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Este artigo procura descrever a trajetória da Pedagogia de Projetos, como proposta metodológica em busca da
aprendizagem significativa. Explicita os conceitos de projeto de ensino e projeto de trabalho, englobando os
pressupostos fundamentais, como forma de praticar um currículo integrado, a favor da transdisciplinaridade.
Registra uma experiência pedagógica sobre os temas transversais, desenvolvida numa classe de alunos de 10
anos, orientada pela pedagoga da escola em parceria com a professora regente e a técnica de biblioteca. Os
alunos se envolveram com muito entusiasmo nos trabalhos de pesquisa, provocando resultados surpreendentes.
1
Pedagoga da rede municipal de ensino de Betim - MG. Especialista em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG. nelita_alves@hotmail.com. Rua Raul Saraiva Ribeiro, 595Tel. (31) 35110572.
CEP: 32610310 - Betim - MG.
2
Professor dos Cursos de Especialização e de Mestrado em Educação Tecnológica do CEFET-MG. dacio@dppg.cefetmg.br. DADB/CEFET-MG, Av. Amazonas, 7675 30510000-BH/MG.
3
Professor dos Cursos de Especialização e de Mestrado em Educação Tecnológica do CEFET-MG. pcventura@deii.cefetmg.br. LACTEA/CEFET-MG, Av. Amazonas, 7675 30510000-BH/MG.
4
Neste texto estamos usando os conceitos de projetos de ensino e projetos de trabalho definidos por Moura et al. (2001), a saber: Projeto de ensino elaborado no interior de uma
(ou mais) disciplina, dirigido à melhoria do processo ensino-aprendizagem dos elementos de conteúdos relativos a essa disciplina; Projeto de trabalho princípio educativo por parte
dos alunos e professores que considera as situações reais, do contexto, da vida, no sentido mais amplo; processo pedagógico que vai muito além da simples transmissão de conteúdos
em aulas expositivas. É o projeto do aluno, o professor é o orientador.
5
GADOTTI, Moacir. In. Projetos em Educação ( Apontamentos. MOURA et al- BH- julho/2001).
cas para selecionar, analisar e decidir sobre questões do currículo fragmentado, retórico e livresco, embora mui-
cotidiano, conforme coloca MOURA et all (2001): O tos professores admitam a necessidade de uma postura
volume de informação de caráter geral e especializado mais adequada à realidade da escola na sociedade da
contido nos meios eletrônicos atuais é absolutamente informação.
superior à capacidade humana para absorvê-lo; esta rea- A Pedagogia de Projetos tem sido abordada na
lidade cria a necessidade de aprendizagem para filtrar a perspectiva de um currículo integrado, que venha ensi-
informação e ajustá-la aos processos mentais que são nar os alunos a pesquisarem a partir dos problemas rela-
ativados para sua adequada utilização. Portanto, o tra- cionados com situações da vida real, dando uma nova
balho com projetos, pode contribuir para a construção abordagem aos conteúdos. Conforme SANTOMÉ (1994),
de competências para lidar nesta nova era de re-valori- há diferentes propostas de elaboração de projetos
zação da informação. curriculares integrados: integração correlacionando di-
Os projetos, considerados como uma prática versas disciplinas, integração em torno de uma questão
educativa, tiveram reconhecimento em diferentes perí- da vida prática e diária, integração através de temas, tó-
odos deste século. Fazem parte de uma tradição na picos ou idéias e integração a partir de temas e pesqui-
escolaridade favorecedora da pesquisa da realidade e do sas decididos pelos estudantes.
