Você está na página 1de 7

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 5ª VARA CRIMINAL

DA COMARCA DE XXXXXXXXXXX

Caio (sobrenome), qualificado no processo em epígrafe, da Ação Penal movida pelo


Ministério Público, por intermédio de seus defensores constituídos, no prazo legal do
artigo 396 do Código de Processo Penal, apresentar

RESPOSTA À ACUSAÇÃO

de acordo com os fatos e fundamentos a seguir delineados:

I. BREVE SÍNTESE DOS FATOS

Alega o parquet que Caio (sobrenome) emprestou a José o importe de R$ 20.000,00


(vinte mil reais), conforme expresso em nota promissória. No dia do vencimento da
dívida (15 de maio de 2010), cobrou de José primeiramente por telefone, resultando
em uma nova promessa de pagamento dentro do prazo de uma semana, o que não
se concretizou, incorrendo José em inadimplência.

Assim, Caio, no dia 24 de maio de 2010, dirigiu-se ao restaurante adquirido por José
com seu dinheiro emprestado e o cobrou, utilizando-se de uma arma de fogo para
tanto e exigindo a quitação da dívida ou o pagamento com a própria vida. Diante
desse fato, José, assustado, contactou a polícia que não conseguiu localizar Caio.

Após levar os fatos à delegacia de polícia, houve a abertura de inquérito policial para
apurar as circunstâncias do ocorrido e, posteriormente, a denúncia pelo crime de
extorsão qualificada pelo emprego de arma de fogo, após a confirmação do
ocorrido em sede de investigação policial. Recebida a denúncia, houve a citação no
dia 18 de janeiro de 2011, pelo juízo da 5ª Vara Criminal, depois de extrapolado o
prazo de 6 (seis) meses entre a identificação de Caio e o início da ação penal.

1
II. PRELIMINARES

2.1 Da exceção de ilegitimidade ad causam ativa

De início, observa-se que a conduta do réu não se molda ao artigo 158, § 1º do


Código Penal, mas ao artigo 345 do mesmo diploma, que discorre sobre o crime de
Exercício arbitrário das próprias razões. Logo, é certo que o Ministério Público não
possui legitimidade ativa para intentar Ação Penal Pública Incondicionada em
desfavor do réu, porquanto, o crime previsto no artigo 345 somente se procede
mediante queixa-crime, tratando-se de Ação Penal Pública de Iniciativa
Privada.

Consequentemente, a rejeição da denúncia é medida que se impõe, considerando


que a falta de legitimidade ad causam ativa implica na ausência de pressuposto
processual, o que enseja, com toda certeza, a incidência do artigo 395, inciso II do
Código de Processo Penal.

Vejamos:

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:


I - for manifestamente inepta;
II - faltar pressuposto processual ou condição para o
exercício da ação penal; ou
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.
Parágrafo único. (Revogado). (Grifo não original).

Ainda, vê-se que o processo padece de regularidade, de modo que a declaração de


sua nulidade é cogente, nos termos do artigo 564, inciso II do Código de Processo
Penal:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:


I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;
II - por ilegitimidade de parte;
III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

[...] (Grifo não original).

Assim, requer a rejeição da denúncia ou a declaração de nulidade do processo


em decorrência da manifesta ilegitimidade ad causam ativa do Ministério Público,
com fulcro nos artigos 395, inciso II e 564, inciso II do Código de Processo Penal.
2
2.2 Da exceção de incompetência do juízo

Conforme supracitado, a conduta de Caio subsome ao artigo 345, que prevê a pena
de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. Dessa forma, é considerado um
crime de menor potencial ofensivo e, em consonância com o artigo 61 da Lei nº
9.099/95, deve ser processado sob o rito do Juizado Especial Criminal -
JECRIM, como segue:

Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor


potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as
contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena
máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não
com multa. (Grifo não original).

Assim, os atos devem ser considerados nulos, uma vez que esse rito não
considera institutos despenalizadores como a transação penal e composição civil
dos danos antes do oferecimento da denúncia. O que revela a ausência das
formalidades essenciais do processo.

Portanto, requer a declaração de incompetência do juízo, atendendo aos artigos


564, inciso I e IV e 567 do Código Processual Penal, bem como, o artigo 5º, inciso
LV da Constituição Federal.

III. MÉRITO

3.1 Da decadência

Nos crimes que se procede mediante Ação Penal Pública de Iniciativa Privada,
extingue-se a punibilidade pela decadência (artigo 107, inciso IV do Código Penal).
De modo que o ofendido ou seu representante legal decairá no direito de queixa ou
de representação se não a exercer dentro do prazo de 6 (seis) meses, contados a
partir do conhecimento da autoria do crime (artigo 38 do Código de Processo Penal).

Atente-se ao inteiro teor da norma:

Extinção da punibilidade
Art. 107 - Extingue-se a punibilidade:
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;

3
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato
como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito,
nos crimes de ação privada;
VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a
admite;
VII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
VIII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei. (Grifo
não original).

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu


representante legal, decairá no direito de queixa ou de
representação, se não o exercer dentro do prazo de seis
meses, contado do dia em que vier a saber quem é o
autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se
esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de


queixa ou representação, dentro do mesmo prazo, nos
casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31. (Grifo não
original).

No presente caso, observa-se que os atos imputados ao réu ocorreram no dia 24 de


maio de 2010, ao passo que nos 6 (seis) meses seguintes não houve a
representação do ofendido, operando-se a decadência diante de seu esgotamento
e, por consequência, a extinção da punibilidade. Consigne-se que tal prazo é de
natureza material, fatal e improrrogável.

