordagem por competência e também se posiciona de forma coerente em
relação às concepções sociológicas tradicionais que associam os professores a agentes de
reprodução das estruturas sociais dominantes.

PIMENTA, Selma G. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez,
2000.
Nesse livro, a autora apresenta algumas reflexões sobre a prática docente. Para isso, parte
de questões/colaborações. São elas:
Para que formar professores? O que identifica o ser professor hoje?
O professor tem um pedaço de decisões imediatas – a sala de aula – que precisa ser por ele
percebido/ocupado.
Nenhum projeto pedagógico avançará na direção proposta se os professores forem vistos
apenas como executores.
Conhecer a realidade da escola noturna a partir de seus atores – os alunos –, seus anseios,
suas angústias, suas esperanças...
A escola é vista como um espaço de socialização, de afirmação do jovem.
No mundo contemporâneo urge uma educação em valores.
É possível uma instituição pública ser pública? Numa escola pública como diferenciar o indi-

capítulo 4 • 93
vidual do coletivo?

O trecho abaixo é um fragmento do Artigo: A formação continuada de professores no cotidia-


no da Escola Fundamental (FUSARI, José Cerchi). Esse recorte vai ao encontro da discussão
sobre a formação continuada de professores. Nesse sentido, as ideias apresentadas pelo
autor levarão a uma enriquecedora reflexão acerca da temática em questão. O texto na ínte-
gra poderá ser encontrado em: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_12_p025-
034_c.pdf> VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Repensando a didática. 25ª. edição. Campi-
nas, SP: Papirus, 2007.
Nesse livro, a autora, propõe repensar o papel da didática na formação de professores da
Educação Básica. Procura estimular a busca de uma proposta didática voltada para a efeti-
vação da prática pedagógica crítica.

DEFFUNE, Deisi; Depresbiteris, Lea. Competências, habilidades e currículos da educa-


ção profissional: crônicas e reflexões. São Paulo: Senac, 2000.

Nesse livro, as autoras buscam definir e comentar, de forma ampla, termos como: poliva-
lência, competências, habilidades, capacidades, entre outros. Para defini-los, usam, nos três
primeiros capítulos, diálogos e situações que viabilizam a compreensão de tais conceitos. As
autoras descrevem, também, três competências profissionais imprescindíveis ao trabalhador
no enfrentamento da realidade e competências que exigem constantes atualizações.

Leia o artigo abaixo Competências e Habilidades Pedagógicas. Nele, você encontrará obser-
vações importantes sobre os desafios encontrados pelo professor no cotidiano escolar, por-
tanto, discussões que permeiam novos conceitos educação, de competência, de habilidades
e, consequentemente, de formação profissional. Esse artigo foi extraído na íntegra do site:
http://www.rieoei.org/deloslectores/490Barros.pdf. Acesso em: 15 de outubro de 2009.

LEITURA COMPLEMENTAR
A formação continuada de professores no cotidiano da Escola Fundamental
José Cerchi Fusari
A luta pela democratização do ensino continua

94 • capítulo 4
A insistência em relação à questão da democratização4 do ensino deve-se ao fato, deveras
lamentável, de que a realidade escolar brasileira, nesta última década do século XX, ainda não
foi alterada para melhor, apesar de toda a luta persistente dos educadores e dos discursos
oficiais das autoridades educacionais.
Nos últimos anos, inúmeros trabalhos, como os de SAVIANI (1980, 1986), RODRIGUES
(1985, 1987), MELLO (1982, 1986), LIBÂNEO (1984, 1991), PIMENTA (1988) e outros,
apontam os determinantes externos e internos do fracasso escolar, ao mesmo tempo em que
evidenciam a função decisiva que a educação escolar desempenha na formação da cidadania
do homem brasileiro.
Segundo SAVIANI (1986, p. 73-76), “ser cidadão significa ser sujeito de direitos e deveres.
Cidadão é, pois, aquele que está capacitado a participar da vida da cidade literalmente e, ex-
tensivamente, da vida da sociedade (...); ser cidadão significa, portanto, participar ativamente
da vida da sociedade moderna, isto é, da sociedade cujo centro de gravitação é a cidade”.
De acordo com o mesmo autor, a educação escolar instrumentaliza o sujeito para o exercí-
cio consciente (direitos e deveres) da cidadania, na medida em que esta – a Escola – deve
democratizar, como já explicitado anteriormente, com qualidade e quantidade, para todos, os
conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade.
Isto significa que é preciso que continuemos lutando, incansavelmente, em conjunto com ou-
tros segmentos da sociedade (famílias, sindicatos, associações etc.) para que este propósito
deixe de ser apenas proposta e transforme-se em realidade.
A educação escolar, no contexto de uma “autonomia relativa e específica” (MELLO,1982),
atua de forma competente (consciente, criativa, crítica e transformadora) junto aos educandos
como um todo e, principalmente, junto àqueles oriundos das camadas majoritárias e desfavo-
recidas da população.
Os alunos que têm acesso (e todos devem tê-lo) e permanecem (e todos devem permanecer)
na Escola devem, ao final de sua educação escolar, apresentar diferenças significativas na
forma de perceber e atuar no mundo. Segundo SAVIANI (1980), a Escola deve fazer a me-
diação entre “o senso comum e a consciência filosófica” (crítica), possibilitando ao educando
desenvolver uma visão científica do mundo que o cerca.
Esta mediação será feita pelo currículo escolar, centrado na comunicação e elaboração de
conhecimentos vinculados ao saber universal e significativo para a vida do homem brasileiro
contemporâneo. Desta forma, a proposta curricular da Escola terá cumprido a sua função,
tornando o aluno mais cidadão, mais humano, enfim.

4 Aqui entendida como o acesso de crianças, jovens e adultos ao sistema regular e supletivo de ensino; permanência
durante toda a trajetória educacio-nal, com qualidade e quantidade de ensino.

