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Apontamentos-Estudantes-Exame
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PROGRAMA GERAL
O presente programa foi concebido para a cadeira de Direito das Sucessões para os
estudantes do 5º ano do Curso de Direito do ISPT, referente ao ano académico
2023/2024.
Objectivo
Introdução
Considerações gerais
Enquadramento histórico
4. Especies de sucessões
5. Partilha em vida
1. Antecedentes legislativos
2. Especies de sucessíveis
O FENÓMENO JURÍDICO-SUCESSÓRIO
2. Pressupostos da vocação
3. Modalidades de vocação
4. Vocações anónimas
5. A herança jacente
6. A aceitação e o repúdio
1. Cálculo da legítima
2.3.1. Imputação
2.3.2. A colação
2.3.3. O Legitimário-donatário
BIBLIOGRAFIA
1. Carlos Pamplona Corte Real. Curso de Direito das Sucessões. Edição Quid juris?,
Lisboa 2012.
3. Cristina Araújo Dias. Código Civil Anotado. Livro V – Direito das Sucessões. 2ª
edição. Coimbra, 2022.
Introdução
Enquadramento histórico
A transmissão dos bens, para os povos germânicos, não obedecia a uma demonstração
de vontade por parte do titular dos mesmos. A propriedade não está encabeçada no
individuo, mas no grupo familiar, e o chefe do grupo não é um proprietário
individual, mas um administrador dos bens que se encontram em situação de
propriedade coletiva. Morto o chefe da família, os bens não são devolvidos a um
sucessor segundo uma disposição voluntária dos mesmos, efetivada pelo seu titular.
Os bens continuam a pertencer ao grupo ou à família; estão reservados para ela e
acontece apenas que um novo membro do grupo (por exemplo, um filho do falecido)
assume a titularidade dos mesmos como administrador dos bens que a todos
pertencem num regime de comunhão ou propriedade coletiva.
Exemplo: Kirk Douglas faleceu recentemente e deixou toda a sua fortuna a uma
fundação, os filhos receberam 0. Nos EUA, país anglo-saxónico, o testador tem
uma ampla liberdade de testar. Em Portugal e demais países do direito latino-
germanico, o testador pode dispor na totalidade ou de parte dos seus bens; mas,
se o de cujus tiver herdeiros legitimários (cônjuge, ascendentes, descendentes),
não pode dispor da totalidade da herança. Na melhor das hipóteses, pode
dispor de metade da herança (se houver cônjuge e descendentes, só pode dispor
de 1/3). A liberdade do testador é limitada.
Por muito limitado que possa ser o âmbito da sucessão, há sempre um conjunto
de direitos e de obrigações que não se extinguem à morte do seu titular, sob
pena de soluções inaceitáveis e injustas. Por exemplo: extintos os créditos, os
devedores ficariam liberados das suas dividas em consequência do falecimento
do credor; ou extintas as dividas, os credores do falecido veriam frustrados os
seus direitos de crédito e injustamente prejudicados. Assim, o fenómeno
sucessório assegura a continuidade das relações jurídicas do decujos, evitando
a sua extinção. A existência do fenómeno sucessório está ligada ao
reconhecimento da propriedade privada, que só é plenamente assegurada se se
admitir a sua transmissibilidade em vida e por morte.
sucessório sempre que uma pessoa assume, numa relação jurídica que se mantém
identica, a mesma posição que era ocupada anteriormente por outra pessoa”1.
Porém, tanto um sector como outro, prevalece a ideia de que a sucessão é sempre
uma aquisição mortis causa. É a morte de uma certa pessoa que faz com que os seus bens
sejam adquiridos por outrem.
“ 1. Não constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por
morte do respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei.
“ 2. Podem também extinguir-se à morte do titular, por vontade deste, os direitos
renunciáveis” (art. 2025º).
1
Cfr. Pereira Coelho in Lições de Direito das sucessões de Cristina Araujo Dias, 7ª ed, pg.45.
