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CPVI – Aula 13 1

Lei Maria da Penha – Lei 11.340/06

1) Introdução:
Tal lei foi feita para atender ao mandamento constitucional do art. 226, §8º, CRFB (“O Estado assegurará a
assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no
âmbito de suas relações”).

No mesmo sentido deste comando constitucional, o Estado Brasileiro, com o intuito de coibir a violência
contra a mulher, assinou dois importantes tratados internacionais:

 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher;

 Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (“Convenção de
Belém do Pará).

A fim de regulamentar o §8º do art. 226 da CF/88 e dar maior efetividade aos compromissos internacionais
assumidos em defesa da mulher, foi editada a Lei n° 11.340/2006, conhecida como “Lei Maria da Penha”. Apesar de
a norma constitucional ser genérica e tratar de violência no âmbito de suas relações familiares de forma ampla, a
presente lei especificou o seu objeto de incidência relacionado à violência doméstica contra a mulher, conforme
art. 1º.

Assim, os arts. 2º e 3º retratam o reconhecimento dos direitos fundamentais às mulheres, bem como
asseguram a elas as condições para o exercício efetivo de seus direitos. Tal norma decorre do princípio da
igualdade constitucional (art. 5º, caput; e art. 3º, III, CRFB).

Sobre a natureza da lei, não se pode dizer que ela tenha conteúdo penal 1, uma vez que ela não prevê tipos
penais que configurem violência doméstica e familiar contra a mulher. Da mesma forma, o seu conteúdo não tem
nenhuma norma ligada ao exercício do jus puniendi. Diz-se que tal lei tem conteúdo PROCESSUAL PENAL (art.
12, 15, 18, 19, 20, etc.), mas também trata de questões ligadas ao DIREITO CIVIL (art. 23, 24, 25, etc.). Portanto,
diz-se que a lei tem CONTEÚDO MISTO.

1.1) Constitucionalidade da Lei Maria da Penha:


Conforme definiu o STF na ADC 19, não há violação do princípio constitucional da igualdade no fato de a
Lei 11.340/06 ser voltada apenas à proteção das mulheres.

A Presidência da República ingressou com uma ação declaratória de constitucionalidade (ADC n° 19) com
o objetivo de declarar que o art. 1º da Lei seria constitucional. A ADC foi necessária porque havia alguns juízes
estaduais que declaravam inconstitucional a Lei Maria da Penha porque elas fariam discriminação entre homem e
mulher ao protegerem apenas as mulheres em detrimento dos homens.

A ADC foi julgada procedente por unanimidade, ou seja, o STF declarou constitucional o art. 1º da Lei,

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A Lei Maria da Penha não traz um rol de crimes em seu texto. Esse não foi seu objetivo. A Lei n.° 11.340/2006 trouxe regras
processuais instituídas para proteger a mulher vítima de violência doméstica, mas sem tipificar novas condutas, salvo uma
pequena alteração feita no art. 129 do CP. Desse modo, o chamado feminicídio não era previsto na Lei n.° 11.340/2006, apesar
de a Sra. Maria da Penha Maia Fernandes, que deu nome à Lei, ter sido vítima de feminicídio duas vezes (tentado). Vale
ressaltar que as medidas protetivas da Lei poderão ser aplicadas à vítima do feminicídio (obviamente, desde que na
modalidade tentada).
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afirmando que não há violação ao princípio da igualdade. Dessa feita, conclui-se que a Lei Maria da Penha
somente protege a mulher.

O homem até pode ser vítima de violência doméstica e familiar (ex: homem que apanha de sua esposa). No
entanto, somente a mulher recebe uma proteção diferenciada. O homem recebe a proteção comum prevista no
Código Penal.

A mulher, conforme o Relator, Min. Marco Aurélio, é vulnerável quando se trata de constrangimentos
físicos, morais e psicológicos sofridos em âmbito privado. “Não há dúvida sobre o histórico de discriminação por
ela enfrentado na esfera afetiva. As agressões sofridas são significativamente maiores do que as que acontecem – se
é que acontecem – contra homens em situação similar”, avaliou. O Relator afirmou que a Lei Maria da Penha
promove a igualdade em seu sentido material, sem restringir de maneira desarrazoada o direito das pessoas
pertencentes ao gênero masculino. Assim, trata-se de uma ação afirmativa (discriminação positiva) em favor da
mulher.

O Min. Ayres Britto disse que a Lei está em consonância plena com o que denominou de “constitucionalismo
fraterno”, que seria a filosofia de remoção de preconceitos contida na Constituição Federal de 1988.

O Min. Gilmar Mendes lembrou que não há inconstitucionalidade em legislação que dá proteção ao menor,
ao adolescente, ao idoso e à mulher.

Igualdade formal e material


A igualdade formal (também chamada de igualdade perante a lei, civil ou jurídica) está prevista no art.
5º, caput da CF/88 e consagra que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.

A igualdade material (igualdade perante os bens da vida, substancial, real ou fática) preconiza que as
desigualdades fáticas existentes entre as pessoas devem ser reduzidas por meio da promoção de políticas públicas
e privadas. A igualdade material também encontra previsão na CF/88 (art. 3º, III).

A igualdade material e a formal acabam sendo conflitantes entre si. Com efeito, a igualdade formal
pressupõe um tratamento igual. Quando se trata todos da mesma forma, está se promovendo a igualdade formal,
mas relegando a igualdade material. Quando se trata desigualmente os desiguais, promove-se a igualdade material
em detrimento da igualdade formal.

As ações afirmativas são medidas especiais que têm por objetivo assegurar progresso adequado de certos
grupos raciais, sociais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem de proteção e que possam ser necessárias e úteis
para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades
fundamentais (REsp 1264649/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 01/09/2011).

Desse modo, ao contrário do que muitas pessoas pensam, as ações afirmativas não se restringem à
proteção de negros, mas também de mulheres e outros grupos.

2) Incidência da Lei:
2.1) Sujeito Passivo (art. 5º):
Conforme dispõe o art. 5º, a lei considera sujeito passivo da relação, objeto de proteção, a mulher em
situação de violência doméstica. Assim, o sujeito passivo da violência doméstica obrigatoriamente deve ser uma
pessoa do sexo feminino (criança, adulta, idosa, desde que do sexo feminino).

Obs.: Deve-se destacar que a Lei Maria da Penha não protege todas as mulheres, mas apenas as que
se encontram nesta condição específica, qual seja, de violência doméstica.
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Obs.2: A lei protege também o transexual com mudança de sexo autorizada pela justiça.

