Revista Mente Afiada-Maio 24

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Mente Afiada - Ano 2, Nº 14 - Maio, 2024

GREEN FLAGS PRA PENSAR


Os sinais para Não é porque está na
reconhecer uma internet, que é verdade!
relação saudável
MITO OU
VERDADE
R$ 9,90

Existe amor à
primeira vista?

JEJUM DE DOPAMINA
Cortar todos os seus prazeres
momentâneos? Não é bem assim!
INÊS249

editorial
O EQUILÍBRIO É A CHAVE…
A dopamina é um neurotransmissor res- de desenvolvermos a autoconfiança, que
ponsável por diferentes funções cerebrais, só pode ser construída quando aprende-
dentre elas, a motivação. O ‘problema’ mos a cumprir o que assumimos com nós
pode estar na forma com que você se re- mesmos em nome dos nossos objetivos
laciona com essa substância, já que, para (principalmente pessoais!).
além das atividades saudáveis, a sensa- Também vamos explorar a lenda do
ção de recompensa imediata causada por amor à primeira vista: será que isso real-
ela pode ser o primeiro passo para desen- mente acontece? Além disso, nas próximas
volver algum tipo de vício. Mas calma, não páginas você vai aprender a reconhecer al-
é preciso cortar todas as atividades praze- gumas green flags, os sinais de um relacio-
rosas da sua vida, você vai entender tudo namento saudável. Bora afiar as mentes?
na nossa matéria de capa!
Por aqui você também irá encontrar Boa leitura,
uma conversa superlegal com a psicólo- Ana Kubata
ga Larissa Fonseca sobre a importância (anabeatriz.kubata@astral.com.br)

PRODUÇÃO GRÁFICA DA CAPA Roberta Lourenço ILUSTRAÇÃO Alphavector e tanuha2001/Shutterstock Images

MAPA DA MENTE AUTOCONFIANÇA MITO OU VERDADE OS DALTÔNICOS


As últimas e mais A importância de se Amor à primeira vista EMOCIONAIS
curiosas descobertas comprometer realmente acontece? A vida com o transtorno
da ciência consigo mesmo de personalidade
antissocial

DAR VOZ A QUEM NÃO JEJUM DE DOPAMINA: SÃO AS GREEN FLAGS HISTÓRIAS DE SUCESSO
SABE O QUE FALA FUNCIONA OU NÃO? QUE QUEREMOS! TE MOTIVAM?

sumário
A internet deixa Essa substância do Saiba como reconhecer O “viés de sobrevivência”
o caminho livre cérebro interfere nos os sinais de que o seu pode supervalorizar o
para espalhar a comportamentos relacionamento sucesso e subestimar
desinformação impulsivos é saudável o fracasso

COORDENADORA DE REVISTAS DIGITAIS Hérica Rodrigues (herica.rodrigues@astral.com.br)


REDAÇÃO Ana Carvalho (ana.carvalho@astral.com.br), Ana Kubata (anabeatriz.kubata@astral.com.br),
Fernanda Villas Bôas (fernanda.villasboas@astral.com.br) e Gabrielle Aguiar (gabrielle.aguiar@astral.com.br) ©2024 EDITORA ALTO
ASTRAL LTDA. TODOS OS
DESIGN Eugênio Tonon (eugenio.tonon@astral.com.br) e Roberta Lourenço (roberta.lourenco@astral.com.br)
DIREITOS RESERVADOS.
Ano 2, nº14 - maio 2024
MARKETING DIGITAL Marcelo Monico (marceloluiz.monico@astral.com.br) PROIBIDA A REPRODUÇÃO.

DIREÇÃO João Carlos de Almeida e Pedro José Chiquito CONTATO atendimento@astral.com.br


ENDEREÇO Rua Joaquim Anacleto Bueno, 1-70, Setor M83 - Jardim Contorno, Bauru - SP - CEP: 17047-281
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MAPA DA MENTE
Texto: Ana Kubata

ENTRE UM VÍDEO E OUTRO… uso excessivo do celular pode resultar


O hábito de rolar a tela do celular, com em dificuldades para controlar os im-
seu fluxo contínuo de conteúdos varia- pulsos, especialmente em jovens, cujo
dos, pode ser viciante devido à interação córtex pré-frontal ainda está em desen-
entre nossos impulsos de busca por pra- volvimento. Entramos em um estado de
zer e recompensa imediata, e a parte do fluxo ao rolar a tela, onde perdemos a
cérebro responsável por controlar esses noção do tempo e nos envolvemos pro-
impulsos. É o que diz Éilish Duke, pro- fundamente com o conteúdo. Embora
fessora de psicologia na Universidade a dependência do celular não seja ofi-
Leeds Beckett, no Reino Unido. cialmente reconhecida como um distúr-
Este comportamento é agravado bio psiquiátrico, é importante monitorar
por fatores ambientais, como o design nossos próprios hábitos e buscar ajuda
Ilustração: klyaksun/Shutterstock Images

dos aplicativos, que mantêm nossa se percebermos um impacto negativo


atenção e nos mantêm engajados. O significativo em nossa vida diária.

VOCÊ SE LEMBRA DOS SONHOS?


Um estudo conduzido pelo Laboratório cional e na consolidação da memória.
de Sono e Cognição da Universidade da Os pesquisadores observaram que os
Califórnia em Irvine, e publicado na re- participantes que se lembraram de seus
vista Scientific Reports, revelou que as sonhos mostraram melhor regulação
pessoas que relatam sonhar têm maior emocional e memória ao reagir a expe-
processamento de memória emocional. riências negativas do dia anterior, em
Isso sugere que os sonhos desempe- comparação com aqueles que não lem-
nham um papel ativo na regulação emo- braram dos sonhos.
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TESTE PARA ALZHEIMER


Uma pesquisa da Universidade de Loughbo-
rough, no Reino Unido, sugere que a perda de

Ilustração: lemono/Shutterstock Images


sensibilidade visual pode ser um indicador
precoce da doença de Alzheimer. Os pesqui-
sadores acompanharam mais de 8 mil pes-
soas por 13 anos e descobriram que aquelas
com sensibilidade visual reduzida apresen-
tavam maior probabilidade de desenvolver
demência. O teste de sensibilidade visual
usado no estudo mostrou resultados signifi-
cativos na detecção precoce da doença.