trabalho ativo por parte do aluno (HERNANDEZ, 1998). O trabalho com projetos exige dos profissionais
Contudo, existe uma trajetória a caminho da Pedagogia uma postura que difere da pedagogia tradicional, en-
de Projetos: métodos de projetos, centro de interesse, globando uma nova visão de currículo, que segundo
trabalho por temas, pesquisa do meio, projetos de traba- HERNANDEZ (1998) precisa-se transgredir a visão do
lho são denominações que se utilizam de maneira indis- currículo escolar centrado nas disciplinas, entendidas
tinta, mas que respondem a visões com importantes vari- como fragmentos empacotados em compartimentos fe-
ações de contexto e de conteúdo (HERNÁNDEZ, 1998). chados, que oferecem aos alunos algumas formas de
Alguns aspectos desta trajetória são as seguintes: conhecimento que pouco têm a ver com os problemas
a) a Pedagogia de Projetos surgiu no início do dos saberes fora da Escola. A flexibilidade dos docen-
século XX com John Dewey e outros represen- tes, o trabalho cooperativo, o intercâmbio entre as várias
tantes da Pedagogia Ativa; muito embora os disciplinas são necessários em busca de um currículo
projetos na educação sejam mais antigos; integrado.
b) com a intenção de melhorar a qualidade de A Pedagogia de Projetos poderá ser aplicada a to-
ensino através da integração dos conhecimen- das as disciplinas do programa, podendo realizar-se sis-
tos, Decroly, Bruner e Stenhouse, já no movi- temática ou ocasionalmente. Os Planos Curriculares Na-
mento escola-novista, desenvolveram técnicas cionais (MEC,1997) apregoam um currículo voltado para
para responder às mutáveis demandas. O aluno a transdisciplinaridade que poderá ser contemplado na
como centro era alvo dos Centros de Interesse; metodologia de projetos, que se relacionam com as no-
c) a partir da metade dos anos 60, produz-se um vas tecnologias, buscando o acesso à informação para
segundo fluxo de interesses pelos projetos, com resolver problemas, selecionar informações, colocar ques-
o nome de trabalho por temas. Neste contexto, tões, procurar explicações e acessar novos dados a partir
Brunner, de 1960 a 1965, estabeleceu que o de necessidades reais.
ensino deveria centrar-se em facilitar o desen- O termo projeto tem sido interpretado de várias for-
volvimento de conceitos-chave a partir das es- mas, há dúvidas no entendimento do que seja projeto
truturas das disciplinas. O ensino através de te- de ensino e projeto de trabalho, no que diz respeito à
mas servirá como mediador para ir além das dis- elaboração e aplicação dos mesmos. Para MOURA et al.
ciplinas, facilitando aos alunos a aprendizagem (2001) projeto de ensino é elaborado no interior de
de conceitos e estratégias vinculadas a experi- uma (ou mais) disciplina, dirigida à melhoria do proces-
ências próximas e interessantes para eles; so ensino-aprendizagem dos elementos de conteúdos
d) os anos 80 vêm estabelecer uma série de mu- relativos a essa disciplina. Poderá ser elaborado pelo
danças na educação, os projetos voltam a ser professor com vistas a resolver um problema, partindo
objeto de interesse. de uma necessidade da classe, cuja solução é desejável,
Atualmente o termo Projetos tem aparecido com de forma a proporcionar aprendizagens múltiplas e pro-
grande freqüência na literatura acadêmica e predomina mover o desenvolvimento cognitivo durante a caminha-
nas discussões no interior das escolas, sobretudo naque- da do aluno. Para SANTOMÉ (1994), o método de pro-
las organizadas por ciclos (Ensino Fundamental). Mas jetos desenvolve-se com a finalidade de resolver os pro-
apesar dos esforços de educadores e pesquisadores em- blemas de meninos e meninas em suas vidas cotidianas.
penhados numa Pedagogia mais adequada à aprendiza- Para HERNÁNDEZ (1998) Os projetos de trabalho cons-
gem significativa, os projetos não têm encontrado se- tituem um planejamento de ensino e aprendizagem vin-
guidores com muita persistência. O que predomina no culado à concepção da escolaridade em que se dá im-
interior das escolas ainda é a pedagogia tradicional com portância não só à aquisição de estratégias cognitivas de
ordem superior, mas também ao papel do estudante como e do que vão necessitar para continuar aprendendo.