2.2) Sujeito Ativo (art. 5º, § único):


Em relação ao agressor, este poderá ser tanto homem quanto mulher. Isso porque a incidência dessa lei
independe de orientação sexual (art. 5º, § único).

Obs.: O STJ (HC 175.816/RS) cada vez mais vem dando uma interpretação restritiva em relação
ao agressor. O STJ exige também outros 2 requisitos:

 Situação de vulnerabilidade da vítima em relação à agressora, de modo a haver


superioridade física ou econômica do agressor em face da vítima. Porém, o STJ entende que a
existência de relação afetiva pressupõe tal superioridade do agressor.

Obs.: O STJ e STF têm entendimento consolidado no sentido de que a hipossuficiência e a


vulnerabilidade, necessárias à caracterização da violência doméstica e familiar contra a
mulher, são presumidas pela Lei n.º 11.340/06.

 Motivação do gênero, ou seja, a vítima é agredida em razão de seu gênero, por ser mulher.

2.3) Definição de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (art.


5º, caput):
O art. 5º, caput e seus incisos dispõe sobre o que configura violência doméstica contra a mulher,
afirmando que configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no
gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, desde que
se encaixe em algumas das situações elencadas em seus incisos:

 Inciso I: No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente


de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas (o importante é que a
mulher faça parte desse convívio permanente).
Unidade Doméstica é espaço caseiro, ou seja, delimitação do espaço físico, em que há o convívio
permanente de pessoas. Neste ambiente doméstico, a agressão independe de relação entre a vítima e o
agressor, não se exigindo o vínculo familiar, pois presume-se uma superioridade do agressor no âmbito
da unidade doméstica (Ex.: A empregada doméstica poderá ser sujeito passivo de violência praticada
por seus empregadores).

 Inciso II: No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são
ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa.
Nesta hipótese, pode-se entender por família o casamento, a união estável (heterossexual ou
homossexual), a família monoparental, dentre outros (Ex.: Duas mulheres mantem relação homoafetiva,
e uma delas pratica violência moral e psicológica contra a outra, tal conduta está sujeita à Lei Maria
da Penha).

 Inciso III: Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido
com a ofendida, independentemente de coabitação. Destaque-se que é irrelevante a orientação sexual
(Ex.: É possível o reconhecimento da violência doméstica contra a mulher entre filha e mãe, ou entre
padrasto e enteada, desde que os fatos tenham sido praticados em razão da relação de intimidade e
afeto existente entre ambas – STJ, INFO 551 e RHC 42092) (Ex.2: Mario e mulher, entre irmãos
(INFO 499, STJ), pai e filha, amigos, namorados, noivos, etc.).
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O STJ somente protege relação de afeto estável , não protegendo relações de afeto esporádicas ou
eventuais (STJ – CC 6.654/MG).

Obs.: No art. 5º o legislador apenas disse o que configura a violência doméstica e familiar contra a
mulher. Porém, deixou para o art. 7º a sua conceituação.

Obs.2: Deve-se destacar que o art. 6º dispõe que a violência doméstica e familiar contra a mulher
constitui uma das formas de violação dos direitos humanos. Neste sentido, quando há grave
violação de direitos humanos poderá ocorrer o Incidente de Deslocamento de Competência (art.
109, §5º, CRFB), permitindo sua incidência às hipóteses da Lei Maria da Penha.

2.4) Análise na Doutrina e Jurisprudência:


 É possível a aplicação da Lei Maria da Penha para a violência praticada por irmão contra irmã,
ainda que eles nem mais morem sob o mesmo teto? SIM, é possível, com base no inciso III acima
exposto. Ressalte-se que, para a configuração de violência doméstica não precisa, necessariamente, que
haja coabitação (Quinta Turma. REsp 1.239.850-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 16/2/2012).

 A Lei Maria da Penha pode ser aplicada para namorados? SIM. A Terceira Seção do STJ vem
firmando entendimento jurisprudencial de que é possível a aplicação da Lei nº 11.340/2006 à agressão
cometida por ex-namorado. Em tais circunstâncias, há o pressuposto de uma relação íntima de afeto a ser
protegida, por ocasião do anterior convívio do agressor com a vítima, ainda que não tenham coabitado.
(HC 181.217/RS, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 20/10/2011).

Obs.: Mas cuidado: não é qualquer namoro que se enquadra na Lei Maria da Penha: Como o art.
5º da Lei n° 11.340/2006 dispõe que a “violência doméstica” abrange qualquer relação íntima de
afeto e dispensa a coabitação, cada demanda deve ter uma análise cuidadosa, caso a caso. Deve-se
comprovar se a convivência é duradoura ou se o vínculo entre as partes é eventual, efêmero, uma vez
que não incide a lei em comento nas relações de namoro eventuais. (CC 91.979-MG, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 16/2/2009).

 Esta Lei pode ser aplicada a agressor que não se conforma com o término do namoro? Incide a
aplicação da Lei n. 11.340/2006 uma vez que a vítima grávida mantinha íntima relação com o agressor,
que vinha praticando agressões físicas por não se conformar com o término do namoro, sendo ele o
suposto pai. Assim, competente a Justiça comum para processar e julgar a questão (CC 92.591-MG, Rel.
Min. Felix Fischer, julgado em 5/12/2008).

 A Lei Maria da Penha pode ser aplicada para a agressão perpetrada por um homem contra a sua
cunhada? SIM. Trata-se da hipótese prevista no inciso II, considerando que a cunhada é parente por
afinidade do agressor (HC 172634/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em
06/03/2012 – Na espécie, apurou-se que a Vítima, irmã da companheira do Acusado, vivendo há mais
de um ano com o casal sob o mesmo teto, foi agredida por ele).

 Aplicação do Princípio do Insignificância: Conforme a Súmula 589 do STJ, o STJ nega a aplicação
da insignificância em caso envolvendo lesões corporais em ambiente familiar. Afirma-se que a violência
física é incompatível com os vetores da insignificância. De igual modo, não se aplica a insignificância
em qualquer dos crimes praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher (STF – RHC
133.043/MT – INFO 825).
Ademais, o STJ definiu que também não se aplica o princípio bagatelar impróprio aos crimes e
contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas. Assim, o STJ, no
AgInt no HC 369.673/MS e no AgRG no REsp 1463975/MS, rechaçou a tese de que se o casal se
reconciliasse durante o curso do processo criminal, o juiz poderia absolver o réu acusado de violência
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doméstica com base no chamado “princípio da bagatela imprópria”, em razão da relevância do bem
jurídico tutelado e da relevância penal da conduta, não implicando a reconciliação do casal em
desnecessidade da pena.

