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SOLUÇÃO DE

CONFLITOS
JURÍDICOS

Eduardo Zaffari
Negociação:
procedimento, integração
e distribuição de valor
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a negociação como um processo de comunicação bila-


teral com o propósito de alcançar um acordo que atenda ao interesse
das partes.
 Explicar os princípios da mediação.
 Analisar o procedimento, a integração e a distribuição do valor na
negociação.

Introdução
A negociação é uma ciência e, ao mesmo tempo, uma técnica comunica-
tiva. Superada a ideia de que a negociação necessita ter um vencedor e
um perdedor, é possível a prática de princípios que possibilitarão sucesso
na negociação e ganhos para todos os negociadores.
A mediação é um procedimento complexo em que os envolvidos
buscarão construir a melhor e mais adequada solução para o seu conflito.
Para que sejam obtidos resultados que atendam a todos os envolvidos, a
legislação prescreve princípios norteadores que contribuirão para a resolu-
ção do litígio, como a boa-fé das partes, a confidencialidade e a cooperação.
No entanto, além desses, não se devem desconsiderar outros princípios
implicitamente existentes no ordenamento jurídico. A criação de valor em
uma negociação é importante para que todos possam ganhar, e a sua
correta distribuição auxiliará para que a satisfação seja recíproca.
2 Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor

Neste capítulo, você vai estudar a negociação como um processo


de comunicação bilateral com o propósito de alcançar um acordo que
atenda ao interesse das partes. Você também vai aprender sobre os prin-
cípios da mediação, tanto os previstos em lei quanto aqueles implícitos
na jurisdição. Por fim, você vai explorar as fases da negociação e como
elas deverão ser aplicadas para a correta distribuição de valor.

Negociação como um processo de comunicação


Negociamos diariamente. Desde o momento em que nascemos, quando chora-
mos pelo colo materno, até a vida adulta, quando combinamos com os amigos
um lugar para jantar, o melhor dia para a visita dos netos, entre outras tantas
atividades diárias que envolvem discussão e um consequente acordo (nem que
se concorde em discordar) com outros indivíduos. A negociação, como técnica
ou ciência, é corrente no nosso dia a dia e tem importância fundamental para
a vida profissional e pessoal.
Antes de mais nada, você deve entender e superar a equivocada impressão
de que o processo de negociação implicaria ganho para uma parte e perda
para a outra. Não há, necessariamente, um vencedor e um perdedor. Além
disso, felizmente o processo de negociação pode ser aprendido por qualquer
pessoa que dedique um pouco de tempo, estudo e prática ao seu entendimento,
trazendo ganhos imediatos aos que se dedicam a estudá-la.
A negociação pode ser conceituada como uma comunicação bidirecional
concebida para se chegar a um acordo, quando existentes interesses opostos,
para que se obtenham benefícios mútuos. Diante da possibilidade de que um
dos negociadores obtenha ganhos impondo a sua vontade e oprimindo o outro,
desenvolveu-se um projeto denominado Escola de Negociação de Harvard,
para a prática de técnicas que possam trazer ganhos a todos os envolvidos, em
um processo de “ganha-ganha”. Será por meio da busca por benefícios mútuos,
de princípios rigorosos de negociação e do afeto entre os negociadores que se
poderão obter vantagens para todos. Para Tartuce (2018, p. 220):

Um dos modelos mais conhecidos, o da negociação baseada em princípios


preconizados pela Escola de Harvard, é orientado por quatro diretrizes bási-
cas: (i) separar pessoas de problemas, [...]; (ii) focar em interesses e não em
posições, [...]; (iii) inventar opções de ganho mútuo, [...]; (iv) insistência em
critérios objetivos para ponderação das opções criadas [...].
Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor 3

Não se usam truques ou armadilhas, e os negociadores não são oponentes


que necessariamente terão que ter os seus desejos frustrados. Usando-se as
técnicas adequadas, uma correta comunicação e a colaboração de todos, é
possível o ganho recíproco.

No procedimento de mediação, reconhece-se expressamente o uso de técnicas


negociais para a solução do conflito, como prescreve o parágrafo terceiro do art. 166
do Código de Processo Civil (CPC): “Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com
o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição” (BRASIL, 2015,
documento on-line).