PSILOCIBINA PARA ANOREXIA


Além dos estudos que já destacam a ver-
satilidade da psilocibina, derivada de co-
Ilustração: Dicky Arnanda/Shutterstock Images

gumelos, em tratamentos de dependência


química, como alcoolismo e tabagismo,
uma pesquisa recente revelou que a subs-
tância demonstra eficácia no tratamento
da anorexia nervosa, oferecendo melhorias
significativas na manutenção do peso cor-
poral e na flexibilidade cognitiva em ratos
de laboratório. Esta condição, caracteriza-
da por comportamentos alimentares res-
tritivos e exercícios excessivos, apresenta
uma das maiores taxas de mortalidade en-
tre as doenças psiquiátricas. A pesquisa,
publicada na revista Molecular Psychiatry,
identificou um mecanismo cerebral espe-
cífico pelo qual a psilocibina atua, abrindo
caminho para terapias direcionadas.
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AUTOCONFIANÇA
NÃO NASCE,
É CONSTRUÍDA
E está diretamente ligada à habilidade de cumprir os
compromissos que assumimos com nós mesmos
Texto: Ana Kubata

Ilustração: tannikart/Shutterstock Images


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S
e pedirmos para o Google defi- ça fazem com que você acredite que
nir o que é autoconfiança, a ex- não será capaz de superá-los. “Essa
plicação será simples: ‘acredi- falta de confiança pode nos levar a nos
tar que você consegue atingir seus subestimar e a aceitar menos do que
objetivos, buscando fazer o seu melhor’. merecemos também em nossas vidas
Mas sabia que a autoconfiança tem tudo pessoais e profissionais”, aponta a es-
a ver com os compromissos que assu- pecialista.
mimos com nós mesmos? Afinal, ela só
pode existir quando temos autonomia o TE DISTANCIA DE CHEGAR
suficiente para resolver os próprios pro- ONDE QUER
blemas, ou melhor, entender o porquê O problema em procrastinar vai além
optar por resolução x, e não y. Calma que de simplesmente adiar uma tarefa ou
vai ficar mais fácil de entender… outra no trabalho. “A procrastinação
pode adiar ações importantes. O medo
AUTOSSABOTAGEM: do fracasso pode paralisar a iniciativa
O MAIOR VILÃO e a persistência necessária para alcan-
Larissa Fonseca, psicóloga clínica há 15 çar objetivos pessoais”, destaca Laris-

Ilustração: eamesBot/Shutterstock Images


anos, explica que viver sem autoconfian- sa, que também aponta outros grandes
ça é como se estivéssemos tentando obstáculos nesse processo: “O auto
construir uma casa em um terreno ins- questionamento pode minar a confian-
tável, e isso afeta diretamente a forma ça pessoal; a falta de autoconhecimen-
como nos comprometemos conosco e to pode levar a metas pouco realistas
com nossos objetivos. “A falta de con- e incompatíveis com as necessidades
fiança pode nos fazer duvidar de nossas individuais; enquanto a pressão dos pa-
próprias capacidades e nos levar a evi- drões sociais pode levar a compromis-
tar compromissos importantes. Quando sos não autênticos.”
não confiamos em nós mesmos, é difícil
estabelecer metas realistas e nos com-
prometer com elas”, afirma.
É por isso que muitas vezes você
acaba procrastinando ou desistindo
facilmente diante do pri-
meiro obstáculo, pois
as crenças limitan-
tes e despidas
de autoconfian-
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NADA DE IGNORAR volvimento ao longo da vida, pois fun-


OS SENTIMENTOS ciona como um alicerce sólido que sus-
A autoconfiança é construída através tenta nossas realizações e conquistas,
de muitos pontos de partida. É o que como afirma Larissa. “A autoconfiança
pode ser chamado de ‘trabalho de for- nos dá a coragem necessária para en-
miguinha’, além de ser importante con- frentar desafios, experimentar novas
tar com a ajuda de familiares, amigos oportunidades e buscar nossos obje-
e, principalmente, profissionais da área tivos. Ela nos capacita a superar obs-
de saúde mental, é preciso lembrar que táculos, aprender com nossos erros e
trata-se de uma evolução. Acontece seguir em frente com determinação.”
aos poucos, com cuidado, paciência e
muita observação. “A autoconfiança fortalece
Ou seja, anular as próprias emo- nossa resiliência emocional,
ções está fora de questão. “Quando permitindo-nos lidar melhor
nos deparamos com momentos de dú- com as adversidades e rejeições
vida e insegurança, é essencial acolher que encontramos ao longo do
esses sentimentos com compaixão. caminho.”
Portanto, aceitar tal insegurança e de-
safiar pensamentos negativos, quando
estabelecemos metas realistas, ajuda AS RELAÇÕES TAMBÉM PEDEM
superar esses momentos”, esclarece a AUTOCONFIANÇA
psicóloga. Ainda de acordo com a psicóloga, cul-
tivar essa segurança em si mesmo não
“Aceitar: sempre que fazemos apenas influencia positivamente o de-
algo novo, sentimos certo frio na senvolvimento pessoal, mas também
barriga, insegurança. Mesmo que tem um impacto significativo nos rela-
esse desconforto exista, continue cionamentos interpessoais - em qual-
e se desafie.” quer esfera da vida - assumindo um pa-
pel crucial na qualidade e na natureza
dessas interações. “Nos relacionamen-
NÃO DEFINE O MOMENTO, tos pessoais, indivíduos autoconfiantes
E SIM A VIDA tendem a estabelecer vínculos mais
O mais importante de tudo é entender profundos, possibilitando uma comuni-
que cultivar a autoconfiança não é algo cação mais objetiva e direcionada. Isso
para ser trabalhado por um tempo e de- contribui para a construção de relacio-
pois esquecido. Essa é uma habilidade namentos sustentáveis ao longo do
essencial para o crescimento e desen- tempo”, descreve.
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Já no contexto profissional, a es- “A prática da autocompaixão tam-


pecialista diz que a autoconfiança é bém se revela essencial”, aponta a
percebida como uma qualidade de va- profissional, que explica o porquê da
lor. “Isso acontece pois é uma postura afirmação: “Ao adotar uma postura com-
associada a eficácia no desempenho e passiva consigo mesmo, reconhecendo
a liderança assertiva nas relações inter- e aceitando as falhas como oportunida-
pessoais. Indivíduos autoconfiantes são des de aprendizado, a autoconfiança é
mais propensos a assumir riscos calcu- cultivada de maneira mais resiliente.”
lados, buscar oportunidades de desen-
volvimento e alcançar metas profissio- E SEJA POSITIVO
nais”, pontua. Por fim, mas não menos importante, pre-
cisamos valorizar os pensamentos posi-
SEJA REALISTA… MAS TENHA tivos sobre nós mesmos, e mais que isso,
COMPAIXÃO POR VOCÊ! desafiar nossa mente quando as ideias
Como já dito, estabelecer metas realis- negativas tomarem conta dela. “Ao ques-
tas é fundamental, porque ao delinear tionar e substituir padrões autodeprecia-