Lei 11.340/06 Art. 129, §9º, CP


- A violência prevista na Lei 11.340/06 refere-se à
- Refere-se à violência no âmbito doméstico,
violência contra a mulher especificamente, independentemente da condição da vítima, podendo essa
levando-se em consideração a condição da vítima, violência ser exercida contra ascendente, descendente,
que tem que ser necessariamente do sexo feminino.irmão, cônjuge ou companheiro, ou quem conviva ou
Assim, o critério definidor é o sexo da vítima- tenha convivido, ou prevalecendo-se das relações
mulher. domésticas, de coabitação ou de hospitalidade. A vítima
pode ser qualquer pessoa que se encaixe na previsão
- O termo “violência” é empregado de forma legal, inclusive homem (STJ, INFO 501).
ampla, englobando qualquer espécie de violência,
conforme art. 7º. - A “violência” é a lesão corporal.

2.5) Formas de Violência (art. 7º):


O art. 7º dá uma maior abrangência ao conceito de violência, de modo que o legislador elencou, em rol
exemplificativo, diversas formas de violências, quais sejam: física, psicológica, sexual, patrimonial, moral, entre
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outras.

 Violência Física: Entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

 Violência Psicológica: Entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e
diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise
degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio
que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

 Violência Sexual: Entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a
participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a
induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar
qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição,
mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus
direitos sexuais e reprodutivos;

 Violência Patrimonial: Entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração,
destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores
e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
Obs.: Mesmo nesse caso, continua a haver a incidência das imunidades absolutas e
relativas previstas, respectivamente, nos arts. 181 e 182, CP. Trata-se de matéria divergente
(em sentido contrário – Maria Berenice Dias).

 Violência Moral: Entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

3) Fase Policial (art. 11 e art. 12):


Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras
providências:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal (art. 158, CPP);
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio
familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis (art. 12, §1º, III)

Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a
autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo
Penal (art. 6º, CPP):
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada (Súmula 542, STJ);
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão
de medidas protetivas de urgência (art. 12, §1º, III; art. 22);
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários;
V - ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de
mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.
§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1 o o boletim de ocorrência e cópia de todos os
documentos disponíveis em posse da ofendida.
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.
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4) Parte Processual:
Inicialmente, cabe destacar que o art. 13 determina a aplicação subsidiária do CPP, CPC, ECA e Estatuto
do Idoso, quando não conflitarem com o estabelecido nesta lei.

4.1) Competência Híbrida/Mista (art. 14):


Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e
criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento
e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Ao se analisar o art. 14, denota-se que o JVD possui competência mista/híbrida, por ser competente para
tratar de matéria cível e criminal. Assim, ao mesmo tempo em que se julga o delito praticado contra a mulher,
praticam-se atos de natureza cível, como a separação judicial, etc (STJ – RESP 1475006).

Porém, apesar de o art. 14 dispor que o JVD, órgão fracionário do Poder Judiciário, possui competência para
julgar causas criminais e cíveis correlatas, deve-se notar que a competência híbrida do JVD é limitada às medidas
protetivas de natureza cível, sendo possível até mesmo a concessão de alimentos provisórios (art. 22, V).

Obs.: No INFO 617, o STJ definiu que os Juizados de Violência Doméstica possuem competência
para as ações de natureza civil que tenham por causa de pedir a prática de violência doméstica e
familiar contra a mulher (Ex.: autorização para viagem ao exterior e guarda unilateral do infante,
na hipótese em que a causa de pedir de tal pretensão consistir na prática de violência doméstica e
familiar contra a genitora).

Assim, para o estabelecimento da competência da Vara Especializada da Violência


Doméstica ou Familiar Contra a Mulher nas ações de natureza civil, é imprescindível que a causa de
pedir da ação consista justamente na prática de violência doméstica ou familiar contra a mulher.

Nota-se, portanto, que o órgão possui característica eminentemente criminal, quando uma mulher é
vítima de violência doméstica.

Importante também destacar que, conforme art. 33, nos locais em que ainda não tiverem sido estruturados
os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as
competências cível e criminal para as causas decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher.
De acordo com o entendimento do STJ na ADC nº 19, esta determinação não ofende competência dos Estados para
disciplinarem a organização judiciária local.

Havia uma corrente de juízes e Desembargadores que defendia que este art. 33 da Lei violava os arts. 96, I,
a2 e 125, § 1º da CF3. Porém, segundo o STF, a Lei Maria da Penha não implicou obrigação, mas a faculdade de
criação dos Juizados de Violência Doméstica contra a Mulher. O art. 33 não cria varas judiciais, não define limites
de comarcas e não estabelece um número de magistrados a serem alocados aos Juizados de Violência Doméstica e
Familiar. Estes temas seriam concernentes às peculiaridades e circunstâncias locais.

O mencionado artigo apenas faculta a criação desses juizados e atribui ao juiz da vara criminal a
competência cumulativa das ações cíveis e criminais envolvendo violência doméstica contra mulher ante a
necessidade de conferir tratamento uniforme especializado e célere em todo o território nacional sobre a matéria.

2
Art. 96. I, a: afirma que compete privativamente aos tribunais elaborar seus regimentos internos, com observância das
normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos
órgãos jurisdicionais e administrativos.
3
Art. 125, § 1º: prevê que a competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização
judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.
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Não há qualquer problema no fato de a lei federal sugerir aos Tribunais estaduais a criação de órgãos
jurisdicionais especializados, tendo isso já ocorrido, por exemplo, com o Estatuto da Criança e do Adolescente e com
a Lei de Falência, cujas respectivas leis recomendaram a criação de varas especializadas no julgamento de tais
matérias.

Fixação da Competência em Matéria Cível (art. 15): De acordo com o art. 15, em matéria cível,
haverá opção da ofendida, sendo competente o Juizado: 1) Do seu domicílio ou residência; 2) Do lugar do fato em
que se baseou a demanda; 3) Do domicílio do agressor.

Competência Recursal: Dependerá da matéria recorrida, podendo ir para a Câmara Criminal ou para a
Câmara Cível.

