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Resumo
O presente artigo constitui uma avaliação no Módulo de Direito das Obrigações IV, cujo
objectivo de estudo é determinar a natureza jurídica da penhora, visto existir uma querela
doutrinal sobre a sua verdadeira natureza, como não se tratar de uma garantia real, mas sim de
um acto judicial, ou seja, uma apreensão judicial dos bens e ou rendimentos do executado, que
acaba também por cumprir uma função de garantia por ter como consequência a retirada do
poder de livre disposição dos bens penhorados ao executado e, ainda, de natureza mista.
Portanto, irá desenvolver e analisar alguns conceitos de penhora, garantia obrigacional, entre
outros, procurando, através dos objectivos específicos estabelecidos, comprovar ou não a
validade das três hipóteses apresentadas, nomeadamente: a) a penhora é um acto judicial; b) a
penhora é uma garantia obrigacional, e c) a penhora tem natureza mista, e em comparação com
os ordenamentos jurídicos brasileiro e português.
Abstract
This article constitutes an assessment in the Obligations Law Module IV, whose study objective
is to determine the legal nature of the attachment, as there is a doctrinal dispute about its true
nature, such as it is not a real guarantee, but rather a judicial act, that is, a judicial seizure of the
assets and/or income of the defendant, which also ends up fulfilling a guarantee function as it
results in the withdrawal of the power to freely dispose of the assets seized to the judgment
debtor and is also of a mixed nature. Therefore, it will develop and analyze some concepts of
attachment, mandatory guarantee, among others, seeking, through the specific objectives
established, to prove or not the validity of the three hypotheses presented, namely: a) attachment
is a judicial act; b) the attachment is an obligatory guarantee, and c) the attachment has a mixed
nature, and in comparison with the Brazilian and Portuguese legal systems.
Introdução
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Mestrando em Direito Civil pela Faculdade de Gestão e Informática da Universidade Católica de Moçambique -
Pemba. Este trabalho é orientado pelo Professor Doutor Neucilto Chapila, no Módulo de Direito das Obrigações
IV. E-mail: chichangoruilagriamas@yahoo.com.br.
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garantia real das obrigações, mas sim como apreensão judicial dos bens e/ou rendimentos do
executado, acabando desta forma por cumprir uma função de garantia, uma vez que tem como
consequência retirar ao executado o poder de livre disposição, ou seja, o poder de vender, doar
ou onerar os bens penhorados, procurando responder à seguinte pergunta: a penhora é uma
garantia obrigacional ou é um acto judicial?
Para responder ao problema, o trabalho apresenta três hipóteses, que se seguem:
a) a penhora é um acto judicial, b) a penhora é uma garantia obrigacional; e c) a penhora tem
natureza mista. E centrando a sua abordagem para comprovar as hipóteses com os seguintes
objectivos, objectivo geral: determinar a natureza jurídica da penhora no diretito moçambicano,
e objectivos específicos: a) definir penhora; b) analisar o conceito de garantia obrigacional; c)
analisar o conceito de acto judicial; d) apresentar a diferença entre garantia obrigacional e acto
judicial; e) determinar a natureza jurídica da penhora no direito moçambicano, e f) apresentar a
natureza jurídica da penhora do direito português e no direito brasileiro.
Metodologicamente, será uma pesquisa teórica e descritiva, pois o autor irá
contemplar uma revisão bibliográfica rigorosa e disponível, sem descurar as consultas aos sites
electrónicos na internet para fundamentar os assuntos ou matérias que constituem objecto de
pesquisa, com vista a uma análise detalhada e rigorosa do mesmo.
Na sua abordagem, o trabalho iniciará com conceptualização da penhora, acto
judicial, garantia obrigacional, suas características ou elementos; demonstrando a diferença
entre acto judicial e garantia obrigacional; determinação da natureza jurídica da penhora no
direito moçambiacano, e comparar a natureza jurídica da penhora no ordenamento juríco
brasileiro e português.
O artigo 817 do Código Civil (C.C) estabelece que, não sendo a obrigação
voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e
de executar o património do devedor, constituindo o património do devedor a garantia geral do
cumprimento das suas obrigações, de acordo com o artigo 601 do C.C, sem prejuízo da
possibilidade de constituição de garantias especiais do crédito sobre bens do devedor ou de um
terceiro, ou seja, o credor pode recorrer à execução do património do devedor com vista a obter
o cumprimento coercivo da sua obrigação através da afectação jurídica desse património,
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mediante o recurso aos tribunais através da instauração de uma acção executiva, situação em
que o tribunal se subsituti ao devedor para as suas obrigações perante o credor.
A penhora constitui um acto fundamental desse processo de execução e segundo
Mouta, a penhora é definida como sendo a apreensão judicial dos bens e/ou rendimentos do
executado para o pagamento dos credores no âmbito de processos executivos ou processo de
execução fiscal instaurados, isto porque se o devedor ficar em incumprimento da obrigação a
que se encontra adstrito, a lei concede ao credor a possibilidade de agir, por intermédio das
instâncias judiciais, contra o património do devedor.