O problema
Com a determinação do objecto da sucessão pretendemos aferir que situações
são transmissíveis e que situações são intransmissíveis por morte. Para
chegarmos a essa con clusão, temos que fazer uma distinção prévia entre
situações jurídicas de carácter patrimonial e situações jurídicas de caracter
pessoal.
Professor Galvão Teles: segundo ele, quando o legislador diz “em razão da sua
natureza”, é porque nos encontramos perante uma norma imperativa ou seja,
uma norma que não pode ser afastada por vontade das partes. Quando o
legislador diz “por força da lei”, neste caso, estamos perante uma norma
supletiva. Quer isto dizer que, em princípio, a lei proíbe. Porém, se o decujus
quiser estabelecer de outro modo pode faze-lo.
Professor Spinoza Gomes da Silva: para este, quando o legislador diz “em razão
da sua natureza” refere-se a direitos que se encontram de tal forma ligados ao
seu titular, que não podem ser transmitidos a outros. Ex: contrato de trabalho,
direito a alimentos… São direitos que, mesmo que a lei dissesse que se
transmitiam por sucessão isto não poderia ocorrer, já que estaríamos perante
uma incompatibilidade em virtude da natureza do direito. A lei não poderia
despor neste sentido. Assim sendo, são relações jurídicas que se extinguem com
a morte, em razão da sua natureza.
Quando o legislador diz “por força da lei”, tratam-se de situações em que a lei
dispôs deste modo mas que poderia tê-lo feito de forma diferente. O legislador
entende que estas relações jurídicas não se deveriam transmitir por morte.
O legislador entende desta forma porque quis, na medida em que, neste caso,
não há nada na sua natureza jurídica que o impeça de ser transmitido por
morte. O direito de preferência convencional não se transmite por morte. O
legislador legislou deste modo porque entendeu ser o melhor. No entanto, não
há nada na natureza desse direito que o impeça de ser transmitido por morte.
Situações jurídicas de caracter pessoal
Caso prático: A foi à discoteca e é assaltado por B que tem como arma uma seringa com
vírus de HIV. A oferece resistência e B injecta o seu conteúdo. Dois anos depois, A
morre. Terá A direito a indemnização pela sua morte?
Soluções:
1. O bem vida não tem um valor monetário, portanto, não deve existir qualquer
indemnização;
2. Não faz sentido atribuir à vítima uma indemnização, uma vez que esta nunca
poderá beneficiar da mesma;
Apreciação doutrinária
1. Respondendo ao primeiro argumento, segundo o qual a vítima não pode
receber indemnização, visto que o bem vida não é avaliável pecuniariamente,
ninguém contesta este argumento. É certo que o bem vida não é avaliável em
termos pecuniários. De qualquer forma, é melhor indemnizar do que
absolutamente não fazer nada.
Esta indemnização é um direito novo que surge na esfera jurídica dos familiares
do de cujus. Não se trata aqui de uma indemnização que entra na esfera jurídica
do falecido e posteriormente transmitida por via sucessória.
Assim sendo, para o professor Galvão Teles, nos termos do art. 496,3 estão em
causa duas indemnizações:
A primeira é a que a vítima recebe pela morte e é transmitida aos sucessores pela
via sucessória normal ou seja, de acordo com a ordem estabelecida pelo art. 2133,
cc.
A segunda indemnização é atribuída por direito próprio pelos familiares em
virtude de terem perdido um ente querido. Quem recebe esta indemnização são
as pessoas indicadas no art. 496,2. Para este professor, só assim que se explica a
parte final do art. 496,3. CC.
Posição dos professores Spinoza Gomes da Silva e Pereira Coelho: Defendem estes
autores que, só está em causa uma indemnização que será atribuída às pessoas que
constam do art. 496,2. Não admitem aqui a indemnização por morte que
posteriormente é transmitida por via sucessória. No entanto, para se determinar
o valor da indemnização é necessário ter em conta dois factores:
1º os danos sofridos pelas pessoas que constam do art. 496,2 e
2º os danos sofridos pela própria vítima.