Ilustração: OlyaOK/Shutterstock Images


objetivos mensuráveis e alcançáveis, tivos por narrativas mais realistas e cons-
fragmentando-os em tarefas menores, trutivas, a autoconfiança é fortalecida”,
você pode gradualmente consolidar orienta Larissa. Celebrar conquistas, por
sua confiança à medida que cada eta- menores que sejam, é igualmente relevan-
pa é concluída com sucesso. Porém, te nesse processo. “Reconhecer e valori-
essa não é a única estratégia indica- zar os progressos alcançados contribui
da para trabalhar essa segurança em para a construção de uma autoimagem
você mesmo. positiva e segura”, conclui a especialista.
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AMOR À
PRIMEIRA VISTA:
MITO OU
VERDADE?
Fomos desvendar a maior lenda dos contos de fadas
Texto: Ana Carvalho

Ilustração: mentalmind/Shutterstock Images


INÊS249

A
h, o amor! Se não é a maior ins- A MENTE APAIXONADA
piração para canções, filmes, O especialista explica que diversas
livros e novelas mundo afora, áreas do cérebro se ativam para cada
definitivamente está entre as maiores. sentimento afetivo. “Quando há atra-
Mas além de ser motivo para tantas cria- ção, áreas como amígdala e hipotálamo
ções, esse sentimento também está li- são acionados. Já na paixão, o circuito
gado a diversos mitos e um dos princi- mesolímbico dopaminérgico atua com
pais é sobre a existência do amor à maior intensidade, enquanto no amor de
primeira vista… Mas será que é mito longo prazo, gânglios da base e núcleos
mesmo? A Mente Afiada conversou com da rafe no tronco cerebral operam com
Fernando Gomes, neurocientista e pro- maior frequência”, explica.
fessor livre docente da Faculdade de É por isso que quando estamos apai-
Medicina da USP, para descobrir! xonados, ficamos mais elétricos só de
ver a pessoa que amamos, essa “eletri-
cidade” é fruto das descargas de dopa-
mina, também chamada de hormônio
da recompensa. Enquanto aquele amor
de anos é bem mais tranquilo.
“Na paixão à primeira vista, a nora-
drenalina provoca uma sensação de
extrema expectativa e ansiedade, já a
dopamina produz uma sensação de
prazer, e a serotonina em níveis mais
baixos produz uma escolha obsessiva
por algo romântico, e é tudo isso que
causa esse comportamento e sensa-
ção de grande significado já depois de
Ilustração: Nadya_Art/Shutterstock Images
um primeiro encontro, por exemplo”
adiciona o profissional.

EMOCIONADO NÃO, ESTIMULADO!


Se você é do tipo que pensa que encon-
trou o amor da vida ao menos duas vezes
por ano, saiba que a explicação pode ser
neurológica! “Pessoas que se apaixo-
nam mais do que outras podem ter uma
predisposição a um recrutamento mais
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facilitado do circuito mesolímbico dopa- DUAS CURIOSIDADES


minérgico, sendo mais sensíveis ao estí- SOBRE AMOR
mulo de afetividade com outra pessoa”, Um beijo para… Alimentar? Em al-
explica Fernando. Agora você pode usar guns locais da Papua Nova Guiné, na
essa sempre que seus amigos te acusa- Oceania, o beijo serve para que os
rem de ser emocionado… pais mastiguem os alimentos e os
passem às crianças pequenas. Já en-
MAS E PARA CIÊNCIA: EXISTE OU tre os povos inuítes, é o famoso ‘bei-
NÃO AMOR À PRIMEIRA VISTA? jo de esquimó’, com os narizes, que
Para o terror dos não românticos, a res- realmente demonstra intimidade.
posta é sim! Mas calma. Um exemplo Mono vs Não Mono: A discussão
entre os animais, é o arganaz do campo, que reina no X (antigo Twitter), tam-
que demonstra a formação de um víncu- bém ocupa o reino dos animais… Bem,
lo afetivo duradouro e estável já após o mais ou menos: no time dos mono-

Ilustração: MPetrovskaya/Shutterstock Images


primeiro encontro. gâmicos, teremos os lobos, cisnes,
“Já entre humanos, só o tempo vai di- urubus e albatrozes. Já no time dos
zer se virou amor, mas a atração física é que não terão somente um parceiro
a porta de entrada para que isso perdure, sexual, estão a maioria dos peixes,
e ela pode vir com diversas explicações, dos anfíbios e até dos mamíferos.
como um rosto familiar, um tom de voz Os leopardos, por exemplo, preferem
ou um determinado padrão de beleza, uma vida mais solitária e terão par-
cheiros, enfim, elementos que tragam a ceiros somente enquanto acasalam
sensação de familiaridade”, finaliza. ou criam os filhotes.
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OS DALTÔNICOS
EMOCIONAIS

Ilustração: woocat/Shutterstock Images

O transtorno de personalidade antissocial (TPAS)


gera falta de empatia e torna muito difícil
construir relações sólidas
Texto: Ana Kubata

O
transtorno de personalidade uma a cada cem pessoas convive com o
antissocial (TPAS) é uma de- transtorno e, de acordo com estes dados,
sordem neuropsiquiátrica que, no Brasil teríamos por volta de 2 a 4 mi-
segundo estudos acadêmicos mais re- lhões dessas pessoas que, tomando aqui
centes, atinge por volta de 1% a 2% da uma liberdade com as palavras, podemos
população mundial. Isso significa que chamar de ‘daltônicos emocionais’.
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O QUE É O TPAS “É como se ela fosse o centro do univer-