Não se pode esquecer que a comunicação é fundamental para todo nego-


ciador, visto que são comuns os mal-entendidos e as falhas de comunicação.
Conforme a Escola de Harvard, antes de qualquer negociação, as partes devem
conversar sobre generalidades, as quais proporcionarão empatia, pontos e
valores comuns que possibilitarão, quando surgidos eventuais impasses, a
retomada da comunicação (MARASCHIN, 2017).
O processo comunicativo na negociação não envolve apenas a oralidade
ou a escrita, mas toda e qualquer ação e reação, bem como todos e quaisquer
atos ou omissões que possibilitem a interação e as trocas de experiências. Até
mesmo olhares e contatos físicos, como um aperto de mãos, criam um ambiente
propício para a solução de impasses decorrentes, muitas vezes, de pontos de
vista diferenciados sobre o mesmo objetivo. É importante o reconhecimento
do outro como ser humano, com desejos, sentimentos e objetivos, os quais, na
maior parte das vezes, são comuns. Diferenciam-se apenas quanto ao ponto
de vista para se alcançar o objetivo.

Comunicar-se na linguagem do outro, de forma respeitosa e amigável, propicia um


ambiente de reconhecimento recíproco que viabiliza a comunicação e o atingimento
do objetivo comum.
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São considerados erros comunicativos, os quais atrapalham a realização


do acordo:

 não falar questões importantes que poderiam contribuir para o acordo;


 não ouvir o que o outro tem a dizer;
 focar-se apenas nas próprias considerações;
 não prestar atenção no que o outro quer dizer;
 não ser claro ou objetivo nas próprias ponderações.

A partir de um procedimento comunicativo eficiente, aumentam-se consi-


deravelmente as condições de possibilidade para a obtenção de uma negociação
que traga vantagens para ambos os negociadores, sem que um perca para que
se realize um acordo.

Princípios da mediação
Os princípios norteadores da mediação, mais do que apenas diretrizes orien-
tadoras do instituto, importam no reconhecimento da dignidade da pessoa
humana, conforme cláusula constante no art. 1º, III, da Constituição Federal
de 1988. Trata-se de exteriorização da participação democrática do cidadão
nas decisões que afetarão a sua vida.
Nesse sentido, buscam-se princípios nos dispositivos legais de forma expressa,
tanto aqueles que tratam do processo quanto aqueles que tratam dos meios de
resolução de conflito. Observe-se que a existência de princípios expressos não
exclui outros decorrentes da Constituição Federal e do processo civil que possam
ser implicitamente deduzidos. No plano normativo, encontram-se os princípios
da mediação no CPC de 2015, em seu art. 166: os princípios da independência,
da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da orali-
dade, da informalidade e da decisão informada. Igualmente, no art. 2º, da Lei
nº. 13.140, de 26 de junho de 2015, a chamada Lei da Mediação, a qual trata
especificamente da mediação, consta que esse meio de resolução deverá observar,
obrigatoriamente, os seguintes princípios (BRASIL, 2015, documento on-line):

 imparcialidade do mediador;
 isonomia entre as partes;
 oralidade;
 informalidade;
 autonomia da vontade das partes;
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 busca do consenso;
 confidencialidade;
 boa-fé.