capítulo 4 • 95
Discutir a formação dos profissionais da educação escolar, no cotidiano da Escola Fundamen-
tal, significa, portanto, colocar realidade no contexto mais amplo da democratização do ensino
e da própria sociedade brasileira. Isto significa assumir a formação do educador em serviço,
como um meio e não como um fim em si.
Contudo, vale registrar que a formação do educador em serviço não vai resolver, por si só,
a questão da democratização do ensino, mas, certamente, terá uma função importante no
processo de construção da escola pública brasileira. Uma nova escola (não confundir com
“escola nova”), democrática, necessita de educadores mais competentes para que cumpra, de
maneira diferenciada, para melhor, a sua função social. Educadores competentes necessitam,
sem dúvida alguma, de condições mínimas de trabalho; dentre elas, a questão salarial é ponto
de partida para qualquer discussão de propostas que visem melhorar o ensino brasileiro.
A democratização do ensino passa pela competência docente
A sala de aula será o local privilegiado para ocorrer, de fato, a propalada e desejada democra-
tização do ensino. Isto pode ser considerado um consenso entre os educadores progressistas
bra sileiros; é preciso colocar à disposição de todos os educandos o saber a que apenas a
elite dominante tem acesso.
É na sala de aula e por intermédio da competência docente que o educador escolar – profes-
sor vai fazer a mediação (“entrar no meio”) competente (crítica, criativa...) entre os educandos
e os conteúdos curriculares, construindo, assim, de forma sistemática e intencional, a apren-
dizagem de conhecimentos, atitudes e habilidades nos educandos.
Nos últimos anos, vários educadores têm abordado a importância do resgate (se é que se
pode dizer assim) da competência docente (técnica) no bojo da questão maior, que é a cons-
trução da escola pública brasileira. Dentre eles, MELLO (1982, p. 43), explicita o seguinte:
Por competência profissional estou entendendo várias característi-
cas que é importante indicar. Em primeiro lugar, o domínio adequado
do saber escolar a ser transmitido, juntamente com a habilidade de
organizar e transmitir esse saber de modo a garantir que ele seja
efetivamente apropriado pelo aluno. Em segundo lugar, uma visão
relativamente integrada e articulada dos aspectos relevantes mais
imediatos de sua própria prática, ou seja, um entendimento das múl-
tiplas relações entre os vários aspectos da escola, desde a organi-
zação dos períodos de aula, passando por critérios de matrícula e
agrupamentos de classe, até o currículo e os métodos de ensino. Em
terceiro, a compreensão das relações entre o preparo técnico que
recebeu, a organização da escola e os resultados de sua ação. Em
quarto lugar, a compreensão mais ampla das relações entre a escola

96 • capítulo 4
e a sociedade, que passaria necessariamente pela questão de suas
condições de trabalho e remuneração.
Em outras palavras, pode-se dizer que o conceito de competência docente apresenta cinco
aspectos essenciais:
• Domínio competente e crítico do conteúdo a ser ensinado;
• Clareza dos objetivos a serem atingidos;
• Domínio competente dos meios de comunicação a serem utilizados para a mediação
eficaz entre o aluno e os conteúdos do ensino;
• Visão articulada do funcionamento da escola, como um todo;
• Percepção nítida e crítica das complexas relações entre educação escolar e sociedade.
Vale insistir que a competência docente não é inata (“dom”) e neutra, mas sim construída e
inserida num tempo e num espaço, o que significa afirmar que ela varia nos diferentes mo-
mentos históricos, estando sempre comprometida com uma camada ou outra da população,
dependendo do nível de consciência dos educadores. Sendo assim, seria desejável que, na
escola pública, a competência docente estivesse definitivamente comprometida com a comu-
nicação e posse de saberes linguísticos, científicos, históricos, sociais e artísticos pelos alunos
das camadas majoritárias da população.
A competência docente é, portanto, uma elaboração histórica continuada, um eterno processo
de desenvolvimento, no qual o educador, no cotidiano do seu trabalho, no exercício consciente
de sua prática social pedagógica, vai revendo, criticamente, analisando e reorientando sua
competência (“saber fazer bem”), de acordo com as exigências do momento histórico, do
trabalho pedagógico e dos seus compromissos sociais, enquanto cidadão – profissional –
educador.
Isto significa colocar um fim a uma concepção de competência docente inata (“dom”), estática,
fechada e acabada, estimulando, nos educadores, uma atitude de busca contínua de aperfei-
çoamento do seu processo de desenvolvimento pessoal (cidadania) e profissional (trabalho).
[....] (FUSARI, 1992).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALDEIRA, Anna Maria Salgueiro e AZZI, Sandra.. Didática e construção da práxis docente:
dimensões explicativa e projetiva. In: ANDRÉ, Marli Eliza D. A. e OLIVIERIA, Maria Rita N. S.
(orgs). Alternativas no ensino de didática. 5ª. edição. Campinas, SP: Papirus, 2003, p.
97-128.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 17ª.

capítulo 4 • 97
Edição. São Paulo: Paz e Terra, 2001.

MIZUKAMI, Maria da Graça N. et al. Escola e aprendizagem da docência: processos de


investigação e formação. São Carlos: EdUFSCar, 2002.

PEREIRA, Júlio Emílio Diniz. Formação de professores, representações e poder. Belo


horizonte: Autêntica, 2000.

PÉREZ GOMÉZ, Angel. O pensamento prático do professor: A formação do professor como


profissional reflexivo. In: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e a sua formação. Lisboa:
Dom Quixote, 1995, p. 95-114.

PIMENTA, Selma G. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez,
2000.

SCHÖN, Donald. A. Formar professores reflexivos como profissionais reflexivos. In: NÓVOA,
A. (Org.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1995.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

HAYDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 8ª. edição. São Paulo: Ática, 2006.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

LIMA, Elvira Cristina de Azevedo Souza. A utilização do jogo na Pré-Escola. Série Ideias,
nº. 10, São Paulo: FDE, 1992. p 24-29. Disponível em: www.crmariocovas.sp.gov.br em:
04/03/2009.

MOURA, Manoel Oriosvaldo de. O jogo e a construção do conhecimento matemático.


Série Ideias, n. 10, São Paulo: FDE, 1992. p 45-52. Disponível em: www.crmariocovas.sp.gov.
br. Acesso em: 05/01/2009.

RAYS, Oswaldo Alonso. Metodologia do ensino: cultura do caminho contextualizado. In: VEI-
GA, Ilma Passos Alencastro. Repensando a didática. 25ª. edição. Campinas, SP: Papirus,
2007, p. 93-108.

ZÓBOLI, Graziella. Práticas de ensino: subsídios para a atividade docente. 11ª. edição. São
Paulo: Ática, 2002.

98 • capítulo 4
NO PRÓXIMO CAPÍTULO
Vimos que as evoluções que permearam (e permeiam) o contexto escolar influenciaram (e
influenciam) diretamente as propostas que subsidiam a formação dos professores, a qual
deve oferecer-lhes um conjunto integrado de conhecimentos teórico-práticos condizentes
com as reformas políticas sociais e culturais, bem como as evoluções das áreas de conheci-
mento que integram a profissão docente. Diante disso, apresentaremos no próximo capítulo
a temática da formação de professores, focalizando sua importância para o desenvolvimento
de seu trabalho pedagógico, sob a ótica de Phillipe Perrenoud.

capítulo 4 • 99
5
Planejamento do
trabalho pedagógico
5 Planejamento do trabalhao pedagógico
Nesse quinto capítulo, vamos estudar o trabalho docente e as competências
profissionais. Além disso, iremos refletir sobre a importância de cada modali-
dade de planejamento educacional.

OBJETIVOS
A finalidade é que você possa compreender o conceito de competência profissional na rea-
lização do trabalho pedagógico, que possa também:
• Definir e conceituar o Planejamento em suas diversas possibilidade de organização e fun-
ções no contexto educacional.
• Refletir sobre a pertinência do planejamento para o processo de ensino e aprendizagem,
bem como para a organização do trabalho docente.

REFLEXÃO
Durante os períodos de estágio é importante que vocês observem a organização dos planeja-
mentos feitos pelos professores, bem como se atentem para os conteúdos que o PPP (Proje-
to Político Pedagógico) da instituição escolar aponta. Você se lembra de analisar algum? Se
lembra de que tipo era? Eram coerentes com a proposta da escola?