Segundo Danielle H. Admoni, psiquiatra so e os outros estivessem ali em fun-
geral e da Infância e Adolescência, pes- ção dela”, acrescenta Danielle.
quisadora e supervisora na residência Segundo a psiquiatra, algumas pes-
de Psiquiatria da Universidade Federal soas com o transtorno de personalidade
de São Paulo (UNIFESP/EPM) e espe- antissocial são muito inteligentes e con-
cialista pela ABP (Associação Brasilei- seguem conviver em sociedade, mas, na
ra de Psiquiatria), o transtorno de per- verdade, não têm relações sólidas, se-
sonalidade antissocial acompanha a jam afetivas ou de amizade. “Às vezes
pessoa ao longo da vida. “Basicamen- podem até acabar cometendo crimes,
te, o indivíduo sente dificuldade de se para justificar o que elas acham certo,
relacionar e ter empatia com as outras tudo em benefício próprio”, aponta.
pessoas”, explica a médica.
TRAUMAS DO LAR
“O que mais chama a atenção Ainda de acordo com Danielle, não há
é essa falta de empatia que estudos suficientes que definam, de
nós, como seres humanos, que fato, a possível causa do TPAS nos indi-
convivemos em sociedade, víduos, o que existem são algumas teo-
obrigatoriamente precisamos ter.” rias. “Sabemos que se você tem pai ou

Ilustração: sneg/Shutterstock Images


mãe com transtorno de personalidade,
A FALTA DE EMPATIA tem uma chance maior de ter também.
Assim, quem é portador do TPAS opta Ou se sofreu algum trauma importante
por fazer tudo em sua vida para benefí- na infância, como um abandono, uma
cio próprio, mesmo que isso signifique violência muito grave ou uso de subs-
‘passar por cima’ de outras pessoas e tâncias na gestação. Mas ainda não há
machucá-las, às vezes até fisicamente. nada bem definido.”
INÊS249

“O que sabemos é que essas


pessoas dificilmente vêm de
famílias funcionais e amorosas,
em geral têm uma história familiar
na infância bastante difícil.”

NÃO É TEA!
Há uma confusão bastante equi-
vocada do senso comum que re-
laciona o transtorno de personali-
dade antissocial com o transtorno
do espectro autista. A psiquiatra
especialista explica que são condi-
ções completamente diferentes. “A
pessoa com espectro autista tem
Ilustração: cosmaa/Shutterstock Images

uma cognição social alterada do


outro, podendo ter dificuldade em
compreender as emoções alheias.
Mas é bem diferente do antisso-
cial, porque no primeiro caso exis-

Ilustração: Iconic Bestiary/Shutterstock Images


te, sim, uma empatia, não é alguém
que justifica as coisas apenas den-
tro do que ela acredita”, detalha.
“Uma coisa é o transtorno de per-
sonalidade antissocial, onde não
existe empatia em relação ao outro,
e outra é o transtorno do espectro
autista, onde existe empatia, mas
há uma dificuldade de compreen-
são do outro”, reforça Danielle.
ta a profissional. “É importante buscar
TEM CURA? psicoterapia, a terapia analítica, ou a
Infelizmente, não há cura para o trans- Cognitivo-Comportamental (TCC), e a
torno de personalidade antissocial, que orientação familiar. As pessoas têm que
pode acompanhar a pessoa durante aprender a lidar com essa pessoa, mas
toda a vida. Mas tem, sim, como alcan- não há uma cura, é algo que acompanha
çar algum tipo de melhora, como orien- a pessoa ao longo da vida”, conclui.
INÊS249

O PERIGO DE DAR
VOZ A QUEM NÃO
SABE O QUE FALA

Ilustração: Alphavector/Shutterstock Images


Ao mesmo tempo em que há muita informação
importante sendo democratizada, a internet deixa
o caminho livre para a desinformação

Texto: Ana Kubata

A
Que as redes sociais abriram meio de compartilhar conhecimentos,
um leque de possibilidades descobertas, e até criar um espaço para
para buscar informação, não discussão - e tudo isso é muito positi-
dá pra negar. O ambiente vir- vo quando pensamos em democratizar
tual é um espaço onde profissionais, sabedoria. Mas será que essa liberdade
pesquisadores e estudiosos sobre de- realmente tem gerado bons resultados?
terminados temas podem utilizar como Muitas vezes, não.
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do advento e crescimento desenfreado


ONDE O PROBLEMA COMEÇA da internet e suas tecnologias - quem
Apesar da informação chegar fácil, há detinha o monopólio da informação e
também o outro lado da moeda, em que de criação de paradigmas eram institui-
muitas pessoas aproveitam essa liber- ções oficiais. “Com a fragmentação dos
dade de forma equivocada e até prejudi- canais de comunicação, a sociedade
cial. Quem nunca rolou o feed e se depa- vem perdendo as referências desses pa-
rou com algum conteúdo sobre saúde, radigmas, e por isso buscam seus valo-
política, ou até questões de comporta- res de outras formas “outras formas, em
mento, vindo de alguém sem nenhuma outros meios”, comenta o profissional.
propriedade para falar sobre o assunto? Em outras palavras, significa que,
Ilustração: GoodStudio/Shutterstock Images

Ou pior, alguém com autoridade, mas para que isso tenha ocorrido (e continue),
passando informações incorretas? É so- as instituições de autoridade em um as-
bre isso que vamos falar aqui. sunto específico passaram a ser desa-
creditadas, principalmente por meio de
MOVIMENTO DE teorias da conspiração. “Na pandemia
DESCREDIBILIZAÇÃO da COVID-19, por exemplo, vimos ata-
O sociólogo, filósofo e escritor Luiz Feli- ques à credibilidade das instituições de
pe Gonçalves diz que devemos levar em saúde, desde a OMS, até à própria ciên-
conta que até certo tempo atrás - antes cia”, pontua Luiz.
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“Ao minar as fontes de referência, tecnologia foi o grande fator que im-
cria-se um vácuo para que novas pulsionou esse processo. “A facilidade
referências sejam imputadas. em se ter um palanque virtual para fa-
E como as fontes hoje são lar com milhares, às vezes até milhões
fragmentadas e de nicho, criam-se de pessoas, permite suprir a necessi-
quantas verdades são desejadas.” dade - já desregulada - de dopamina de
uma forma muito negativa”, destaca.
Ele também alerta para os riscos
A FONTE DO PROBLEMA cognitivos e a longo prazo que esse com-
Para Luiz Gonçalves, as redes sociais portamento pode causar. “A repetição
têm um papel central nessa proble- de discursos rasos contribui para a dis-
mática por três principais motivos: seminação de informações incorretas,

1 dissemina o enfraquecimento de
instituições de autoridade cien-
tífica;
o que prejudica a tomada de decisões
bem fundamentadas e a compreensão
adequada de determinados temas, além

2 oferece os meios para que in-


formações alternativas sejam
publicadas;
de limitar a percepção da pessoa sobre
temas importantes.”