Em reforço, atente-se ao julgado do Superior Tribunal de Justiça em caso análogo:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FURTO


QUALIFICADO. ERRO NA CAPITULAÇÃO JURÍDICA
CONFERIDA AOS FATOS DESCRITOS NA DENÚNCIA.
POSSIBILIDADE DE CORREÇÃO EXCEPCIONAL.
EQUÍVOCO NO ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA
CONDUTA NARRADA NA EXORDIAL. EXERCÍCIO
ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES. CRIME DE AÇÃO
PENAL PRIVADA. ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO
PÚBLICO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE QUEIXA PELO
OFENDIDO. RECURSO PROVIDO. 1. Ainda que se trate de
mera retificação da capitulação jurídica dos fatos descritos
na vestibular, tal procedimento não pode ser realizado no
4
momento do recebimento da inicial, sendo cabível apenas
quando da prolação da sentença, nos termos do artigo 383
do Código de Processo Penal. Doutrina. Precedentes do
STJ e do STF. 2. Todavia, quando se trata de beneficiar o
réu, buscando-se a correta fixação da competência ou do
procedimento a ser adotado, admite-se a excepcional
atuação do magistrado, que pode corrigir o enquadramento
típico contido na inicial antes de proferida sentença
condenatória no feito. Precedentes do STJ e do STF. 3. No
caso dos autos, imputou-se aos recorrentes e demais
corréus o crime de furto qualificado, porque um deles,
buscando solucionar uma dívida que a vítima visada havia
com ele contraído, resolveu pegar, acompanhado dos
demais, uma moto que acreditava pertencer ao devedor. 4.
Tendo o Ministério Público narrado na incoativa que os
acusados agiram com o especial fim de obter o pagamento
de uma dívida que o suposto dono da moto havia contraído
com um deles, caracteriza-se o tipo penal previsto no artigo
345 do Código Penal. 5. O crime de exercício arbitrário
das próprias razões praticado sem violência somente se
procede mediante queixa. 6. O não exercício do direito
de queixa no prazo de seis meses, a contar do
conhecimento da autoria pelo ofendido, enseja a
extinção da punibilidade. 7. Recurso provido para
atribuir nova capitulação à conduta dos recorrentes para
o crime previsto no artigo 345 do Código Penal,
anulando-se a ação penal em razão da ilegitimidade
ativa do Ministério Público e extinguindo-se a sua
punibilidade pela decadência do direito de exercício de
queixa, estendendo-se os efeitos da decisão aos corréus
em igual situação, na forma do artigo 580 do Código de
Processo Penal. (STJ - RHC n. 78.111/PB, relator Ministro
Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 15/12/2016, DJe de
1/2/2017). (Grifo não original).

À vista disso, requer o reconhecimento da extinção da punibilidade pelo decurso


do prazo de 6 (seis) meses para representação do ofendido e a absolvição sumária
do acusado, com espeque no artigo 397, inciso IV do Código de Processo Penal.

3.2 Da tipificação do crime

Em análise dos autos, verifica-se que a conduta do réu foi classificada no ilícito
penal previsto no artigo 158 do Código Penal, que exige para tipificação o ato de
“constranger alguém [...] com o intuito de obter para si ou para outrem indevida

5
vantagem econômica”. Tal enquadramento não passa de um equívoco, porquanto o
réu não constrangeu José a fim de obter “indevida vantagem econômica”, mas
desejava tão somente reaver o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) que
emprestou legalmente e imbuído de boa-fé objetiva.

Todavia, o devedor recusou-se a cumprir com suas obrigações legais, obrigando o


réu a agir com suas próprias forças para receber o valor que lhe é devido pelo
Ordenamento Jurídico. Torna-se, portanto, hialina que a conduta do réu molda-se
perfeitamente ao tipo penal previsto no artigo 345 do Código Penal.

Vejamos:

Exercício arbitrário das próprias razões


Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para
satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei
o permite:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além
da pena correspondente à violência.
[...] (Grifo não original).

Dessa forma, caso Vossa Excelência entenda que se trata de fato típico, ilícito e
culpável, requer a desclassificação do crime para o tipo penal previsto no
artigo 345 do Código Penal, com arrimo no artigo 419 do Código de Processo
Penal.

IV. PEDIDOS

Ante o exposto, requer:

1. A rejeição da denúncia ou a declaração de nulidade do processo em


razão da ilegitimidade ad causam ativa do Ministério Público, com fulcro nos
artigos 395, inciso II e 564, inciso II do Código de Processo Penal;
2. Subsidiariamente, a declaração de incompetência do juízo, com
fundamento no artigo 564, inciso I e IV e 567 do Código Processual Penal,
bem como, o artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal;
3. O reconhecimento da extinção da punibilidade pelo decurso do prazo de 6
(seis) meses para representação do ofendido e a absolvição sumária do
acusado, com espeque no artigo 397, inciso IV do Código de Processo Penal;
4. Subsidiariamente, a desclassificação do crime para o tipo penal previsto
no artigo 345 do Código Penal, com arrimo no artigo 419 do Código de
Processo Penal.
6
Requer provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, em
especial, a prova documental e testemunhal.

Pede deferimento.

28 de janeiro de 2011, Palmas-TO.

João Eduardo Pinto Pires


OAB XXX.XXX

Ellen Thais Oliveira Santos


OAB XXX.XXX

Rol de testemunhas:

1. Testemunha primeira;
2. Testemunha segunda;
3. Testemunha terceira;
4. Testemunha quarta.

Você também pode gostar