Medida Cautelar de Interceptação Telefônica: É possível a realização de interceptação telefônica para


investigar a prática de delito de violência doméstica, desde que cumpridas as exigências do art. 2º da Lei 9.296.
Nestes casos, o juízo competente será o do JVD, onde houver. Onde não houver, será o Juízo das Varas Criminais,
conforme art. 33, lei 11.340

4.2) Crimes Dolosos contra a Vida:


No caso de crime doloso contra a vida, mesmo em se tratando de violência doméstica, a competência será
do Júri, por se tratar de competência constitucional, que deve prevalecer sobre a competência determinada na
presente lei (fazer remição no art. 14 da Lei para o art. 5º, XXXVIII, d, CRFB).

Obs.: Também se aplicam as regras de foro por prerrogativa que tenham sua competência estabelecidas na
Constituição.
Obs.2: De igual modo, no caso de crime praticado a bordo de navio e aeronave, a competência será da Justiça
Federal, conforme art. 109, IX, CRFB¸ uma vez que se trata de competência constitucional, que deve prevalecer
sobre a competência legal.

Contudo, é possível que a Lei Estadual de Organização Judiciária atribua ao JVD a competência para
instruir o feito até a fase de pronúncia (1ª Fase do Procedimento do Júri) (STJ – INFO 465).

Situação 1: Existem alguns Estados que, em sua Lei de Organização Judiciária preveem que, em caso de crimes
dolosos contra a vida praticados no contexto de violência doméstica, a Vara de Violência Doméstica será
competente para instruir o feito até a fase de pronúncia. A partir daí, o processo será redistribuído para a Vara do
Tribunal do Júri. Segundo já decidiu o STF, essa previsão é válida. Assim, a Lei de Organização Judiciária poderá
prever que a 1ª fase do procedimento do júri seja realizada na Vara de Violência Doméstica em caso de crimes
dolosos contra a vida praticados no contexto de violência doméstica. Não haverá usurpação da competência
constitucional do júri. Apenas o julgamento propriamente dito é que, obrigatoriamente, deverá ser feito no Tribunal
do Júri (STF. 2ª Turma. HC 102150/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 27/5/2014. Info 748).

Situação 2: Se a lei de organização judiciária não prever expressamente essa competência da Vara de Violência
Doméstica para a 1ª fase do procedimento do Júri, aplica-se a regra geral e todo o processo tramitará na Vara do
Tribunal do Júri.

Medida Cautelar de Interceptação Telefônica no Júri: Caso o delito investigado seja um crime doloso
contra a vida, o juízo competente para a autorização da interceptação telefônica será o Tribunal do Júri, por meio
do Juiz Presidente.

4.3) Retratação da Representação (art. 16):


O legislador tratou da renúncia (retratação) do direito de representação no art. 16, que deve se dar em
audiência específica para esse fim, na presença do Juiz, com a oitiva do Ministério Público.

Obs.: Afirma-se que o termo “renúncia” não é o mais adequado, uma vez que é mais possível a
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“retratação da retratação”, desde que ainda não se tenha esgotado o prazo decadencial de 6 meses
contados da ciência do fato (art. 38, CPP).

Destaque-se que, segundo o STJ (RHC 41545), tal audiência será realizada se houver manifestação da vítima
antes de a denúncia ser recebida. Nota-se, assim, que o art. 16, Lei 11.340, traz regra distinta do art. 25, CPP, que
admite a retratação da denúncia após o oferecimento da denúncia.

Obs.1: Essa audiência especial só deve ser designada quando já existir nos autos manifestação da
vítima querendo desisitir do feito. Muitos juízes vêm designando de forma automática essa audiência
especial mesmo sem qualquer manifestação da vítima. O STJ já entendeu que essa prática é ilegal e
que, de certa forma, acaba por estimular a vítima a desistir do procedimento.

Obs.2: Importante ressaltar que este artigo não se aplica aos delitos de lesão corporal leve e culposa
praticados no âmbito de violência doméstica, tendo em vista que a ação penal nesses delitos é
pública incondicionada (art. 41).

Assim, o STF, na ADI 4.424, não declarou inconstitucionais os art. 12, I e 16, dando-lhes
interpretação conforme a Constituição, confirmando que deveriam ser interpretados de acordo
com o art. 41, ou seja, deve-se entender que a representação mencionada em tais dispositivos refere-
se a outros delitos praticados contra a mulher e que sejam de ação penal condicionada (Ex.: Ameaça
– art. 147, CP), não se aplicando para lesões corporais.

Neste sentido também é a Súmula 542 do STJ, segundo a qual, “a ação penal relativa ao
crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública
incondicionada”.

4.4) Atuação do Ministério Público e Assistência Judiciária:


Além da posição de autor na persecução penal, promovendo a ação penal contra o agressor, o Ministério
Público também atuará como fiscal da correta aplicação da lei, conforme art. 25 e 26, atuando nas causas cíveis e
criminais (haverá acumulação das atribuições cível e criminal no membro do MP que atue no JVD).

Em relação à assistência judiciária, os art. 27 e 28 determinam que “em todos os atos processuais, cíveis e
criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado,
ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei (concessão de medidas protetivas)” e “é garantido a toda mulher em
situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária
Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado”.

4.5) Inaplicabilidade da Lei 9.099 (art. 41):


O art. 41 dispõe que a lei 9.099/95 é inaplicável aos crimes praticados com violência doméstica e
familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista. Esse dispositivo possui dois comandos:

1) O primeiro comando é no sentido ele as infrações penais praticadas nos moldes dessa lei não se
considerarem infrações penais de menor potencial ofensivo;

2) O segundo comando é evitar a aplicação das medidas despenalizadoras trazidas pela lei 9.099/95
(composição civil dos danos – art. 74; transação penal – art. 76; representação – art. 88; suspensão
condicional do processo – art. 89). Todas essas medidas visam a evitar o processo ou evitar uma
condenação.
CPVI – Aula 13 10
Como o legislador deu um tratamento mais severo aos crimes praticados no âmbito ela violência
doméstica e familiar contra a mulher, ele quis que não fossem aplicadas medidas que permitam uma
alternativa ao processo ou que impliquem uma alternativa à condenação.

Questão relevante versa sobre a constitucionalidade do artigo ora comentado. Isso porque o art. 98, I, CRFB
dispõe que a União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão juizados especiais, providos por
juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de
menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e
sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de
juízes de primeiro grau. Assim, questiona-se se a lei ora comentada, por ser uma lei ordinária, poderia afastar a
incidência da lei 9.099/95 nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Apesar de muita discussão, as jurisprudências do STF (ADC 19) e do STJ (INFO 539) pacificaram-se no
sentido da constitucionalidade do art. 41. O STF, na ADC 19, decidiu que este art. 41 é constitucional e que, para
a efetiva proteção das mulheres vítimas de violência doméstica, foi legítima a opção do legislador de excluir tais
crimes do âmbito de incidência da Lei n.° 9.099/95.