Professor Pamplona Corte Real: para ele, o art. 496,3 refere-se a 2 tipos de danos:
Os danos não patrimoniais sofridos pela própria vítima – relativamente a estes
será a própria vítima a receber a indemnização;
Os danos não patrimoniais sofridos pelos familiares da vítima.
O art. 496,3 aplica-se àquelas situações em que existe um lapso de tempo entre a
lesão que vai provocar a morte e a própria morte. Aplica-se àqueles casos em
que a morte não é imediata. Neste caso, a própria vítima vai receber uma
indemnização pela presciência da morte. O saber que se vai morrer causa
sofrimento e este sofrimento é um dano patrimonial que deverá ser
indemnizado. Neste caso em que existe um lapso entre a causa da morte e a
morte, a vítima deverá ser indemnizada: primeiro pelos danos causados pela
presciência da morte e segundo pelos danos ocorridos quando a morte não é
instantânea.
No entanto, a sucessão não seguirá a via sucessória normal, quer dizer, não
segue a lista indicado no art. 2133. A sucessão da indemnização far-se-á de
acordo com a lista indicada no art. 496,2, ou seja, aparece logo em primeiro
lugar o cônjuge, filhos, os ascendentes, irmãos, sobrinhos….
Para o professor Pamplona Corte Real, o artigo 496,3, parte final, (podem ser
atendidos não só os danos patrimoniais….) porque quando a morte for
instantânea, não existirá lapso de tempo entre a lesão e a própria morte e
portanto, não existe lugar a esta indemnização (por isso se diz podem….). Se a
morte for instantânea ninguém pode ser indemnizado pela presciência da morte
e não há tempo para que esta pessoa gaste dinheiro com as despesas de
medicamentos e outras…
2
Cfr. Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito da Família e das sucessões, 6ª edição, pag. 269.
3
Cfr. Cristina Araujo Dias. Lições de Direito das Sucessões. Pag. 50-51
1- Doação por morte (art. 946º): se a doação é feita por causa da morte, isto
é, se a morte do doador é causa da transmissão dos bens doados. De
acordo com a regra geral do artigo 946º, as doações por morte são
proibidas.
2- Doação em vida: se a doação produz imediatamente os seus efeitos,
atribuindo ao donatário um direito sobre os bens doados.
Cabe então fazer uma delimitação negativa daquilo que, embora com as
devidas aspas, não é uma sucessão mortis causa:
Rebuscando o artigo 2024º CC, a primeira questão que se coloca é como é que o
CC regula a transmissão dos bens por morte, como se processa a sucessão com
o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas
patrimoniais do falecido?
Sucessão legitimária: é deferida por lei e não pode ser afastada pela
vontade do autor da sucessão. “Diz respeito à porção de bens de que o
de cujus não pode dispor por estar destinada por lei aos herdeiros
legitimários, nos termos do artigo 2157º CC”.
Sucessão legitima: esta é também deferida por lei, porém pode ser
afastada pela vontade do autor da sucessão. De acorodo com o
artigo 2131º, são chamados à sucessão os herdeiros legítimos nas
situações em que o falecido não tenha disposto valida e
eficazmente, no todo ou em parte, dos bens que de que podia
dispor para depois da morte.
4
Deserdação (art. 2166º) O CC permite ao autor da sucessão privar o herdeiro legitimário da
quota legítima em testamento, isto é, impedir que um ou todos os herdeiros legitimários
venham a receber os bens após a sua morte. É a deserdação: deserdar um herdeiro legitimário
significa impedir que essa pessoa venha a receber os bens. Em todo o caso, esta possibilidade é
muito, mas muito limitada, só podendo fundamentar-se numa das situações previstas no artigo
supra. Por exemplo, se o filho não ligava aos pais, não queria saber deles, não se pode deserdar
com base nesse fundamento. Mais uma vez, a posição do legislador visa tutelar o valor
constitucional da família, embora na prática possa não ser muito justo, prestando-se a abusos.
