Resolução Caso Prático

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FILOSOFIA DO DIREITO

ATIVIDADE PRÁTICA

ESTUDO DE CASO
De acordo com as correntes iusnaturalistas e iuspositivistas, analisar o
que poderia acontecer em um Estado onde o direito à saúde não é
reconhecido como parte dos direitos fundamentais, entendidos como direitos
humanos constitucionalistas; um indivíduo precisa ativar o seu direito à
saúde como parte de seus direitos subjetivos.

RESOLUÇÃO DO CASO PRÁTICO


(por Francisco Tomás Joaquim)

A problemática apresentada num sentido lato está relacionada com o


direito natural e o positivismo legal; e num sentido mais restrito está
relacionada com a problemática moderna entre a moralidade e a lei, a saber
que soluções para este caso se reserva a cada uma destas teorias.

A minha abordagem será pragmática e explicativa; no sentido em que


vou expor os institutos jurídicos essenciais para o caso e descrevê-los na
visão de cada umas das teorias iusnaturalista e iuspositivista.

Assim, discorreremos sobre os conceitos de Estado, direitos


fundamentais e a perspectiva das diferentes teorias em relação a estes
mesmos conceitos, para no final apresentar uma solução de acordo com a
posição hipotética deste Estado em análise.

a) O Estado

Primeiramente, vários são os livros e manuais que salientam que o


Estado é apenas uma das possíveis formas de organização da sociedade,
pois que ao longo da história os homens em sociedade já se organizaram de
outras formas, a título de exemplo, a tribo, o clã, a pólis grega, os impérios
antigos, etc.

Hans Kelsen (1999, p. 261) afirma que o termo “Estado” é usado em


vários sentidos, causando uma situação insatisfatória na definição dos
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teórico-políticos. Acrescenta que para simplificar a questão é preferível
recorrer a um ponto de vista puramente jurídico, e assim, o Estado entende-
se como uma pessoa jurídica, uma espécie de personificação da
comunidade criada por uma ordem jurídica nacional (em contraposição a
uma internacional).

Como apontam os autores Rocha, Batalhão e Aragão (2004, p. 115)


um Estado será a afirmação de um poder soberano exercido uniformemente
sobre o povo, num determinado território.

Essa soberania segundo Kelsen (1999, pp. 272-273) só é possível se


se entender o Estado como uma ordem normativa, conferindo-o essa
mesma ordem, o carácter de poder de autoridade com poder de obrigar.

Já neste campo (da conceitualização de Estado) se percebe o


antagonismo teórico entre positivismo e naturalismo. Vejamos:

Kelsen (1999, pp. 559-560) assevera «O Direito positivo como ordem


humana arbitrária, cujas regras carecem de justeza auto-evidente, requer
necessariamente uma agência para a concretização de atos de coerção e
exibe a tendência inerente de evoluir, de ordem coercitiva para uma
“organização” coercitiva específica. Essa ordem coercitiva, sobretudo
quando se torna uma organização, é idêntica ao Estado. Assim, pode-se
dizer que o Estado é a forma perfeita do Direito positivo. O Direito natural é
em princípio, uma ordem não-coercitiva, anárquica. Toda a teoria de Direito
natural, na medida em que conserva a idéia de uma lei pura da natureza, é
necessariamente um anarquismo ideal (…)».

Parece-nos evidente que Kelsen, um dos maiores expoentes do


iuspositivismo (com a sua teoria pura do direito), nega a existência de uma
conceitualização do que é Estado ante uma visão do iusnaturalismo. Ou
seja, pelos princípios do Direito natural não se concebe a ideia de um
Estado, porquanto, o Estado é consequência de uma organização normativa
positivista.

Por conseguinte, o filósofo e jurista brasileiro, Galvão de Sousa


(Ferraz Costa, 2002), professor universitário, fundador da Faculdade
Paulista de Direito, traz uma abordagem sobre o direito natural, que
pessoalmente considero uma resposta à posição de Kelsen, acima
apresentada; em resumo, ele diz o seguinte: o direito natural é uma técnica
de realização do justo, uma exemplaridade superior que é a um tempo
transcendente (enquanto expressão de uma ordem natural criada por Deus)
e imanente ao direito positivo (pois o dota de um conteúdo de justiça ao
realizá-lo historicamente). Só um Estado que respeite esta distinção básica
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pode aspirar a ser considerado um verdadeiro Estado de Justiça e não um
simples Estado de legalidade.

Não encontramos uma teoria acabada sobre um conceito de Estado


que englobe de forma unificada o iusnaturalismo e o iuspositivismo. Porém,
a teoria do “contratualismo” é o que mais aproxima aquelas duas
concepções.

Segundo Reale (2002, p. 646) o contratualismo é a alavanca do Direito


na época moderna. Porque existe sociedade? Porque existe o Direito? O
Direito existe, respondem os iusnaturalistas, porque os homens pactuaram
viver segundo regras delimitadoras dos arbítrios. Da ideia do indivíduo em
estado de natureza, sem leis, sem normas, surge a ideia da possibilidade de
contratar. Da possibilidade de contratar deriva o fato do contrato; e do
contrato, a norma (…) a sociedade é um fato natural, mas o Direito é um
fato contratual.

