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1.

Introdução

A hipoteca, o penhor, e os privilégios creditórios são garantias reais das obrigações,


aquelas que conferem ao credor o direito de se fazer pagar, com prioridade ou
preferência face a quaisquer outros credores, pelo valor ou rendimentos de certos e
determinados bens, móveis ou imóveis, do próprio devedor ou de terceiro1.

O presente Trabalho com o titulo ``Hipoteca, o Penhor, e Privilégios Creditórios``


tem como objecto de estudo o regime jurídico‫׃‬

- hipoteca, serão abordados aspectos relativos ao regime e as modalidades, que pode ser
hipoteca voluntária (quando resulta de contrato, que é a mais frequente na vida prática),
hipoteca legal (quando resulta da lei e após proceder-se ao respectivo registo na
conservatória), ou ainda, hipoteca judicial (quando resulta de sentença judicial e após
proceder-se ao respectivo registo na conservatória);

- penhor que, quanto ao objecto pode ser: penhor de coisas ou penhor de créditos (sobre
as várias modalidades de penhor, consultar o nosso artigo: penhor. Os credores titulares
dos direitos reais de garantia emergentes de penhor designam-se de credores
pignoratícios;

- privilégios creditórios, que são aqueles que incidem sobre bens específicos do
património do devedor.

1
Leitão, Luís Manuel Teles de Menezes, Direito das Obrigações – Vol. II, transmissão e extinção das
obrigações, não cumprimento e garantias do crédito, 2ª Edição, Almedina, Coimbra, 2003, p.235
2. Hipoteca

2.1. Noção

A hipoteca traduz-se no direito concedido a certos credores de serem pagos, pelo valor
de certos bens imobiliários do devedor e, com preferência a outros credores estando os
seus créditos devidamente registados. Além dos bens imobiliários, podem ser objecto de
hipoteca, os automóveis, navios e, aeronaves (bens móveis registáveis)2.

2.2. Objecto

A hipoteca incide sobre coisas imóveis ou havidas como tais, indicadas nos art.688.º a
691.º. CC3

2.3. Regime

Não é requisito da hipoteca, que os bens saiam da posse do autor da garantia, diferente
do que se verifica no penhor. No entanto, compreende-se a diferença, dada a especial
natureza dos bens sobre que recaem as duas garantias: a hipoteca sobre coisas imóveis
ou equiparadas que não podem ser facilmente ocultadas ou sonegadas, como acontece
com a generalidade dos móveis.

A hipoteca carece de ser registada sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação
às partes (cfr. art. 687.º CC).

2.4. Tipos

Existem três modalidades de hipotecas previstas na lei (cfr. art. 703.º CC):

Legais (cfr. art. 704.º CC), a hipoteca legal é a hipoteca que resulta directamente da lei,
independentemente da vontade das partes, e pode constituir-se desde que exista a
obrigação que visa garantir.

Judiciais (cfr. art. 710.º CC), a hipoteca judicial é a hipoteca que resulta de uma
sentença de um Tribunal.

2
Varela, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª Edição, Almedina, Coimbra
1997, p.116.
3
Código Civil.
Voluntárias (cfr. art.712.º CC), a hipoteca voluntária é a que emerge de contrato ou de
declaração unilateral (em especial, testamentos, embora esta última hipótese seja muito
rara na prática).

3. Penhor

3.1. Noção e Objecto

Só podem ser objecto do penhor de direitos, coisas móveis que sejam susceptíveis de
transmissão, artigo 680º do CC, desde que preenchido também o requisito do artigo
666º, nº.1 do mesmo Código, isto é, englobam-se aqui créditos e outros direitos não
sujeitos a hipoteca4, pertencentes ao devedor ou a terceiro. Delineado o objecto do
penhor de direitos cumpre defini-lo, como sendo um direito real de garantia, de natureza
negocial, que confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos
juros5, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de créditos ou
outros direitos não susceptíveis de hipoteca, pertencentes a devedor ou a terceiro.