Com poucas distinções entre ambos, examinemos os principais princípios


no plano normativo.
Ao dispor o princípio da autonomia de vontade, valoriza-se a liberdade
como valor da dignidade da pessoa humana. Torna-se a parte envolvida no
conflito protagonista e responsável pelas consequências do conflito e sua
resolução. Confia-se na capacidade do indivíduo de escolher e valoriza-se seu
senso de justiça, o que deverá levar as partes a optar, de forma voluntariosa, pelo
caminho da resolução consensual no momento de crise. Sendo os envolvidos
os protagonistas, deverão estes optar livremente pela mediação, mantendo-se a
sua livre vontade para participar, escolher o caminho e manter-se na mediação
desde o início do procedimento até seu fim. Em qualquer momento durante o
procedimento, poderão as partes interrompê-lo, caso sintam-se constrangidas.
Ligado à autonomia de vontade, o princípio da decisão informada, segundo
Tartuce (2018, p. 206), é o princípio que “[...] impõe o esclarecimento, por parte dos
mediadores, sobre os direitos de aceitar participar da via consensual e de seguir
participando das sessões”. Embora refira que se trata de esclarecimento quanto
ao direito de participar da mediação, a autora reconhece a necessidade de que os
participantes tenham dados suficientes para a construção da solução do litígio.
Apenas se pode reconhecer uma vontade livre e autônoma de qualquer
participante se houver a compreensão pelas partes sobre os direitos e deveres
da mediação, sobre os direitos e deveres da discussão na mediação e sobre
as consequências da eventual solução a que as partes se comprometam em
composição. O mediador não deve agir como advogado ou consultor das
partes, sob pena de comprometer a necessária imparcialidade, mas deverá
se certificar de que as partes estão devidamente informadas, sob pena de
comprometimento da liberdade consensual necessária.

A Lei nº. 13.140/2015 prescreve expressamente o direito de a parte desistir da mediação


a qualquer momento: “Art. 2º A mediação será orientada pelos seguintes princípios: [...]
§ 2º Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação” (BRASIL,
2015, documento on-line).
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Os meios usuais de resolução de conflitos pelo Poder Judiciário podem


ser, em alguns momentos, opressivos e confrontadores. Isso porque o pro-
cesso judicial tem uma série de ritos, expressões e usos que podem ser, para
o leigo, intimidadores. Os meios alternativos de solução de conflitos devem
ser acolhedores, razão pela qual há expressa previsão legal do princípio da
informalidade. Isso significa que a mediação deverá permitir a tranquilidade,
a descontração e que as partes se sintam participantes do procedimento e da
construção da solução. A informalidade não exime, entretanto, o mediador de
esclarecer as partes sobre algumas regras a serem observadas no procedimento.
Sem impedir que as partes imponham o clima que desejam, regras mínimas
como respeito mútuo, ouvir o outro, confidencialidade, dentre outros, permiti-
rão o procedimento. A flexibilidade do procedimento, fruto da informalidade,
auxiliará para que os litigantes consigam estabelecer a comunicação e construir
a melhor solução para sua controvérsia. Para Spengler (2017, p. 149), “[...] nesse
sentido, nada obsta que os envolvidos busquem soluções alternativas, desde
que suas escolhas não firam a moral e os bons costumes”.
Os mediadores deverão atuar com imparcialidade e independência, ou seja,
sem qualquer espécie de pressão, influência ou subordinação, seja em relação
às partes, seja em relação ao Poder Judiciário. O princípio da independência
determina que sempre que um mediador se sentir constrangido, verificar que
não há condições de desenvolvimento do procedimento, ou constatar que o
acordo que as partes pretendem é ilegal ou impossível de ser cumprido por
qualquer dos participantes, deverá recusar-se de participar, conforme o Código
de Ética de Mediadores e Conciliadores da Resolução nº. 125 do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), de 29 de novembro de 2010.

A Resolução CNJ nº. 125/2010 introduziu a regulamentação dos meios de resolução


de conflitos e instituiu o Código de Ética para os mediadores e conciliadores.

O princípio da imparcialidade prescreve que o mediador não deverá se


posicionar em favor de qualquer dos envolvidos, velando os mesmos motivos
de suspeição e impedimento que valem para os juízes de Direito, além de
qualquer outro motivo que possa, mesmo não revelado, influenciar que o
mediador prestigie qualquer das partes da mediação. Quanto maior o reco-
nhecimento de imparcialidade das partes no mediador, maior credibilidade
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este gozará para conduzir as partes à construção de uma solução para o litígio.
Por esse motivo, o mediador deverá revelar, antes do início do procedimento,
qualquer situação que embarace sua participação. Trata-se de um dever de
revelação. Observe, contudo, que a adoção de técnicas de negociação não
importa em comprometimento da imparcialidade do mediador.
Para o reestabelecimento da comunicação, o princípio da oralidade
é essencial. Nas sessões, as partes terão a oportunidade de verbalizar,
passar suas impressões, construir reflexões, escutar outras perspectivas
e responder e formular questionamentos. É o momento de participação,
que permitirá a construção da solução mais adequada à crise discutida.
Lembrando que o processo oral não exclui a utilização da escrita para a
formalização do acordo; Spengler (2017, p. 148) afirma que a oralidade
advém dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Lei nº. 9.099, de 26 de
setembro de 1995.