5.1 Planejamento: definição e relevância no trabalho pedagógico

Assim como a formação de profissional reflexivo, outra questão que tem ga-
nhado cada vez mais destaque nessa temática é a formação de professores com
competências profissionais.
Para abordar esse assunto, recorremos a Perrenoud (2000), sociólogo suíço,
que, ao desenvolver estudos sobre temas educacionais, ganhou grande reper-
cussão ao destacar o assunto competências profissionais. Entre o final do sé-
culo XX e início do século XXI, o autor introduziu uma “nova” dimensão para
abordar o trabalho pedagógico desenvolvido pela escola: a formação de com-
petências.
Ressalta que ser professor na escola contemporânea demanda desse pro-

102 • capítulo 5
fissional a criação de situações para resolver problemáticas que emergem no
contexto da sala de aula. Diante disso, acredita que ensinar praticando já não
é suficiente, destacando que é necessário ao professor também criar situações
que exijam dos alunos a resolução de situações para que possam confrontar
suas dificuldades específicas, aprendendo a dosá-las. Sugere, assim, a organi-
zação de um trabalho pedagógico por meio de situações-problema “que reque-
rem a proposição de problemas realistas e que estejam incluídos em situações
que lhes dêem sentidos” (PERRENOUD apud DAMIS, 2007, p. 27).
Para ele, a noção de competência indica “a capacidade de mobilizar um
conjunto de recursos cognitivos (saberes, atitudes, informações etc) para en-
frentar um tipo de situação” (PERRENOUD, 2000, p. 15). Revela quatro aspectos
que contemplam essa definição:
1. As competências não são elas mesmas saberes, savoir-faire8 ou atitudes,
mas mobilizam, integram e orquestram tais recursos.
2. Essa mobilização só é pertinente em situação, sendo cada situação sin-
gular, mesmo que se possa tratá-la em analogia com outras, já encon-
tradas.
3. O exercício da competência passa por operações mentais complexas,
subentendidas por esquemas de pensamento [...] que permitem deter-
minar (mais ou menos consciente e rapidamente)

5.2 Planejamento educacional: tipos e especificidades

Recorrendo a outra estudiosa do assunto, Haydt (2006), encontramos uma


visão similar à de Menengola e Sant’Anna (2002). Para a autora, planejamen-
to pode ser definido como “um processo mental que envolve análise, reflexão,
previsão” (HAYDT, 2006, p. 94). Mais uma vez, observamos que o planejamento
contempla alguns aspectos, tais como: análise de uma dada realidade, reflexão
sobre as condições dessa realidade e a previsão de formas alternativas de ação
para superar dificuldades e/ou alcançar os objetivos esperados. Isso significa
que o planejamento educacional se constitui num processo contínuo, cuja pre-
ocupação é traçar diretrizes para possibilitar o desenvolvimento da educação,
bem como para buscar maneiras adequadas para seguir essas diretrizes, no
sentido de atender tanto aos alunos quanto à sociedade.
O resultado desse processo pode dar origem a um plano, que pode ser defi-

8 Savoir-faire – Saber fazer

capítulo 5 • 103
nido como o resumo inicial das ideias resultantes do processo mental de plane-
jar, podendo configurar-se ou não sob a forma escrita (HAYDT, 2006).
Temos, aqui, dois conceitos importantes e que não podem ser confundidos
pelos professores. Tanto Menengola e Sant’Anna (2002) como Haydt (2006)
explicam que o planejamento educacional é um processo e, como tal, é ativo
e dinâmico, pois, ao envolver algumas operações mentais, tais como análise,
reflexão, previsão, seleção, definição, estruturação e organização, resulta na
elaboração escrita de um plano educacional. Logo, o plano educacional pode
ser definido como o resultado dessas operações mentais de planejamento, ori-
ginando assim um esboço das conclusões desse processo, não sendo, portanto,
algo fechado e definitivo. “Cabe à escola, partindo de sua realidade e de suas
necessidades e possibilidades, estruturar e organizar os seus planos para aten-
der a seu público- alvo” (MENENGOLA; SANT’ANNA, 2002, p. 36).

5.2.1 Planejamentos escolares: PPP e planejamentos específicos

PPP – Projeto Político Pedagógico


O Projeto Pedagógico é compreendido como um documento que orienta os
docentes no planejamento específico de sua disciplina, de modo a concretizar
a política educacional da instituição. Vale dizer que todo projeto pedagógico
possui uma dimensão política, a medida que o aspecto político encontra-se ex-
presso no ato pedagógico enquanto fazer educativo.
Dentro desta perspectiva encontramos diversas denominações para o Pro-
jeto Pedagógico, tais como Projeto Político Pedagógico, Proposta Pedagógica,
Projeto Educativo, dentre outros. Entende-se que a palavra projeto indica “[...]
um documento que contém um conjunto de decisões, procedimentos, instru-
mentos e ações articulados na direção da superação de problemas, numa reali-
dade específica” (FUSARI, 1993, p. 102-103).
Segundo Veiga (1998), o Projeto Pedagógico,” é político no sentido de com-
promisso com a formação do cidadão para um tipo de sociedade. [...] Pedagógi-
co, no sentido de definir as ações educativas e as características necessárias às
escolas de cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade “ (VEIGA, p. 13).
Complementando ainda, Saviani (1984, p. 85), esclarece que “[...] corre-se o
risco de se identificar educação com política, a prática pedagógica com a prá-
tica política, dissolvendo-se, em consequência, a especificidade do fenômeno

104 • capítulo 5
educativo”. Então se entende que tanto a ação pedagógica como a ação política
são práticas distintas que devem ser entendidas no seu sentido histórico, ou
seja, como manifestações da prática social.
Sendo assim, acredita-se que a terminologia “Projeto Pedagógico” expressa
que “A função política da educação se cumpre na medida em que ela se realiza
enquanto prática especificamente pedagógica” (SAVIANI, 1984, p. 93). Logo,
quando se utiliza o termo pedagógico nele está expresso o caráter político da
ação, pois nenhuma ação é neutra.
Sendo assim, sobre tal perspectiva, podemos afirmar que todo projeto su-
põe uma ruptura com o presente e propõe promessas para o futuro, projetando
objetivos. Desta forma, o termo “Projeto” representa a tentativa de arriscar-se,
na instabilidade para se chegar à outra estabilidade possível e melhor que a
atual, a partir do compromisso e empenho dos elementos envolvidos. Partindo
dessa reflexão, apresenta-se a seguir al guns dos elementos básicos que com-
põem um projeto pedagógico e a sua normatização, vale pontuar que a elabora-
ção do projeto pedagógico nas instituições de educação superior é uma inicia-
tiva relativamente recente na história da educação brasileira.
A iniciativa de organização do projeto pedagógico em instituições de ensino
está aliada ao movimento de mudanças na educação que teve início em meados
da década de 1980, com o declínio da ditadura militar. Apenas em 1996, por
meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), n° 9394/96,
se tornou um documento obrigatório para todas as instituições, fazendo parte,
inclusive, dos elementos considerados nas avaliações internas e externas, visto
que organiza e possibilita a melhoria da qualidade do trabalho pedagógico.