Com efeito, o penhor de direitos assenta na ideia de que os bens, para serem objecto do
penhor, têm que ser susceptíveis de transmissão, ou seja o direito objecto da garantia
tem que poder ser cedido. O objecto do penhor tem de ter natureza de coisa móvel,
excluindo-se assim as coisas imóveis. Como já foi referido anteriormente, podem ser
objecto de penhor créditos e outros direitos, como pode ler-se no artigo 666º do CC, já
mencionado mas de forma não exaustiva podemos elencar alguns dos outros direitos
susceptíveis de penhor. Podemos assim ter, no campo do penhor de direitos, penhor de
acções (participações sociais), de valores mobiliários, de aplicações financeiras, de
depósitos a prazo, de alvará, entre outros.
No que diz respeito a obrigações futuras ou condicionais, a lei também as prevê no nº. 3
do artigo 666º do CC, permitindo que estas sejam garantidas pelo penhor. No
entendimento de Vaz Serra, no caso de crédito condicional, extingue-se o penhor, caso
não se verifique a condição para a sua existência, o mesmo acontecendo para o crédito
futuro, uma vez que também aqui o penhor se extingue, no caso de o crédito não nascer.

4
HUGO RAMOS ALVES, Do penhor, p. 142, entende que nada obstará a que sejam dados em penhor
créditos hipotecários. O autor considera que este penhor tem de ser considerado admissível na medida em
que o direito empenhado não é o prédio hipotecado mas sim a prestação.
5
No penhor, a garantia prestada cobre o crédito mas também os juros, sem qualquer limite temporal, ao
contrário do que se verifica na hipoteca em que apenas ficam cobertos três anos de juros, tal como se
pode ler no artigo 693º, nº. 2 do Código Civil
No penhor de créditos futuros, engloba-se uma série de créditos futuros com ou sem
limitação temporal6. Com a permissão legal do penhor sobre créditos futuros coloca-se a
questão da determinabilidade do objecto abrangido pelo penhor, que deveria ser desde
logo determinado aquando da sua constituição.

Tendo em conta o princípio da acessoriedade, é difícil entender que um penhor seja


constituído validamente sem que nesse momento o crédito garantido ainda não exista,
dado que será difícil prever quais os créditos garantidos naquele penhor. Apesar destas
dificuldades, o certo é que o legislador previu a possibilidade do penhor de créditos
futuros e por isso é importante delimitar certos requisitos para que o penhor possa ser
validamente constituído e sempre respeitando o critério da determinabilidade.

3.2. Legitimidade para empenhar

Podem ser empenhados direitos pertencentes ao devedor ou a terceiro, na constituição


da garantia, contudo só tem legitimidade para dar bens em penhor quem os puder
alienar. Ora não faria sentido que a lei permitisse que se empenha-se um bem alheio.
Este entendimento decorre do direito conferido ao credor, previsto no art.º 675º do CC,
pois se o credor, no caso de incumprimento do devedor, pode promover a venda do bem
empenhado, no momento da constituição do penhor pode importar a alienação desse
mesmo bem. O art.º 675º do CC remete-nos ainda para o art.º 717º do mesmo Código.
Assim, o penhor constituído por terceiro7 extingue-se, na medida em que, por causa
imputável ao credor, não se puder dar a sub- rogação do terceiro nos direitos do credor.
E ainda, o caso julgado proferido em relação ao devedor produz efeito relativamente a
terceiro que haja constituído o penhor, nos termos em que os produz em relação ao
fiador, remetendo assim, para o art.º 635º do mesmo Código. Ou seja, o caso julgado
entre o credor e o devedor não é oponível ao terceiro empenhador, mas a este é lícito
invoca-lo em seu benefício, salvo se verifique uma situação em que não se exclui a
responsabilidade do terceiro empenhador.