responsável por sua própria aprendizagem. Para VEN- A avaliação realizada somente ao final do proces-
TURA (2002: p.39), projeto é uma so, denominada avaliação somativa, não é o instrumen-
to adequado para se utilizar nos projetos , uma vez que
ação negociada entre os membros de uma os mesmos devem ser avaliados no início, ao longo do
equipe, e entre a equipe e a rede de construção percurso, com o objetivo de possibilitar intervenções
de conhecimento da qual ela faz parte, ação esta
que se concretiza na realização de uma obra ou por parte do orientador e no final do processo englo-
na fabricação de um produto inovador. Ao bando a apresentação pública do produto final.
mesmo tempo em que esta ação transforma o Para MORAN (2001), a fase de avaliação coletiva
meio, ela transforma também as representações
e as identidades dos membros da rede
do projeto contempla os momentos de reflexão sobre a
produzindo neles novas competências, através participação dos alunos e do professor no processo.
da resolução dos problemas encontrados. Enfim, o orientador do projeto deve estar atento aos
Os projetos de trabalho abordam uma metodologia avanços/dificuldades dos alunos em cada etapa do traba-
mais autônoma, possibilita a busca de um processo de lho e a partir das observações deve promover discussões
colaboração e produção do conhecimento significativo, com o grupo de forma a replanejar as ações. A auto-
sendo o educador o orientador do processo. Devem ser avaliação do aluno, a avaliação do professor e do grupo
pensados e utilizados como base fundamental de pro- são essenciais para promover a eficácia do projeto.
cessos de aprendizagem no âmbito escolar, de forma
integrada e contextualizada, que segundo MOURA et al.
(2001), englobam pressupostos fundamentais, tais como:
a) realização de projetos de trabalho por grupos 2 RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA
de alunos com número de participantes defini-
do criteriosamente frente a cada experiência;
b) a definição de um período de tempo limite
para a concretização do projeto de modo a cons- Não há ensino sem pesquisa e pesquisa
tituir um fator importante no seu desenvolvi- sem ensino6
mento e concretização;
c) a forma de escolha de temas ou objetos centrais A experiência que vamos relatar foi realizada numa
dos projetos, com destaque para a importância da classe de 2º ciclo de Formação Humana da Escola Muni-
liberdade de escolha por parte dos estudantes; cipal Barão do Rio Branco, situada no bairro Vianópolis,
d) a importância de que os projetos possam con- região oeste de Betim Minas Gerais.
templar uma finalidade útil de modo que os Sabe-se que no desenvolvimento de um projeto, tanto
alunos tenham uma percepção de um sentido alunos quanto professores são responsáveis por buscar as in-
real dos projetos propostos; formações. Essa prática pedagógica exige cooperação, esfor-
e) o envolvimento de múltiplos recursos no de- ço pessoal, estratégias e planejamento para a sua execução.
senvolvimento dos projetos, abrangendo não O reconhecimento da dificuldade de se implan-
somente os recursos disponibilizados pela es- tar uma metodologia de projetos gerou um esforço que
cola, mas também recursos que os próprios alu- contribuiu para o direcionamento dos projetos de tra-
nos podem providenciar junto a outras fontes, balho na Escola Municipal Barão do Rio Branco. Em
como seja, a comunidade em geral; setembro de 2002, decidimos elaborar um projeto de
f) a importância da socialização dos resultados dos ensino para ensinar os pré-adolescentes de uma deter-
projetos desenvolvidos, em diversos níveis de minada classe a realizarem projetos de trabalho. Consi-
comunicação, como a própria sala de aula, a deramos que, nesta idade, estes alunos se encontram
escola e a própria comunidade, devendo essa no estágio operatório-concreto, portanto, capazes de
socialização incluir apresentação pública dos abstrair dados da realidade.
resultados por parte dos autores.