Por ser um acto unilateral e individual, o testamento não pode ser feito em
conjunto com outra pessoa (é nulo o testamento conjunto). Para a sua validade,
requer a capacidade do agente, objecto licito e forma prescrita ou não defesa em
lei. A não observância das solenidades exigidas por lei, o acto pode considerar-
se nulo (art. 166,5,cc).
Também aqui não há sucessão por morte. Não se trata de pacto sucessório, um
vez que os bens são doados em vida, não são deixados pelo doador e não fazem
parte da sua herança. A partilha não é da herança, mas de bens presentes. A
partilha em vida é relativamente frequente e pode ter várias razões,
designadamente evitar futuros conflitos entre os herdeiros legitimários quanto
à partilha da herança. Em todo o caso, esta partilha apresenta certos
inconvenientes, como o de poder prejudicar interesses de alguns dos herdeiros
legitimários, nomeadamente em caso de variação do valor dos bens doados e a
de possibilitar que os doadores venham a encontrar-se em estado de carência.
Segundo Cristina Araujo5, “os bens que forem objecto de partilha em vida não são
restituidos à massa da herança para igualação da partilha, nos termos do artigo
2104º...”
5
Cristina Araujo Dias, Código Civil Anotado (Livro V, Direito das Sucessões), pg. 24.
Sempre que o herdeiro desconfie que a herança é deficitária, tem duas opções
ou alternativas:
Ou aceita
Ou não aceita a benefício do inventário.
Portanto, já fica “ab initio” protegido de responder aos encargos da mesma com
o seu património pessoal.
Ex: A e B são dois herdeiros em que A recebeu 3000 e B recebeu 1000 e uma dívida de
2000. A e B terão de pagar a dívida na proporção da sua quota. Assim, A pagará 1500 e
B 500.
Nos termos ainda do art. 2098, alei permite que os herdeiros convencionem
duas coisas:
sendo, não poderão demandar todos os herdeiros na proporção das suas quotas
e sim, o herdeiro que ficou responsável pelos encargos.
“Deixo meu carro ao Sousa que, todavia, terá que pagar a dívida ao mecânico”. Se
Sousa quiser ficar com o carro terá que pagar a dívida que o autor da sucessão
tem para com o mecânico. Nestas situações, temos duas posições divergentes:
Posição do Professor Pamplona Corte Real: neste caso concreto, o legatário vai
cumprir o encargo geral da herança, porque o que estava em causa era uma
dívida que pertencia ao decujus e portanto, teria que se pagar pelos bens da
herança.
Não obstante o encargo recair sobre o legatário e, desta forma ser ele o
responsável pelos encargos da herança, estaremos perante uma situação em que
o próprio legatário também será responsável pelas dívidas da herança.
Resumindo, por regra, quem tem que satisfazer os encargos da herança são os
herdeiros, ficando assim os legatários com um grande benefício em relação a
estes. As normas que prevêem que os herdeiros são responsáveis pelos
encargos da herança não são imperativas. O autor da sucessão pode determinar
que certos encargos que caberiam aos herdeiros recaiam sobre os legatários.
Direito de acrescer
O direito de acrescer funciona dentro de cada tipo de vocação. Significa que, os
herdeiros testamentários não acrescem sobre os herdeiros legais me os
herdeiros legais não acrescem sobre os testamentários.
Os herdeiros testamentários são aqueles instituídos pelo testamento e os
herdeiros legatários são os que constam da lei.
Ex: A faz um testamento e institui seus herdeiros B e C. Se um deles não quiser ou não
poder receber a parte que lhe compete, esta será dada ao outro.
Relativamente aos herdeiros, essa limitação não se verifica. Portanto, desde que
estejamos dentro do mesmo tipo de vocação, isto é, sucessão legal ou sucessão
testamentária, o direito de acrescer irá funcionar, independentemente de estar
em causa o mesmo bem ou bens diferentes (art. 2031 e 2137).