6
HUGO RAMOS ALVES, Do Penhor, p. 299, a propósito do penhor de créditos futuros, define-o como
sendo “o crédito ainda não nascido no momento da celebração do contrato de penhor, sendo que, em
algumas hipóteses, ainda não terá, sequer, sido celebrado o contrato que ditará o seu nascimento e, em
outros casos, já estarão estabelecidas as regras gerais em que se desenvolverá o contrato. De igual modo,
também serão considerados créditos futuros os que nasçam sucessivamente de relações obrigacionais pré-
existentes, como acontece, tendencialmente, nos contratos duradouros”.
7
HUGO RAMOS ALVES, Do Penhor, págs. 98 e seguintes.
3.3. Constituição

Conforme se depreende da leitura do art.º 681º nº. 1 do CC, para a constituição do


penhor de direitos estabelece-se a forma e a publicidade exigida para a transmissão dos
direitos empenhados8. Ademais, e à imagem do que acontece no penhor de coisas,
passou a exigir-se, para se considerar a constituição do penhor de direitos válida, a
entrega ao credor, no que diz respeito às coisas móveis. Assim, tal como no penhor de
coisas se exige a entrega da coisa empenhada ou documento que confira a exclusiva
disponibilidade dela, para que o penhor produza os seus efeitos, também no penhor de
direitos se exige a entrega dos documentos que conferem a exclusiva disponibilidade do
direito, para desta forma evitar que o empenhador pudesse dispor do direito empenhado
sem o consentimento do credor.

No tocante ao regime do penhor de direitos sujeitos a registo, este só produz os seus


efeitos a partir do momento em que for feito o registo 9. Quanto ao penhor de direitos,
cujo objecto é um crédito, este só produz os seus efeitos após a notificação do devedor,
ou desde que este aceite o crédito. Esta regra, para efeitos de constituição, está contida
no nº. 2 do art.º 681º do CC, que se refere expressamente ao penhor de créditos. Na
opinião de Vaz Serra, enquanto que no penhor de coisas se exige a entrega da coisa, ou
seja “subtrair a coisa à disponibilidade material do empenhador” para evitar situações
prejudiciais a terceiros, por pensarem que a coisa não estava onerada, no penhor de
créditos, o autor entende que, esta formalidade conseguida através da entrega no penhor
de coisas, se consegue com a notificação do devedor, mediante a qual este fica advertido
da existência do penhor, e se pretende ainda dar publicidade ao penhor, perante
terceiros. Assim, para efeitos de constituição de penhor de créditos válido e para que
este possa produzir os seus efeitos é necessário a notificação do devedor ou a aceitação
deste, sendo que até este momento não se pode considerar a existência de penhor.

Com efeito, não podemos deixar de fazer uma breve comparação entre o penhor de
créditos e a cessão de créditos10. É do entendimento comum que na cessão de créditos se
verifica a produção de efeitos por mero efeito do contrato, apenas sendo necessária a
8
Assim, temos por exemplo o penhor de créditos hipotecários relativos a bens imóveis, em que se exige
escritura pública ou documento particular autenticado e registo para que seja constituído validamente.
9
Está sujeito a registo, nos termos da alínea o) do nº. 1 do artigo 2º do Código de Registo Predial, o
penhor de créditos hipotecários ou de créditos garantidos por consignação de rendimentos de coisas
imóveis.
notificação para produção de efeitos perante o devedor cedido e terceiros adquirentes do
mesmo direito. Ressalva-se assim a tutela de terceiros de boa-fé, já que perante estes os
efeitos só se verificam após a notificação, aceitação ou o simples conhecimento. Pelo
exposto, verificamos que em ambos os casos, quer no penhor de direitos, quer na cessão
de créditos, os negócios não produzem os seus efeitos enquanto houver
desconhecimento, ou falta de notificação, de um dos interessados do teor do negócio
celebrado. Efectivamente, apesar desta proximidade de regimes, temos que ter em
conta, que na cessão de créditos estamos perante a alienação de um direito e no penhor
de créditos não é essa a realidade, mas sim a afetação de determinado direito ao
cumprimento de outro negócio. Sintetizando, enquanto que a cessão de créditos produz
efeitos entre as partes e em relação a terceiros, independentemente da notificação do
devedor, o penhor de créditos não produz quaisquer efeitos, quer entre as partes, quer
em relação ao devedor do crédito empenhado, sem a notificação ou aceitação.