O processo do trabalho já há muito tempo valoriza a oralidade na colheita da prova


e nos demais atos processuais, embora a Lei nº. 9.099/1995 a tenha expressamente
prescrito no art. 62.

Dois pontos que suscitam algumas dúvidas quanto à oralidade são:

1. se o mediador deverá ler para as partes o processo ou as peças escritas


do litígio, ou se deverá permitir que as partes construam oralmente a
controvérsia da qual vão tratar;
2. se deverá o mediador transcrever o que as partes disserem durante a
sessão de mediação.

Responder esses questionamentos positivamente depende das características


de negociação de cada mediador, ou seja, da maneira como se sinta o mediador
mais à vontade na sessão e, fundamentalmente, que tais transcrições e leituras
não tornem o procedimento formal e engessado. É importante que a solução
a ser adotada para o conflito seja transcrita na medida em que os envolvidos
permitam, de forma clara e objetiva. Embora não haja exigência legal de que
o acordo seja escrito, essa forma permite um senso de responsabilidade maior
e uma melhor organização psíquica dos termos do acordo.
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O princípio da busca de consenso se relaciona com a necessidade de coo-


peração entre as partes e com a não competitividade. Segundo Tartuce (2018,
p. 219), “[...] verifica-se uma situação cooperativa quando um participante do
processo, ligado de forma positiva a outro, comporta-se de maneira a aumentar
suas chances de alcançar o objetivo, aumentando com isso também a chance
de que o outro o faça”. O mediador e todos os envolvidos no procedimento
deverão atuar de forma contributiva para que se possa reestabelecer a comu-
nicação e o diálogo, em um ambiente propício ao consenso. Observa-se que
mesmo que não se chegue a um consenso quanto à solução, poderão as partes
criar um ambiente de comunicação que lhes oportunize, em outro momento,
uma composição.
Nesse sentido, ganha enfoque a boa-fé que deverá pautar os sentimentos
das partes, que deverão atuar com honestidade, lealdade e justiça em relação a
todos os envolvidos, sejam estes a parte adversa, os advogados, os mediadores
ou os terceiros. Os envolvidos poderão ter diferenças quanto a aspectos sobre
o bem da vida discutido, mas isso não lhes permite agir de forma desleal ou
desonesta em relação ao outro. O ordenamento jurídico brasileiro ressalta, a
todo o momento, a necessidade de que as partes guardem a boa-fé tanto na
formação quanto na execução dos negócios jurídicos, conforme prescreve o
art. 422 do Código Civil, em que “Os contratantes são obrigados a guardar,
assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de
probidade e boa-fé” (BRASIL, 2002, documento on-line).

O Código Civil traz inúmeros exemplos em que a boa-fé vem prescrita como um
pressuposto das relações civis, como nos arts. 128, 164, 167, 187, 242, 286, 307, 309,
entre inúmeros outros.

O princípio da confidencialidade vem determinado no §1º do art. 166 do


CPC, para que as partes possam se sentir à vontade para agir com transpa-
rência, compartilhando informações e dados que possam auxiliar na solução
do problema. Absolutamente tudo o que for tratado na sessão de mediação
será confidencial, mesmo que qualquer das partes admita fato controverso
do litígio. Por esse motivo, apenas serão transcritos os fatos, as propostas e
Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor 9

os encaminhamentos que todos os envolvidos concordem que sejam escritos.


