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A Teoria do Sujeito Suposto Saber

LU
O pensamento de Lacan é suposto saber (S.S.S.), tem como
complexo e tem vitalidade. Não ponto de partida uma reflexão
é, pois, de espantar que mude, e sobre o conhecimento e a
ainda mais em um tema como o ordem simbólica.
da transferência, que o ocupou O ponto de partida da
em muitas ocasiões ao longo de argumentação de Lacan é um
sua extensa obra. - estudo sobre a função do
Até aqui, a transferência analista. Uma coisa é que o
havia sido situada na tópica do analista fique incluído na
imaginário, na qual analista e relação dual da fase do espelho
paciente espelham-se um no e outra, muito diferente, é que
outro e ficam prisioneiros de ocupe o lugar terceiro exigido
sua fascinação narcísica. A pela ordem simbólica.
partir dessa perspectiva, o A partir dessa diferença,
processo psicanalítico só se Lacan coloca-se a questão da
constituirá no momento em que posição do analista na situação
o analista transformar essa analítica, não menos que a
relação dual em simbólica, para posição da análise na ciência.
o que é necessário que rompa a A função do analista é
relação diádica e ocupe um desaparecer enquanto eu (moi) -
lugar terceiro, o lugar do
diz Miller (1979, p. 23) - e não
código, o lugar do grande
permitir que a relação
Outro.

d SUJEITO SUPOSTO SABER

Em Les quatre concepts


fondamentaux de la psychanalyse
(1964), o livro XI de seus Sujeito
seminários, Lacan oferecerá imaginária domine a situação
uma nova hipótese, que atribui analítica. O analista deve estar
à transferência um lugar na or- no lugar do Outro. Miller
dem simbólica. Essa proposta, expressa essa concepção do
conhecida como a teoria do sujeito processo analítico com um

Outro
2 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

esquema simples, com uma cruz O


na qual em um de seus eixos SUJEITO
inscreve-se a relação imaginária SUPOST
e recíproca do eu e do a (outro O
SABER
com minúscula) e, no outro
NA
eixo, estão o sujeito e o grande TRANSF
Outro. ERÊNCI
A ciência pressupõe A
separar o simbólico do imaginá-
Com base nessas idéias,
rio, o significante da imagem. O
articula-se a nova teoria da
significante, diz Miller na
transferência de Lacan. Ao
página 60 de sua terceira
introduzir a regra da associa-
conferência, pode existir inde-
ção livre, o analista diz ao
pendentemente de um sujeito
paciente que tudo o que disser
que se expresse por seu in-
terá valor, terá sentido; desse
termédio. 1 Entretanto, cada vez
modo, a partir do dispositivo
que o progresso da ciência cria
do tratamento, o analista
uma nova invenção significante,
transforma-se, para o paciente,
sentimo-nos levados a pensar
no sujeito suposto saber.
que estava ali desde sempre e
Embora, por essa
então a projetamos em um sujeito circunstância, o analista faça as
suposto saber. Descartes tornou vezes, no tratamento, de sujeito
possível a ciência porque suposto saber, o que Lacan
colocou Deus como garantia da afirma é que a experiência
verdade, com o que pôde psicanalítica consiste precisa-
separá-lo do conhecimento mente em evacuá-lo.
científico. Portanto, a ciência Estruturalmente, o S.S.S. surge
apresenta-se como um discurso com a abertura da análise;
sem sujeito, como um discurso porém, a questão está no final e
impessoal, o discurso do sujeito não no começo. O fim da
suposto saber em pessoa análise significa ejetar o S.S.S.,
(Miller, 1979, p. 66). com
Para Lacan, "algo de Deus
persiste no discurso da ciência a
partir da função do S.S.S.", diz
Miller (p.70), "porque é muito
difícil defender-se da ilusão de
que o saber inventado pelo
significante não existe desde
sempre", que sempre esteve ali.

1 Compare-se com a idéia de


Bion
para pensar os pensamentos.
FU

PS

preender que não existe. analista introduza a regra


Por isso, a análise ocupa um lu- fundamental no momento de
começar o tratamento.
gar especial na ciência, porque Contudo, não se deve deduzir
apenas nela o S.S.S. pode ficar disso, sem mais, que o S.S.S.
incluído no processo e ser, no surge do fato de que o paciente
final, evacuado. Se há uma atribui ao analista a
ciência verdadeiramente ateia, onisciência, um saber oní-
modo que tudo abrange e
sentencia Miller, é a psicanálise alcança. Quando esse fenôme-
(p. 68). no ocorre em estado puro, já
Miller afirma que a análise estamos frente à psicose: o
da transferência consiste em paciente crê que o analista
descobrir que não há um S.S.S. conhece seus pensamentos (pa-
no sentido real e salienta, a ranóia) e inclusive os provoca,
seguir, que esse processo no como no delírio transitivista
qual se evacua o S.S.S. no final dos esquizofrênicos. Nesses
do tratamento coincide com a casos extremos, a transferência
perda do objeto, o luto pelo funciona ao máximo e o S.S.S.
objeto, tal como propõe emerge em toda a sua
Melanie Klein (1935, 1940). magnitude, e salientamos que,
Em outras palavras, com ou sem intenção, Lacan
segundo a teoria do S.S.S., o vem a definir com elegância a
analisando tenta de início psicose de transferência.
estabelecer uma relação imagi- Nos outros casos, mais
nária com o analista, já que, ao comuns e menos graves, quan-
atribuir a ele o saber sobre o do o analista introduz a regra
que lhe acontece, está fundamental e, com isso, dá ao
assumindo que o analista e ele paciente a garantia de que tudo
são um. Quando o analista não o que disser poderá ser
se deixa colocar nesse papel e interpretado, o analisando em
faz o analisando compreender geral se mostra cético e teme,
que o único que sabe o que lhe antes, poder enganar o analista.
acontece (qual é seu desejo) é Lacan propõe um exemplo
ele mesmo, atin- ge-se o nível simples: um paciente que
simbólico. oculta sua sífilis, porque teme
Essa idéia não só é correta, que isso conduza o analista a
como também é aceita por todos uma explicação organicista e o
nós. O analisando atribui-nos desvie do psicológico (1964, p.
um conhecimento dele que não 238 da edição castelhana). O
temos, e nossa tarefa é retificar paciente pode pensar, então,
esse juízo, que provém de uma não apenas que o analista sabe
fascinação narcisista. Winnicott tudo, como também, ao
(1945, 1952) diria que devemos contrário, que o analista será
ir tirando as ilusões do paciente, enganado se lhe proporcionar
até fazê-lo compreender que certos dados.
esse objeto que sabe tudo não E necessário destacar que
existe mais que em sua a teoria do S.S.S., enquanto
imaginação. atribui a transferência à própria
Como uma primeira constituição da situação
aproximação a essa teoria, po- analítica, à sua estrutura - que
demos dizer que, no começo do Lacan gosta de chamar de
tratamento, o analisando supõe discurso analítico - reconhece à
que o analista possui o saber transferência um lugar próprio
que concerne a ele e que, com o e já não poderá denunciá-la,
passar do tempo, vai parece-me, como momento de
abandonando essa suposição. Já errância do analista. A
dissemos que o S.S.S. é a transferência sur; do paciente
conseqüência imediata de que o no próprio momento em que o
4 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