Em igual sentido são as Súmulas 536 e 542 do STJ:

 Súmula 536, STJ: “A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam
na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha”.

Obs.: Embora não se admita, nos crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra
a mulher, os benefícios da transação penal, suspensão condicional do processo e substituição
da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito, o STJ admite a concessão do
benefício da suspensão condicional da pena, haja vista que esse instituto está previsto
somente no Código Penal (artigos 77 e seguintes), e não na Lei nº 9.099/95.

 Súmula 542, STJ: “A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada”.

Obs.: O art. 41 fala apenas em CRIMES. Porém, se o agente praticar uma contravenção penal
com violência doméstica, também não será possível aplicar a Lei nº 9.099/95. De fato, a
interpretação literal do art. 41 da Lei Maria da Penha poderia indicar, em uma análise rápida, a
conclusão de que os institutos despenalizadores da Lei nº 9.099/1995 seriam aplicáveis às
contravenções penais praticadas com violência doméstica e familiar contra a mulher. Entretanto, em
uma interpretação que atenda os fins sociais a que a lei se destina, deve-se concluir que o art. 41 da
Lei nº 11.340/2006 afasta a Lei nº 9.099/1995 tanto em relação aos crimes quanto às
contravenções penais praticados contra mulheres no âmbito doméstico e familiar. Nesse sentido:
STJ – Info 539 e Súmula 588, STJ4.

Assim, a Lei nº 9.099/95 não se aplica NUNCA E PARA NADA que se refira à Lei
Maria da Penha. Nada que esteja na Lei n 9.099/95 poderá ser utilizado para delitos praticados
com violência doméstica.

Vale ressaltar que a Lei 9.099/95 não se aplica nunca e para nada que se refira à Lei Maria da Penha. O
STJ interpretava este art. 41 afirmando que a inaplicabilidade da Lei 9.099/95 significava apenas que os institutos
despenalizadores da Lei dos Juizados é que não poderiam ser utilizados na Lei Maria da Penha, ou seja, transação
penal e suspensão condicional do processo.
4
Em caso de CRIMES praticados contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico: o STF possui o
mesmo entendimento do STJ e afirma que não cabe a substituição por penas restritivas de direitos. Em caso de
CONTRAVENÇÕES PENAIS praticadas contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico há uma
discordância. O STF afirma que é possível a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, nos moldes
previstos no art. 17 da Lei Maria da Penha, aos condenados pela prática da contravenção penal. Isso porque a contravenção penal
não está na proibição contida no inciso I do art. 44 do CP, que fala apenas em crime. Logo, não existe proibição no ordenamento
jurídico para a aplicação de pena restritiva de direitos em caso de contravenções.
CPVI – Aula 13 11
O STF foi além e disse que, além dos institutos despenalizadores, nenhum dispositivo da Lei n.° 9.099/95
pode ser aplicado aos crimes protegidos pela Lei Maria da Penha. Desse modo, a Lei 11.340/06 exclui de forma
absoluta a aplicação da Lei n.° 9.099/95 aos delitos praticados contra a mulher no âmbito das relações
domésticas e familiares.

Em razão de tal entendimento, toda lesão corporal, ainda que de natureza leve ou culposa, praticada contra a
mulher no âmbito das relações domésticas, é crime de ação penal pública INCONDICIONADA.

O crime de lesões corporais está previsto no art. 129 do CP. O Código Penal não diz que o crime de lesões
corporais é de ação pública condicionada. Logo, quando lei não diz que determinado crime é de ação pública
condicionada, a regra é de que ele é de ação pública incondicionada (art. 100, § 1º do CP).

Ocorre que a Lei 9.099/95 afirmou, em seu art. 88, que o crime de lesões corporais leves e culposas seria de
ação penal pública condicionada: Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá
de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Ex.: Em ema briga de bar, João desfere um soco em Ricardo, causando-lhe lesões corporais leves, este crime é de
ação penal pública condicionada, ou seja, qualquer providência para apurar este delito e para dar início ao
procedimento criminal só se inicia se o ofendido (no caso, Ricardo) tiver interesse e provocar os órgãos públicos
(procurar a polícia ou o Ministério Público).

Repita-se que, se não houvesse este art. 88 da Lei 9.099/95, a ação penal nos crimes de lesões corporais leves
e culposas seria pública incondicionada, considerando que o Código Penal não exige representação para este crime
(art. 129 c/c art. 100, § 1º do CP).

Antes do julgamento do STF, a dúvida era então a seguinte: As lesões corporais leves e culposas praticadas
contra a mulher no âmbito de violência doméstica eram de ação pública incondicionada ou condicionada? Em
outras palavras, este art. 88 da Lei n.° 9.099/95 também valeria para as lesões corporais leves e culposas
praticadas contra a mulher no âmbito de violência doméstica? Havia duas correntes sobre o tema:

1ª corrente: ação pública INCONDICIONADA 2ª corrente: ação pública CONDICIONADA


(o art. 88 não vale para a Lei Maria da Penha) (art. 88 vale para a Lei Maria da Penha)
Argumentos principais: Argumentos principais:
a) A ineficiência do Estado na proteção da mulher a) O art. 41 da Lei só veda medidas despenalizadoras que
vítima de violência doméstica representa grave não integrem a vontade da mulher (veda transação penal e
violação de direitos humanos; suspensão do processo).
b) O projeto de lei previa representação e foi b) Por razões de política criminal e de proteção da família
alterado. reconstituída, é importante que a mulher tenha poder de
c) A Lei 11.340/06 é expressa ao determinar que não decidir se deseja instaurar ou não a persecução penal.
se aplica a Lei 9.099/95.

Antes de o STF proferir o julgamento que estamos analisando, quem primeiro teve que enfrentar a discussão
foi o STJ. De início, o STJ entendeu que se tratava de ação pública incondicionada (HC 96.992-DF, Rel. Min. Jane
Silva (Des. convocada do TJ-MG), julgado em 12/8/2008). Ocorre que esse entendimento mudou e o STJ passou a
adotar, de maneira pacífica, a 2ª corrente, ou seja, de que se tratava de ação pública CONDICIONADA.