Assim, para que o penhor de direitos produza os seus efeitos o credor terá de levar a
cabo determinadas formalidades após a celebração do contrato, nomeadamente a
notificação do devedor/empenhador para que este possa produzir os efeitos pretendidos
e tenha relevância externa. Note-se, porém, que apesar da ineficácia do penhor de
direitos antes da notificação ou aceitação, o legislador quis ressalvar a produção de
alguns efeitos, art.º 681º, nº.3 do CC, remetendo com as necessárias adaptações para o
art.º 583º, nº2 do mesmo Código. Deste preceito se depreende que o conhecimento
efectivo da existência do penhor por parte do devedor afasta a necessidade de
notificação ou aceitação deste quanto à constituição do penhor. Podemos afirmar que, à
semelhança do que acontece no penhor de coisas por efeito da entrega, a notificação tem
como função privar o autor do penhor da possibilidade de dispor do bem empenhado. A
notificação pode ser feita quer pelo sujeito que constitui o penhor quer pelo credor
pignoratício. Quanto à entrega dos documentos comprovativos do direito de penhor

10
ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol II, 7.ª Edição, p. 545, é do entendimento que na
cessão de créditos o negócio produz imediatamente efeitos entre as partes (cedente e cessionário) e em
relação a terceiros e só a sua eficácia em relação ao devedor fica dependente da notificação deste ou do
conhecimento do ato por parte deste. Quanto ao penhor de direitos entende que, em princípio, só com a
notificação do devedor se deve considerar feita a advertência deste da existência do penhor e a
publicidade do ato perante terceiros. A lei prevê duas excepções em relação a esta regra de que o penhor
só tem eficácia após a notificação do devedor sendo elas no caso de penhor sujeito a registo, em que este
produz efeitos logo a partir da data do registo e nas situações em que o credor prove que é do
conhecimento do devedor a existência do penhor, e neste caso também não é necessária a notificação
deste para a eficácia do penhor, suprindo o conhecimento do devedor dessa existência a falta de
notificação.
sobre o bem empenhado, não deve condicionar a constituição do penhor, pelo que este
já está validamente constituído com a notificação ou aceitação. Esta entrega não é
essencial para a existência ou eficácia do penhor. Somos do entendimento de que a
forma de constituição do penhor visa prosseguir a publicidade deste, enquanto que a
entrega dos referidos documentos deve-se a uma função probatória 11, esta entrega serve
para provar a existência do penhor em relação àquele direito e também para publicitar o
penhor. Quanto ao direito de preferência conferido ao credor pela constituição de um
penhor de direitos é de referir que são requisitos dessa preferência a notificação ou
aceitação do devedor. Daqui também se depreende que, não há qualquer dificuldade em
constituir mais do que um penhor sobre o mesmo direito para garantia de diferentes
créditos, pois terá sempre direito de preferência o credor cujo seu penhor de direitos foi
constituído em primeiro lugar. É, no entanto, sempre necessária a notificação ao
devedor para que prevaleça o penhor constituído em primeiro lugar.

Não obstante, cumpre salientar que a forma do negócio jurídico não pode ser
confundida com a sua publicidade. Assim, a publicidade ou falta desta, em nada afecta o
negócio jurídico, uma vez que este já está concluído, apenas tendo como efeito a
inoponibilidade em relação a terceiros. Pese embora se produzam na mesma os efeitos
em relação às partes. Quanto à falta de forma negocial, estamos perante a conclusão do
negócio jurídico e aqui sim, a falta desta implica a não celebração do negócio, ou seja
inexistência do penhor.