analista intr duz a regra A


fundamental e, quanto mais T
doente estiver paciente, mais R
verá o analista como o S.S.S.
A
em pesso como é o caso do
paranóico, por exemplo. N
Ferenczi; havia dito, em seu S
ensaio de 1909, que a F
quantidade c transferência é E
diretamente proporcional ao R
grau de ei fermidade. Ê
Desse modo, creio que a N
teoria do S.S.S. implica qut C
cada vez que enunciamos uma I
antítese e operamos um A
reversão dialética, estamos E
apoiando implicitamente a crer A
ça de nosso analisando de que O
somos o S.S.S., o que nc obriga R
a interpretar essa crença, ou D
seja, a integrar à ant: tese que E
propusemos o elemento M
transferencial com que recebe o
S
paciente. Se isso é assim, então
I
a técnica dev variar e
M
aproximar-se da que utiliza a B
interpretação transfe rencial Ó
como um instrumento L
indispensável e cotidianc Por I
tudo isso, penso que as duas C
teorias de Lacan sobre ; A
transferência não são
facilmente conciliáveis. Essa grande mudança do
pensamento de Lacan pode ser
notada nos Quatro conceitos, já
antes de propor sua teoria do
S.S.S. quando, no Capítulo XI
(p. 152), diz que "a
transferência é a colocação em
ato da realidade do incons-
ciente". Com essa afirmação,
Lacan aproxima-se da opinião
dos analistas em geral, isto é,
que a transferência é um fe-
nômeno universal e que deriva
basicamente do funcionamento
do inconsciente, do processo
primário. De acordo com o
que Freud ensinou, prossegue
Lacan, a realidade do
inconsciente é sexual, é o
desejo. E esse desejo que põe
em ato a transferência, conclui
ele, é o desejo do outro, ou
FU

PS

seja, o desejo do analista. Por é o ouvinte quem decide


isso, a presença do analista é sobre o sentido; em todo
muito importante para Lacan, e diálogo, o que cala detém o
a esse tema dedica o Capítulo poder, porquanto outorga
X do livro. Esse desejo do significação ao que o outro
analista, bem singular, por diz; porém, quando o ouvinte
certo, é o de não se identificar passa -a ser falante, esse
com o outro, respeitando a poder de fato se reparte. O
individualidade do paciente diálogo analítico, ao
(Miller, 1979, p. 125). contrário, é completamente
Voltando ao anterior, o assimétrico, já que o analista
discurso analítico (a situação sempre cala e, se fala, é para
analítica) tem para Lacan, no sancionar a significação do
entanto, outra vertente. Se, ao que o analisando disse.
pedir ao paciente que fale e que Portanto, somente o analista
diga tudo o que passa por sua tem o poder. Desse ponto de
cabeça, instaura, por um lado o vista, o discurso (situação)
S.S.S. como coluna vertebral da analítico é constitutivamente
transferência, por outro, um pacto entre o analista e o
outorga ao analista um poder paciente, em que este
sobre o sentido daquilo que o reconhece àquele o lugar do
analisando diz. Sua posição de grande Outro.
intérprete converte o analista
no amo da verdade, afirma
Lacan, enquanto decide EF
retroativamente a significação EIT
daquilo que lhe é dirigido. O
Nesse momento, e enquanto CO
sujeito que se supõe saber o NS
sentido, o analista já é o Outro.
Aqui se estabelece, pois, TIT
claramente, uma diferença entre UI
o Outro que sabe NT
verdadeiramente e o sujeito E
suposto saber - e tudo me faz E
supor que essa diferença é a EF
mesma que vai da ordem EIT
imaginária à ordem simbólica.
Enquanto garantidor da OS
experiência analítica, o analista CO
é o grande Outro, e esse é o NS
ponto em que a transferência TIT
torna-se simbólica. UÍ
O nível simbólico da DO
transferência surge então, evi- S
dentemente, quando o analista,
em vez de ocupar o lugar do O pivô da transferência,
S.S.S. que lhe atribui o aquilo que a funda, é a forma
paciente, ocupa o lugar do Ou- singular com que se
tro. Como se cobre esse trajeto estabelece o discurso
sem cair no autoritarismo, analítico a . partir do convite
nem incorrer em afirmações a associar livremente, que
ideológicas, se se prescinde da configura um diálogo
interpretação transferencial, assimétrico. Esse nível é
parece-me que é mais fácil de constitutivo, transfenomê-
pensar do que de executar na nico e estrutural. Não se trata
práxis concreta do consultório. aqui de uma vivência, e sim
E necessário assinalar de uma estrutura. Por isso,
aqui que, para Lacan, sempre Lacan insiste em que não se
6 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

deve confundir o efeito diferença entre efeitos


constituinte da transferência (es- constituintes e constituídos,
trutura) com os efeitos fica definido o que depois
constituídos (fenômenos) que haveria de designar como o
derivam daquele. A estrutura suporte da transferência, ou
está além dos fenômenos e seja, o S.S.S.
consiste em que o analista A teoria simbólica da
coloque-se no lugar do transferência apóia-se no que
significante para o sujeito. No Lacan chamou, no começo de
plano fenomenológico, essa sua investigação, de pacto
situação estrutural pode analítico - a aliança analítica de
originar diversos sentimentos Freud. Em seu discurso de
(vivências): o desprezo, a Roma, Lacan fala,
credulidade, a admiração, a efetivamente, de que o paciente
desconfiança, etc. acredita que sua verdade está
Desejo reiterar, neste em nós, que nós a conhecemos
ponto, porque me parece um desde o momento em que ele
conceito lacaniano de real travou seu pacto inicial
valor que, ao formular a teoria conosco. Assim se configuram
da transferência, não se deve para Lacan os efeitos cons-
confundir a dimensão tituintes da transferência, com
fenomênica com a estrutural. seu índice de realidade (p.125-
A teoria do S.S.S. não se 126).
refere a uma vivência do O efeito constituinte da
analisante, e sim a um pressu- transferência, enquanto de-
posto que surge da própria pende da estrutura do discurso
estrutura da situação. Disso analítico, tem uma relação com
decorre que, como vimos há o real e o simbólico e não está
pouco, o fenômeno possa ser vinculado à repetição, ao passo
exatamente o contrário, a que os efeitos constituídos que
saber, que o analisante pense decorrem dessa estrutura são
que o analista não sabe, que repetitivos. Desse modo, em
pode ser enganado. seu nível simbólico, a
Essa diferença entre o transferência fica desvinculada
estrutural e o fenomenal no da repetição, um ponto no qual
discurso analítico é, sem insiste especialmente Oscar
dúvida, um fator básico para Masotta (1977) em seu prólogo
compreender não apenas a aos Quatro conceitos.
nova teoria de Lacan sobre a Diz Lacan: "De fato, essa
transferência, mas também a ilusão que nos leva a buscar a
teoria da transferência em realidade do sujeito além do
geral. Os fenômenos que muro da linguagem é a mesma
Freud deslindou, descobriu e pela qual o sujeito crê que sua
estudou na transferência - e verdade está em nós já dada,
que, para Miller, são a que nós a conhecemos de
repetição, a resistência e a antemão, e é igualmente por
sugestão - giram em torno do isso que está aberto à nossa
eixo estrutural e transfenomênico intervenção ob- jetivante.
do S.S.S. Por isso, já em seu "Sem dúvida, não tem de
discurso de Roma de 1953, responder, por sua vez, por
que é como o ponto de partida esse erro subjetivo que,
de sua investigação, Lacan confesso ou não em seu
distingue os efeitos discurso, é imanente ao fato dê
constituintes da transferência que entrou na análise e de que
dos conseqüentes efeitos travou seu pacto inicial. E não
constituídos; e, ao se pode descuidar a subjetivi-
incorporar esse trabalho a seus dade desse momento, tanto
Escritos em 1966, em uma nota menos quanto que encontramos
de rodapé afirma que, com a nele a razão do que poderíamos
FU