3 repete para o público insistente-


mente as informações desejadas
– e não necessariamente as verda-
OS APROVEITADORES
ESTÃO ON-LINE
Para Luiz Carvalho, muitas pessoas que
deiras – por meio dos algoritmos. disseminam essas pseudoinformações
“Além disso, os algoritmos pro- fazem isso de forma quase que… ino-
movem uma polarização: não só o cente. Não há maldade, a princípio, nes-
leigo, paradoxalmente, formula uma sa atitude. “Elas acreditam que estão
opinião sobre uma verdade científica, ajudando outras pessoas, e se sentem
mas também cria hostilidade contra impelidas a compartilhar justamente
quem pensa diferente”, acrescenta o por elementos usados no conteúdo,
sociólogo. como gatilhos mentais estratégicos”,
aponta o neurocientista.
Por isso é preciso tomar muito cui-
É ‘FÁCIL’ FALAR QUALQUER dado com o conteúdo consumido, pois
COISA, EM QUALQUER LUGAR a internet está cheia de gente que só
Luiz Felipe Carvalho, formado em neu- quer se aproveitar da desinformação
rociências pela Logos University Inter- ou ingenuidade alheia, e utilizam sua
national, traz uma visão complemen- imagem e voz para mentir, alienar e até
tar sobre o assunto, e concorda que a aplicar golpes (emocionais ou financei-
INÊS249

ros). “Muitos praticam manipulação de- uma mudança de hábitos, de ideologias,


liberada e como, na maioria das vezes de igreja, etc. Dessa forma, buscamos in-
não há ganho direto, o grande objetivo formações que confirmem os conceitos
é chamar a atenção.” ou hábitos que já temos”, explica.

É CONFORTÁVEL O EFEITO DUNNING-KRUEGER:


PERMANECER NO ERRO JÁ OUVIU FALAR?
O sociólogo Luiz Gonçalves também Para elucidar um pouco mais esse ce-
atribui essa onda de desinformação a nário, Luiz Gonçalves contou a história
um outro viés, o de que as ‘verdades’, ao do estudo feito por dois cientistas: David
contrário do que podemos pensar, têm Dunning e Justin Krueger. Foram feitos
muito mais apelo à emoção do que à ra- dois testes para dois grupos diferentes,
zão. “As pessoas preferem estar certas sendo um para especialistas e outro
do que erradas”, pontua. Além disso, a para não-especialistas sobre um deter-
base para que as pessoas formem uma minado assunto.
opinião costuma ser mais pautada na Um teste era sobre o quanto a pessoa
própria experiência, do que na análise achava que sabia sobre a matéria, e o outro
de várias outras, como seria feito em um era um teste de proficiência sobre o tema
trabalho científico mais rigoroso. em questão. “Obviamente, os especialis-
Imagem: MicroOne/Shutterstock Images

Como exemplo, Luiz cita um pensa- tas foram muito melhor que os leigos na
mento muito compartilhado no senso co- proficiência, e, surpreendentemente, pior
mum: “A avó da minha vizinha fumou a no quanto achavam que sabiam sobre o
vida inteira, e nunca teve nenhum proble- assunto”, pontua o sociólogo.
ma de saúde”. De acordo com ele, essa
tendência é uma porta aberta a vieses de “A conclusão do Efeito Dunning-
confirmação. “Ser contrariado por uma Krueger é: quanto menos se sabe
verdade científica pode pressionar por sobre algo, mais se acha que se
sabe, e vice-versa.”
INÊS249

JEJUM DE
DOPAMINA:
FUNCIONA
OU NÃO?
Entenda como essa substância do cérebro interfere nos
comportamentos impulsivos e saiba como se programar
para garantir mais saúde mental
Texto: Fernanda Villas Bôas

S
erá que uma mudança de há- o jejum de dopamina. Ele propôs que as
bitos pode regular a ação dos pessoas reduzissem comportamentos
neurotransmissores a ponto considerados impulsivos, capazes de
de promover uma melhoria no funcio- atrapalhar o dia a dia e o próprio equilí-
namento do cérebro? Essa é uma per- brio emocional. E listou uma relação de
gunta de milhões! A resposta, que não atividades, associadas à sensação de
é tão simples, vem gerando um debate bem-estar, que poderiam se transformar
entre defensores e opositores de um em vícios: comer para aliviar dores emo-
método que ficou conhecido como je- cionais; acessar a internet para jogar ou
jum de dopamina. verificar redes sociais; fazer compras
Tudo começou em 2019. Naquele num ritmo excessivo; consumir mate-
ano, o psiquiatra estadunidense Came- rial pornográfico regularmente; buscar
ron Sepah, da Universidade da Califórnia, novidades a todo instante (sobretudo,
em São Francisco (EUA), publicou um no meio digital); e usar drogas com fi-
estudo em que defendeu um método – nalidade recreativa.
INÊS249

Em outras palavras, se as pessoas nervoso central. Também chamada de


passassem, por exemplo, a restringir mensageiro químico, ela é responsável
o uso do celular e revisassem a quali- por diferentes funções cerebrais, como
dade da alimentação poderiam inibir a controle de movimentos, capacidade de
dependência que os abusos dessas ati- concentração, formulação de desejos
Ilustração: solar22/Shutterstock Images

vidades provocam. Sepah fez mais: re- e ativação de impulsos. E também por
comendou a aplicação da chamada te- uma função que deve ter interessado ao
rapia cognitiva-comportamental (TCC) autor da expressão “jejum de dopami-
para fundamentar seu método. Essa na”: a motivação.
abordagem psicoterapêutica, criada Motivação gera prazer, bem-estar.
nos anos 1960, convida o paciente a Por exemplo: quando você começa a
modificar pensamentos e atitudes para fazer exercícios físicos e nota a perda
aliviar o sofrimento emocional. de quilos na balança, pode sentir um
entusiasmo redobrado para continuar
GATILHO DO PRAZER batendo ponto na academia e pres-
E o que isso tem a ver com a dopamina? tar mais atenção ao que come. Nesse
Tudo. Mas vamos por partes. Dopami- caso, tanto o treino quanto a refeição
na é um neurotransmissor, ou seja, um serão detonadores de gratificação, por-
composto que articula a comunicação que estarão carregando um propósito
entre os neurônios, as células do sistema – a tal motivação.
INÊS249