3.4. Regime

Após a constituição do penhor de direitos, e tal como se lê no art.º 682º do CC, o auto
do penhor é obrigado a entregar os documentos comprovativos do direito de penhor,
que estiverem na sua posse, ao credor pignoratício.
Apesar desta obrigação imposta pela lei, a entrega de tais documentos não é essencial
para a existência do penhor ou para a sua eficácia, pois esta entrega serve apenas como
meio probatório desse direito adquirido pelo credor. Para além da função probatória,
esta entrega de documentos serve também para impedir fraudes por parte do devedor,
que sem os documentos fica impedido de dispor do bem empenhado.
11
No caso de estarmos perante um penhor de títulos de crédito, a entrega do documento será essencial
para uma constituição válida do penhor, este é o entendimento de HUGO ALVES RAMOS, Do penhor,
p. 155.
Deparamo-nos assim, com um dever de cooperação entre as partes do negócio
celebrado, quer seja entre o devedor e o credor, quer entre o devedor e eventuais
relações com terceiros. Não obstante, este dever de cooperação nada tem que ver com a
constituição do penhor propriamente dita, pois não é essencial para que este se
constitua. Este dever de cooperação que se consubstancia na entrega dos documentos
comprovativos do direito de penhor do credor, tem, como já foi referido, carácter
probatório da existência deste direito mas não é de todo elemento essencial para a
constituição do penhor.
O penhor constitui-se com o acordo das partes e começa a produzir os seus efeitos com
a notificação do devedor ou a aceitação por parte deste, pelo que a entrega de
documentos serve como prova da existência daquele direito
O credor pignoratício é ainda obrigado a praticar actos indispensáveis à conservação do
direito empenhado e a cobrar os juros e demais prestações acessórias compreendidas na
garantia, art.º 683º do CC. O mesmo é dizer que o credor pignoratício é obrigado a
guardar e administrar aquele direito de forma diligente, respondendo pela sua existência
e conservação. Apesar do credor pignoratício não ser o proprietário daquele direito mas
pelo facto de ter aquele direito como garantia da satisfação preferencial do seu crédito
tem de agir como um proprietário diligente e conservar aquele direito como se fizesse
parte do seu património.
Mas, cumpre salientar, que existem regimes especiais, como é o caso, por exemplo, do
penhor constituído em garantia de créditos de estabelecimentos bancários autorizados.
Ora, neste tipo de penhor não havendo lugar a entrega, o possuidor, não sendo o credor
mas sim o titular do crédito empenhado, considera-se um mero possuidor em nome
alheio, sendo-lhe aplicáveis sanções penais, caso este aliene, modifique, destrua ou
desencaminhe o objecto sem autorização escrita do credor, bem como se empenhar
novamente os bens, sem mencionar neste novo contrato de penhor a existência de
penhor anterior ao agora constituído. Por consequência da não entrega do bem ao
credor, este fica livre dos deveres que lhe são incumbidos enquanto detentor,
nomeadamente a obrigação de guardar e administrar o bem de forma diligente.
Quanto à cobrança de créditos empenhados, prevê-se no art.º 685º do CC que o credor
pignoratício deve cobrar o crédito empenhado logo que este se torne exigível, passando
o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse crédito. Antes do
vencimento do crédito empenhado, não pode o credor exigir o cumprimento da
obrigação, mas após este vencimento o credor não só pode como deve cobrar o crédito
empenhado para evitar possíveis prejuízos. Este artigo refere-se expressamente ao
penhor de créditos, pelo que estamos perante a existência de dois credores, o credor do
crédito empenhado e o credor pignoratício. O credor tem o dever de cobrar o seu crédito
tal como prescreve a lei, contudo este não está obrigado a fazê-lo logo que o crédito se
torne exigível, pode fazê-lo mais tarde pois é livre de correr os riscos que entender.

