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SOCIOLOGIA DO DIREITO
PROF. ARTUR STAMFORD
RECIFE
2021.1
1. ANÁLISE DO FILME “A 13a EMENDA” A PARTIR DO TEMA DECISÃO
JURÍDICA E SOCIEDADE.
Dito isso, logo nos minutos iniciais do filme, um dos entrevistados comenta que tal
ressalva contida ao final da redação da emenda abre uma espécie de vácuo normativo que
pode ser “usado como ferramenta para os propósitos que quiserem”. Essa afirmação dialoga
com os pressupostos da Teoria Sociocognitiva da Compreensão, apresentados por Stamford da
Silva. De acordo com o mencionado autor, nunca exercemos total controle sobre os possíveis
entendimentos que o nosso enunciado possa vir a ter, visto que compreender é um exercício
de convivência sociocultural.3 Contextualizando: embora tal emenda tenha sido criada em um
suposto contexto de liberdade, a vagueza indissociável da linguagem abre margem para
múltiplas compreensões a serem encampadas em diferentes momentos políticos, inclusive
mais repressivos, como de fato aconteceu. Isso porque, em última análise, a decisão jurídica
não se limita à aplicação literal da lei, visto que a linguagem comporta em si uma série de
significados a serem interpretados.
Ato contínuo, ainda analisando o filme com base nas ideias trazidas pelas
mencionadas autoras, percebe-se que não havia que se falar, também no momento da “Lei e
Ordem”, em legal mobilization.6 Isso porque tal conceito se traduz no poder de mobilização
dos movimentos sociais que, naquele período, esbarravam no aparato repressivo do estado.
Assim, sequer havia como as demandas coletivas chegarem ao judiciário, já que movimentos
negros, como os Panteras Negras, foram criminalizados e declarados como inimigos internos
da nação, na tentativa de enfraquecê-los e destruí-los. Ou seja, a única forma de tal
movimento chegar ao judiciário era como sujeito passivo de um processo penal, já que a
muitos dos seus membros foram processados e julgados criminalmente, além dos que foram
brutalmente assassinados pelos agentes do governo. Em suma, a mobilização encampada por
esses grupos se davam nas ruas e não em sede do Poder Judiciário.
Adentrando ainda mais na temática da decisão jurídica, já que esta não se resume às
decisões emanadas do poder judiciário, o filme menciona a influência da ALEC (American
Legislative Exchange Council) no processo de proposição de leis no Congresso
Estadunidense. Tal organização, que traz como lema a limitação ao governo e o livre mercado,
teve uma efetiva parcela de contribuição nas leis que promoviam o encarceramento em massa
nos EUA. Isso porque tal organização contava com o patrocínio de empresas privadas que
atuavam no sistema prisional americano, seja na área de cadeias privadas ou na área de
contratos de alimentação e saúde dos presos. Assim, a ALEC terminava por intermediar
práticas lobistas entre outras empresas privadas e os Congressistas. Trazendo tal perspectiva
5 CARDOSO, Evorah Lusci; FANTI, Fabiola. Movimentos sociais e direito: o poder judiciário em disputa. In:
SILVA, Felipe Gonçalves; RODRIGUEZ, José Rodrigues (Coord.). Manual de Sociologia Jurídica. São
Paulo: Saraiva, 2013, p. 243.
6 Ibid., p. 247.
para o processo Luhmanniano de comunicação, nota-se mais uma forma de alopoiese do
direito, na medida em que o direito e a economia se confundem na formulação das leis, já que
a criminalização de determinadas condutas não é norteada pelo código binário “lícito/ilícito”7,
mas sim pelo código “lucrativo/não lucrativo”.
Outro ponto que merece destaque é a informação trazida pelo filme de que em
determinados Estados norte-americanos, como o Alabama, o direito de voto é usurpado pela
existência de condenação criminal. Tal questão dialoga com o fato de que a decisão jurídica,
ocorre em três momentos comunicativos distintos: no âmbito político (entre a sociedade e a
legislação, já que o voto decide os responsáveis pela formulação das leis na sociedade), no
momento político-jurídico (quando a norma jurídica editada pelo Legislativo é utilizada como
parâmetro para a tomada de decisões judiciais) e no momento jurídico (quando o órgão
julgador profere sua decisão que deve ser observada por seus destinatários,
independentemente de discussões sobre a justiça da decisão)8. Dessa sorte, percebe-se que os
cidadãos dos Estados que impedem o direito ao voto no caso de condenação criminal, os
negros se vêm marginalizados do processo de formulação de leis na sociedade, pois são
afastados da escolha de seus representantes.
2. CONCLUSÃO.
i) O direito é uma luta incessante dentro de uma sociedade com interesses diversos;
iv) Esse processo de mudança, seja fática ou interpretativa, só é possível pelo fato de
que a norma não carrega um princípio predeterminado pela literalidade ou pela vontade do
legislador. Ou seja, tal sentido vai sendo criado a partir de condicionantes da realidade social e
dos atores que participam do processo interpretativo: autor, texto e leitor.
BIBLIOGRAFIA:
A 13a EMENDA. Direção: Ava DuVernay. Produção: Howard Barish; Ava DuVernay;
Spencer Averick. Estados Unidos: Netflix, 2016.
CARDOSO, Evorah Lusci; FANTI, Fabiola. Movimentos sociais e direito: o poder judiciário
em disputa. In: SILVA, Felipe Gonçalves; RODRIGUEZ, José Rodrigues (Coord.). Manual
de Sociologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 2013.
STAMFORD DA SILVA, Artur. Literalidade como trabalho social: a decisão judicial como
constructo do direito e da sociedade. In: FREITAS, Lorena et al (Org.). O judiciário e o
discurso dos direitos humanos – volume 2. Recife: EdUFPE, 2012.