CONEXÃO
É interessante ler VASCONCELOS, Celso: Planejamento. Projeto de Ensino Aprendiza-
gem e Projeto Político Pedagógico, São Paulo, Libertad, 1999.
Este livro aborda de forma pertinente e reflexiva como pensar em um planejamento cons-
trutivo, além de dialogar sobre as especificidades do Projeto Político Pedagógico e suas
derivações.

capítulo 5 • 105
Vasconcelos (2007) aponta algumas finalidades do Projeto Pedagógico, que
envolvem a ressignificação do trabalho pedagógico, por meio do planejamento
e da intencionalidade que tal trabalho possui. Ele argumenta dizendo ser o PP
um instrumento para possibilitar mudanças na realidade, fortalecer o coletivo
e evitar a fragmentação, fundamentando as ações da instituição e oferecendo
um norte, dentro de uma linha de atuação.
Além disso, o PP tem por intuito propiciar a maximização das ações e a mi-
nimização de esforços, buscando superar as práticas autoritárias e de cunho ex-
cessivamente burocrático; criando mecanismos para superação dos problemas
que o contexto aponta, atingindo maior satisfação com o trabalho de todos.

5.3 Organização curricular: planejando o currículo

Como definição o currículo é compreendido como a organização do conhe-


cimento escolar que tem sua importância para a organização das atividades
que serão pensadas e realizadas na escola. É importante primeiramente apon-
tar que todo currículo deve ser pensado como parte do projeto-político-pedagó-
gico de cada escola, sendo fundamental que ele seja pensado e refletido pelos
sujeitos em interação “que têm um mesmo objetivo e a opção por um referen-
cial teórico que o sustente” (VEIGA, 2002, p.7).
O surgimento do currículo ocorreu a partir da organização de uma escola
democrática, inicialmente pensada para as massas através de um ensino pa-
dronizado, ou seja, com uma organização de conteúdos iguais em todas as es-
colas. Porém é visível que ao analisar os currículos escolares, fica evidente que
ele contempla mais do que uma relação de conteúdos, demonstrando premis-
sas que envolvem questões de poder, que envolvem todas as relações que per-
meiam o cotidiano da escola e, fora dela, de classes sociais indo além de uma
questão de conteúdos didáticos.
Segundo Veiga (2002) afirma,

Currículo é uma construção social do conhecimento, pressu-


pondo a sistematização dos meios para que esta construção
se efetive; a transmissão dos conhecimentos historicamente

106 • capítulo 5
produzidos e as formas de assimilá-los, portanto, produção,
transmissão e assimilação são processos que compõem uma
metodologia de construção coletiva do conhecimento esco-
lar, ou seja, o currículo propriamente dito (VEIGA, 2002, p.7).

Sendo assim, essa organização curricular deve iniciar principalmente pelo


projeto-político-pedagógico de cada escola, e deve levar em conta alguns prin-
cípios básicos da sua construção.
Partindo disso, vale pontuar que o currículo não é estático, e que deve ser
constantemente refletido e construído a partir de análises sobre o processo de
produção do conhecimento escolar, que busca uma organiza ção curricular que
seja integrada e contextual, ao contrário do que muitas vezes encontramos na
prática cotidiana.
Ao contrário de da grade curricular encontrada em muitas escolas, no qual
cada disciplina é ensinada separadamente, sendo algumas consideradas de
maior importância em detrimento de outras (e portanto recebem maior carga
horária para serem explanadas no contexto escolar), busca-se difundir a pre-
missa da integração.
Baseado nesta perspectiva, muitos autores apontam para a possibilidade de
o currículo não ser organizado baseando-se em conteúdos isolados, mas sim
em consonância com a complexidade do mundo em que vivemos, a partir de
uma visão multifacetada, construída pelas visões das diversas áreas do conhe-
cimento.
Desta maneira a organização do currículo deve procurar viabilizar uma
maior interdisciplinaridade, contextualização e transdisciplinaridade; asse-
gurando a livre comunicação entre todas as áreas, e ainda uma valorização do
trabalho pela via dos projetos.

ATIVIDADE
1. Quais as finalidades do planejamento educacional? Tais finalidades são importantes
para a realização do trabalho docente? Por quê?
2. Os planos curriculares estão sendo documentados, levando-se em consideração as di-
retrizes oficiais e as condições sociais e educacionais dos sujeitos envolvidos no pro-
cesso de ensino?
3. Qual a importância política e pedagógica do plano de ensino?

capítulo 5 • 107
4. Que aspectos devem ser considerados pelo professor na elaboração do plano de aula?

LEITURA RECOMENDADA
MENENGOLA, M.; SANT’ANNA, I. M. Por quê planejar? Como planejar?: currículo, área,
aula. 12ª. edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
Para os autores, a educação, a educação, o ensino e toda a ação pedagógica devem ser
pensados e planejados de modo que possam propiciar melhores condições de vida à pessoa.
Apresentam o planejamento como um procedimento útil e necessário tanto para o professor
como para o aluno. Também evidenciam que cabe à escola e aos professores o dever de
planejar a sua ação educativa para construir o bem viver.

LEITURA COMPLEMENTAR
O texto a seguir, é um recorte do artigo: O Planejamento do Trabalho Pedagógico: Algumas
Indagações e Tentativas de Respostas (José Cerchi Fusari). A partir da leitura do texto abai-
xo, você poderá agregar novas informações sobre a temática apresentada nesse capítulo.

O Planejamento do Trabalho Pedagógico: Algumas Indagações e Tentativas de Res-


postas9
José Cerchi Fusari

Qual é o Sentido Atual Para o Conceito de Planejamento do Ensino?


Na medida em que se concebe o planejamento como um meio para facilitar e viabilizar a de-
mocratização do ensino, o seu conceito necessita ser revisto, reconsiderado e redirecionado.
Na prática docente atual, o planejamento tem-se reduzido à atividade em que o professor
preenche e entrega à secretaria da escola um formulário. Este é previamente padronizado e
diagramado em colunas, onde o docente redige os seus “objetivos gerais”, “objetivos especí-
ficos” “conteúdos”, “estratégias” e “avaliação”.
Em muitos casos, os professores copiam ou fazem fotocópias do plano do ano anterior e o
entregam à secretaria da escola, com a sensação de mais uma atividade burocrática cum-
prida.

9 O artigo poderá ser encontrado na íntegra em: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/prp_a.php?t=016

108 • capítulo 5
É preciso esclarecer que planejamento não é isto. Ele deve ser concebido, assumido e viven-
ciado no cotidiano da prática social docente, como um processo de reflexão.
Segundo SAVIANI (1987, p. 23), “a palavra reflexão vem do verbo latino ‘reflectire’ que sig-
nifica ‘voltar atrás’. É, pois um (re)pensar, ou seja, um pensamento em segundo grau. (.. .)
Refletir é o ato de retomar, reconsiderar os dados disponíveis, revisar, vasculhar numa busca
constante de significado. É examinar detidamente, prestar atenção, analisar com cuidado. E
é isto o filosofar’.
Entretanto, não é qualquer tipo de reflexão que se pretende e sim algo articulado, crítico e
rigoroso. Ainda segundo SAVIANI (1987, p. 24), para que a reflexão seja considerada filosó-
fica, ela tem de preencher três requisitos básicos, ou seja, ser:
• “radical” - o que significa buscar a raiz do problema;
• “rigorosa” - na medida em que faz uso do método científico;
• “de conjunto” - pois exige visão da totalidade na qual o fenômeno aparece.
Pode-se, pois, afirmar que o planejamento do ensino é o processo de pensar, de forma
“radical”, “rigorosa” e “de conjunto”, os problemas da educação escolar, no processo ensi-
no-aprendizagem. Consequentemente, planejamento do ensino é algo muito mais amplo e
abrange a elaboração, execução e avaliação de planos de ensino.
O planejamento, nesta perspectiva, é, acima de tudo, uma atitude crítica do educador diante
de seu trabalho docente.

