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ESCRITA-MAGISTRATURA-FEDERAL-DIREITO-ADMINISTRATIVO-IMPROBIDADE-ADMINISTRATIVA

DA-POLI-CIA-CIVIL-DIREITO-ADMINISTRATIVO-IMPROBIDADE-ADMINISTRATIVA

TREINANDO A ESCRITA ✍

DIREITO ADMINISTRATIVO - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Rafael, Prefeito de um Município do interior do Ceará, contratou Paula, sem concurso público, baseado

em lei municipal, para exercer a função de enfermeira. Essa contratação durou de maio de 2009 até julho

de 2012, sendo ela então dispensada, imotivadamente, sem receber direitos trabalhistas.

A Justiça do Trabalho declarou nula a referida contratação, por ofender o art. 37, II, da CF/88 e

determinou o encaminhamento de cópias dos autos ao Ministério Público estadual. O Promotor de

Justiça, então, ajuizou ação de improbidade contra Rafael argumentando que essa contratação violou o

princípio do concurso público; os princípios da legalidade, da moralidade administrativa, da

impessoalidade e da eficiência. Por isso, estaria configurado o ato de improbidade administrativa com

base no caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92.

A ação de improbidade foi julgada procedente, tendo Rafael apelado da decisão. Na fase recursal, o

promotor de justiça ofereceu acordo de não persecução cível, tendo Rafael aceitado o acordo.

Diante do caso concreto, responda, fundamentadamente:

a) É possível a realização desse acordo? Em que momento o acordo pode ser celebrado?

b) Quais os requisitos para a celebração do acordo?

c) O que ocorre se houver o descumprimento do acordo?

d) De acordo com a jurisprudência do STJ, há ato de improbidade administrativa no caso em tela?

Justifique.

RESPOSTA

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A QUESTÃO

O tema “improbidade administrativa” é sempre cotado para ser cobrado nas provas de concursos

públicos, seja nas provas objetivas, seja nas subjetivas.

A improbidade administrativa é regida pela Lei nº 8.429/92, que foi bastante modificada no ano de

2021, por meio da Lei nº 14.230/21.

É essencial que o candidato conheça a lei e, principalmente, as modificações trazidas.

Pois bem.

De acordo com o prof. Márcio André Lopes Cavalcante, o “acordo de não persecução cível é um

negócio jurídico firmado entre o Ministério Público e o suposto autor do ato de improbidade administrativa

segundo o qual este último se compromete a cumprir certas condições e, em troca, não será condenado por

improbidade administrativa1”.

É interessante mencionar que até 2019, o ANPC (acordo de não persecução cível) não era possível,

pois a lei vedava a realização de transação, acordo ou conciliação envolvendo improbidade administrativa.

Após a vigência da Lei nº 13.964/2019 passou a ser permitido acordo de não persecução cível em

improbidade administrativa. Não obstante, não havia ainda uma regulamentação detalhada, que veio com o

advento da Lei nº 14.230/21, que passou a disciplinar, de forma mais detalhada, o acordo de não persecução

cível envolvendo improbidade administrativa.

Veja o que diz o art. 17-B da LIA:

Art. 17-B. O Ministério Público poderá, conforme as circunstâncias do caso

concreto, celebrar acordo de não persecução civil, desde que dele advenham, ao

menos, os seguintes resultados:

I - o integral ressarcimento do dano;

II - a reversão à pessoa jurídica lesada da vantagem indevida obtida, ainda que

oriunda de agentes privados.

§ 1º A celebração do acordo a que se refere o caput deste artigo dependerá,

cumulativamente:

I - da oitiva do ente federativo lesado, em momento anterior ou posterior à

propositura da ação;

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https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/a4939072217b46203c4f5764cb4dac40?categoria=2&subcategoria=23

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II - de aprovação, no prazo de até 60 (sessenta) dias, pelo órgão do Ministério

Público competente para apreciar as promoções de arquivamento de inquéritos

civis, se anterior ao ajuizamento da ação;

III - de homologação judicial, independentemente de o acordo ocorrer antes ou

depois do ajuizamento da ação de improbidade administrativa.

§ 2º Em qualquer caso, a celebração do acordo a que se refere o caput deste

artigo considerará a personalidade do agente, a natureza, as circunstâncias, a

gravidade e a repercussão social do ato de improbidade, bem como as vantagens,

para o interesse público, da rápida solução do caso.

§ 3º Para fins de apuração do valor do dano a ser ressarcido, deverá ser realizada

a oitiva do Tribunal de Contas competente, que se manifestará, com indicação

dos parâmetros utilizados, no prazo de 90 (noventa) dias.

§ 4º O acordo a que se refere o caput deste artigo poderá ser celebrado no curso

da investigação de apuração do ilícito, no curso da ação de improbidade ou no

momento da execução da sentença condenatória.

§ 5º As negociações para a celebração do acordo a que se refere o caput deste

artigo ocorrerão entre o Ministério Público, de um lado, e, de outro, o investigado

ou demandado e o seu defensor.