Como em toda proposta didática, os projetos tam-
bém requerem avaliações criteriosas, que permitam o
julgamento e análise dos resultados, podendo ser quan- 2.1 Planejamento
titativa e qualitativa, com o objetivo de orientar a prática
docente e possibilitar ações corretivas antes do final. Para
HERNÁNDEZ (1998), seria fundamental converter a avali-
ação numa peça-chave do ensino e da aprendizagem que Ao pensar no trabalho com projetos, um dos nos-
possibilite aos docentes pronunciar-se sobre os avanços sos objetivos era contribuir para a formação de alunos
educativos dos alunos e, a esses, contar com pontos de investigadores, participativos e sujeitos de suas aprendi-
referência para julgar onde estão, aonde podem chegar zagens, aliado à formação ética e cooperativa, com signi-
6
Fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar, que se acrescente
à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque
professor, como pesquisador (FREIRE).
ficado para os alunos, próximo à realidade de cada um e o tema orientação sexual; inicialmente todos queriam
sem artificialidade ou imposição. ficar neste grupo, o que demandou ampla negociação e
Aproveitamos o pedido da classe, que solicitara à uma garantia de que todos os temas estudados resultari-
professora regente o trabalho de pesquisa. Na verdade, am numa socialização na sala de aula. Foi necessário ar-
tiramos vantagem do desejo dos alunos que, para se sen- gumentar, esclarecer e novamente reforçar o número de
tirem importantes, sujeitos autônomos, precisavam imi- participantes de cada grupo. Uma aluna se emocionou
tar os alunos maiores, do 3º ciclo, que habitualmente diante da possibilidade de sair do grupo de sexualidade
freqüentavam a biblioteca escolar para fazerem seus tra- (era uma das maiores da classe e apesar de possuir ape-
balhos extra-classes; observávamos que eles queriam se nas dez anos já tinha um corpo de moça e grande inte-
sentir grandes como os outros e fazer pesquisas na resse por namoro). Aos poucos, alguns alunos foram mi-
biblioteca era um meio para tal. grando de um tema para outro, por influências de ou-
Assistindo todo aquele entusiasmo da classe, de- tros colegas e argumentações da orientadora e da regen-
cidimos propor um projeto sobre os temas transversais te da classe. Os temas ética e pluralidade cultural foram
que correspondem a questões importantes, urgentes e mais difíceis de se comporem, por se tratarem de assun-
presentes sob várias formas na vida cotidiana, devendo tos pouco conhecidos, ou seja, pouco discutidos e ain-
ser incorporados nas áreas já existentes e no trabalho da abstratos no cotidiano dos alunos, que são proveni-
educativo da escola. Daí as suas possibilidades como entes de uma comunidade humilde e pouco letrada, que
base para os projetos de trabalho, de forma a integrar apesar de um rico conhecimento popular portam um
as áreas convencionais ou estarem presentes em todas vocabulário limitado.
elas, que incorporam o currículo, de forma a compor Finalmente, compusemos os grupos. Passamos à
um conjunto articulado e aberto a novos temas, mas organização do projeto. Combinamos o tempo de dura-
buscando um tratamento didático que contemple sua ção, dois meses, tempo que os alunos acharam muito
complexidade e sua dinâmica. longo, a princípio; combinamos o encerramento com
Para iniciar as atividades, fizemos uma reunião de uma apresentação na Feira da Cultura (quando os alu-
discussão na sala de aula, começando uma breve apre- nos deveriam tornar público o produto do projeto) e
sentação dos temas transversais: saúde, sexualidade, meio outros pormenores do trabalho.
ambiente, ética e pluralidade cultural e solicitamos que Fizemos o esboço do projeto a partir do conheci-
os alunos se manifestassem sobre o que sabiam a respei- mento que possuíam sobre o assunto, as expectativas e
to de cada tema. Foi necessário o encorajamento da classe os objetivos do grupo, os meios e as estratégias para
para que levantassem hipóteses a respeito deles. Após atingi-los, o que favoreceu o conhecimento mútuo, a
algumas manifestações, sugerimos que usassem o dicio- discussão coletiva e a construção de significados através
nário. Findada a sondagem dos conhecimentos prévios da interatividade.
dos alunos sobre cada tema, passamos para as discussões
e pedimos que procurassem identificar problemas den-
tro de cada um. As perguntas começaram a fluir. Muitas
eram as questões para as quais não sabíamos as respostas 2.2 Execução
e, simultaneamente, a necessidade de pesquisar para sa-
ber. Grande parte da classe se envolveu na discussão.