Planejamento e Plano de Ensino Podem Ser Tomados Como Sinônimos?


Apesar de os educadores em geral utilizarem, no cotidiano do trabalho, os termos “planeja-
mento” e “plano” como sinônimos, estes não o são.
É preciso, portanto, explicitar as diferenças entre os dois conceitos, bem como a íntima re-
lação entre eles.
Enquanto o planejamento do ensino é o processo que envolve “a atuação concreta dos edu-
cadores no cotidiano do seu trabalho pedagógico, envolvendo todas as suas ações e situa-
ções, o tempo todo, envolvendo a permanente interação entre os educadores e entre os pró-
prios educandos” (FUSARI, 1989, p. 10), o plano de ensino é um momento de documentação
do processo educacional escolar como um todo. Plano de ensino é, pois, um documento
elaborado pelo(s) docente(s), contendo a(s) sua(s) proposta(s) de trabalho, numa área e/ou
disciplina específica.
O plano de ensino deve ser percebido como um instrumento orientador do trabalho docente,
tendo-se a certeza e a clareza de que a competência pedagógico-política do educador esco-
lar deve ser mais abrangente do que aquilo que está registrado no seu plano.

capítulo 5 • 109
A ação consciente, competente e crítica do educador é que transforma a realidade, a partir
das reflexões vivenciadas no planejamento e, consequentemente, do que foi proposto no
plano de ensino.
Um profissional da Educação bem-preparado supera eventuais limites do seu plano de ensi-
no. O inverso, porém, não ocorre: um bom plano não transforma, em si, a realidade da sala de
aula, pois ele depende da competência-compromisso do docente.
Desta forma, planejamento e plano se complementam e se interpenetram, no processo ação
-reflexão-ação da prática social docente.

Como Formalizar o Plano de Ensino?


É preciso assumir que é possível e desejável superar os entraves colocados pelo tradicional
formulário, previamente traçado, fotocopiado ou impresso, onde são delimitados centímetros
quadrados para os “objetivos, conteúdos, estratégias e avaliação”.
A escola pode e deve encontrar outras formas de lidar com o planejamento do ensino e com
seus desdobramentos em planos e projetos. É importante desencadear um processo de re-
pensar todo o ensino, buscando um significado transformador para os elementos curriculares
básicos:
• objetivos da educação escolar (para que ensinar e aprender?);
• conteúdos (o que ensinar e aprender?);
• métodos (como e com o que ensinar e aprender?);
• tempo e espaço da educação escolar (quando e onde ensinar e aprender?);
• avaliação (corno e o que foi efetivamente ensinado e aprendido?).
O fundamental não é decidir se o plano será redigido no formulário x ou y, mas assumir que
a ação pedagógica necessita de um mínimo de preparo, mesmo tendo o livro didático como
um dos instrumentos comunicacionais no trabalho escolar em sala de aula.
A ausência de um processo de planejamento do ensino nas escolas, aliada às demais dificul-
dades enfrentadas pelos docentes no exercício do seu trabalho, tem levado a uma contínua
improvisação pedagógica nas aulas. Em outras palavras, aquilo que deveria ser uma prática
eventual acaba sendo uma “regra”, prejudicando, assim, a aprendizagem dos alunos e o pró-
prio trabalho escolar como um todo.
Sugiro que os docentes discutam a questão da “forma” e do “Conteúdo” no processo de pla-
nejamento e elaboração de planos de ensino, buscando alternativas para superar as dicoto-
mias entre fazer e pensar, teoria e prática, tão presentes no cotidiano do trabalho dos nossos
professores. Vale a pena enfrentar este desafio e pensar a respeito!

110 • capítulo 5
A Elaboração de Planos de Ensino, da Forma Corno Está Sendo Praticada, Elimina o
Trabalho de Preparo das Aulas?
Não. O preparo das aulas é uma das atividades mais importantes do trabalho do profissional
de educação escolar. Nada substitui a tarefa de preparação da aula em si.
Cada aula é um encontro curricular, no qual, nó a nó, vai-se tecendo a rede do currículo esco-
lar proposto para determinada faixa etária, modalidade ou grau de ensino.
Também aqui vale reforçar que faz parte da competência teórica do professor, e dos seus
compromissos com a democratização do ensino, a tarefa cotidiana de preparar suas aulas,
o que implica ter claro, também, quem é seu aluno, o que pretende com o conteúdo, como
inicia rotineiramente suas aulas, como as conduz e se existe a preocupação com uma síntese
final do dia ou dos quarenta ou cinquenta minutos vivenciados durante a hora-aula. A aula,
no contexto da educação escolar, é uma síntese curricular que concretiza, efetiva, constrói o
processo de ensinar e aprender.
O aluno precisa ir percebendo, sentindo e compreendendo cada aula como um processo
vivido por ele para que, na especificidade da educação escolar, avance, como diz SAVIANI
(1987), do “senso comum” à “consciência filosófica”.
A aula, por sua vez, deve ser concebida como um momento curricular importante, no qual o
educador faz a mediação competente e critica entre os alunos e os conteúdos do ensino,
sempre procurando direcionar a ação docente para: estimular os alunos, via trabalho curricu-
lar, ao desenvolvimento da percepção crítica da realidade e de seus problemas; estimular os
alunos ao desenvolvimento de atitudes de tomada de posição ante os problemas da socieda-
de; valorizar nos alunos atitudes que indicam tendência a ações que propiciam a superação
dos problemas objetivos da sociedade brasileira.
[...] (FUSARI, 1998).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HAYDT, Regina Célia Cazaux. Curso de Didática Geral. 8ª. edição. São Paulo: Ática, 2006.

MARTINS, Pura Lúcia Oliver. Conteúdos escolares: a quem compete a seleção e a orga-
nização. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro (coord.). Repensando a didática. 25ª. edição.
Campinas: Papirus, 2007, p. 75-92.

MENENGOLA, M.; SANT’ANNA, I. M. Por quê planejar? Como planejar?: currículo, área,
aula. 12ª. edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

capítulo 5 • 111
EXERCÍCIO RESOLVIDO
Capítulo 1
1. Em qual contexto a Didática surgiu? Quais são os pressupostos evidenciados
pelos grandes teóricos da Didática em relação ao processo de ensino e aprendiza-
gem?
Foi no século XVII que a Didática emergiu formalmente como uma área de conhecimento
que visa à investigação da ligação entre ensino e aprendizagem. Nesse século, João Amós
Comênio (1592-1670) escreveu a primeira obra clássica sobre Didática, A Didática Magna,
a qual é uma de suas obras mais expressivas.
Apesar de terem concepções diferentes, os pressupostos evidenciados pelos grandes teóri-
cos da Didática em relação ao processo de ensino e aprendizagem têm um aspecto comum:
a tentativa de ampliar o ensino a uma parcela significativa da população, pois acreditavam na
educação popular.