Isso acontece, porque a dopamina Da mesma forma, ler um bom livro


está vinculada ao sistema de recom- pode incrementar o repertório intelectual,
pensa do cérebro. Porém, não é papel o que talvez não aconteça se dedicarmos
do cérebro atribuir valor ou hierarquizar horas e horas do nosso tempo livre aos
o tipo de estímulo ao qual iremos rea- joguinhos virtuais. Nas duas situações, o
gir. Ou seja, treinar na academia pode cérebro vai responder com gratificação
ser tão satisfatório como devorar um – cabe a cada um discernir o que é mais
prato de salgadinhos fritos em frente à favorável para a saúde física e mental.
TV. Nos dois casos, lembrar essa expe- Isso significa que o tal jejum de do-
riência pode nos levar a repeti-la para pamina, de fato, funciona? Ou seja, ele-
reconquistar a sensação de prazer, cer- ger atividades cotidianas associadas a
to? Depende. satisfações menos instantâneas pode
“Quando nos mantemos motivados mesmo melhorar o funcionamento do
para alcançar um objetivo e, assim, es- cérebro? “Recompensas fáceis e imedia-
tabelecemos disciplina, aí está uma tas, como prazeres que não requerem
das atividades da dopamina”, esclare- esforço, podem, de fato, sequestrar o
ce o médico neurocirurgião funcional nosso processamento cerebral e reduzir
Ilustração: Blueastro/Shutterstock Images

com formação pelas universidades de nossa motivação para gestos construti-


Oxford e Florida, Bruno Burjaili. Ele ensi- vos mais complexos, que só trariam be-
na que, para priorizar práticas que pro- nefícios mais adiante”, explica Bruno.
vocam bem-estar, é preciso reconhecer Faz parte dessas recompensas fá-
os resultados positivos que decorrem ceis tudo o que foi relacionado pelo psi-
de cada uma delas. Assim, frequentar a quiatra californiano como atividades vi-
academia é benéfico para a saúde; co- ciantes, incluindo excesso de álcool, de
mer de forma descontrolada, não. smartphone e até de estímulos sexuais.

QUÍMICA DO CÉREBRO FELIZ

Ocitocina Serotonina Endorfina Dopamina


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8 CURIOSIDADES SOBRE A ERRO DE INTERPRETAÇÃO


DOPAMINA Mas é claro que isso não significa ra-
1. É um neurotransmissor. Ou seja, faz dicalizar e manter distância eterna de
a comunicação entre os neurônios; uma sobremesa saborosa ou do sho-
2. Movimentos, desejos, impulsos, pping em semana de liquidação. O se-
prazer e concentração dependem da gredo, dizem os especialistas, é a pon-
dopamina; deração. Por isso, o jejum sugerido pelo
3. À medida que envelhecemos, os ní- médico não é exatamente uma absten-
veis de dopamina no cérebro caem. Na ção de rotinas que geram prazer, e sim
verdade, o envelhecimento afeta o fun- um controle dessas rotinas.
cionamento cerebral como um todo; O fato é que nem todo mundo enten-
4. A produção de dopamina é redu- deu assim quando Cameron Sepah divul-
zida em pessoas que desenvolvem gou o jejum de dopamina. Nos últimos
Parkinson. Também há disfunção da anos, a proposta do psiquiatra se trans-
dopamina em quem apresenta TDAH formou em um atalho para alavancar a
(Transtorno do Déficit de Atenção e Hi- produtividade entre os profissionais do
peratividade) e dependência química; Vale do Silício, em São Francisco, reco-
5. A dopamina foi descoberta em nhecido como um dos principais pólos
1959 pelo farmacologista sueco Ar- tecnológicos do mundo.
vid Carlsson; Muitos desses profissionais levaram
6. Essa descoberta rendeu um prêmio as instruções de Sepah ao pé da letra e
Nobel de Medicina e Fisiologia a Carl- passaram a avaliar a possibilidade de
sson, uma vez que fomentou a pesqui- espaçar mais as atividades prazerosas
sa de medicamentos contra a doença entre os compromissos diários, ava-
de Parkinson; liando que menos celular, menos sexo
7. O tratamento de pessoas que so- e menos diversões interativas elevaria
frem de Parkinson com movimentos a qualidade dessas experiências cada
comprometidos inclui uma espécie de vez que elas fossem retomadas, já que
reposição da dopamina: o levodopa; eles estariam “estocando” dopamina
8. O uso experimental de levodopa no cérebro.
em pacientes com Parkinson aparece Acreditaram também que essa de-
no filme Tempo de Despertar (1991), sintoxicação de prazeres poderia fa-
com Robert de Niro no papel do pa- vorecer as ações cognitivas, já que as
ciente e Robin Williams como o médi- distrações as encolheriam, o que seria
co que administra a medicação. Eles muito oportuno para quem deseja tra-
protagonizam uma amizade marcada balhar mais e melhor num ambiente al-
por reveses, surpresas e superações. tamente competitivo.
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Sepah tratou logo de desfazer o mal- net nem fazer compras desnecessárias.
-entendido. No Health Blog, que perten- Nesse dia, o ideal seria interagir mais
ce à Faculdade de Medicina da Univer- com pessoas próximas, visitar parques,
sidade de Harvard (EUA), aparece um ler, meditar, ouvir música e experimentar
trecho de uma entrevista em que ele treinamentos que expandam a espiritua-
comenta a interpretação equivocada lidade ou promovam vivências de sensi-
do seu método. O psiquiatra admite ter bilização – terapias corporais, escutas,
criado um título atraente para despertar artesanato. Dessa forma, ficaria muito
o interesse das pessoas, sem imaginar mais fácil estreitar o contato com gente
que elas absorveriam o sentido literal querida, alegrar-se com coisas simples,
da expressão “jejum de dopamina” (em praticar o autoconhecimento e, finalmen-
inglês, dopamine fasting). te, assumir o controle da própria vida.
O blog reforça que, apesar de o nível
de dopamina aumentar no cérebro após SEIS HÁBITOS VICIANTES
a realização de uma prática que gera O método jejum de dopamina propõe
satisfação, o inverso não é verdadeiro: a redução das seguintes atividades:
“A dopamina não diminui quando você
evita atividades superestimulantes, por-
tanto, um ´jejum´ de dopamina não re-
duz, de fato, os níveis de dopamina”.