Contudo, no caso de penhor de créditos, o credor pignoratício, esse sim tem o dever de
cobrar de imediato o crédito, logo que este se torne exigível pois não tem o direito de
sujeitar o credor aos riscos da não cobrança imediata, nomeadamente o perecimento da
coisa devida, a insolvência do devedor, entre outros. Com a cobrança do crédito não se
dá de imediato a satisfação do crédito garantido, pois este pode ainda nem se ter
vencido. O que se verifica nesta situação é que o penhor passa a incidir sobre a coisa
prestada em satisfação do crédito, ou seja passa a incidir sobre o dinheiro que se obteve
com a satisfação do crédito empenhado. Assim, se até ao momento o penhor tinha como
objecto uma coisa incorpórea, ou seja um direito passa agora a ter como objecto uma
coisa, quase sempre dinheiro. No nº. 2 do art.º 685º do CC, prevê-se a situação de o
crédito ter por objecto a prestação de dinheiro ou outra coisa fungível, ora nesta situação
o devedor não pode cumprir a obrigação senão aos dois credores conjuntamente, e na
falta de acordo destes, o obrigado tem a faculdade de usar da consignação em depósito.
É esta a solução que melhor garante os direitos do autor do penhor e do credor
pignoratício. O nº. 3 do mesmo artigo prevê ainda uma outra situação que é quando o
mesmo crédito for objecto de vários penhores. Quando assim acontece, só o credor cujo
direito prefira em relação a todos os demais credores tem legitimidade para cobrar o
crédito empenhado. O credor com direito de preferência é aquele cujo direito de penhor
primeiramente foi notificado ao devedor ou por este primeiramente aceite, tratando-se
de penhor sujeito a registo, a prioridade é determinada como não poderia deixar de ser
pela data do registo. Quanto aos credores que não gozam de preferência, confere-lhes a
lei a faculdade de compelirem o devedor a satisfazer a prestação ao credor preferente,
para que satisfeito o crédito ao credor preferente, eles possam ainda aproveitar sobre o
mesmo crédito alguma coisa do saldo da garantia, segundo a ordem de prioridade entre
os vários penhores. O credor do crédito empenhado não pode receber a respectiva
prestação sem o consentimento do credor pignoratício, art.º 685º nº. 4 do CC. Se esta
situação fosse permitida, deixaria de ser possível a eficácia da garantia e ficaria
frustrado o direito do credor pignoratício.
Assim, havendo consentimento por parte do credor pignoratício para que o credor titular
do crédito receba a prestação extingue-se o penhor.

3.5. Transmissão

De realçar que a transmissão de penhor se distingue do subpenhor, uma vez que neste
estamos perante um ato de disposição do credor em relação à garantia que recebeu. Na
transmissão de penhor o credor limita-se a transmitir a posição que detém no contrato de
penhor, não havendo por isso sobreposição de contratos como acontece no subpenhor12.

A transmissão de penhor assemelha-se às regras da transmissão da hipoteca,


destacando-se dois requisitos: que estejamos perante outro credor do mesmo devedor e
que a garantia a ser transmitida não seja estritamente pessoal. Saliente-se ainda, a
proximidade às regras da cessão de créditos, no que diz respeito ao penhor de créditos,
isto porque por exemplo é necessário o consentimento de terceiro, na eventualidade
deste ser o autor da garantia. Ou seja, numa situação em que estejamos perante um
penhor de créditos e em que há um terceiro que empenhou o seu crédito, este tem que
dar o seu consentimento para que seja possível haver transmissão desse penhor. Note-se
que, com a transmissão de penhor não se verifica um aumento do valor da garantia, ou
seja o novo crédito transmite-se tal e qual como existia originalmente, não se alterando
em nada, e o novo credor, tal como o credor inicial, carece de poderes para ampliar o
objecto da garantia que recebeu do devedor13.

3.6. Extinção
Da conjugação dos artigos 679º, 677º e 730º do CC, se conclui que o penhor se extingue
pela restituição do bem empenhado, ou do documento a que se refere o nº. 1 do art.º
669º do mesmo Código, e também pelas mesmas causas de extinção do direito de
hipoteca com excepção da prescrição a favor de terceiro adquirente ( artigo 730º al. b)).