Na minha humilde opinião, esta teoria converge a ideia de que o


Estado (organização social – regida por normas), portanto, um Estado
caracterizado pelos princípios do iusnaturalismo na sua gênese, regido
pelas normas do iuspositivismo na sua construção.

b) Os direitos fundamentais

Segundo Canotilho (2003, p. 393) as expressões «direitos do homem»


e «direitos fundamentais» são frequentemente utilizadas como sinónimas.
Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui-las da seguinte
maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em
todos os tempos (dimensão iusnaturalista-universalista); direitos
fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente
garantidos e limitados espácio-temporalmente. Os direitos do homem
arrancariam da própria natureza humana e daí o seu carácter inviolável,
intemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos
objectivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.

Adentremos no caso em análise: um Estado onde o direito à saúde


não é reconhecido como parte dos direitos fundamentais, entendidos como
direitos humanos constitucionalistas; um indivíduo precisa ativar o seu
direito à saúde como parte de seus direitos subjetivos.

Canotilho (2003, p. 476) coloca o direito à saúde na esfera dos direitos


fundamentais sociais e estes são compreendidos como autênticos direitos
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subjectivos inerentes ao espaço existencial do cidadão, independentemente
da sua justicialidade e exequibilidade imediatas.

De acordo com Carlos Nino citado por Álvarez Ledesma (2015, p. 97-
98), existem duas teses filosóficas causadoras de grande tensão entre as
teorias do iuspositivismo e iusnaturalismo.

Em resumo estas duas teses apontam: a) a existência de princípios


determinantes da justiça das instituições sociais, universalmente válidos,
que não carecem de reconhecimento, pois são acessíveis à razão humana;
b) o sistema normativo de um Estado não merece a qualificação de lei, caso
não satisfaça o primeiro postulado.

Diante destas teses, o facto desse Estado não colocar na Constituição


o direito à saúde pode ser visto no prisma do iuspositivismo – essa
Constituição é formalmente válida, a lacuna sobre o direito a saúde fere
princípios morais, portanto, parece ser uma Constiuição injusta, mas “dura
lex sed lex”, ela é lei e deverá ser cumprida; para o iusnaturalismo, portanto,
essa Constituição, para além de ser injusta, por faltar com princípios do
direito natural, carece de validade material, logo seria ilegal obedecer à essa
Constituição.

Ora, sendo um seu direito subjectivo este indivíduo pode ativá-lo, mas
antes se atentarmos ao que diz Canotilho (2003, p. 403), percebemos que
existem os direitos fundamentais formalmente constitucionais – porque
estão positivados na Constituição; e existem os direitos materialmente
constitucionais, embora não estejam plasmados na Constituição, estes
constam de leis e regras de direito internacional aplicáveis neste Estado – o
direito à saúde é um direito materialmente constitucional, consta dos artigos
22.º e 25.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Por isso, o autor prevê a via da tutela jurisdicional efectiva recorrendo


ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH); entrar com um
processo ação direta de inconstitucionalidade por omissão, dentro desse
Estado, atacando a omissão inconstitucional, que ocorre quando o Poder
Legislativo não observa seu dever de legislar.

Porque se este Estado, do caso em análise se considera um Estado


de direito então há certas premissas que este tem de respeitar, para não se
assemelhar a um Estado-autoritário.

Para finalizar a visão do professor Rojas (2016, pp.299-300) que


assevera que o Estado de direito é defensor de valores incontestáveis como
justiça, liberdade, igualdade, o bem comum e outro, apresentando como
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uma das suas características uma consciência nacional e internacional dos
direitos fundamentais do homem.

BIBLIOGRAFIA

Canotilho, J. J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª


ed., Almedina, 2003, Coimbra – Portugal.
Declaração Universal dos Direitos Humanos - Adotada e proclamada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas (resolução 217 A III) em 10 de
dezembro 1948. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-
universal-dos-direitos-humanos, Acesso: 26. abril. 2024.

Ferraz Costa, João Batista de A. Prado. Alguns aspectos do pensamento


político de José Pedro Galvão de Sousa. Disponível em:
<http://santamariadasvitorias.org/alguns-aspectos-dopensamento-politico-
de-jose-pedro-galvao-de-sousa> Palestra proferida pelo Prof. João Batista
de A. Prado Ferraz Costa durante o Seminário de Filosofia Política
promovido pela FAFISMA, pela Academia Oikos de Ciências Políticas e
Sociais no auditório do Senai. Anápolis, 4 de junho de 2002. Acesso: 26.
abril.2024.

Kelsen, Hans, Teoria Geral do Direito e do Estado; tradução de Luís Carlos


Borges, 3ª ed., 1999, São Paulo: Martins Fontes.

Reale, Miguel, Filosofia do Direito, 19ª, 3ª tir., Saraiva Editora, 2002, São
Paulo.

Rocha, Isabel, Batalhão, Carlos José e Aragão, Luís, Introdução ao Direito,


Porto Editora, 2004, Portugal: Porto.

Rojas, André Serra, Ciência Política, 2016, México:Porría.

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