2. Qual(is) é(são) a(s) contribuição(ões) da Didática para o trabalho docente?


Entre as contribuições da Didática para o trabalho docente, é possível observar que a evolu-
ção dos pensamentos sobre a Didática se fundamenta em pressupostos teóricos que muito
contribuíram para a organização do espaço escolar, bem como para a reforma dos métodos
de ensino e de sua aplicação, ao longo do desenvolvimento do ensino formal.

3. Leia a citação a seguir e a partir dela reflita sobre o tema: “um professor que tem
didática”. Em seguida, escreva um texto (no máximo 20 linhas) caracterizando esse
professor.
Através do ensino criam-se as condições para a assimilação cons-
ciente e sólida de conhecimentos, habilidades e atitudes e, nesse pro-
cesso, os alunos formam suas capacidades e habilidades intelectuais
para se tornarem, sempre mais, sujeitos da própria aprendizagem (LI-
BÂNEO, 1994, p. 128).

Resposta pessoal. Entretanto, é importante que seja feita a seguinte análise: ao fazer a ca-
racterização deste professor (“um professor que tem didática”), deve-se ter como referência
um profissional que tenha as habilidades e as condições necessárias capazes de fomentar e
suscitar em seus alunos o desejo e a busca da descoberta de conhecimentos,habilidades e
atitudes, enfim, a construção do processo de ensino-aprendizagem de seus alunos.

112 • capítulo 5
4. Quais são as dimensões que integram a Didática fundamental? Comente cada
uma delas.
As dimensões que integram a Didática Fundamental são as dimensões humana, técnica e
político-social. Entretanto, a Didática Fundamental deve assumir a multidimensionalidade do
processo ensino-aprendizagem e promover uma articulação entre estas dimensões no cen-
tro de sua discussão. Preocupando-se com os seguintes elementos: “como realizar a prática
pedagógica”; “para que realizar a prática pedagógica”; “por que realizar a prática pedagógica”.
Portanto, esses três elementos só têm sentido quando desenvolvidos de forma articulada,
pois sua proposta não almeja apenas a mecanização e a manipulação de métodos e técnicas.

Capítulo 2
1. Qual é o papel da educação formal ao longo de sua trajetória histórica?
O surgimento da educação formal trouxe uma série de preocupações em relação à organiza-
ção e efetivação do processo de ensino e aprendizagem. Tais preocupações são explicadas
a partir do momento histórico, social e político da escola, originando explicações em relação
ao processo ensino-aprendizagem.

2. Qual é a concepção de ensino-aprendizagem evidenciada em cada tendência pe-


dagógica? E qual é a metodologia utilizada para propiciar tal aprendizagem?

TENDÊNCIA CONCEPÇÃO DE ENSINO- METODOLOGIA


PEDAGÓGICA APRENDIZAGEM
Pedagogia Tradicio- Função da escola é a transmissão dos O professor utiliza a
nal (Corrente Liberal) conhecimentos, visando à preparação exposição oral dos
intelectual e moral dos alunos. conteúdos.

O professor leva em
Pedagogia Reno- Seus pressupostos propiciaram, na déca-
conta os interesses dos
vadora (Corrente da de 1930, o surgimento do Movimento
alunos e é represen-
Liberal) dos Pioneiros da Escola nova, se opondo
tada por um conjunto
às práticas pedagógicas tidas como
de métodos ativos,
tradicionais.
tais como: pesquisa,
O mais importante não é o ensino, mas,
projetos, atividades
sim, o processo de aprendizagem. A
cooperativas
perspectiva de aprendizagem se baseia
na motivação e na estimulação de
problemas.

capítulo 5 • 113
Fundamenta-se na teoria behaviorista Utiliza-se procedimen-
Tecnicismo Educacio- da aprendizagem. tos e técnicas espe-
nal (Corrente Liberal) A escola deveria formar indivíduos para cíficas para garantir o
ingressar no mercado de trabalho. controle do ambiente
O ensino é voltado para a aquisição de da aprendizagem.
técnicas. Nesse contexto, a educação
se fundamenta no modelo empresarial,
adequando o ensino às exigências da
sociedade industrial e tecnológica.

Pedagogia Liber- A pedagogia libertadora floresceu a Prioriza discussões,


tadora (Corrente partir das experiências de Paulo Freire. assembleias, pes-
Progressista) Se caracteriza como uma educação quisas participantes,
“não formal”; a construção do conhe- trabalhos em grupo etc.
cimento é realizada a partir do diálogo
entre professor e alunos, mediada pela
realidade concreta em que vivem. Se
opunha à educação tradicional.
O cerne da proposta da pedagogia
libertadora é a transformação social do
homem.

Fundamenta-se nos estudos desenvolvi- As metodologias


Pedagogia Cogniti- dos pela psicologia acerca da cognição utilizadas devem partir
vista / Construtivista do ser humano, procurando explicar de métodos ativos
(Corrente Progres- como o indivíduo absorve e processa as (pesquisa em grupo,
sista) informações, dando-lhes significado. experimentação),
A função da escola oferecer possibilida- propondo discussões
des de aprendizagem ao aluno. como condição de
desenvolvimento
da aprendizagem.
Estimula interações
estabelecidas entre
alunos/alunos e alunos/
professor.

114 • capítulo 5
Pedagogia crítico- Surgiu após o final do regime militar, no Ênfase à livre-ex-
social dos conteúdos final dos anos 70 e início dos anos 80, pressão, ao contexto
(Corrente Progres- trazendo reivindicações para a efetivação cultural, partindo de
sista) de mudanças na escola pública, alme- uma relação direta da
jando uma educação crítica e capaz de experiência do aluno,
superar as desigualdades sociais. confrontando-se com
Neste contexto, os conteúdos de ensino o seu saber sistemati-
são constantemente reavaliados de zado. Alunos desenvol-
acordo com as realidades sociais. vem consciência crítica
diante do contexto
social.

3. Quais as contribuições da teoria sociointeracionista à educação? Quais são os


principais conceitos destacados por Vygostsky em relação ao processo de apren-
dizagem?
A teoria sociointeracionista tem se revelado um caminho para a promoção de uma ação
transformadora de ensinar e aprender. Nessa teoria, a perspectiva predominante é possibi-
litar aos alunos apropriação de conhecimentos, bem como oportunizar-lhes condições para
elaborar novos conhecimentos. Nesse contexto, é tarefa do professor criar um ambiente na
sala de aula propício ao diálogo, levando os alunos a refletir sobre os porquês e os como da
ação, por meio de um processo de interação.