PS

chamar de efeitos constituintes COMENTÁRIO FINAL


da transferência, enquanto se
distinguem por um índice de Em resumo, poderíamos
realidade dos efeitos dizer que o tema da transfe-
constituídos que lhes seguem" rência ocupa um lugar muito
(1953b, p. 125-126). Há aqui o importante no pensamento de
chamado à nota de rodapé já
citada, na qual Lacan aponta Lacan e, em sua obra escrita,
que ali se encontra definido o cristaliza-se em pelo menos
que designou mais tarde como o dois momentos, em duas
suporte da transferência, o teorias que unem a transfe-
sujeito suposto saber.
E diz no parágrafo rência à ordem do imaginário e
seguinte, para tornar mais claro à ordem simbólica.
o anterior, que Freud insistia em A teoria imaginária da
que, dentro dos sentimentos
trazidos para a transferência, transferência, enunciada em
deve-se distinguir um fator de 1951, a conceitua como um
realidade "e tirava, como processo diádico, especular e
conclusão, que seria abusar da narcísico em que falta o
docilidade do sujeito querer
persuadi-lo, em todos os casos, terceiro, o Outro que remete ao
de que esses sentimentos são código e redistribui os papéis
uma simples repetição da dupla mãe-criança, impondo
transferencial da neurose" (p. a Lei do Pai. Se o analista não
126).
Parece-me que, ao se coloca como o terceiro que
introduzir o real na tem de operar o corte
transferência, Lacan aproxima- (castração), ingressa em um
se, embora certamente por um campo imaginário onde
caminho bem diferente, do reverbera indefinidamente na
conceito de aliança terapêutica
dos psicólogos do ego. Pelo fato situação tu-eu. Isso é o que
de que se apóia no pacto analíti- sucede a Freud com Dora:
co selado pelo paciente, ao identificado com o Sr. K,
aceitar a regra fundamental, a Freud quer ser querido por
teoria simbólica da
transferência corresponde ao Dora, em lugar de lhe indicar
plano da realidade, e não ao seu vínculo homossexual com
repetitivo. Cabe aqui perguntar, a Sra. K.
entretanto, se ainda podemos Muitos anos depois, em
continuar chamando isso de 1964, Lacan propõe uma série
transferência, se já não seria
melhor chamá-lo pura e de idéias que articulam a teoria
simplesmente de aliança simbólica da transferência. Segundo
terapêutica ou pacto
psicanalítico. Em outras ela, o discurso analítico é uma
palavras, o efeito constituinte da estrutura que fica definida ao
transferência, enquanto se começar a relação, quando o
distingue por seu índice de analista introduz a regra
realidade, pertence à ordem
simbólica; porém, já não é mais fundamental. A partir desse
transferência, ao menos na momento, o analista ocupa um
forma estrita que, em seu lugar determinado na estrutura
devido momento, definimos. recém- formada, que é o lugar
Apenas os efeitos constituídos a do S.S.S.
partir disso merecem, em meu
entender, esse nome. E evidente que, ao atribuir
ao analista a posição de S.S.S.,
8 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

o analisando procura significante, já que excederia o


estabelecer uma relação ima- âmbito deste comentário, mas
tentarei expô-la à medida que é
ginária e narcisista: se o aplicável à transferência na
paciente afirma que o analista práxis psicanalítica.
sabe o acontece com ele, o Ao longo de toda a sua
paciente, é porque analista e obra, Lacan insiste sem esmo-
paciente são um; contudo, se o recer em que o inconsciente
analista não se deixa colocar está estruturado como uma
nessa posição e a denuncia linguagem, e não é por acaso
como um mero pressuposto do que os Ecrits iniciam com "Le
paciente, então se alcança o séminaire sur 'La lettre volée'"
nível simbólico. Desse modo, (1955, "O seminário sobre A
como todos sabem, a função do carta roubada'"), em que toma
analista é ficar finalmente o conto de Poe para ilustrar sua
excluído da vida e da mente do teoria do significante. Lacan
analisando. sustenta que os personagens do
conto ficam definidos em
Ade relação à carta como
ndo: significante, a qual rege o
signi destino de quem a possui. Na
fican relação entre o rei, a rainha e o
te,
repet
ministro, muda a posição deste
ição quando se apropria da carta e,
e ao mesmo tempo, fica preso a
trans ela. Mais adiante na história,
ferên quando a relação se dá entre o
cia chefe de polícia, o ministro e
Antes de encerrar estes Dupin, também este, como
dois capítulos, farei uma ten- possuidor da carta, converte-se
tativa de expor as idéias de em algo distinto do que era até
Lacan sobre a transferência a esse momento. "Pode-se dizer
partir de suas próprias pautas. que, quando os personagens
Embora não seja fácil, é a única apoderam-se da carta, são
maneira de entender esse apanhados e arrastados por
grande pensador, que em muitos algo que predomina com van-
aspectos afasta-se tagem sobre suas
decididamente das outras linhas particularidades individuais" (0
doutrinárias da psicanálise eu na teoria de Freud e na técnica
atual. psicanalítica, 1983, p. 295). Os
Lacan retorna a Freud com personagens ficam definidos
o propósito de formalizar suas
teorias a partir da lingüística por sua posição frente a esse
estrutural e da matemática protagonista singular que é a
combinatória. E faz isso com carta. Além disso^oxonteú- do
sua noção original de significante, (ságni£cado)-da^carta não tem,
que orienta como uma bússola
todo o "campo freudiano". Não e isso é inegável, nenhuma
pretendo desenvolver em sua importância na trama do conto.
plenitude a teoria lacaniana do Os elementos valem mais por
FU