Sustentava-se, dentre outros argumentos que “não há como prosseguir uma ação penal depois de o juiz ter
obtido a reconciliação do casal ou ter homologado a separação com a definição de alimentos, partilha de bens,
guarda e visitas. Assim, a possibilidade de trancamento de inquérito policial em muito facilitaria a composição dos
conflitos envolvendo as questões de Direito de Família, mais relevantes do que a imposição de pena criminal ao
agressor” (REsp 1.097.042-DF, Rel. originário Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Jorge
Mussi, julgado em 24/2/2010).

Porém, o Pleno do STF julgou a questão e modificou novamente o panorama da jurisprudência pátria.
Passou-se a entender que qualquer lesão corporal, mesmo que leve ou culposa, praticada contra mulher no
âmbito das relações domésticas é crime de ação penal INCONDICIONADA, ou seja, o Ministério Público
pode dar início à ação penal sem necessidade de representação da vítima. Em suma, o STF adotou a 1ª corrente
CPVI – Aula 13 12
acima exposta. Para a maioria dos ministros do STF, se a ação penal fosse considerada condicionada esta
circunstância acabaria por esvaziar a proteção constitucional assegurada às mulheres.

Obs.: IMPORTANTE!!! Crimes como ameaça (art. 147, § único) e estupro (art. 213 c/c art. 225),
continuam condicionados à representação da vítima.

Algumas consequências que vislumbramos ser decorrentes deste entendimento do STF:

1) Se uma mulher sofrer lesões corporais no âmbito das relações domésticas, ainda que leves, e procurar a delegacia
relatando o ocorrido, o delegado não deve fazer com que ela assine uma representação, uma vez que não existe mais
representação para tais casos. Bastará que o delegado colha o depoimento da mulher e, com base nisso, havendo
elementos indiciários, instaure o inquérito policial;

2) Em caso de lesões corporais leves ou culposas que a mulher for vítima, em violência doméstica, o procedimento de
apuração na fase pré-processual é o inquérito policial e não o termo circunstanciado;

3) Se a mulher que sofreu lesões corporais leves de seu marido, arrependida e reconciliada com o cônjuge, procura o
delegado, o promotor ou o juiz dizendo que gostaria que o inquérito ou o processo não tivesse prosseguimento, esta
manifestação não terá nenhum efeito jurídico, devendo a tramitação continuar normalmente;

4) Se um vizinho, por exemplo, presencia a mulher apanhando do seu marido e comunica ao delegado de polícia, este é
obrigado a instaurar um inquérito policial para apurar o fato, ainda que contra a vontade da mulher. A vontade da
mulher ofendida passa a ser absolutamente irrelevante;

5) É errado dizer que, com a decisão do STF, todos os crimes praticados contra a mulher, em sede de violência
doméstica, serão de ação penal incondicionada. Continuam existindo crimes praticados contra a mulher (em violência
doméstica) que são de ação penal condicionada, desde que a exigência de representação esteja prevista no Código Penal
ou em outras leis, que não a Lei n.° 9.099/95. Assim, por exemplo, a ameaça praticada pelo marido contra a mulher
continua sendo de ação pública condicionada porque tal exigência consta do parágrafo único do art. 147 do CP. O que o
STF decidiu foi que o delito de lesão corporal, ainda que leve, praticado com violência doméstica contra a mulher, é
sempre de ação penal incondicionada porque o art. 88 da Lei n.° 9.099/95 não pode ser aplicado aos casos da Lei Maria
da Penha.

6) Os arts. 12, I e 16, da Lei Maria da Penha não foram declarados inconstitucionais. O que o STF fez foi tão-somente
dar interpretação conforme a Constituição a estes dispositivos, confirmando que deveriam ser interpretados de acordo
com o art. 41 da Lei. Em suma, deve-se entender que a representação mencionada pelos arts. 12, I e 16 da Lei Maria da
Penha refere-se a outros delitos praticados contra a mulher e que sejam de ação penal condicionada, como é o caso da
ameaça (art. 147 do CP), não valendo para lesões corporais.

4.6) Impossibilidade de Penas Restritivas de Direito:


Segundo definiu o STF (INFO 804), não é possível a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambienta doméstico
(art. 129, §9º, CP).

Sobre as penas restritivas de direitos, o Código Penal prevê que, em determinadas situações, em se tratando
de pessoa condenada a uma pena privativa de liberdade, pode ser esta reprimenda substituída por uma ou duas penas
restritivas de direito. Os requisitos cumulativos para a conversão da pena privativa de liberdade em penas restritivas
de direitos estão previstos no art. 44 do CP e podem ser assim esquematizados:
CPVI – Aula 13 13

Inicialmente, cabe notar que a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos
pressupõe, entre outras coisas, que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça. Nos casos
de crime do art. 129, §9º, CP, o crime é cometido com violência contra pessoa, motivo suficiente para obstaculizar o
benefício, nos termos do art. 44, I do CP.

A tentativa de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos se deu sob o argumento de
que, o art. 17 da Lei Maria da Penha, ao prever que “é vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e
familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de
pena que implique o pagamento isolado de multa”, alguns doutrinadores sustentaram a tese de que o art. 17, ao
proibir apenas esses tipos de penas, teria, a contrario sensu, permitido que fossem aplicadas outras espécies de penas
restritivas de direitos. Essa interpretação, contudo, não foi aceita pela jurisprudência.

O entendimento que prevalece é o seguinte: além das sanções previstas no art. 17, são proibidas
quaisquer penas restritivas para os condenados por violência doméstica e familiar contra a mulher. Isso
porque o art. 44, I, do CP veda penas restritivas de direito em caso de crimes cometidos com violência ou
grave ameaça à pessoa.
CPVI – Aula 13 14

5) Medidas Protetivas:
O art. 12, III, determinou o prazo de 48h para que a autoridade policial remeta expediente ao juiz com o
pedido das medidas protetivas de urgência (art. 22) feitas pela ofendida. Em seguida, no art. 18, determinou-se
que, recebido o expediente, o Juiz deverá tomar as providências descritas no dispositivo também em 48h, dentre elas,
decidir sobre as medidas protetivas de urgência.

Obs.1: Em relação a quem é o legitimado para conceder as medidas protetivas, somente será o juiz
da JVD (VER ARQUIVO NA PASTA SOBRE COMENTÁRIOS À LEI 13.827, QUE PASSA A
AUTORIZAR, EM ALGUMAS HIPÓTESES, A APLICAÇÃO, PELA AUTORIDADE
POLICIAL, DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA).

Obs.2: Alguns autores afirmam que as medidas protetivas já são conferidas na Delegacia, conforme
se denota dos incisos do art. 11.

Conforme dispõe o art. 19, as medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a pedido da
ofendida (conforme visto) ou a requerimento do Ministério Público.