Vygotsky defende a teoria sociointeracionista de desenvolvimento e aprendizagem, a partir


de uma perspectiva histórico-cultural de educação, na qual se considera o impacto decisivo
da interação social humana sobre a aprendizagem e o desenvolvimento. Tendo se dedicado à
compreensão da origem e funcionamento das funções mentais superiores, Vygostky aponta
que essas não são formadas exclusivamente pelo organismo biológico, ressaltando o papel
dos processos sociais como fatores imprescindíveis para o desenvolvimento de tais funções.
Logo, pela perspectiva sócio-histórica, as funções mentais superiores são construídas so-
cialmente, pelo processo de internalização: os conteúdos presentes na situação interpessoal
(entre as pessoas) tornam-se intrapessoais (no interior da pessoa). Para Vygotsky (2000
apud CHINALIA, 2006), a relação estabelecida entre aprendizagem e desenvolvimento su-
põe necessariamente a participação do outro, já que é na interação social, experienciando
condições de aprendizagem, que esta impulsiona o desenvolvimento. Sendo assim, o autor
introduz em sua teoria, o conceito de Zona de Desenvolvimento Potencial (ZDP), segundo o

capítulo 5 • 115
qual a interação social cria possibilidades de avanço superiores àquelas que seriam obser-
vadas individualmente.

Desse modo, ao reconhecer o papel da aprendizagem ou das mudanças decorrentes da ex-


periência no meio social para o desenvolvimento humano, podemos atentar para a relevância
do trabalho educacional formal e informal em que são inseridos os seres humanos.

Capítulo 3
1. A escola está produzindo um processo pedagógico que visa à superação das
desigualdades?
Não. Entretanto, apesar da escola ainda continuar reproduzindo desigualdades, mediante
isso, ainda busca-se uma proposta de ensino de qualidade, que possa verdadeiramente am-
pliar a participação efetiva do povo nos vários segmentos de decisão da sociedade, desde a
década de 60-70 do século XX. Neste sentido, a escola não pode mais se organizar como
espaço de exclusão. Assim, a escolarização para a cidadania, ao contrário da escolarização
para a exclusão e para a submissão, requer algumas reflexões sobre as ações que permeiam
o trabalho docente.

Segundo Chinalia (2006), a sociedade em que vivemos se diz democrática, mas os privilégios
permanecem favorecendo um grupo de pessoas. Lembrando que sociedade e escola não
existem de forma isolada, o que acontece na sociedade reflete-se nas escolas, que realizam
em seu contexto um trabalho a partir dos valores, das crenças e das prioridades que circulam
na sociedade. As desigualdades têm origem nos modos de organização das sociedades,
levando-se em conta seus processos históricos, políticos e econômicos, nos quais o homem
está inserido. Os indivíduos formam a sociedade e, possuindo suas particularidades, tentam
na medida do possível se adequar aos modelos que ela determina. A sociedade é construída
pela diversidade humana e, por isso mesmo, acaba privilegiando apenas alguns de seus
segmentos.

2. Ao desenvolver o trabalho docente, os professores propiciam incentivos e condi-


ções favoráveis para a aprendizagem? Como realizar ações como essas?
Para o fazer pedagógico dos professores propiciar as condições necessárias e favoráveis
para a aprendizagem, faz se necessário pensar e refletir sobre as relações pedagógicas que
permeiam o contexto escolar, integrando o trabalho docente. Diante disso, precisa ser anali-
sado se o trabalho docente envolve as relações interpessoais entre professor e alunos e en-
tre alunos/alunos, bem como ações pedagógicas mediadoras, ou seja, aquelas que provêm

116 • capítulo 5
condições e meios para os alunos se tornarem sujeitos ativos no processo de apropriação
dos conhecimentos sistematizados.
Além disso, é fundamental que o trabalho pedagógico na escola seja condizente às condi-
ções sociais de origem, às características individuais e socioculturaiss e ao nível de rendi-
mento escolar dos alunos. A democratização do ensino supõe o princípio da igualdade, mas,
junto com seu complemento indispensável, o princípio da diversidade.
Neste sentido, o professor, ao desenvolver sua ação docente, precisa abandonar as aulas
baseadas simplesmente na memorização de nomes, informações e conceitos, relacionan-
do-as aos conhecimentos e conceitos do cotidiano diário dos alunos e colocar em prática
as várias reflexões e organizações que integram a ação docente, uma delas é relacionar os
conteúdos de ensino a partir daquilo que têm significância para o aluno, no sentido de facilitar
sua aprendizagem.

3. Leia o trecho a seguir (extraído do livro infantil: Vivinha, a baleiazinha, de Ruth


Rocha). Em seguida, elabore uma atividade em que você poderá trabalhar com seus
alunos o respeito às diferenças (de gênero, de raça, de intelectualidade, entre ou-
tras).
Vivinha, a baleiazinha
Vivinha, a baleiazinha vivia muito tristinha.
Escondidinha, coitadinha...
Não queria brincar, não queria folia.
Passava o dia na melancolia.
Mas, também, as outras baleias mexiam muito com ela. E por quê?
Veja você, porque Vivinha tinha nascido diferente. Vivinha tinha nascido estampadinha, cheia
de bolinhas, listrinhas, florzinhas.
A mãe de Vivinha dizia:
- Vai brincar, minha filha!
Mas, Vivinha ficava em casa curtindo sua mágoa.
Quando Vivinha aparecia na janela, as outras baleias buliam com ela:
- Olha a baleiazinha estampadinha...
- Olha a baleiazinha estampadinha...
(ROCHA, Ruth. Vivinha a baleiazinha. São Paulo: Moderna, 2007.)

Não há uma resposta única, entretanto, você deverá fazer uma reflexão para elaborar a ativi-
dade em que você poderá trabalhar com seus alunos. Leia a seguinte reflexão para auxiliá-lo:

O tema apresentado no leva a pensar sobre a emergência de a es-

capítulo 5 • 117
cola se constituir em um local que propicie aprendizagem a todos os
alunos, bem como que não haja mais mecanismos que reforcem as di-
ferenças. Essa emergência é corroborada por Rays (2004, p. 95), ao
dizer que: “[...] A educação é hoje patrimônio do conjunto dos seres hu-
manos, sem distinção de classe. No entanto, não basta simplesmente
que a educação seja patrimônio do conjunto dos seres humanos. É
preciso que, além de abranger as diferentes classes sociais, a educa-
ção ocorra de forma processual e crítica e que seja contextualizada”.

Então, na escola para todos há que se pensar em concepções e ações de ensino que respei-
tem as diferenças e, ao mesmo tempo, que assegurem a todos os seus alunos a construção
e a reconstrução dos conhecimentos, beneficiando a todos, independentemente de suas
diferenças e/ou necessidades.