PS

sua relação do que por sua XI dos Quatro conceitos, que "a
substância» o que é relação do sujeito com o
característico da perspectiva significante é o ponto de
estruturalista, que inspira toda a referência que quisemos pôr no
primeira parte da obra de primeiro plano de uma
Lacan. retificação geral da teoria
Lacan chega a pensar que analítica, pois também é
quem possui a carta sofre, por primeiro e constituinte na
sua influência, um processo de instauração da experiência ana-
feminização, fundan- do-se em lítica, assim como primeiro e
algumas contingências do relato constituinte na função radical
e, com isso, parece querer do inconsciente" (p. 145).
convencer-nos de que o poder "Vous saisissez pourquoi la
da carta como significante relation du sujet au signifiant
chega a prender e a converter o est le repère que nous avons
sujeito em feminino. Que, ao voulu mettre au premier plan
apoderar-se "da carta da rainha" d'une rectification générale de
(porque dela foi roubada), o la théorie analytique, car il est
ladrão identifique-se com o aussi premier et constituant
objeto danificado e adquira dans l'instauration de
algum traço da personalidade de l'expérience analytique, que
sua vítima é algo que não entra premier et constituant dans la
em nada no raciocínio de fonction radicale de l'incons-
Lacan; e não poderia entrar sem cient"2 (Les quatre concepts, p.
menosprezo de sua teoria,
127). Portanto, para Lacan, o
porque, então, a carta já não
significante é o primeiro na
seria somente um significante,
teoria e na prática da psi-
mas o símbolo de um objeto
canálise e primeiro, também,
"empírico", como podem ser o
no funcionamento do in-
seio, o pênis ou a mãe, por
consciente.
exemplo. Quero dizer que há
O significante lacaniano
muitas formas de entender
é, sem dúvida, herdeiro da
psicanaliticamen- te o conto de
teoria do signo lingüístico de
Poe, e não apenas uma. Assim,
Ferdinand de Saussure ,
Freud veria a rainha como a
(1916), que o define como a
mulher com pênis, a mãe fálica,
e Melanie Klein não duvidaria combinação_deumconceitQ. -(-
em supor que a rainha com a significado) e uma imagem
carta é a mãe que contém em acÚsücãXilgnificante) e pro-
seu interior o pênis do pai, os põe um gráfico que se tornou
bebês, e as fezes que o filho- célébrer-----------------------------
ministro ataca por inveja e por -
ciúmes.
A noção de significante
aparece continuamente ao longo
de toda a obra de Lacan, e
assim lemos, por exemplo, no
começo da seção 2 do Capítulo 2N. de R.T. Em francês, como no
original.
10 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

Hilbert (1984, p. 120), em que


um significante só se liga a
outro significante, afastado de
toda referência empírica (ou
objetai): o signo é "para
alguém", mas o significante o
é apenas para outro
significante. Não é de se
estranhar, então, que Oscar
Esse gráfico mostra-nos Masotta, em seu cuidadoso
as duas faces inseparáveis do estudo "Psicoanálisis y
signo como um sistema estructuralismo" (1969), che-
fechado (elipse), no qual a raia
horizontal expressa o vínculo gue a dizer que, quando a
entre ambos os elementos; as teoria psicanalítica parte da
flechas indicam sua relação de relação de objeto, cai em uma
ida e volta, enquanto a própria espécie de delírio empirista
elipse implica a conexão
unívoca de ambos os termos. que parece esquecer que
Lacan inverte essa relação Freud fala de achado (e não
para indicar a preeminência do de relação) de objeto, de
significante e torna espessa a modo que o objeto começa
linha divisória, a tal ponto que por não estar. É certo que a
o significante fica acima (para
não dizer no ar), só e teoria da relação de objeto
desprovido de toda relação vem mais de Berlim, de
com o significado, porque a Budapeste e de Londres do
barra que os separa é que de Viena e que, para
impenetrável. Desprovido de
elipses e de flechas, o famoso Freud, o objeto é contingente
algoritmo lacaniano fica à pulsão e deve ser achado.
finalmente assim: Não é menos certo, por outro
lado, que Freud distingue o
S
s
objeto da pulsão e o objeto de
amor do ego. Que o objeto
onde o S maiúsculo é o não esteja, em princípio, isso
significante; o s minúsculo, o se explica sobre a base da
significado; a espessura da teoria do narcisismo primário,
barra, sua radical separação. que Freud aceita na maioria
Rompida a relação do das vezes. Freud diz, também,
significante com o significado, que o achado do objeto é, na
a significação só pode provir realidade, um reencontro, o
das relações de combinação que é entendido por muitos
(sintagma) e substituição como um retorno ao primeiro
(paradigma) que se objeto, enquanto Lacan o
estabelecem nos elos da cadeia considera como uma prova de
simbólica significante. Esta se que o desejo nunca pode, por
erige assim, como assinala definição, encontrar o objeto
Rios (1984), em um sistema de onde se originou, porque
axiomático fechado, este ficou irremediavelmente
surpreendentemente análogo perdido na trama simbólica. O
ao formalismo matemático de tema é complexo e presta-se a
FU

PS

uma discussão mais ampla. transferência". Por isso, Maci


Basta dizer, nesse momento, (1983) pode dizer com clareza,
em La repetición significante,
que para Freud o objeto valioso livro dedicado a esse
começa por não estar tema, que "o sujeito da análise
(narcisismo primário), ao está sempre em transferência,
passo que para Lacan termina está sempre transferido" (Cap. 6,
p. 203, grifos no original), o
por não estar, já que o objeto que se deve entender
do desejo não coincide com o estritamente como que "o
da necessidade e jamais pode sujeito é transportado pela
ser nomeado, recoberto pela marca significante" (p. 207).
Outro discípulo eminente de
demanda. A maneira de um Lacan, o argentino Juan David
Parmênides ao avesso, Lacan Nasio (1984), afirma que,
diz que o não-ser é (Rios, enquanto está estruturado
1989, comunicação pessoal). como linguagem, "o
A rigor, Lacan dá toda inconsciente consiste nessa
uma volta para descartar, pri- relação formal entre um
meiro, a idéia de que o objeto é significante reconhecível e
encontrável, enquanto diz que atual e os outros
ele é perdido e, por isso, busca-
se uma falta; e depois dirá que
o que é, é o objeto, que é o
objeto perdido. Assim, no
Seminário X sobre a angústia
(1962-1963), Lacan afirmará
que "a angústia não é sem
objeto". Dessa perspectiva, ele
afirma que há um objeto que se
busca como um chamariz (o que
corre metonimicamente), e
outro que é o objeto causa do
desejo (que é o objeto "a"). Este
último é a razão principal de
todo o devir psíquico. Ambos
os objetos (o da busca e o da
causa) têm sua razão no falo
como cobertura. Ou seja, a
teoria lacaniana, em seus
últimos trabalhos, está
fortemente influenciada pela
teoria objetai (Moreno, 1999,
comunicação pessoal).
Essa breve digressão talvez
sirva para compreender com
que sentido rigoroso (e também
extremo) Lacan não se cansa de
dizer que "um significante só é
significante para outros
significantes" e também que
"um significante é o que
representa o sujeito para outros
significantes", do que se segue
que o analista deve oferecer-se
para que o paciente encontre
nele (como no morto do bridge)
os significantes com os quais se
representar como "sujeito da
12 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