Igualmente não poderá ser revelado oralmente o que for tratado entre as
partes durante a mediação. Assim, a Lei determina que “a confidencialidade
se estende a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo
teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa
deliberação das partes” (BRASIL, 2015, documento on-line).
As informações obtidas no processo de mediação não poderão ser usadas em
qualquer processo judicial ou arbitral, e o mediador, assim como os membros
de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos
oriundos da conciliação ou da mediação.
Por fim, as partes deverão ter igual oportunidade durante o procedimento,
resguardando-se a isonomia. O mediador deverá observar que as partes te-
nham igual tempo para exposição de suas razões, mesmo número de sessões
individuais, mesmas oportunidades de exposição e instrumentos negociais.
A inobservância dessa igualdade, mesmo que não proposital, poderá dar a
impressão ao supostamente prejudicado que estaria sendo preterido, quebrando
a necessária confiança e cooperação.

Procedimento, integração e distribuição


do valor na negociação
Existem basicamente dois tipos de negociação que são preconizados como
forma, os quais poderão importar na criação de valor. O primeiro método é a
negociação distributiva, em que os negociadores competem pela distribuição
de determinado interesse. Dessa forma, há o ganho de um lado dos negociantes
e a respectiva perda do outro. Há um determinado valor fixo pretendido que os
negociadores competem entre si para a obtenção, visto que existiriam escassas
possibilidades de expansão desse valor. Haveria a chamada “negociação de
soma zero”.
O segundo método, de negociação integrativa, consiste na negociação em
que todas as partes cooperam para obter o máximo de vantagens para ambos,
aliando esforços para que surja um acordo que atenda aos interesses de todos
os negociadores. Nesses casos, buscam-se soluções em que surjam ganhos para
todos, em um resultado de “soma maior que zero”. Na negociação integrativa,
o conhecimento dos interesses fundamentais de cada parte permitirá que se
obtenham soluções criativas, que permitam o ganho de todos e uma relação
negocial duradoura.
10 Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor

Observe que a negociação importa em cinco fases, conforme a Escola de


Harvard:

 preparação;
 criação de valor;
 negociação;
 fechamento;
 reconstrução.

Para o sucesso de cada negociação, salienta-se que se deve observar cada


uma dessas fases de forma rigorosa, posto que todas são importantes para o
desenvolvimento do acordo (MARASCHIN, 2017).

Atenção ao momento da negociação, pois a proposta obriga o proponente, segundo


o Código Civil, art. 427: “A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário
não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”
(BRASIL, 2002, documento on-line).

A primeira fase da negociação consiste na correta preparação antes do


seu início. Os participantes devem conversar previamente com todos os que
sofrerão consequências de eventual acordo, para que não precisem interromper
a comunicação no meio do procedimento de negociação para consultar tercei-
ros. A exposição de tratativas com terceiros e a discussão de opções frente ao
outro negociador poderá quebrar o clima favorável criado.
Igualmente se deve ter conhecimento prévio das repercussões jurídicas das
opções possíveis de serem criadas e pactuadas. Não adiantará um processo
negocial que chegue ao seu êxito, mas não seja possível em razão da falta
de autorizações de órgãos administrativos ou por ser ilegal, o que tornaria
inexequível o acordo. Os participantes apenas poderão criar soluções e pactuar
sobre elas se forem juridicamente possíveis e não dependerem de autorização
de terceiros, salvo se tratar-se de um acordo condicional; por exemplo, o in-
quilino concorda em aumentar o aluguel mensal se os bombeiros fornecerem
uma autorização de exploração diferenciada do imóvel.
Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor 11