Obs.1: O pedido da ofendida para que lhe seja concedida medida protetiva não precisa ser
subscrito por advogado ou Defensor Público (art. 27, parte final, da Lei nº 11.340/2006).

Obs.2: A Lei 13.505/2017, que acrescentou dispositivos na Lei 11.340, foi vetado no que dispunha
que os Delegados de Polícia poderiam aplicar, provisoriamente, até deliberação judicial, medidas
protetivas de urgência em favor da mulher, como a determinação para que o suposto agressor ficasse
distante da vítima.

Tal previsão foi, contudo, vetada pelo Presidente da República sob o argumento de que a
prerrogativa de impor medidas protetivas de urgência é privativa do Poder Judiciário, não podendo
ser estendida à Polícia. Veja as razões apresentadas: “Os dispositivos, como redigidos, impedem o
veto parcial do trecho que incide em inconstitucionalidade material, por violação aos artigos 2º e
144, § 4º, da Constituição, ao invadirem competência afeta ao Poder Judiciário e buscarem
estabelecer competência não prevista para as polícias civis.”

Dessa forma, com o veto, a competência para impor medidas protetivas de urgência continua
sendo privativa da autoridade judicial. Cabe ao Delegado de Polícia apenas remeter ao juiz pedido da
CPVI – Aula 13 15
ofendida para a concessão de medidas protetivas de urgência (art. 12, III, da Lei nº 11.340/2006)
(VER ARQUIVO NA PASTA SOBRE COMENTÁRIOS À LEI 13.827, QUE PASSA A
AUTORIZAR, EM ALGUMAS HIPÓTESES, A APLICAÇÃO, PELA AUTORIDADE
POLICIAL, DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA).

Questiona-se sobre a possibilidade de concessão de ofício das medidas protetivas de urgência pelo juiz.
Tendo em vista que o art. 19 não prevê expressamente tal possibilidade, alguns doutrinadores afirmam que tal
concessão de ofício não é possível, à luz do sistema acusatório.

Porém, outra corrente (Pacelli) entende que é possível que as medidas protetivas sejam concedidas pelo Juiz
de ofício, com fundamento no poder geral ele cautela do juiz, bem como por inexistir violação ao sistema
acusatório, uma vez que o Juiz não estará promovendo a persecução penal contra o acusado, buscando um elemento
de prova contra ele, nem exercendo a função de acusador. Ao contrário, o Juiz está apenas tomando medidas de
ofício que visam a beneficiar a vítima de violência doméstica contra a mulher. Note-se que todas as medidas
protetivas de urgência visam a proteção da mulher enquanto vítima.

Ademais, destaque-se que o art. 20 permite que o Juiz decrete de ofício a prisão preventiva do agressor em
qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal, o que também permitiria sua decretação de ofício das
medidas protetivas de urgência.

Obs.: Muitos sustentam que a prisão preventiva de ofício na fase de inquérito é inconstitucional por
violar o sistema acusatório.

Por fim, afirma-se que a previsão do §1º do art. 19, no sentido de que as medidas protetivas de urgência
poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério
Público, confirmaria a possibilidade de o Juiz poder concedê-las de ofício, uma vez que ele pode concedê-las sem
oitiva das partes. Não fosse assim, sempre haveria a prévia oitiva da parte que fez o requerimento.

Em relação à forma de aplicação das medidas protetivas, o art. 19, §2º, determina que poderá se dar de
forma isolada ou cumulativamente, a depender da necessidade que o caso concreto demandar. Também é possível a
revisão e substituição por outras de maior eficácia. A aplicação cumulativa, revisão e sua modificação por outras
de maior eficácia também poderá ser realizada pelo Juiz de ofício (doutrina), ou mediante requerimento do MP ou a
pedido da vítima (art. 19, §3º).

5.1) Medidas Protetivas em Espécie:


A doutrina, e a própria lei, dividem as medidas protetivas entre medidas protetivas contra o agressor (art.
22) e medidas protetivas em favor da vítima (art. 23 e 24).

a. Medidas Protetivas contra o Agressor (art. 22): Deve-se destacar que o rol do art. 22 é
exemplificativo (§1º), podendo incidir o poder geral de cautela, independentemente que a medida esteja
tipicamente prevista em lei (Ex.: Frequência aos narcóticos anônimos).
As medidas protetivas de urgência não têm natureza penal e têm finalidade de proteção da vítima. O
Juiz poderá aplica-la imediatamente, independentemente da manifestação das partes (vítima e agressor)
CPVI – Aula 13 16
ou do Ministério Público (este que, contudo, deverá ser comunicado posteriormente – art. 22, §1º).
O descumprimento das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor não configura crime
de desobediência (art. 330, CP), uma vez que a própria lei (art. 20) já estabelece a decretação da prisão
preventiva como consequência do descumprimento das medidas protetivas estabelecidas, à luz dos princípios
da intervenção mínima e subsidiariedade do Direito Penal. Além disso, o art. 22, §4º, permite a fixação, pelo
Juiz, de multa em caso de descumprimento (STJ – INFO 544). Portanto, em regra, o descumprimento de
medida protetiva é conduta atípica (MUDOU – Ver ao final)

Obs.: É cabível Habeas Corpus contra a ilegalidade de fixação das medidas protetivas de
urgência. Apesar de o descumprimento dessas medidas poder gerar sanções de natureza cível
(art. 22, §4º), também pode gerar a decretação da prisão preventiva (art. 20), sendo, portanto,
um risco à liberdade do agressor (art. 647, CPP). Contudo, essa possibilidade somente ocorre
se a medida protetiva de urgência for ilegal (STJ – INFO 574).

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá
aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre
outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei
no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o
agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou
serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios5.
§ 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre
que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério
Público.
§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos
do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou
instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o
superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos
crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
§ 3o Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento,
auxílio da força policial.
§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da
Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

Resumo sobre Aplicação de Crime de Desobediência

Não há crime de desobediência quando a pessoa desatende a ordem e existe alguma lei prevendo uma
sanção civil, administrativa ou processual penal para esse descumprimento, sem ressalvar que poderá haver
também a sanção criminal.

 Regra: Se na Lei, houver previsão de sanção civil ou administrativa para o caso de descumprimento da
ordem dada, não se configura o crime de desobediência.

 Exceção: Haverá delito de desobediência se, na Lei, além da sanção civil ou administrativa, expressamente
constar uma ressalva de que não se exclui a sanção penal.

