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DIREITO COMERCIAL II (SOCIEDADES COMERCIAIS)

TURMA A, 2023/2024
Regência: Prof. Doutor Luís Menezes Leitão

CASOS PRÁTICOS 5-9

ÍNDICE
CASO N.º 5: AS DELIBERAÇÕES NA PARAÍSO DA CAPARICA, S.A. ............................................................... 1
CASO N.º 6: A SAÍDA DA SÓ PEQUENAS, LDA. ................................................................................................... 2
CASO N.º 7: A SAÍDA DA PARAÍSO DA CAPARICA, S.A. ................................................................................... 3
CASO N.º 8: RESPONSABILIDADE DOS GERENTES POR CONTRATAÇÃO DE SWAPS
ESPECULATIVOS .......................................................................................................................................................... 3
CASO N.º 9: DA ADMINISTRAÇÃO À FISCALIZAÇÃO DA VAI DAR TUDO CERTO, S.A. ......................... 4

CASO N.º 5: AS DELIBERAÇÕES NA PARAÍSO DA CAPARICA, S.A.

1. Ermelinda está escandalizada. Como acontece em todas as sextas-feiras, na


semana passada reuniu com Alberto, Benedita, Cícero e Daniela, que são
seus sócios na Paraíso da Caparica, S.A. Esta sociedade dedica-se à
comercialização de chapéus de sol, toalhas e outros utensílios para a praia.
Ermelinda e os demais são administradores daquela sociedade e
encontram-se semanalmente para tratar de temas de gestão societária. No
final da reunião, Daniela chamou Benedita e Ermelinda à parte e começou a
discursar sobre as vantagens de este ano a Só Pequenas, Lda. — outra
sociedade em que as três detêm a totalidade do capital social — alienar o
seu bar na Praia de São João. Benedita concordava com a argumentação de
Daniela, mas Ermelinda respondeu com evasivas, porque gostava de olhar
melhor para as contas da sociedade, para confirmar alguns dados
enunciados por Daniela. Qual não foi o seu espanto quando verificou que
Daniela e Benedita assinaram, durante o fim-de-semana, um contrato
através do qual o tal bar foi vendido, invocando uma deliberação aprovada
na passada sexta-feira! Ermelinda recorreu aos tribunais para fazer valer os
seus direitos, mas as suas sócias riram-se desdenhosamente quando leram a
petição inicial da ação: não admitem ser tratadas como rés, acham que
Ermelinda demorou demasiado tempo a reagir judicialmente e além disso
estão convencidas de que «podem repetir tudo quando quiserem, segundo as
regras, se é isso que a picuinhas da Ermelinda quer». Quid iuris?

2. Como as relações entre as três ficaram degradadas depois deste incidente,


Ermelinda não ficou surpreendida quando recebeu uma carta de Benedita,
sugerindo que outro estabelecimento da sociedade fosse dado em garantia,
para obtenção de um financiamento de apoio à tesouraria. Ermelinda achou
que não tinha nada que responder, mas começou a ficar enervada quando
recebeu outra carta, através da qual lhe era pedido que decidisse sobre
aquele tema. Ermelinda acha que se nada responder, nada a pode afetar.
Terá razão?

3. A gota de água foi o último negócio celebrado entre a Só Pequenas, Lda. e


Daniela. Tratava-se da compra de um pavilhão industrial, pela sociedade a
Daniela, por um preço manifestamente superior ao seu valor de mercado. O
tema foi levado a deliberação dos sócios: Daniela e Benedita votaram a
favor, mas Ermelinda votou contra, achando escandaloso não só os termos
do negócio, como também o facto de Daniela votar nesta deliberação.
Ermelinda acha que (i) a deliberação não pode ser válida; (ii) o negócio não
pode ser válido; e que (iii) pelo menos Daniela deve indemnizar a sociedade
pelos danos a esta causados com esta trapalhada. Terá razão?

4. A questão colocar-se-ia de forma diferente se o objeto da deliberação fosse a


distribuição aos sócios de reservas legais?

CASO N.º 6: A SAÍDA DA SÓ PEQUENAS, LDA.

Na sequência dos litígios sucessivos — analisados no caso anterior —


Ermelinda está decidida a sair da Só Pequenas Lda. Para o efeito, pretende
transmitir a sua quota a Francisco, que se diz capaz de pôr ordem na casa.

1. Imagine que o contrato de sociedade apenas permite a cessão de quotas


quando os restantes sócios exerçam efetivamente o direito de preferência
sobre a totalidade das quotas a alienar.

2. Imagine agora que:

(a) O contrato de sociedade nada dispõe sobre a transmissão de quotas,


tendo Benedita e Daniela deliberado recusar o consentimento à cessão;
(b) Benedita, que também é gerente, decide adquirir a quota de
Ermelinda, para viabilizar a recusa do consentimento da sociedade e
evitar que a quota seja adquirida por estranhos.

3. Por fim, imagine que o contrato de sociedade proíbe, em absoluto, a cessão


de quotas.

CASO N.º 7: A SAÍDA DA PARAÍSO DA CAPARICA, S.A.

1. Farta de aventuras, Ermelinda pretende igualmente sair da


Paraíso da Caparica, S.A., cujo capital social está dividido em 50.000 ações
tituladas, nominativas, de € 1 cada, cuja transmissão está condicionada ao
consentimento da sociedade.

2. Imagine agora que o contrato de sociedade continha uma norma nos termos
da qual a sociedade pode recusar por três vezes, em relação a cada
acionista, a transmissão de ações: à quarta vez a sociedade tem que
demonstrar esforços sérios para encontrar um comprador.