§ 6º O acordo a que se refere o caput deste artigo poderá contemplar a adoção de

mecanismos e procedimentos internos de integridade, de auditoria e de

incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética

e de conduta no âmbito da pessoa jurídica, se for o caso, bem como de outras

medidas em favor do interesse público e de boas práticas administrativas.

§ 7º Em caso de descumprimento do acordo a que se refere o caput deste artigo, o

investigado ou o demandado ficará impedido de celebrar novo acordo pelo prazo

de 5 (cinco) anos, contado do conhecimento pelo Ministério Público do efetivo

descumprimento.

Assim, as negociações para a celebração do acordo ocorrerão entre o Ministério Público, de um

lado, e, de outro, o investigado ou demandado e o seu defensor, não havendo participação do magistrado.

O acordo de não persecução cível somente poderá ser celebrado se dele advier, ao menos, os

seguintes resultados: I - o integral ressarcimento do dano; II - a reversão à pessoa jurídica lesada da vantagem

indevida obtida, ainda que oriunda de agentes privados.

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De acordo com o art. 17-B, § 4º, da LIA, o acordo poderá ser celebrado: a) no curso da investigação

de apuração do ilícito; b) no curso da ação de improbidade; ou c) no momento da execução da sentença

condenatória. Veja novamente:

Art. 17-B (...)

§ 4º O acordo a que se refere o caput deste artigo poderá ser celebrado no curso

da investigação de apuração do ilícito, no curso da ação de improbidade ou no

momento da execução da sentença condenatória. (Incluído pela Lei nº 14.230, de

2021)

É certo que, antes da Lei nº 14.230/21, a Lei de Improbidade não tratava expressamente sobre isso.

Mesmo assim, havia julgados do STJ afirmando que o acordo poderia ser celebrado mesmo em fase recursal.

Veja:

É possível acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade

administrativa em fase recursal.

STJ. 1ª Turma. Acordo no AREsp 1314581/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado

em 23/02/2021 (Info 686).

Assim, seja antes ou depois da Lei nº 14.230/2021, o STJ entende que é possível a homologação

judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal.

STJ. 1ª Seção. EAREsp 102.585-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 09/03/2022 (Info 728).

A celebração do acordo dependerá do preenchimento de três requisitos cumulativos:

1) a oitiva do ente federativo lesado, em momento anterior ou posterior à propositura da ação;

2) aprovação, no prazo de até 60 dias, pelo órgão do Ministério Público competente para apreciar

as promoções de arquivamento de inquéritos civis, se anterior ao ajuizamento da ação;

3) homologação judicial, independentemente de o acordo ocorrer antes ou depois do ajuizamento

da ação de improbidade administrativa.

Em qualquer caso, a celebração do acordo considerará a personalidade do agente, a natureza, as

circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do ato de improbidade, bem como as vantagens, para o

interesse público, da rápida solução do caso (§ 2º do art. 17-B).

O acordo poderá contemplar a adoção de mecanismos e procedimentos internos de integridade,

de auditoria e de incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta

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no âmbito da pessoa jurídica, se for o caso, bem como de outras medidas em favor do interesse público e de

boas práticas administrativas (§ 6º do art. 17-B).

Para fins de apuração do valor do dano a ser ressarcido, deverá ser realizada a oitiva do Tribunal de

Contas competente, que se manifestará, com indicação dos parâmetros utilizados, no prazo de 90 dias (§ 3º do

art. 17-B).

Em caso de descumprimento do acordo, o investigado ou o demandado ficará impedido de

celebrar novo acordo pelo prazo de 5 anos, contado do conhecimento pelo Ministério Público do efetivo

descumprimento (§ 7º do art. 17-B).

Por fim, de acordo com o STJ, a contratação de servidores públicos temporários sem concurso

público, mas baseada em legislação local, não configura a improbidade administrativa prevista no art. 11 da Lei

nº 8.429/92, por estar ausente o elemento subjetivo (dolo), necessário para a configuração do ato de

improbidade violador dos princípios da administração pública. STJ. 1ª Seção.REsp 1913638-MA, Rel. Min. Gurgel

de Faria, julgado em 11/05/2022 (Recurso Repetitivo – Tema 1108) (Info 736).

Veja o que diz o art. 11:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os

princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os

deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por

uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

É importante mencionar que o caso ocorreu antes da vigência da Lei nº 14.230/21. Não obstante, a

conduta não configurou ato de improbidade administrativa mesmo antes da Lei nº 14.230/2021.

A contratação de servidores públicos temporários sem concurso público baseada em legislação

local, ainda que considerada posteriormente inconstitucional, afasta a caracterização do dolo genérico para a

configuração de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública.

Desse modo, como o Prefeito agiu baseado em lei municipal, não se pode dizer que ele tivesse dolo

de praticar o ato de improbidade. Veja:

A contratação de servidores públicos temporários sem concurso público, mas

baseada em legislação local, não configura a improbidade administrativa

prevista no art. 11 da Lei nº 8.429/92, por estar ausente o elemento subjetivo

(dolo), necessário para a configuração do ato de improbidade violador dos

princípios da administração pública.

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STJ. 1ª Seção.REsp 1.913.638-MA, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 11/05/2022

(Recurso Repetitivo – Tema 1108) (Info 736).