Ex.1: Marcelo foi parado em uma blitz. O agente de trânsito determinou que ele apresentasse a habilitação e o
documento do veículo, tendo Marcelo se recusado a fazê-lo. Marcelo não cometeu crime de desobediência porque
o art. 238 do Código de Trânsito já prevê punições administrativas para essa conduta (infração gravíssima,
multa e apreensão do veículo), sem ressalvar a possibilidade de aplicação de sanção penal.

Ex2: Gutemberg foi intimado para testemunhar em uma ação penal, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado

5
A prestação de alimentos é uma forma de manter a subsistência da vítima e de seus dependentes, para que a violência
doméstica contra ela não acabe prejudicando-os.
CPVI – Aula 13 17
de comparecer ao ato processual. Gutemberg cometeu o crime de desobediência. O CPP determina que o juiz
poderá aplicar multa e condená-lo a pagar as custas da diligência, sem prejuízo do processo penal por crime de
desobediência (art. 219). Assim, a Lei (no caso, o CPP) prevê punições civis, ressalvando, no entanto, que elas
poderão ser aplicadas juntamente com a condenação criminal.

Ex3: Cleôncio foi intimado para testemunhar em uma ação de indenização por danos morais, tendo, no entanto,
sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Cleôncio não cometeu o crime de desobediência. O
CPC prevê que a testemunha faltosa será conduzida coercitivamente e condenada a pagar as despesas do
adiamento do ato (art. 412 - art. 455, §5º, NCPC). Contudo, a Lei (no caso, o CPC) não prevê a possibilidade de
tais sanções cíveis serem aplicadas juntamente com a punição pelo crime de desobediência.

b. Medidas Protetivas em favor da Mulher Vítima (art. 23 e 24): Trata-se de medidas


descritas em rol exemplificativo (sendo possível também citar o art. 9º, §2º), que têm como destinatário a
vítima. Tais medidas têm natureza cível, o que confirma a competência mista do JVD.

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do
agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e
alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.

Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da
mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em
comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática
de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.

5.2) Prisão Preventiva:


Conforme dito, o art. 20 permite que o Juiz decrete, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público ou
representação da autoridade policial, a prisão preventiva do agressor em qualquer fase do inquérito ou da
instrução criminal.

Obs.: Para alguns doutrinadores, a possibilidade de o Juiz decretar de ofício a prisão preventiva
violaria o sistema acusatório. Já outra corrente entende inexistir violação, uma vez que a única
finalidade da prisão preventiva é garantir a execução das medidas protetivas de urgência, não
promovendo a persecução penal, nem exercendo a função de acusador.

Obs.2: Muitos sustentam que a prisão preventiva de ofício na fase de inquérito é inconstitucional por
violar o sistema acusatório.

Tal dispositivo está em consonância com o art. 313, III, CPP, que prevê a possibilidade de decretação de
prisão preventiva para garantir a execução das medidas protetivas de urgência (STJ – RHC 48942 – o
descumprimento de medida protetiva de urgência constitui motivo suficiente para embasar a segregação cautelar).

Como medida cautelar que é, o Juiz sempre deverá observar os princípios da necessidade, da
excepcionalidade e da adequação ao caso concreto (art. 282, I e II, e §4º, CPP).

Em relação ao momento, a prisão preventiva poderá ser decretada a qualquer tempo na persecução criminal,
seja na fase do inquérito policial, seja na fase da ação penal.

Por fim, o art. 20, § único, retrata o princípio da necessidade que rege a decretação dessa medida cautelar.
CPVI – Aula 13 18
Assim, o que irá determinar a revogação ou a nova decretação da prisão preventiva é a presença ou não de motivos
que a justifiquem.

Obs.: A nova decretação da prisão poderá ser feita de ofício pelo Juiz.

5.3) Notificação da Ofendida (art. 21):


Um dos meios de se proteger a vítima é por meio de sua informação de todos os atos praticados em relação
ao seu agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão.

Assim, a notificação é de qualquer ato processual, e não somente em relação à prisão ou libertação do
agressor (como ocorre no art. 201, §2º, CPP). Assim, por exemplo, no caso de ser decretada alguma medida
protetiva contra o agressor, a vítima deverá ser informada de tal fato, até mesmo para que possa informar ao juiz no
caso de descumprimento pelo agressor.

5.4) Vedação à Pena de Cesta Básica ou Outras de Prestação


Pecuniária ou Substituição por Multa (art. 17):

Alguns doutrinadores questionam sobre a “pena de cesta básica” descrita no dispositivo. A CRFB, no art.
5°, XLVI estabeleceu as espécies de penas que existem no ordenamento jurídico penal brasileiro ("A lei regulará a
individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de
bens; c) multa; d) prestação social alternativa; c) suspensão ou interdição de direitos.''). Não se vê no dispositivo
constitucional a pena de cesta básica, o que leva parcela da doutrina a sustentar a sua inconstitucionalidade por
ausência ele previsão constitucional.

Contudo, de outro giro, outra parcela doutrinária sustenta que ela é constitucional, em razão de o constituinte
ter utilizado as expressões "entre outras", o denota um rol exemplificativo de penas.

Na realidade, a pena de cesta básica é uma criação baseada no art. 45, § 2°, do Código Penal, como espécie
de prestação pecuniária, pena restritiva de direitos prevista no art. 43, I, do Código Penal. Portanto, percebe-se que a
pena de cesta básica funciona como alternativa à pena restritiva de direitos de prestação pecuniária, e desse
dispositivo decorre a sua previsão legal.

A intenção do legislador, ao proibir a pena de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como
a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa, foi evitar que ao autor de um delito praticado
em âmbito de violência doméstica e familiar contra a mulher não seja aplicada uma pena severa e seja aplicada
apenas uma pena de multa ou de prestação pecuniária. A preocupação do legislador foi com a função preventiva
geral da pena, no sentido ele dar mostras à coletividade de que o agressor não vai receber apenas uma pena ele multa
ou uma prestação pecuniária. Em outras palavras, o legislador não admitiu que uma agressão à mulher pudesse custar
ao agressor somente uma doação de cesta básica, uma prestação pecuniária ou uma multa.

Contudo, isso não quer dizer que não caibam outras penas restritivas de direitos previstas no art. 43 do
Código Penal.

Atualização Legislativa
CPVI – Aula 13 19
Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência
previstas nesta Lei: (Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018)
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 13.641, de
2018)
§ 1o A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que
deferiu as medidas. (Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018)
§ 2o Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder
fiança. (Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018)
§ 3o O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis.
(Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018)

Ver Material Anexo

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