APRENDA A APROVEITAR
O MÉTODO
Uma vez que a abstenção de atividades
prazerosas não é o caminho para o cé-
rebro funcionar melhor, como utilizar
de maneira prática o jejum de dopami- • Comer para aliviar sofrimento ou
na? O blog da Universidade de Harvard pressão emocional;
Ilustração: Nadia Snopek/Shutterstock Images

destaca que Cameron Sepah aconselha • Acessar a internet por longos


pequenas ações no dia a dia. O mais períodos para jogar ou acompanhar
indicado é que essas ações não pertur- redes sociais;
bem nem descaracterizem o estilo de • Comprar compulsivamente;
vida de cada um. • Consumir material pornográfico
Uma das sugestões é se afastar das com regularidade;
práticas viciantes uma a quatro horas • Dar vazão à avidez por novida-
por dia. Outra alternativa é eleger o sába- des (bombardeio de informações)
do ou o domingo para não utilizar a inter- • Usar drogas recreativas.
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SAÚDE EMOCIONAL EXIGE errado e em excesso. Com isso, em


EXERCÍCIO DE CONCILIAÇÃO última instância, ser um passo para o
Como preservar a saúde emocional infarto, o AVC (acidente vascular cere-
diante de tantos estímulos, sobretu- bral), o câncer”, adverte o médico. Ou
do tecnológicos? “Em uma palavra, seja, o melhor é reconsiderar e ouvir
amor”, diz o neurocirurgião Bruno aquele outro lado do cérebro que en-
Burjaili. Ele compreende esse termo coraja decisões racionais.
como um exercício de conciliação. Burjaili compara o cérebro a uma
“Devemos entender o amor como a orquestra com vários músicos, que
nossa capacidade de sustentar con- tocam instrumentos diferentes e
tradições e analisá-las sem impulso, acompanham partituras distintas.
por um desfecho melhor para o todo”. Devemos regê-la com sabedoria e
Pense numa torta holandesa: ela é sensibilidade: “Um bom maestro
apetitosa, vistosa, convidativa. O lado consegue dirigir esse processo para
instintivo do seu cérebro vai forçar que a música seja agradável ao final.
você a consumi-la: a ingestão de açú- Redes cerebrais brigando geram dor
car combinado com gordura represen- e infelicidade. A saúde mental depen-
ta uma explosão de prazer ao paladar. de da nossa capacidade de construir

Fontes: https://onlinelibrary.wiley.com e https://www.health.harvard.edu/blog


“Mas esse doce pode atrapalhar uma pontes produtivas entre elas para
refeição balanceada e predispor à obe- que possam processar informações
sidade se for consumido no momento em conjunto, em paz”.
Ilustração: Buravleva stock/Shutterstock Images

“Redes cerebrais brigando geram dor e infelicidade. A saúde mental


depende da nossa capacidade de construir pontes produtivas entre elas.”
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SÃO AS
GREEN FLAGS
QUE QUEREMOS!
Saiba como reconhecer os sinais de que
o seu relacionamento é saudável
Texto: Gabrielle Aguiar

A
internet adora fazer brincadei- atenção às green flags – bandeiras ver-
ras de como ignoramos as red des – para podermos identificar os si-
Ilustração: Nadya_Art/Shutterstock Images

flags, ou bandeiras vermelhas nais positivos de que o relacionamento


em tradução literal, de alguém, o que é saudável.
faz com que, muitas vezes, entremos Se você já sofreu muito no amor, a
em relacionamentos que não são sau- Mente Afiada pediu ajuda a Karine Bon-
dáveis. Mas se o certo é que fiquemos fim Pereira, psicóloga supervisora da
atentos as red flags, para que possa- Conexa, ecossistema digital de saúde
mos fugir a qualquer sinal de que algo integral, para te ensinar os pontos que
está errado, também devemos prestar devemos reconhecer.
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QUAIS SÃO AS GREEN FLAGS feitas de pessoas reais. É importante


PARA RECONHECER QUE O entender o que faz parte de uma relação
RELACIONAMENTO É SAUDÁVEL? saudável, incluindo desentendimentos
“Acredito que um relacionamento sau- e discordâncias, e reconhecer aquilo
dável é aquele que, em essência, os par- que ultrapassa os limites do respeito e
ceiros respeitam a individualidade um da individualidade de cada membro da
do outro, mutuamente”, pontua a psicó- relação”, indica.
loga. “É um ambiente em que você pode
ser autêntico, sem medo do julgamento NÃO ESTOU VENDO!
ou sem precisar se moldar ao desejo do Assim como temos dificuldade para re-
outro, sentindo-se bem consigo mes- conhecer as red flags de alguém, nós
mo, confiante e seguro”, completa. também temos dificuldade em reconhe-
cer um relacionamento saudável, que
nos faz bem. Mas por que isso aconte-
ce? Karine explica que os modelos de
relacionamento na atualidade muito se
assemelham à lógica descrita pelo fi-
lósofo Zygmunt Bauman em sua obra
Amor Líquido, de 2003.
“Neste livro, o autor explora a fragili-
dade das relações humanas, permeadas
por incerteza e ausência de compromis-
so, além de serem facilmente voláteis.
Isso gera uma percepção previamente
negativa sobre o modo de se relacionar
e de perceber a interação com o outro,
fazendo as pessoas ficarem mais de-
Ilustrações: Nadya_Art/Shutterstock Images
Em resumo, Karine indica que o me- fendidas com a ideia de se entregar a
lhor “indicador” para saber se um rela- uma relação. Neste estado defensivo,
cionamento é ou não saudável está em é mais fácil esperar sempre pelo ‘pior’,
perceber como essa relação influencia como uma forma de defesa, impossibili-
seu bem-estar. A resposta para essa tando enxergar aquilo que é benéfico, as
pergunta está dentro de cada um que green flags. Além disso, quando aspec-
está lendo essa matéria, e apenas você tos positivos são percebidos, podem ser
poderá respondê-la. “Isso não significa vistos com certa suspeita, refletindo a
que 100% do tempo nos sentiremos dificuldade de estabelecer uma relação
bem e satisfeitos, afinal, relações são de confiança entre as pessoas.”
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VOCÊ MERECE! que leva à repetição de padrões anterio-


Muitas pessoas que passaram por re- res. O processo terapêutico, neste sen-
lações ruins enfrentam dificuldades tido, também é um excelente espaço na
em entender que merecem estar em compreensão desse aspecto, uma vez
um novo relacionamento, mas dessa que oferece a possibilidade de identifi-
vez saudável. A psicóloga explica que car as origens e influências que impac-
para reverter esse pensamento, a me- tam em suas escolhas atuais. Por meio
lhor pergunta para iniciar uma reflexão da terapia, é possível identificar traumas
é: “Por que você acredita que merece e modelos anteriores de relacionamen-
algo tão negativo? Por que você mere- to presentes na história do indivíduo, au-
ceria um relacionamento ruim, que te xiliando na construção de insights para
faz sentir mal?”. lidar de forma mais consciente na es-
“Com frequência, estar em relacio- colha de um parceiro, promovendo mu-
namentos tóxicos leva as pessoas a danças significativas, rumo a uma rela-
se sentirem responsáveis e culpadas ção mais saudável”, finaliza.
pelos comportamentos prejudiciais do
parceiro. Nestas relações, o parceiro
tóxico pode transferir ao outro a culpa
por seus comportamentos impulsivos
e agressivos, fazendo com que a outra
pessoa sinta-se mal, por erros e agres-
sões (de qual natureza forem) que lhe
Ilustrações: Nadya_Art/Shutterstock Images

são infligidas. O processo psicotera-


pêutico é um potente aliado na recons-
trução da autoestima, autoconfiança e
na quebra destas crenças que ficam
enraizadas. Ao compreender e valo-
rizar suas qualidades, você fortale-
ce sua autoestima e passa a buscar
relacionamentos que estejam ali-
nhados com seus valores e desejos.”