Dentre outras, os alunos queriam saber se ética era guar-
dar segredo, se os professores estavam usando a ética na Sob a orientação da pedagoga, os alunos foram
sala de aula e se rato virava morcego. desafiados a colocar no papel o que sabiam e o que que-
Como orientadora do projeto, disse a eles que riam saber sobre o tema. Alguns alunos tiveram dificul-
não responderíamos as questões, mas que poderíamos dade, sobretudo quando se tratava dos temas pouco co-
buscar juntos, em equipes, soluções àquelas perguntas. nhecidos por eles, conforme exposto anteriormente, o
Propusemos à classe, de 27 alunos, a formação que demandou mais orientação. Findada esta primeira
de 3 grupos de 5 integrantes e 2 grupos de 6 compo- avaliação, partimos para a construção do primeiro índi-
nentes, conforme o interesse pelos temas, pois preci- ce. Os estudantes, em grupos, confeccionaram cartazes,
saríamos de ler muito e encontrar outras fontes de nos quais especificaram os aspectos que iam trabalhar no
informação para respondermos a todas as dúvidas so- projeto, conforme cada tema. Fizeram previsão das fon-
bre todos os temas. tes de pesquisas e recursos necessários para o desenvol-
Na expectativa de busca de caminhos que possibi- vimento do projeto, alicerçados na orientação da
litassem novos conhecimentos, cada aluno procurava ar- pedagoga, orientadora do projeto.
ticular com algum colega um grupo determinado para o A partir daquele momento, as diretrizes básicas
tema de seu interesse; contudo, encontramos uma difi- foram estabelecidas, em consonância com os alunos, datas
culdade: havia temas com grande número de preten- foram combinadas para execução de cada etapa do pro-
dentes e outros com poucos interessados. Foi assim com jeto. Estabelecemos um cronograma que foi alterado al-
gumas vezes, ou seja, quando havia necessidade, Sexualidade: O grupo de pré-adolescentes esta-
embasados em argumentações convincentes e/ou ne- va eufórico e cheio de questões referentes ao próprio
cessidades reais dos educandos. corpo. As interrogações borbulhavam e transbordavam
Num clima de grande interesse da maioria dos os limites da idade. Foi o grupo que mais respostas pro-
alunos, iniciamos mais uma etapa do projeto, a bus- curava. Dentre muitos outros, podemos elencar alguns
ca às respostas das questões levantadas por eles. Sob assuntos sobre os quais foram feitas inúmeras perguntas:
a orientação da pedagoga da escola, em parceria com menstruação, métodos contraceptivos, relação sexual,
a regente da turma, esboçamos um quadro onde os namoro, fecundação, gravidez e o uso do fumo e da
alunos registravam: bebida durante a gestação.
O queremos saber? Como vamos fazer? Saúde: A princípio surgiram mais questões relati-
vas a doenças do que à saúde em si. Dividimos o tema
A partir daí, os temas transversais foram desdobra- em subtemas, conforme os assuntos: AIDS, dengue e
dos em eixos temáticos, conforme a curiosidade dos alu- drogas. Após discutir o que é saúde e o que é doença e
nos . Na socialização das demandas dos pequenos gru- a interferência de uma sobre a outra, o tema foi mais
pos percebemos, dentro de cada tema, questionamentos bem delimitado e as pesquisas giraram em torno de uma
relevantes que serão apresentados a seguir: alimentação saudável e da prática de esportes como um
bem para a saúde.
Ética: O que é ética? Ética é guardar segredo? Os dois últimos grupos, ou seja, sexualidade e
Como deve ser a ética nas ruas? E ética profissional, o saúde, tiveram destaque na execução do projeto, pela
que é? Os professores usam a ética na sala de aula? Como integração e responsabilidade de seus componentes que
devemos agir perante os outros? se envolviam com muito entusiasmo em cada etapa do
projeto. Os demais grupos enfrentaram algumas dificul-
Meio ambiente: Este tema se subdividiu em dades de ordem organizacional, relacional e cognitiva
outros sub-temas. Inicialmente os meninos (as) op- para executarem seus trabalhos, porém, com algumas
taram por estudar os morcegos, mamíferos muito intervenções da orientadora, da professora regente e da
presentes na região que possui grande número de técnica da biblioteca 7 , que muito contribuiu para
sítios com árvores frutíferas, o que atrai estes ani- efetivação das buscas em prol dos objetivos propostos
mais em busca de alimentação. Na verdade, os para o projeto, os problemas foram solucionados atra-
educandos não acreditavam que estes bichinhos vés das reuniões que fazíamos com os alunos.