CASO N.º 8: RESPONSABILIDADE DOS GERENTES POR


CONTRATAÇÃO DE SWAPS ESPECULATIVOS

António é sócio da BLUELIGHT, LDA., sendo titular de uma quota representativa


de 25% do seu capital social. Promoveu duas ações de responsabilidade civil —
uma em nome da sociedade, outra em nome próprio — contra Carlos e David,
gerentes há 10 anos.
Acusa Carlos de “gestão danosa”, por ter celebrado contratos de swap de taxas de
juro de teor que considera ser manifestamente especulativo, que vieram a causar
prejuízos à sociedade de centenas de milhares de euros. Diz ainda que David não
fiscalizou a atuação de Carlos, no sentido de proteger a sociedade.
Carlos defende-se, dizendo que a sua atuação foi perfeitamente lícita. Tinha de
rentabilizar o dinheiro que a sociedade tinha no banco e que não rendia juros
nenhuns. Confiou na informação que o banco lhe deu de que era um produto
ótimo. Não lhe passou pela cabeça que as taxas de juro pudessem baixar como
vieram a baixar. Diz ainda que está protegido pela business judgment rule.
David, por seu turno, diz que não sabia de nada. Carlos não lhe comentou nada
e não lhe passava pela cabeça andar permanentemente a perguntar-lhe o que ele
fazia.
1. Qual o enquadramento normativo de cada uma das pretensões e respetivos
pressupostos?
2. Quem tem razão? Deve Carlos indemnizar a sociedade? Deve Carlos
indemnizar diretamente António?
3. E David?

CASO N.º 9: DA ADMINISTRAÇÃO À FISCALIZAÇÃO


DA VAI DAR TUDO CERTO, S.A.

Em 2008, António e Bernardo, jovens empreendedores, viviam num período de


inocência em que acreditavam que tudo era possível. Tinham um projeto
empresarial que, na sua perspetiva, tinha um futuro muito promissor. Para dar
forma jurídica ao projeto, constituíram uma sociedade anónima juntamente com
quatro investidores, com a firma “Vai dar tudo certo, S.A.”. Pediram a um
contabilista, Eduardo, umas dicas sobre os estatutos e escolheram o modelo de
governo previsto no art. 278.º/1, a) CSC, o único cujo funcionamento prático o
contabilista conhecia. Um amigo do contabilista, que era ROC (Filipe), ficou
como fiscal único. António e Bernardo ficaram como administradores executivos
e dois dos investidores (Carlos e Diogo) ficaram como não executivos. Bernardo
assumiu a presidência do conselho.
Apesar de aparentemente os negócios da sociedade estarem a correr bem, a
verdade é que esta não apresentava resultados positivos. Em 2012, os quatro
investidores começaram a ficar desconfortáveis. Carlos e Diogo pediram então
mais informações sobre alguns contratos celebrados pela sociedade que
apareciam de forma obscura nas contas da sociedade. António e Bernardo
responderam que eles deviam confiar na informação que lhes tinha sido prestada
e que a insistência no assunto consubstanciava uma manifestação de deslealdade
que, colocando em causa o trabalho de equipa, era inadmissível. Carlos e Diogo
escreveram então ao contabilista da sociedade, Eduardo, a pedir pormenores
sobre as contas, tendo este respondido que não o podia fazer sem o
consentimento de António e Bernardo.
Por portas travessas, os investidores acabaram por perceber que António e
Bernardo tinham celebrado um contrato com a sociedade, nos termos do qual
esta lhes pagava uma “comissão de gestão”, consumindo esta praticamente todos
os resultados positivos da atividade da sociedade. Perante isto, os investidores
pretendem levar a questão aos tribunais, retirando todas as consequências,
incluindo a responsabilização de António e Bernardo pelos prejuízos sofridos.
António e Bernardo, quando se apercebem da intenção daqueles, escrevem-lhes
uma carta onde explicam que atuaram no contexto da sua discricionariedade
empresarial, por entenderem que esta era a solução que melhor servia os
interesses da sociedade. Não podem, portanto, ser responsabilizados.
Entretanto, os investidores não compreendem o silêncio de Filipe: nunca disse
nada sobre o que se passava, os seus relatórios anuais como fiscal único nunca
referiram a “comissão de gestão” e as certificações legais de contas eram omissas
quanto à “obscuridade” das contas...

1. Qual o sentido da qualificação dos administradores como “executivos” e


“não-executivos” e qual o reflexo no seu status?
2. Podiam Carlos e Diogo exigir as informações referidas a António e
Bernardo, por um lado, e ao TOC, por outro?
3. Têm razão Carlos e Diogo ao considerar que a celebração do contrato, do
qual resulta a “comissão de gestão” para António e Bernardo, constitui uma
violação dos deveres destes?
4. Qual o papel do fiscal único e do ROC na sociedade? Poderia Filipe ser
responsabilizado pelos danos sofridos pela sociedade em virtude da
“comissão de gestão”?

Sugestões de leitura:
JOSÉ FERREIRA GOMES, “Responsabilidade civil dos administradores: ilicitude e
culpa”, in Paulo Câmara (coord.), Administração e governação das sociedades, 2020,
279-307 (= in JOSÉ FERREIRA GOMES, Estudos Dispersos, 1, 2021, 13-44).

JOSÉ FERREIRA GOMES, “A discricionariedade empresarial, a business judgment rule


e a celebração de contratos de swap”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários:
Ensaios de homenagem a Amadeu Ferreira, 2 (2015), 57-98, disponível online.

- JOSÉ FERREIRA GOMES, Da administração à fiscalização das sociedades, 2015, §§ 13 ss.,


63 ss. Sobre os arts. 78.º e 79.º, pp. 687-690 (nota 2463).

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