De acordo com a definição clássica apresentada por Schiavi (2010, p. 1), a
penhora é definida como o acto pelo qual o órgão judiciário submete a seu poder imediato
determinados bens do executado, fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação do
direito do exequente, isto é, a penhora é um acto de império do Estado, praticado na execução,
que tem por finalidade vincular determinados bens do devedor ao processo, tantos quantos
bastem para o pagamento integral do crédito, e, com o produto da futura expropriação judicial
desses bens, satisfazer o crédito do exequente. Portanto, trata-se de um acto de afectação de
determinados bens do devedor que provoca o gravame de vinculá-los ao processo em que
realiza a execução.
A penhora consiste na apreensão judicial dos bens do executado, momento em
que se manifesta o exercício do poder coercitivo dos tribunais, onde perante uma situação de
incumprimento, o tribunal priva o executado do pleno exercício dos seus poderes sobre
determinado bem ou bens, que sem deixar de pertencê-lo, ficam a partir desse momento sujeitos
à satsifação do crédito do exequente.
Da conjugaçãos dos artigos 601 do C.C e 821 do Código de Processo Civil
(C.P.C), depreende-se que estão sujeitos à execução todos os bens, com as execepções
referentes a patrimónios autonómos, que, de acordo com a lei substantiva respondem pela
dívida, quer pertençam ao devedor, quer a terceiro. E também se pode extrair os seguintes
princípios gerais: a) que a penhora tem apenas, por objecto o património do devedor e/ou do
terceiro, neste último, nos casos em que sobre seus bens incida uma garantia especial do crédito
exequendo e quando tenha sido julgada procedente a impugnação pauliana de que resulte para
o terceiro a obrigação de restituição dos bens ao credor; b) que a execução abrange apenas os
direitos de expressão patrimonial, ficando assim excluídos os direitos pessoais, e c) que nunca
podem ser penhorados senão bens do executado, seja este o devedor principal, um devedor
subsidiário ou um terceiro, sem excepção.
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Segundo Maló, a penhora é um acto processual pelo qual o Estado retira ao
executado os poderes de aproveitamento e disposição de um direito patrimonial na sua
disponibilidade e ela desempenha as seguintes funções:
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O Código de Processo Civil ainda prevê nos artigos 822 e seguintes bens que são
absoluta ou totalmente impenhoráveis e bens relativa ou parciamente impenhoráveis, sem
descurar a discriminação detalhada do regime de bens que são objecto da penhora, quer seja:
penhora de bens indevisos, penhora de bens de casal, penhora de bens de sociedade, entre
outros.
Segundo Santana (2014, p. 144 – 146), no mundo dos factos, há os que são
juridicamente irrelevantes, como é o caso da chuva e do sol, e os factos jurídicos – estes, os
que interessam ao direito - dentre os quais há os factos jurídicos stricto sensu, que são os factos
naturais suscetível de produzir efeitos jurídicos, a título de exemplo o nascimento e a morte), e
os actos jurídicos lato sensu, que resultam da actividade humana consciente. Dentre os quais
estão os actos jurídicos e os negócios jurídicos. O acto processual é uma espécie do acto
jurídico; é o acontecimento previsto nas normas processuais como capaz de produzir o
nascimento, a conservação, a modificação, a transferência ou a extinção da relação jurídico-
processual. O somatório dos actos processuais praticados – do começo ao fim - é que compõe
o processo.
A forma dos actos processuais é a determinada, expressamente, em lei, nos
termos dos artigos 138 e seguintes do C.P.C. Os actos processuais devem ser documentados e
por regra, de forma escrita. A língua língua portuguesa é da substância do acto, de tal modo que
depoimentos de estrangeiros serão tomados com a participação de intérpretes, e documentos
em língua estrangeira deverão ser traduzidos, sendo realizados, em regra, na sede do tribunal,
conforme o artigo 149 do C.P.C, excepto em casos de deferência ou de justo impedimento, mas,
em princípio, dentro dos dias úteis, vertigo 143 do Código de Processo Civil.
Os actos processuais classificam-se, quanto ao sujeito processual que os pratica
em actos das partes, actos do juiz e actos dos auxiliares do juízo. Os actos das partes
subdividem-se em actos de manifestação de vontade e actos materiais. São actos de
manifestação de vontade os (a) actos postulatórios, que consistem em pedidos, postulações ou
requerimentos; (b) actos persuasórios, através dos quais os sujeitos tentam convencer o julgador
de suas razões, colacionando citações doutrinárias e jurisprudenciais; (c) actos dispositivos, tais
como os de desistência da acção ou eleição do foro; e (d) os actos probatórios, que consistem
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nas várias diligências probatórias, tais como a colheita da prova testemunhal ou pericial. Os
actos materiais consistem em pagamento de custas ou retirada de autos.