tão inoportunos, segundo eles, fossem importan- A pesquisa, nos diversos grupos, foi estimula-
tes para a polinização das plantas. Os alunos afir- da por meio de coleta de dados pelos próprios alu-
mavam que os morcegos eram ratos em mutação. A nos e realizada em enciclopédias e periódicos da
principal questão deste grupo foi: rato vira morce- Biblioteca escolar, em livros dos próprios alunos,
go? Confrontar conhecimento popular e científico cartilhas recolhidas no Posto de saúde local, em tra-
foi uma tarefa que demandou muita pesquisa e dis- balho de campo e a partir do lar, estendendo-se à
cussões profundas. vizinhança e à comunidade.
No decorrer do trabalho, fomos fazendo as altera-
Pluralidade cultural: A pesquisa de campo ções, acréscimos e eliminações que julgávamos necessá-
foi a principal fonte para aquisição de informações rios. Gostaria de salientar que o projeto não é tarefa
sobre o tema. A princípio, alguns alunos resistiram determinada pelo orientador ou professor. Deve ser es-
a este tipo de pesquisa, acreditavam que pesquisa colhido, discutido e planejado coletivamente. Os meios
só se fazia em livros. O convencimento foi a tarefa e estratégias assim planejados foram reestruturados con-
mais árdua da orientadora do projeto desse grupo forme as necessidades e de acordo com as novas idéias e
que, aos poucos, foi se dedicando ao estudo do descobertas que surgiam. Assim, os alunos enfrentaram
tema. Seduzir o grupo a buscar conhecimentos nas com naturalidade e criatividade situações às vezes difí-
entrevistas e depoimentos das pessoas da comuni- ceis e inesperadas.
dade e valorizar este saber, que lhe é próprio, foi O projeto foi coletivamente construído pela
um passo importante para obtenção de resultados. pedagoga da escola, a professora regente, os alunos e a
Organização de festas e comidas típicas, manifesta- técnica da biblioteca que procuravam transformar as dúvi-
ções populares do bairro, do município e até do das em desafios que exigiam dos alunos a capacidade de
estado de Minas Gerais, foram assuntos que abstrair e interagir de modo que a afetividade e a interação
nortearam os trabalhos. também fossem redesenhadas continuamente.
7
Andréia Barbosa Martins Técnica da biblioteca escolar, que com muito empenho, faz da biblioteca um centro de interesse.
Nossos encontros ocorriam semanalmente, nos seu tema ou algo aprendido, podendo relatar as dificul-
quais eram analisados os andamentos dos trabalhos: tira- dades e os avanços no desenrolar do projeto, apontan-
vam-se as dúvidas e propunham-se novas metas. Fazía- do o que precisava melhorar para o próximo projeto,
mos debates sobre o tema, intensa e extensa produção uma auto-avaliação em relação à cooperação, participa-
de idéias, partilhas, trocas, pesquisas, construções de sig- ção e aprendizagem. Os depoimentos foram carregados
nificados, produções de texto (música, relatórios, tea- de muita sinceridade, obedecendo ao combinado de que
tro) aconteciam, englobando as intenções, os propósi- deveriam dizer somente a verdade, usando a ética, já
tos e compromisso de aprender uns com os outros, com- que tinham aprendido bastante sobre ela. Até os alunos
partilhando saberes, respeito e criatividade. mais tímidos se manifestaram.
Ao final de cada etapa do cronograma, tínha-
mos algo novo, que era difícil mensurar, pois os co-
nhecimentos e as habilidades adquiridas nem sem-
pre eram vistas e sim sentidas. Era interessante ob-
servar a satisfação das crianças ao ensinar e aprender 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
umas com as outras.