Capítulo 4
1. Os professores, em seu processo de formação profissional, estão discutindo as
relações que integram o processo ensino-aprendizagem?
Desde a década de 80 (do século XX), as discussões sobre a formação de professores se
intensificaram em decorrência das mudanças que permearam (e ainda permeiam) o pensa-
mento educacional e, consequentemente, a formação de professores. Então, na atualidade
(mais precisamente, desde a década de 90 do século XX), a formação de professores é con-
siderada um processo contínuo de profissionalização, sendo a formação inicial apenas o pri-
meiro momento. Ou seja, podemos dizer que o conhecimento profissional do professor deve
estar em constante construção e aperfeiçoamento, para que acompanhe o desenvolvimento
acelerado do conhecimento científico, na cultura e na arte, bases do conhecimento escolar e
das estruturas materiais e institucionais da sociedade. Em suma, é necessário que para uma
formação profissional contemporânea do professor, esta formação seja fundamentada em
uma perspectiva que amplia e ressignifica os modelos de formação profissionais iniciais, indo
em direção a um profissional cidadão.
Portanto, é possível observar que as discussões e propostas sobre a formação de professo-
res têm permeado a questão da defasagem existente entre a formação acadêmica (teoria) e
a realidade escolar (prática), destacando a necessidade de se repensar a separação entre a
teoria e a prática, ainda presente em alguns cursos de formação de professores.

2. Por que a formação de professores deve integrar a teoria e a prática? Os profes-


sores estão buscando a formação continuada?
Neste sentido, alguns estudos sobre a formação de professores pesquisadores e reflexivos,

118 • capítulo 5
focalizando a teoria e a prática como indissociáveis, ou seja, como elementos que se comple-
mentam. E assim surgiu o conceito de professor reflexivo que remete à ideia dos professo-
res buscarem investigar e pesquisar a prática docente, visando à realização de uma prática
pedagógica que atenda às problemáticas da sala de aula, integrando sua criatividade e seu
conhecimento técnico.
Torna-se, portanto, indispensável que os professores busquem a formação contínua, acre-
ditando que nela os professores podem refletir e pensar criticamente sobre sua prática. Na
formação contínua, as atividades desenvolvidas devem solicitar do profissional em ação a
observação e o registro de suas ações pedagógicas, para que seja possível propor a reestru-
turação de estratégias de ações diante dos problemas detectados.
De modo geral, verifica-se que, desde as últimas décadas do século XX, a literatura vem
apontando que a formação inicial é apenas um momento da formação docente e não o único,
como antes. Logo, adentramos o século XXI, fortalecendo esse pensamento e ampliando a
ideia de que a formação continuada deve ser desenvolvida de modo a contribuir com o en-
tendimento de que a formação profissional do professor não termina com a sua diplomação
na graduação, mas completa-se na realização de seu trabalho docente.
Portanto, a formação continuada, deve ser pensada como uma formação necessária e impor-
tante para complementar, ampliar e ressignificar a primeira formação com saberes e práticas
necessários ao professor no desenvolvimento da docência. Nessa perspectiva, o cotidiano
escolar é considerado como um espaço de produção, criação e recreação de saberes, isto
é, um local em que o professor mobiliza e emprega saberes provenientes de sua prática
cotidiana.

3. Leia a citação abaixo e reflita sobre a realização do trabalho docente. Nele, elabo-
re um comentário, respondendo à seguinte questão: quais são as contribuições da
prática reflexiva para a formação de professores?
O professor, ao ensinar, encontra-se constantemente monitorando o que ocorre durante
a aula e agindo com base em percepções e interpretações do que está acontecendo. As
crenças, metas, objetivos e conhecimentos dos professores se inter-relacionam, afetando-os
uns aos outros. Suas escolhas e decisões, além do contexto imediato, estão submetidas às
influências da história pessoal do professor e da história deste com seus alunos (MIZUKAMI,
2002, p. 44).
Observa-se, portanto, a importância de os professores exercerem um processo de reflexão
sobre as ações pedagógicas que desenvolvem em sala de aula para melhorar a eficácia de-
las, pois isso poderá possibilitar-lhes compreender, interpretar e explicar a realidade da sala
de aula, da escola e do ensino e, ao mesmo tempo, intervir nela. Uma formação profissional
que caminha nessa direção pode contribuir para que seja possível reduzir distâncias entre a

capítulo 5 • 119
teoria e a prática, que é um dos objetivos centrais da formação de professores.

4. Que saberes integram a formação de professores e consequentemente estão


presentes na prática docente, segundo Freire?
Neste sentido, alguns saberes são considerados indispensáveis aos professores, segundo
Freire (2001), os quais vão ao encontro de uma prática docente alicerçada por reflexões,
críticas, pesquisas, aspectos necessários e indispensáveis durante o processo de formação
inicial e continuada.
• Paulo Freire revela a importância do professor pesquisar, evidenciando que ensinar exige
pesquisa.
• O trabalho pedagógico permeia ações pedagógicas que valorizam e respeitam a história e
a realidade cultural, na qual os alunos estão inseridos. Isso significa que, para o autor, ensinar
exige competência profissional.
• Destaca a formação permanente do professor como um momento fundamental, pois o
professor, estando em atuação (exercendo a docência), sentirá necessidade de refletir sobre
sua prática.

Capítulo 5
1. Reflita sobre o conceito de competências descrito por Perrenoud (1999, p. 7-8),
“competências são uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo
de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”.
Além da formação do profissional reflexivo, outra questão que tem ganhado cada vez mais
destaque é a formação de professores com competências profissionais. Perrenoud (2000),
introduziu uma “nova” dimensão para abordar o trabalho pedagógico desenvolvido pela esco-
la: a formação de competências. O autor ressalta ainda que ser professor na escola contem-
porânea demanda desse profissional a criação de situações para resolver problemáticas que
emergem no contexto da sala de aula. Para ele, a noção de competência indica “a capacidade
de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, atitudes, informações, etc) para
enfrentar um tipo de situação.”

2. As ações pedagógicas desenvolvidas na escola contemporânea refletem a atua-


ção de um professor competente?
Sim, segundo (PERRENOUD, 2000), a noção de competência indica “a capacidade de mo-
bilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, atitudes, informações etc) para enfrentar
um tipo de situação”. O autor revela quatro aspectos que contemplam essa definição:
1. As competências não são elas mesmas saberes, savoir-faire ou atitudes, mas mobilizam,
integram e orquestram tais recursos.

120 • capítulo 5
2. Essa mobilização só é pertinente em situação, sendo cada situação singular, mesmo que
se possa tratá-la em analogia com outras, já encontradas.
3. O exercício da competência passa por operações mentais complexas, subentendidas
por esquemas de pensamento [...] que permitem determinar (mais ou menos conscien-
te e rapidamente) e realizar (de modo mais ou menos eficaz) uma ação relativamente
adaptada à situação.
4. As competências profissionais constroem-se, em formação, mas também ao sabor da
navegação diária de um professor, de uma situação de trabalho a outra.

3. Qual é a relação entre professor competente e práticas pedagógicas produtivas?


Existe uma relação tênue entre professor competente e sua prática pedagógica. Ou seja,
como visto anteriormente, competência está relacionada à capacidade de mobilizar um con-
junto de recursos cognitivos para enfrentar um tipo de situação, fundamentando, dessa for-
ma, sua prática pedagógica cotidiana.

PERRENOUD (2000), ressalta também que não há uma “maneira neutra de fazer esse tra-
balho, porque a própria identificação das competências supõe opções teóricas e ideológicas
e, portanto, uma certa arbitrariedade na representação do ofício e em suas facetas”
Bom estudo!

capítulo 5 • 121

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