significantes, não- carrega nada de substancial e


reconhecíveis e virtuais" (En los concreto, a não ser o sujeito de
limites de la trasferencia, p. 23). um discurso (1983, p. 203). O
Ao situarem a sujeito é carregado pela marca
transferência no campo da significante, e o famoso
significação, os autores aforismo de Lacan, do qual
lacanianos tomam como ponto partimos, deve ser entendido,
de partida de nascimento do para Maci, não como que o
conceito o parágrafo C do significante representa o
Capítulo VII, em que é sujeito, mas que simplesmente
chamado de Übertragung o o põe em relação, engancha-o
processo graças ao qual o na rede significante, que é uma
desejo inconsciente transfere-se cadeia desiderativa (p. 207).
a um resto diurno pré- Com a mesma perspectiva,
consciente para abrir caminho à Masotta diz que "é preciso
consciência. Para esses autores, situar o sujeito (...) no
a teoria da transferência começa interstício das relações de
em 1900, e não em 1895. Há substituição e combinação que
aqui um claro divisor de águas unem um significante a outro
entre os que entendem (eu, significante..." (1970, p. 43). E
entre eles) a transferência como o mesmo que expressa
transferência de objetos e os que a Jacques-Alain Miller (1966)
pensam como transferência de com o conceito de sutura, o
significantes. Isso surge do fato de ponto em que o sujeito fica
que para Lacan, como soldado à cadeia simbólica
acabamos de ver, o objeto é significante. A sutura nomeia,
radicalmente uma ausência, ou pois, a relação do sujeito com
melhor, é velado por uma a cadeia de seu discurso, onde
ausência cuja significação é figura como um elemento que
fálica. E muito claro, porém, falta sob a espécie de pos-
que para o Freud de "Sobre a suidor de um lugar (1966, p.
psicoterapia da histeria", no 41).
fenômeno recém-descrito, in- Como o diz no começo do
tervém a pessoa do médico, de "Seminário sobre 'A carta
modo que "a transferência sobre roubada'", Lacan sustenta que
o médico acontece por falso o automatismo de repetição
enlace" (AE, v2, p. 306). ([Wiederholungszwang) tem seu
"Transference on to the princípio no que ele chama de
physician takes place through a insistência da cadeia significante
false connection" ("The e exemplifica- o com a
psychotherapy of hysteria", AE, estrutura que se repete no
v.2, p. 302). Recorde-se o conto entre a cena em que o rei
exemplo de Freud, a doente que não vê, a rainha vê que o rei
teve o desejo de que a beijasse, não vê e o ministro vê a carta,
como o havia tido, muitos anos e a outra cena na qual quem
antes, de outro homem. Freud não vê é o chefe de polícia
conclui que, desde que pôde (que agora ocupa o lugar do
compreender esse fenômeno, rei), enquanto o ministro está
todo requerimento similar para no lugar da rainha, e Dupin, no
sua pessoa teria de ser reduzido lugar do ministro. Ou seja, os
a uma transferência por falso personagens mudam, mas os
enlace. lugares não, e o roubo repete-
Com sua habitual precisão, se. Assim entende Lacan o
Maci (1983) diz que a automatismo de repetição e a
transferência é um circuito e função do psicanalista (Dupin),
lembra que a palavra Übertragung à medida que os
assinala algo que se suporta e deslocamentos ficam
que se transporta, que circula. determinados pelo lugar que
A transferência, contudo, não um significante - a carta - vem

f
FU

PS

a ocupar no trio. A segunda Freud de suas limitações e


cena repete a primeira, mas, penetra na essência de seu
graças a essa repetição, permite pensamento, embora seja
ao analista-Dupin compreender possível que esteja equivocado
a primeira, não por seus méritos e mais distante do mestre do
pessoais, e sim porque ocupa o que acredita.
lugar do sujeito do inconsciente. O algoritmo lacaniano que
Vemos aqui, novamente, que sanciona a autonomia do
Lacan parte do estruturalismo, simbólico é, sem dúvida, uma
concepção da qual mais tentativa legítima de aplicar o
adiante, em sua obra, tentará método axiomático formal da
desligar-se (a partir do matemática e da lingüística
Seminário X sobre a angústia, estrutural às descobertas de
1962-1963). Freud. Nisso, o mérito de
Mais tarde, quando Lacan é grande e
sublinha a materialidade do inquestionável. No entanto, há
significante, que não suporta ser muitas formas de entender essa
partido, afirma que o teoria, e uma coisa é propô- la
significante é o símbolo da como um modelo
ausência e da morte, com o que metodológico que pode,
nos dá sua explicação daquilo efetivamente, dar uma
que Freud situa além do explicação da combinatória das
princípio de prazer em 1920: o associações livres e das
sujeito segue o desfiladeiro do relações sutis que Freud foi
simbólico e seu próprio ser fica capaz de desentranhar em um
modelado sobre o momento que ato falho, um sintoma ou um
o percorre na cadeia sonho (e que todos, graças a
significante (Ecrits, p. 30; Escritos ele, podem realizar em seu
II, p. 30), de modo que uma trabalho cotidiano), e outra,
linguagem formal o determina. muito diferente, é erigir as
Há um elemento que governa a combinações sintáticas como
experiência humana além da única fonte da significação. Em
vida, que Freud chama de alguns momentos, sobretudo
instinto (ou pulsão) de morte e na primeira parte de sua obra,
que, para Lacan, é a repetição Lacan parece querer emancipar
simbólica, em que se mostra a combinatória significante de
que "IL ordre du symbole ne toda referência às coisas. Desse
peut plus être conçu comme modo, a semântica e inclusive
constitué par l'homme, mais a pragmática ficam subsumidas
comme le constituant", ou seja, na sintaxe. Enquanto modelo, a
"a ordem do símbolo já não teoria do significante será
pode ser concebida como aceitável para todos (ou quase
constituída pelo homem, mas todos) os analistas; porém, para
como o constituindo" (p. 46). A muitos, será difícil segui-la
autonomia do simbólico, dirá quando for proposta como um
depois (p. 52), é a única coisa sistema fechado de elementos
que permite liberar de seus interconectados que não
equívocos a teoria e a prática da admitem nenhuma relação com
associação livre em psicanálise. entidades extralingüísticas.
A reconhecida influência
de Heidegger no pensamento de
Lacan é aqui patente e leva-o a
uma visão muito peculiar da
teoria dualista das pulsões de
1920, com um Freud
descarnado de todo referente
empírico e com um homem cuja
existência é ser para a morte.
Lacan crê que, assim, libera
14 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

Em sua versão mais mânticas e delas dependem


rigorosa, a teoria de Lacan afir- suas condições de verdade e
ma sem rodeios que a relação suas propriedades
sintática entre os significantes informativas. Quanto a Freud,
dá conta da significação, com como mostrou Klimovsky
independência de uma relação (1989) em sua destacada
semântica com as coisas. Isso é apresentação ao Congresso
o que pensava Hilbert, da Internacional de Roma, é
matemática, com sua famosa indubitável que ele estava
teoria da definição implícita, convencido de que havia
segundo a qual os conceitos descoberto coisas e que sua
matemáticos são dependentes teoria do inconsciente era
do sistema sintático em que, por semântica. E certo que Freud
convenção, são situados. presta muita atenção à
Dentro desse sistema, o combinatória de elementos
significado de cada termo varia significantes e, por algum
em relação com os outros motivo, salienta continuamente
significantes e, é claro, o a importância dos mecanismos
usuário do sistema - o "sujeito", de condensação e sobretudo de
poderia dizer Lacan - não pode deslocamento de um
interferir em nada nessa significado a outro, porém
combinatória. Entretanto, como nunca põe em dúvida o fato de
afirma Gregorio Klimovsky que o significado provém da
(1984, p. 50), "a maioria das relação que o significante tem
linguagens formais da com coisas que não são
matemática admite in- significantes.
terpretações ou modelos não- O esquecimento do nome
isomórficos". Em outras pa- de Signorelli, que Freud
lavras, se acrescentarmos a um (1901b) analisa
sistema axiomático um di- magistralmente no primeiro
cionário que atribui um capítulo de Psicopatologia da vida
determinado significado a seus cotidiana, ilustra o que dizemos.
termos (excluídos os termos Ali, é evidente que as
lógicos), obteremos o que se associações podem ser
chama de uma interpretação do consideradas como uma cadeia
sistema e diremos que essa simbólica significante na qual
interpretação configura um Freud, como sujeito, fica
modelo adequado, se os axiomas enredado. Ele não duvida nem
tornam-se verdadeiros. Esse por um momento, contudo, que
modelo, como é óbvio, já não é o suicídio de um paciente que
um sistema sintático, mas lhe importava muito, e de que
semântico. De acordo com esse tinha sabido em Trafoi, era um
ponto de vista, a matemática referente semântico dos
atual tende a resgatar o valor conteúdos "morte e
semântico de seus sistemas, sexualidade" e um fator eficaz
busca sua aplicação a algo para a aparição dos
externo. significantes Botticelli e
Mesmo admitindo o Boltraffio (por Signorelli).
formalismo matemático como Para Freud, que sempre en-
método, é necessário dizer que tendeu a psicanálise como
há um trecho muito longo para ciência natural, o significado é
chegar às ciências fáticas, algo mais do que a relação
porque elas não consistem entre significantes.
simplesmente em um jogo Uma esforçada tentativa
formal de signos (ou signifi- de desenvolver a lógica do
cantes), mas em algo em que há significante de forma rigorosa
designação e condições de é a de Jacques-Alain Miller
verdade. Uma linguagem (1966), a partir das idéias de
científica tem referências se- Frege sobre o número. Frege
FU