No desenrolar do projeto se tornou necessário
uma reunião com os pais, pois o nível de curiosidade
sobre sexo e sexualidade era tão avançado para os pa- Havia grupos mais integrados e alunos que esta-
drões normais da idade da classe, que decidimos convo- vam em níveis diferentes em relação às habilidades de
car os responsáveis para anunciar o objetivo do traba- leitura. A síntese do grande número de informações,
lho, discutir os pontos de vista e a dimensão que o tra- provenientes de textos longos, foi um grande desafio
balho deste tema tomara devido à curiosidade da turma. para a maioria dos alunos, o que tornou necessárias in-
Fomos elogiados pela iniciativa. Ganhamos a confiança tervenções pedagógicas pertinentes, através de recortes
deles, que afirmaram que preferiam que seus filhos apren- que habilitassem os alunos para esta atividade, procu-
dessem sobre o assunto na escola, de forma correta e rando assim evitar cópias desnecessárias e sem objeti-
não pela rua, onde se veiculam informações poucas se- vos. Foi ao longo do trabalho que os educandos adqui-
guras e que eles (os pais) tinham pouca liberdade para riam confiança e passaram a atuar mais efetivamente no
tratar desse assunto com os filhos. Sendo assim, a base projeto. Poucos permaneceram apáticos, aqueles que
do projeto era a postura de diálogo permanente e a va- resistiram ao desafio de aprender a aprender eram cri-
lorização da participação de todos. anças infreqüentes às aulas, portadoras de outros pro-
Administrar conflitos foi uma tarefa dos envolvi- blemas, aqui não relatados.
dos no projeto e estes aos poucos foram sendo supera- Orientação sexual foi o tema de maior interes-
dos, através de intervenções, inclusive das próprias cri- se da classe, sobretudo das meninas; queriam saber
anças/pré-adolescentes que foram aprendendo lidar tudo sobre sexo e sexualidade, a cada dia surgia uma
melhor com as diferenças e as habilidades de cada um. À nova curiosidade. Tornou-se difícil delimitar assun-
proporção que aumentava a convivência, os elementos tos, o que requisitou habilidade na orientação por
dos grupos procuravam administrar as discórdias, evi- parte dos envolvidos.
tando acusar os companheiros, promovendo um cresci- O projeto desenvolvido por nós foi constantemen-
mento pessoal e socializado da classe. te alimentado por nossa vontade de superar limites. Para
Programamos a culminância do projeto com apre- que o crescimento fosse ainda maior, tornou-se impor-
sentações alusivas aos temas para a Feira da Cultura em 6 tante refletir cada passo, cada ação. Nossas metas eram
de dezembro de 2002, com o objetivo de tornar público estabelecidas e reavaliadas ao longo do trabalho. A avali-
os resultados dos trabalhos. A idéia foi bem recebida pela ação foi usada também para identificar onde havíamos
maioria dos alunos, que investiram nos preparativos: acertado ou errado, aumentando o diálogo entre os alu-
escreveram e ensaiaram peças de teatro, danças, compu- nos, a professora regente, a técnica de biblioteca e a
seram músicas e fizeram maquetes; usaram a criatividade pedagoga, orientadora do projeto. Nosso foco era sem-
com a ajuda final de todos os envolvidos. Toda a comu- pre o caminho percorrido e não apenas a meta atingida.
nidade escolar foi convidada a participar do evento que Era por meio da avaliação que tirávamos informações
envolvia outras apresentações culturais. Chegou o gran- básicas para reprogramar.
de dia. Muitos convidados estavam presentes para co- À medida que os alunos iam desenvolvendo seus
mungar com aquele conhecimento. Os alunos que iam trabalhos, assumindo responsabilidades, interagindo com
apresentar ficaram tensos, mas ao mesmo tempo, senti- os colegas para confrontar e melhorar suas produções, a
am-se visivelmente entusiasmados. classe se tornava mais viva e cooperativa, logo percebía-
Encerramos o projeto com um seminário na sala mos o envolvimento deles como co-autores de suas apren-
de aula, um dia após a Feira Cultural. Combinamos as dizagens. Algumas situações nos possibilitaram maior
regras: cada participante deveria fazer exposição sobre amadurecimento. Os próprios alunos, assim como nós,