Nessa fase preparatória, um bom negociador faz um check-list de todas


as opções possíveis de serem pactuadas e os requisitos necessários para a
sua pactuação, preparando-se ou consultando a efetiva possibilidade. Não
se deve levar à negociação opções que não poderão ser cumpridas. O uso de
preparativos comuns para uma negociação mais complexa, como instrumentos
tecnológicos (computadores, telefones, etc.), deve ser tratado com os demais
envolvidos previamente. No momento da negociação, instrumentos que possam
auxiliar a escrita do acordo, por exemplo, devem estar disponíveis para os
negociadores.
Na segunda fase, a de criação de valor, as partes deverão empregar es-
forços para a criação de vantagens que ultrapassem a soma zero, evitando
que uma perca para a outra ganhar. Em praticamente todas as negociações,
negociadores dispostos poderão criar situações em que ambos ganhem. Ambos
os negociadores deverão ter consciência de que uma solução que atenda aos
interesses de todos se torna mais justa e fácil de ser cumprida, alcançando-
-se a pacificação social. Trata-se da criação de uma opção “ganha-ganha”.
Embora inicialmente possa parecer difícil, é possível a criação de situações
de ganhos indiretos. Um exemplo é o da indústria que se compromete em
ressarcir dano ambiental, mas lhe é concedida a oportunidade de usar a conduta
como um comprometimento ambiental que agregará valor para os acionistas
e consumidores. Em um momento de valorização de condutas socialmente
responsáveis, uma indústria verde tem as suas ações no mercado valorizadas.
Criadas as opções de valor, passa-se à parte da negociação, em que se
distribuirão as vantagens que os envolvidos encontraram para que todos saiam
satisfeitos. Nesse momento, os negociadores examinarão as alternativas e de-
verão buscar a melhor forma de pactuação, identificando acordos bons e ruins.
Esse trabalho deverá ser realizado de forma conjunta, visto que, diante das
melhores opções e imbuídos de boa-fé negocial, todos os envolvidos tenderão
a escolher as alternativas que tragam maior ganho a todos. Usualmente, dentre
várias alternativas, os negociadores buscam a que satisfaça da melhor forma a
todos, pois, dessa forma, será maior a possibilidade de futuras composições,
caso necessárias.
Nessa fase de distribuição de valores é que se usarão as técnicas negociais
preconizadas por Harvard, como a escuta ativa, a inversão de papéis, o afago,
dentre outras, as quais criam a condição de possibilidade para um acordo.
Trata-se da fase mais importante, na qual o negociador usará todas as técnicas
disponíveis e convenientes (MARASCHIN, 2017).
12 Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor

A técnica da escuta ativa, segundo Tartuce (2018), preconiza não apenas escutar o
outro, mas considerar atentamente as mensagens verbais e não verbais ditas pelo outro.

O fechamento é o momento em que a negociação chegará ao seu final,


com a decisão sobre a melhor alternativa. Nessa fase, os negociadores pac-
tuam sobre as obrigações de cada um, as quais trarão os ganhos esperados.
Preferencialmente se deve resumir o negociado na forma de um acordo, o qual
servirá para recordar às partes a negociação realizada e os deveres de cada
um. Evitam-se colocar por escrito situações de desgaste ou que sejam inúteis,
o que apenas despertará sentimentos desagradáveis e evocará a vontade de
não cumprir o acordo.
Na fase de reconstrução, os negociadores reconstruirão o relacionamento
que possa ter sofrido algum desgaste no processo de negociação. O uso das
técnicas negociais, ou seu emprego de forma equivocada, poderá trazer senti-
mentos ruins, os quais poderão prejudicar a execução do acordo ou as futuras
negociações. Dessa forma, é importante que, depois da fase de negociação,
os negociadores conversem sobre assuntos comuns, permitindo a retomada
do clima criado na fase de preparação. Não se deve ignorar jamais essa fase,
pois ela consolidará a satisfação como sentimento dos negociadores.

BRASIL. Lei nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995. Diário Oficial [da] República Federa-
tiva do Brasil, Brasília, DF, 27 set. 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Leis/L9099.htm>. Acesso em: 18 jun. 2018.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 14 maio 2018.
13 Negociação: procedimento, integração e distribuição de valor

BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial
[da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 17 mar. 2015. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 18 jun. 2018.
BRASIL. Lei nº. 13.140, de 26 de junho de 2015. Diário Oficial [da] República Federativa
do Brasil, Brasília, DF, 29 jun. 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm>. Acesso em: 18 jun. 2018.
BRASIL. Resolução CNJ nº. 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: <http://
www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579>. Acesso em: 18 jun. 2018.
MARASCHIN, M. U. (Coord.). Manual de negociação baseado na teoria de Harvard.
Brasília: EAGU, 2017.
SPENGLER, F. M. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2017.
TARTUCE, F. Mediação nos conflitos civis. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.

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