PS

baseia-se no conceito de clínica psicanalítica, nota-se de


verdade de Leibniz, ou seja, de imediato a distância que vai da
que a verdade é que cada coisa lógica do significante ao que
é idêntica a si mesma. Disso ocorre na sessão.
decorre que há uma classe de Em "La signification du
coisas não-idênticas a si phallus" (1958b, "A significa-
mesmas que, de fato, é uma ção do falo"), que leu em
classe vazia, já que não pode alemão no Instituto Max
haver um objeto subsumido na Planck de Munique, em 9 de
classe de não-idênti- co a si maio de 1958, Lacan expõe sua
mesmo. Essa classe vazia é o teoria do significante com
número zero. Desse modo, o relação ao complexo de
conceito da não-identidade a si castração. A relação do sujeito
mesmo está representado pelo com o falo estabelece-se
número zero, que sutura o independentemente da
discurso lógico. ("C'est l'énoncé diferença anatômica dos sexos,
décisif que le concept da non- já que, nesse artigo, o falo não
identité-à- soi est assigné par le nombre é um objeto, e muito menos um
zéro qui suture le discours órgão, mas um significante
logique" [p. 46, grifos no destinado a significar com sua
original].) Sendo assim, a presença os efeitos de
lógica pode sustentar-se a si significação. (Mais adiante,
mesma, como quer Frege, sem essa concepção irá mudar.) À
nenhuma referência ao real. diferença de todos os demais
Então, prossegue Miller, o significantes, o falo não tem
zero inscreve-se em um lugar outra contrapartida senão a
desenhado pela subsunção, falta e essa falta, sublinhemo-lo,
onde o objeto falta: o zero é um refere-se não só ao aparelho se-
branco que torna visível a falta xual da mulher, mas também à
e, ao mesmo tempo, é contado morte. Nesse ponto, é justo
por um (embora o conceito de dizê-lo, Lacan segue fielmente
zero não subsuma, no real, mais Freud, para quem o incons-
que um branco); assim, ciente não registra nem o
converte- se no suporte geral da genital da mulher, nem a
sucessão dos números (p. 47). E morte. Se Freud chegou a
necessário que o zero seja um pensar que a mulher constitui-
número, que ocupe o lugar se a partir da castração (inveja
suturante da falta, para que o fálica), Lacan dá um passo a
discurso da lógica feche. mais e afirma que tampouco o
A partir dessa complexa homem retira seu sexo de sua
exposição matemática, Miller conformação biológica. Para
conclui que, se o zero não é ambos, a mulher e o homem, o
mais que o possuidor do lugar falo instaura a falta que
suturante da ausência, se o zero constitui o desejo e põe em
deve ser restituído à sucessão marcha a cadeia desiderativa
dos números, então não há do significante.
obstáculo para reconhecer a A necessidade do homem
relação que a cadeia significante desvia-se pelo fato de que fala,
mantém com o sujeito. O já que então fica sujeito à
sujeito é, em conclusão, esse demanda, que retorna a ele
objeto do impossível que a alienada. Para Lacan, isso não
lógica conhece como não- é o efeito da dependência da
idêntico a si mesmo. criança (biológica, instintiva),
A exposição de Miller é, mas da conformação
sem dúvida, engenhosa ao significante e de que a
homologar o zero à falta e a mensagem falada é emitida a
lógica da aritmética à do partir do lugar do Outro (Leitura
significante; porém, quando estruturalista de Freud, p. 284;
essas idéias são aplicadas à Earits, p. 690). Nisso se
16 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

distingue o desejo da teórico da psicanálise. Essa


necessidade e da demanda. concepção inteiramente
Para Lacan, a demanda narcisista do amor, segundo a
refere-se a outra coisa que não a qual o desejo sexual leva a
satisfação reclamada, é antes de buscar o complemento no
tudo demanda de uma presença outro, Lacan a contrasta com
ou ausência, demanda de amor. sua polêmica assertiva: a
Tudo o que pode ser concedido relação sexual não existe,
fica transmutado pela demanda corolário que pode parecer
em prova de amor e, entre a chocante, mas que é uma
necessidade e a demanda, abre- conseqüência ineludível de sua
se a fenda (Spaltung) na qual concepção da vida erótica e do
aparece o desejo. Como diz inconsciente estruturados
Jinkis (1974, p. 82), o como uma linguagem. Em
significante deve ser pensado outras palavras, os
com relação à falta no Outro, significantes dessa linguagem
que é o fundamento da cadeia não podem dar conta da
simbólica. O sujeito mora em relação (no sentido de ratio)
um mundo significante cujo sexual.
fundamento é a falta. Como dissemos há pouco,
Por isso, o falo é o Lacan segue de perto o Freud
significante por excelência, a da fase fálica (1923e) e da
barra que divide o signo sexualidade feminina (1931b,
lingüístico, graças ao qual o 1933a, Conferência n° 33) para
inconsciente está estruturado quem, na fase fálica infantil,
como uma linguagem. Tanto o há apenas um órgão sexual,
homem quanto a mulher que o menino teme perder e a
desejam do outro o que lhes fal- menina quer ter. Entretanto, a
ta, e essa falta essencial remete, distância que vai da fase fálica
em última instância, ao falo. O à teoria do falo como
homem deseja encontrar na significante é sem dúvida
mulher o falo para superar, muito grande e, a meu ver,
assim, seu medo de perdê-lo, e intransponível. Freud usa o
a mulher anseia receber do substantivo "falo" para
homem o falo que lhe falta. Só designar o órgão reitor da
podemos desejar o que nos falta etapa genital infantil, que para
e, no ato de amor, cada um dá ele (mas não para Jones, Karen
ao outro o que não tem. Não Horney ou Melanie Klein) é
devemos esquecer que Lacan comum ao menino e à menina,
mantém, ao longo de sua obra, porque ambos se imaginam
uma concepção inteiramente dotados de um órgão idêntico,
narcisista do amor e nada o que é o pênis no varão e o
enfurece mais que o conceito de clitóris na mulher, aos quais
oblatividade3 genital que - convém aquele vocábulo.
lamenta - um francês Enquanto Freud remete essa
(Laforgue) introduziu no corpo condição às diferenças
3 Oblação: oferenda e sacrifício que se anatômicas do homem e da
faz aos deuses - diz o Diccionario de la mulher (Freud, 1925j), Lacan
lengua espafíola de la Real Academia.
FU