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4. Diferença entre acto processual ou judicial e garantia obrigacional
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Em face do exposto, discute-se em doutrina qual é a natureza jurídica da
penhora. Uma primeira corrente defende que a penhora tem natureza de acto cautelar (função
de garantia), isto porque segundo Neto (2017), por meio da penhora, ocorre a individuação e
a indisponibilidade do bem do executado, mas isto não torna a penhora uma cautelar, pois tal
acto é o primeiro acto executivo. E de acordo com Cardoso (2015), a penhora não é medida de
mera preservação ou cautelar do interesse em jogo; é o início de sua efectivação. Também
não é revestida da eventualidade e acessoriedade típica das medidas cautelares, nem reclama
o preenchimento dos seus pressupostos, pois se realiza independentemente de urgência
(periculum in mora) e já é fundada em direito certo e, não, simplesmente provável (fumus
boni iuris), daí que esta corrente não procede.
Para uma segunda corrente, defende que a penhora é acto misto, ou seja, tem a
natureza de acto cautelar e acto executivo. Para os autores supracitados, não é o melhor
entendimento, já que a sua função cautelar é secundaria e não serve para definir a sua natureza
ou a sua substância, que é desencadear a expropriação forçada e sendo o início da invasão
patrimonial que sofrerá o devedor.
A terceira corrente, que é a predominante, defende que a penhora é um acto
essencialmente executivo, pelo qual se apreendem bens do devedor, com isso, a
responsabilidade patrimonial deixa de ser genérica para recair especificamente sobre ele. A
penhora é acto executivo, ainda que insuficiente para satisfazer o credor. A partir da penhora,
poderão ser praticados actos de expropriação dos bens, que serão convertidos em pecúnia a
ser entregue ao credor. Sem dúvidas é, em essência, simples acto executivo. É acto necessário
do processo executivo de expropriação. É o primeiro passo executivo, para a realização da
transferência forçada dos bens do devedor. Portanto, apesar de ter uma função preventiva de
conservar o bem constrito de subtração e deteriorações e dar ao processo a segurança de que
há, no património do executado, bens para satisfazer a dívida que estão sob cuidados do
depositário, não seria este efeito anexo suficiente para modificar-lhe a sua natureza jurídica
de acto executivo. A função da penhora não é sancionatória, mas sim instrumental porque
pretende-se, com ela, salvaguardar a utilidade final do direito de execução do credor (função
garantística da penhora).
Segundo Mouta, a penhora, apesar de, em bom rigor, não se tratar de uma
garantia real, mas sim de uma apreensão judicial dos bens e ou rendimentos do executado,
acaba também por cumprir uma função de garantia porque tem como consequência retirar ao
executado o poder de dispor livremente os bens penhorados, o que torna os actos do executado
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que envolvam a disposição, oneração ou arrendamento serem inoponíveis em relação à
execução.
6. Direito comparado
Segundo Maló, para autores como Dias Marques, Castro Mendes, Menezes
Leitão, Lebre de Freitas e Menezes Cordeiro, a penhora tem a natureza de garantia real, de
acordo com o conteúdo da disposição do artigo 822 do Código Civil. No entanto, muitos
autores, incluindo Rui Pinto, defendem que não há na penhora nem sequela nem inerência,
caracteres reais que justificam que a garantia acompanhe a transmissão do bem e possa ser
invocada contra quem for o seu proprietário ou possuidor no momento da execução. A função
da penhora é, maioritariamente, conservatória. Para estes, a penhora é um acto processual
produtor de um complexo de efeitos, pelo que há que distinguir entre os efeitos conservatórios
correspondentes às indisponibilidades, quer material, quer jurídica, e o efeito de garantia
servido pela preferência derivada da penhora.
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Considerações finais
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Referências Bibliográficas
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Geral. Almedina. Coimbra Editora;
COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das obrigações. Coimbra Editora, 2001;
MENDES, João de Castro, Teoria Geral do Direito Civil. Vol. II. Associação Académica da
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Lisboa, 2017;
ALVES, João, GERALDES, António, SANTOS, Jorge, Direito Civil e Processual Civil
(Tomo II), Instituto Nacional de Administração-INA, 2007, Págs. 215 – 222;
SOUSA, Miguel Teixeira de, Direito Processual Civil Executivo: A Acção Executiva
Singular;
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GIL, A. Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Editora Atlas, 1999;
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em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/203/edicao-1/penhora, acesso em
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CANAU, Duarte, Direito das Obrigações II, Universidade de Lisboa: Faculdade de Direito.
Disponível em: https://aafdl.pt/wp-content/uploads/2021/03/Obrigações-II-Duarte-Canau.pdf,
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