ADEUS, PADRÕES REPETITIVOS


E para finalizar essa matéria, Karine ofe-
rece uma dica de ouro para evitar come-
ter padrões repetitivos em novos relacio-
namentos. “É necessário compreender o
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HISTÓRIAS DE
SUCESSO
TE MOTIVAM?

A psicologia vê o “viés de sobrevivência”


como um fenômeno que pode supervalorizar
o sucesso e subestimar o fracasso
Texto: Gabrielle Aguiar
Ilustração: Elymas/Shutterstock Images

N
ada nos motiva mais do que Isso é o que a psicologia chama de
uma boa história de sucesso “viés de sobrevivência”, que, de acordo
alheio. “Brasileira realizou seu com Tatiane Paula, Psicóloga Clínica, é
sonho de abrir o restaurante na França!”, uma tendência psicológica em focar nas
dá até um arrepio, né? Mas, cadê a parte histórias de sucesso e ignorar as expe-
em que ela fracassou diversas vezes an- riências de fracasso. “Essa teoria desta-
tes de chegar ao sucesso? ca como nossa mente é naturalmente
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inclinada a se concentrar nas narrativas habilidades cognitivas para lidar com a


positivas, muitas vezes deixando de lado pressão social em relação ao conceito
os desafios e as dificuldades encontra- de sucesso, e também para gerenciar
das no caminho para o sucesso”, pontua. nossas próprias frustrações. “Entendo
que lidar com frustrações é uma parte es-
OK, MAS ISSO É BOM OU RUIM? sencial do processo de autodescoberta e
É muito ruim! Tatiane te explica o porquê: crescimento emocional”, completa.
“Focar apenas em histórias de sucesso
pode ser perigoso, pois cria expectativas MAS, PODEMOS USAR PARA
irreais e nos deixa despreparados para O LADO POSITIVO
lidar com falhas e frustrações. É impor- Histórias de sucesso de outras pessoas
tante reconhecer que o sucesso, muitas podem nos inspirar, motivar e ensinar li-
vezes, vem acompanhado de tentativas ções valiosas.“No entanto, é importante
fracassadas e que a falha também é uma lembrar que cada jornada é única e que
parte importante do processo de aprendi- o sucesso de outra pessoa não garante
zado e crescimento”. o mesmo resultado para nós. Comparar
Para a especialista, evitamos olhar nossas vidas com as dos outros pode ser
para histórias de fracasso, muitas vezes, prejudicial, pois cada um tem seu próprio
por medo de nos sentirmos desencora- ritmo e desafios a enfrentar”, enfatiza.
jados ou de repetir os mesmos erros. “A Tatiane conta que podemos apren-
sociedade nos pressiona a buscar cons- der a olhar para os dois lados de uma

Ilustração: Viktoria Kurpas/Shutterstock Images


tantemente o sucesso, o que pode nos mesma história praticando a resiliência
levar a evitar confrontar nossas próprias e a flexibilidade mental, mas o que isso
falhas. No entanto, entender e aprender significa? “significa reconhecer tanto os
com os fracassos é crucial para sucessos quanto os fracas-
o crescimento pessoal e profis- sos como oportunidades de
sional”, diz. aprendizado, desenvolven-
Além disso, a psicó- do uma mentalidade de
loga enfatiza a impor- crescimento que nos
tância de desenvolver permite adaptar-nos
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às circunstâncias e enfrentar os desafios • Praticar a autoconsciência: É importan-


com confiança e determinação.” te estar ciente de nossas próprias tendên-
cias cognitivas e emocionais. “Reconhe-
DICAS! cer quando estamos sendo influenciados
Tatiane separou algumas dicas para en- pelo viés de sobrevivência nos permite to-
carar histórias de sucesso de uma ma- mar medidas para corrigir esses padrões
neira que não nos influencie negativa- de pensamento e tomar decisões mais
mente, mas sim como parte do processo informadas.”
de amadurecimento emocional, incluindo • Buscar diversidade de experiências:
sucesso e fracassos. Expor-nos a uma variedade de experiên-
• Desenvolver pensamento crítico: Uma cias e perspectivas nos ajuda a obter
das melhores maneiras de lidar com o uma visão mais equilibrada da realidade.
viés de sobrevivência é cultivar o pensa- “Isso inclui diversificar as fontes de infor-
mento crítico. “Isso envolve questionar mação que consumimos e buscar fee-
ativamente as histórias de sucesso que dback de pessoas com diferentes pontos
encontramos e analisar cuidadosamente de vista. Ao fazer isso, podemos evitar a
o contexto em que ocorreram. Ao fazer armadilha de nos concentrarmos apenas
isso, podemos evitar cair na armadilha de em histórias de sucesso isoladas.”
pensar que o sucesso é a norma e o fra- • Praticar a aceitação: Aceitar que o su-
casso é uma anomalia.” cesso nem sempre é garantido e que o
fracasso faz parte do processo de cresci-
mento e aprendizado é fundamental para
desenvolver uma mentalidade resiliente.
“Em vez de temer o fracasso, podemos
aprender a vê-lo como uma oportunidade
de crescimento e autodesenvolvimento.”
• Buscar apoio profissional: Por fim, bus-
Ilustração: SpicyTruffel/Shutterstock Images
car apoio profissional de um psicólogo
clínico pode ser extremamente benéfico
para lidar com questões relacionadas ao
viés de sobrevivência e outros padrões
de pensamento enviesados. “Um psicó-
logo pode fornecer orientação personali-
zada e técnicas específicas para ajudar a
desenvolver uma perspectiva mais equili-
brada e saudável em relação ao sucesso
e ao fracasso.”

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