PS

afirma apoditicamente no 286). Nesse caso, o "falo" é


começo de "Die Bedeutung des simplesmente o pênis, e nem
Phallus" (1958b) que as mencionemos quando, na
seqüelas que resultam do mesma página, recorre à sua
complexo de castração n turgidez para sustentar seus
inconsciente masculino e da argumentos, dos quais resulta
Penisneid no feminino são ir que o significante fálico não é
mais que o pênis rodeado das
solúveis a toda redução a dados
fantasias inerentes a todo ser
biológicos.
humano. As transformações
O salto que vai da fase
que Lacan oferece nas últimas
fálica de Freud à sexualidad
páginas do trabalho que
genital do adolescente pode ser
apresentou no Instituto Max
compreendido dentro d sua
Planck são ilustrativas de
teoria (falocêntrica), embora
como se podem explicar
não seja compartilhade O salto
algumas características
que Lacan dá para romper toda
psicológicas e psicopatológicas
ligação da sexuali dade humana
do homem e da mulher, do
com a biologia é muito mais
ponto de vista da teoria da fase
abrupto, auda e, em meu
fálica, mas nada acrescentam,
entender, não suficientemente
em meu entender, à dignidade
fundado. A par te sua
do falo como significante. Ao
insistência em apresentar o falo
contrário, quando Lacan
como significante Lacan nunca
procura dar conta da
chega a nos explicar em que
impotência do homem e da
consiste esst passo que o leva
frigidez da mulher com sua
da zoologia à cultura. As vezes,
teoria do falo como
recorre; referências mitológicas
significante, suas explicações
para dar conta dessa função, re
acabam sendo pobres e
cordando-nos os mitos
evocam vivamente o protesto
paleolíticos em que os
masculino de Adler (1912); o
monumen tos glorificam um
mesmo se pode dizer para a
falo que já não parece guardar
homossexualidade.
relaçãc alguma com o homem
Se, como penso, falham
do qual foi membro e, então, o
os esforços de Lacan para
fale é um símbolo como
justificar sua teoria do falo
qualquer outro; em certas
como significante primordial,
ocasiões, surpreende-nos com
então cabe contrastá-la com
recursos concretos, tais como
outras, o que não está no
"ce signifiant est choisi comme
âmbito deste comentário, e
le plus saillant de ce <ju'on peut
assinalar, ainda que brevemen-
attraper dans le réel de la
te, seus ingredientes
copulation sexuelle" (Ecrits, p. ideológicos. Roberto Speziale-
692), ou seja, "esse significante Bagliacca ocupou-se desse
é escolhido como o que mais tema em seu bem documenta-
sobressai do que se pode captar
do livro Sulle spalle di Freud
no real da copulação sexual"
(1982, Sobre os ombros de Freud).
(Leitura estruturalista de Freud, p.
Esse autor considera que a
18 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

teoria de Lacan configura a analítico (ibid., p. 161; ibid., p.


ideologia fálica própria da 142), e essa realidade sexual
não é outra coisa senão o
personalidade autoritária. desejo.
Speziale-Bagliacca afirma que Nesse ponto de sua
o falo é pura e simplesmente o reflexão, Lacan afirma
pênis em ereção e, remetendo- terminantemente que o desejo
se ao que diz o próprio Lacan e que está em jogo na
transferência é o desejo do
também aos mitos antigos dos analista, afirmação esta que
cultos fálicos, sustenta que essa coincide com outro articulador
concepção (que do ponto de indispensável de sua teoria: o
vista social configura o desejo é o desejo do outro. Ou seja,
se o desejo expressa essa
machismo) está a serviço das realidade sexual que aparece
defesas maníacas, em uma na transferência, que é a
tentativa de eludir a colocação em ato da realidade
dependência e evitar a do inconsciente, então o desejo
depressão. Para esse autor, a do analista significa o desejo do
paciente.
técnica lacaniana (e em especial Abordaremos o desejo do
as sessões de tempo livre) está analista com mais detalhe nos
fortemente influenciada por capítulos sobre a
uma dificuldade de contratransferência; porém,
digamos por ora que Lacan
compreender os aspectos reporta-se à experiência
continentes do setting, que têm a paradigmática de Breuer com
ver com a mãe e com a função Anna O. (Bertha Pappenheim)
para fundamentar uma
materna do analista, que a afirmação que ele mesmo teme
genialidade de Freud foi capaz que possa deixar estupefata a
de plasmar nas normas do sua audiência. Afirma, então,
tratamento. Seguindo Fornari que a chimney-sweeping ia sobre
(1981), Speziale-Bagliacca os trilhos quanto mais signifi-
cantes dava Anna O. e não
considera que há um código havia, em sua fala, nem um
paterno e um código materno, e traço de sexualidade, até que
não somente a Lei do Pai, como Breuer a introduz. Para Lacan,
diz Lacan.4 inclusive a pseudociese
Vimos que, para Lacan, o daquela histérica e histórica
inconsciente é o jogo do paciente não é mais que o
significante (Os quatro conceitos, desejo de Breuer: era ele quem
p. 137) e recordemos agora que queria ter um filho. E Lacan dá
"a transferência é a colocação um princípio de prova que
em ato da realidade do parece confirmá-lo
inconsciente" (p. 152). "Le plenamente: ao partir para a
transfert est la mise en acte de Itália com sua mulher, em uma
la réalité de 1' inconscient" (Les espécie de nova lua-de-mel,
quatre concepts, p. 133). Como nos Breuer a deixa grávida (Os
ensinou Freud, a realidade do quatro conceitos, Cap. XII, parág.
inconsciente é sexual, de modo 3). Para tornar mais claro seu
que na transferência deve pensamento, afirma em
inscrever-se o peso da realidade seguida que Freud - este que,
sexual, que corre sob o que su- para Lacan, é o que realmente
cede no nível do discurso sabe da experiência analítica! -
dá a Breuer uma saída
elegante, assegurando-lhe que
4 Ahumada (1992) também escreveu a transferência surge
recentemente sobre os ingredientes ativos espontânea do inconsciente de
da técnica lacaniana.
FU