A primeira forma que deve ser indicada é que o penhor se extingue logo que a obrigação
garantida se extinga, ou seja se o devedor cumprir normalmente com a obrigação a que
está adstrito o penhor extingue-se de imediato, assim como se extingue se se verificar

12
HUGO RAMOS ALVES, Do Penhor, pág. 166.
13
HUGO RAMOS ALVES, Do Penhor, pág. 166.
alguma forma de caducidade do crédito. Esta forma de extinção está estritamente ligada
ao princípio da acessoriedade, na medida em que a garantia depende da existência do
crédito, ora se o crédito deixa de existir, quer por ter sido pago quer por outro motivo, o
penhor também se extingue por não haver razão da sua existência.

4. Privilégios creditórios

4.1. Noção

É um direito conferido a certos credores, de serem pagos, em atenção à natureza dos


seus créditos, de preferência a outros credores. Esta garantia não necessita de ser
registada (cfr. art. 733.º).

O privilégio creditório constitui uma garantia mais forte do que a hipoteca, porque se
houver concurso entre credores, os privilégios imobiliários preferem à preferência,
assim como preferem à consignação de rendimentos e ao direito de retenção, ainda que
estas garantias se mostrem anteriores (art. 751.º)14.

4.2. Objecto

Nos termos do art. 734.º esta garantia, abrange os juros de crédito respeitantes aos
últimos dois anos, se forem vencidos.

4.3. Tipos

Os privilégios creditórios podem ser‫׃‬

Privilégios mobiliários, é o que pode abranger o valor de bens móveis, de todos se, o
privilégio é geral ou, de determinados se, o privilégio é especial do devedor, existentes à
data da penhora ou de acto equivalente (cfr. art. 736.º e 738.º); e

Privilégios imobiliários, aqueles que podem abranger apenas o valor de determinados


bens imóveis (cfr. a.743.º e ss.). De acordo com a actual redacção do a. 735º nº 3,
introduzida pelo DL nº 38/2003 de 8 de Março, os privilégios imobiliários estabelecidos
neste Código são sempre especiais.

14
Lima, Pires de / Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª Edição, Coimbra Editora, 2010,
p.310.
Conclusão

As garantias reais constituem mais valias quer para o devedor quer para o credor da
obrigação garantida, pois o primeiro prestando uma garantia real consegue mais
facilmente a concessão de um crédito e o segundo ao beneficiar de uma garantia real vê
o seu crédito garantido, o que lhe traz maior segurança na sua satisfação perante os
demais credores.

Pelo exposto podemos concluir que‫׃‬

- a hipoteca é a garantia que confere mais segurança ao credor quanto ao ressarcimento


do seu crédito (com excepção dos privilégios creditórios especiais e do direito de
retenção) e tem uma enorme importância prática, na medida em que praticamente todos,
senão mesmo todos os contratos de crédito à habitação prevêem a existência de hipoteca
sobre o imóvel adquirido

- um crédito garantido por penhor traz grandes vantagens para o credor, quer em caso de
incumprimento da obrigação, quer em caso de declaração de insolvência do devedor,
pois em ambos os casos o penhor de acordo com o art.º 666º n.º 1 do CC gradua-se
preferencialmente perante os restantes credores.

- Os privilégios creditórios conferem a certos credores o direito de, independentemente


de registo, serem pagos com prioridade ou preferência face a outros credores.

Bibliografia

Manuais

Alves, Hugo Ramos, Do Penhor, Almedina, Coimbra, Junho 2010.


Leitão, Luís Manuel Teles de Menezes, Direito das Obrigações – Vol. II, transmissão
e extinção das obrigações, não cumprimento e garantias do crédito, 2ª Edição,
Almedina, Coimbra, Fevereiro 2003.

Varela, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª Edição,
Almedina, Coimbra 1997.

Legislação

Lima, Pires de / Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª Edição, Coimbra
Editora, 2010.

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