Se o caso houvesse ocorrido após a vigência da Lei nº 14.230/2021, também não haveria

improbidade, pois, a Lei nº 14.230/2021 trouxe duas alterações que restringiram ainda mais a possibilidade de

caracterização do ato de improbidade administrativa.

Veja as principais alterações:

1ª) agora, só existe ato de improbidade administrativa se houver dolo específico.

Antes da Lei nº 14.230/2021, a jurisprudência do STJ afirmava que o dolo genérico era suficiente

para a configuração da conduta ímproba.

2ª) o rol de atos de improbidade administrativa do art. 11 da LIA passou a ser taxativo e não se

pode mais enquadrar a conduta no caput nem no inciso I, que foi revogado.

Antes da Lei nº 14.230/2021, as expressões “qualquer” e “notadamente” utilizadas no caput do art.

11 da LIA demonstravam que o rol dos atos de improbidade administrativa era exemplificativo (numerus

apertus).

No entanto, a Lei nº 14.230/2021 modificou a redação do caput do art. 11 para inserir a expressão

“caracterizada por uma das seguintes condutas”. Logo, agora, pode-se dizer que os incisos do art. 11 encerram

uma lista exaustiva.

Desse modo, os princípios que o MP afirmou que o Prefeito havia violado se enquadravam no caput

e no inciso I do art. 11 da LIA, mas não encontram, atualmente, correspondência nos incisos desse mesmo

artigo.

ESPELHO DE RESPOSTA

O acordo de não persecução cível é um negócio jurídico firmado entre o Ministério Público e o

suposto autor do ato de improbidade administrativa segundo o qual este último se compromete a cumprir

certas condições e, em troca, não será condenado por improbidade administrativa. É interessante mencionar

que até 2019, o ANPC (acordo de não persecução cível) não era possível, pois a lei vedava a realização de

transação, acordo ou conciliação envolvendo improbidade administrativa. Após a vigência da Lei nº 13.964/2019

passou a ser permitido acordo de não persecução cível em improbidade administrativa. Não obstante, não havia

ainda uma regulamentação detalhada, que veio com o advento da Lei nº 14.230/21, que passou a disciplinar, de

forma mais detalhada, o acordo de não persecução cível envolvendo improbidade administrativa.

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De acordo com o art. 17-B, § 4º, da LIA, o acordo poderá ser celebrado: a) no curso da investigação

de apuração do ilícito; b) no curso da ação de improbidade; ou c) no momento da execução da sentença

condenatória.

O acordo de não persecução cível somente poderá ser celebrado se dele advier, ao menos, os

seguintes resultados: o integral ressarcimento do dano; a reversão à pessoa jurídica lesada da vantagem

indevida obtida, ainda que oriunda de agentes privados.

A celebração do acordo dependerá do preenchimento de três requisitos cumulativos: 1) a oitiva do

ente federativo lesado, em momento anterior ou posterior à propositura da ação; 2) aprovação, no prazo de até

60 dias, pelo órgão do Ministério Público competente para apreciar as promoções de arquivamento de

inquéritos civis, se anterior ao ajuizamento da ação; 3) homologação judicial, independentemente de o acordo

ocorrer antes ou depois do ajuizamento da ação de improbidade administrativa.

Em caso de descumprimento do acordo, o investigado ou o demandado ficará impedido de

celebrar novo acordo pelo prazo de 5 anos, contado do conhecimento pelo Ministério Público do efetivo

descumprimento (§ 7º do art. 17-B).

Por fim, de acordo com o STJ, a contratação de servidores públicos temporários sem concurso

público, mas baseada em legislação local, não configura a improbidade administrativa prevista no art. 11 da Lei

nº 8.429/92, por estar ausente o elemento subjetivo (dolo), necessário para a configuração do ato de

improbidade violador dos princípios da administração pública.

PONTUAÇÃO

TÓPICO PONTOS MÁXIMOS

1. Acordo de não persecução cível. Conceito. Histórico. 1,00

2. O acordo poderá ser celebrado: a) no curso da investigação de

apuração do ilícito; b) no curso da ação de improbidade; ou c) no


2,00
momento da execução da sentença condenatória. o art. 17-B, § 4º,

da LIA.

3. Somente poderá ser celebrado se dele advier, ao menos, os

seguintes resultados: o integral ressarcimento do dano; a reversão


1,50
à pessoa jurídica lesada da vantagem indevida obtida, ainda que

oriunda de agentes privados.

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4. ANPC. Requisitos. 2,00

5. Em caso de descumprimento do acordo, o investigado ou o

demandado ficará impedido de celebrar novo acordo pelo prazo


1,50
de 5 anos, contado do conhecimento pelo Ministério Público do

efetivo descumprimento (§ 7º do art. 17-B).

6. A contratação de servidores públicos temporários sem concurso

público, mas baseada em legislação local, não configura a

improbidade administrativa prevista no art. 11 da Lei nº 8.429/92,


2,00
por estar ausente o elemento subjetivo (dolo), necessário para a

configuração do ato de improbidade violador dos princípios da

administração pública.

TOTAL 10,00

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