PS

Bertha, que o desejo não é de desejo que, como tal, não se


Breuer, mas dela. E desse satisfará jamais. O desejo não é
grande equívoco, em que Freud
nega o desejo de Breuer, que da ordem da necessidade e é
surgem os Estudos e a própria impossível satisfazê-lo, porque
psicanálise. Devo confessar sempre se vai correr de um
que, embora não faça aqui mais ponto a outro. A cadeia de
do que levar a seu ponto mais significantes, através de seu
extremo o que foi dito em sua
"Intervenção sobre a deslocamento metonímico,
transferência" (1951) e em outorga a significação. Por
outros escritos, a originalidade e isso, Lacan diz em "L instance
a audácia de Lacan deixam-me, de la lettre dans 1' inconscient
de fato, estupefato.
Vale a pena assinalar, por ou la raison depuis Freud"
outro lado, que essa afirmação (1957, "A instância da letra no
categórica sobre "o desejo de inconsciente ou a razão desde
Breuer" não resiste à prova dos Freud") que "o significante
fatos. Lacan apóia-se na versão instala a falta do ser na relação
dada por Jones (1955) da
viagem de Breuer com sua de objeto" (Leitura estruturalista de
esposa, em junho de 1882, após Freud, p. 200; Écrits, p. 515). E
interromper o tratamento de
Anna O. (Cap. XI, "O período afirma também, nesse mesmo
de Breuer"). No entanto, a artigo, que na cadeia do
cuidadosa investigação de significante o sentido insiste
Ellenberger veio mostrar,
conclusivamente, que Dora (mantém-se, persevera, insta,
Breuer, último rebento do interpela o sujeito), mas não
matrimônio, nasceu em 11 de
março de 1882, antes da famosa consiste, já que nenhum dos
segunda lua- de-mel de seus elementos da cadeia leva a uma
pais em junho (Ellenberger, significação final (ibid., p. 188;
1970, p. 483; Sulloway, 1979, ibid., p. 502). É justo destacar
p. 79-80). Além dessa refutação aqui a beleza e a precisão com
"empírica" que vem do registro
civil, a afirmação de Lacan não que Lacan é capaz de se
parece consistente com sua expressar.
própria forma de pensar, já que, Com o deslocamento do
como diz Rios (comunicação desejo, com o corrimento
pessoal), só poderia sus- tentar-
se demostrando que Anna O. metonímico do significante em
não tinha esse desejo, o que é busca da significação, Lacan
difícil de provar, sobretudo para pode estabelecer uma nova
quem sustenta que o desejo é o relação entre transferência e re-
desejo do outro. Lacan descarta petição. A repetição não tem
por completo que fosse Anna O.
quem faz Breuer sentir o desejo seu fundamento na necessidade
de engravidá-la (e, por (compare-se com Lagache,
deslocamento, sua esposa). 1951), mas na busca do novo e,
Se seguimos corretamente nesse sentido, a transferência,
o pensamento de Lacan, em seu nível simbólico, não é
podemos concluir que em sua uma repetição das coisas do
teoria a transferência deve ser passado, nem sombra dos
entendida basicamente como amores antigos (Os quatro
uma transferência de
significantes em busca de um
conceitos, Cap. XIX, seção 2), e
sim, ao contrário, ação do
20 R. HORÁCIO ETCHEGOYEN

simbólico, um instrumento de sujeito. Esse objeto é o que


acesso ao material inconsciente. Lacan chama de objeto a. Em
Lacan é categórico ao dizer, na outras palavras, o brinquedo do
seção 2 do Capítulo III do menino simboliza não a
Seminário XI, que o conceito de repetição de uma necessidade
repetição nada tem a ver com o que apelaria para o retorno da
de transferência, se bem que foi mãe, mas a repetição de sua
estudando esta que Freud o partida como causa de uma
descobriu.
Creio entender com mais Spaltung no sujeito, "superada
segurança o pensamento de pelo jogo alternativo fort-da, que
Lacan, neste ponto, no que diz é um aqui ou ali e que não
no Capítulo Y "Tyche et aponta, em sua alternância,
automaton", de Les quatre concepts, mais que a sei fort de um da e da
em que, jogando com esses de um fort" (Os quatro conceitos, p.
termos aristotélicos, nosso autor 61 e 72). Se não o entendo mal,
recorda-nos o esforço de Freud Lacan quer dizer que o carretel
na procura de encontrar o real
como objeto a, resíduo do
por trás do trauma para
sujeito no real, é o que
assegurar, de imediato, que a
representa o significante fort
repetição (Wiederholung) não se
refere ao retorno de uma para o significante da. O brin-
necessidade, ma sim que quedo do carretel não expressa
demanda o novo. a necessidade de que a mãe
Aqui, Lacan retoma o volte, e sim repete sua partida
famoso brinquedo do carretel, para simbolizá-la. Do mesmo
que Freud descreve no Capítulo modo, o analista como objeto a
II de Além do princípio de prazer deve permitir que o
(1920g). Como todos lembram, significante circule (metonímia
aquele menino de um ano e significante), deve colocar-se
meio, neto de Freud, lançava o no lugar do sujeito que deixa
carretel enquanto proferia um que um significante o
"fort" ("se foi") para recolhê-lo represente (ou o ponha em
depois, com o barbante, até relação) com outro
exclamar "da" ("aqui está"). Ao significante. A ênfase
interpretar esse brinquedo, lacaniana na escuta é porque ela
Freud inclina-se a pensar que o é entendida como recepção do
menino procura superar o fluxo de significantes (Max
trauma do desaparecimento da Hernández, 1989, comunicação
mãe, transformando o passivo pessoal). Lacan acredita que se
em ativo; Lacan, porém, susten-
ta que esse fenômeno é repete unicamente para
secundário. Para ele, o simbolizar, sem levar em conta
brinquedo do carretel é, antes, a que se repete também para não
resposta do sujeito ao que a simbolizar, para não pensar,
ausência da mãe provocou, no para nã< recordar (por
qual o carretel não representa a exemplo, o vínculo - K de
mãe, mas uma pequena coisa do
FU

PS

Bion). Não se dev< confundir


transferência com elaboração.
Em seu interessante ensaio
"A transferência", Miche
Silvestre (1985) afirma que o
significante tem uma virtu de
curativa, porquanto pode
representar o sujeito pari outro
significante (p. 39), e
acrescenta que "axepetição e o
motor do simbólico e da lógica
4e-significante" (p. 41) O que o
psicanalista deve fazer é deixar
que o registre simbólico ocupe
o lugar do motor do tratamento
e que desse modo, seja exercido
o efeito curativo do significante
(p. 42). A inevitável conclusão
de Silvestre é que não hg mais
resistência à análise senão a do
próprio analista (comc Lacan
repete ao longo de sua obra) "à
medida que este se opõe à ação
do simbólico" (p. 42).
Como se pede ver, essas
idéias não remetem mais a um
conflito entre o S.S.S. e o
Grande Outro, ou entre a ordem
do imaginário e a ordem
simbólica; ao contrário, elas
nos propõem unia confiança
plena, para não dizei cega, no
desdobramento do significante
e em sua potencialidade
curativa Assim, pois, outorga-se
ao significante uma qualidade
quase Jhumana e pessoal,
delega-se a ele a tarefa própria
do analista no tratamento, a de
vencer as resistências, supondo
que. mais cedo ou mais tarde, o
significante será capaz de triunfar
sobre elas. E o preço - .elevado,
a meu ver — «jne paga, enfim,
a escola lacaniana por tomar
como pesto de referência da
teoria e da práxis psicanalíticas
a relação do sujeito com o
significante.
Agradeça e
Gregorio
Klimovsky, Carlos
Rios e JSsIís Sereno
par sua
indispensável e
generosa ajiLda
para escrever este
adendo.

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