Você está na página 1de 72

MONKEYPOX

Paulo Roberto Abrão Ferreira


Professor Adjunto da Disciplina de Infectologia
Escola Paulista de Medicina – Unifesp
Virologia
• Trata-se de uma antropozoonose viral, semelhante à varíola, mas com
chance de transmissão pessoa-a-pessoa, menor gravidade e
mortalidade
• Gênero orthopoxvirus (DNA), que é o mesmo do agente causador da
varíola e do vírus da vaccínia (componente da vacina contra varíola)
• Aspecto de “tijolo” ou ovalado à microscopia eletrônica e nessa
técnica são indistinguíveis entre si, dentro do gênero
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3)
(accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Virologia
• Há dois clados descritos, sendo o primeiro com uma subdivisão
• Ia e Ib (oeste da África), menos virulentos, com várias deleções
gênicas
• II (região central da África), mais virulento
• Surto de 2022, tem similaridade com o observado na Nigéria (Ia e Ib).
• Foram observadas mais mutações, causando a preocupação quanto à
adaptação desse agente ao ser humano
https://www.who.int/news/item/12-08-2022-
monkeypox--experts-give-virus-variants-new-
names
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3)
(accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Epidemiologia
• O primeiro isolamento desse vírus foi na Dinamarca, em 1958, a partir de
macacos de laboratório de Singapura. Foram observados surtos em animais de
laboratório nos EUA e na Holanda
• O primeiro caso em humanos foi diagnosticado na República Democrática do
Congo, em 1970.
• Regiões endêmicas – oeste e centro da África
• Após a descontinuação da vacinação contra a varíola (1980), por sua erradicação
(1977), provavelmente, por aumento da suscetibilidade populacional, mais casos
foram observados no oeste e no centro da África
Epidemiologia
• A vacina contra varíola reduz em 5 vezes a incidência de MPX

• MPX sempre foi monitorada pela OMS

• Entre 2005 e 2007, houve um aumento de 20 vezes na incidência dos casos,


observados na República Democrática do Congo

• Não vacinação prévia, sexo masculino, idade menor que 15 anos e contato com a
floresta foram fatores de risco observados
Epidemiologia
• Depois de 40 anos sem notificar casos, em 2017, vários foram observados na
Nigéria, sendo que alguns ocorreram em viajantes após o retorno para áreas não
endêmicas (surto em 2017 e 2018)
• Em 2022, a OMS relatou vários casos em países africanos, sendo que na
República Democrática do Congo, ocorreram, entre janeiro e maio de 2022
(1284 notificações e 58 mortes)
Epidemiologia
• Países não endêmicos

• Casos relacionados às viagens esporádicas ou contato com animais

• Casos esporádicos foram documentados fora de áreas endêmicas. Entre 2018 e


2021, 7 casos foram notificados no Reino Unido, sendo quatro com viagens para
áreas endêmicas, dois por transmissão domiciliar, a partir de um caso índice e
um em profissional de saúde, por contato nosocomial.
• Em julho de 2021, um caso em Dallas e em novembro de 2021, um caso em
Maryland, ambos procedentes da Nigéria, mas sem casos secundários.
Epidemiologia
• Entre maio e junho de 2003, um surto com 71 casos humanos (confirmados e
prováveis) de varíola símia, em seis estados (Illinois, Indiana, Kansas, Missouri,
Ohio e Wisconsin)
• Antes desse conjunto de casos, a varíola dos macacos não havia sido encontrada
no hemisfério ocidental
• Cães-da-pradaria pareciam ter adquirido o vírus de roedores africanos, quando
as duas espécies foram alojadas em um centro de distribuição em Illinois
• A exposição direta a animais sem equipamento de proteção individual (EPI) foi
considerada a provável fonte de transmissão, embora a transmissão de pessoa
para pessoa não pudesse ser totalmente excluída
• Proibição da venda de pequenos roedores de outros países pelo CDC
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3) (accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Epidemiologia
• Surto mundial. Europa, maio de 2022
• Países de regiões não endêmicas do mundo, fornecendo evidências
de disseminação comunitária
• Maioria dos casos foi identificada em homens que fazem sexo com
homens
• Hipótese de que pode haver disseminação devido ao contato próximo
durante a atividade sexual ou ser, de fato, uma IST
• Primeiros casos no Reino Unido (12/05/22), sendo um caso com
viagem para a Nigéria. Restante da Europa e EUA (17/05/22).
Global Heath Dashboard
Transmissão
• Macacos e humanos são hospedeiros incidentais; o reservatório
permanece desconhecido, mas é provável que sejam pequenos
roedores.
• Contato com material biológico versus lesão com solução de
continuidade (menor tempo de incubação e casos mais graves)
• Lesão por roedores
• Acidente ocupacional
• Trauma na relação sexual
• DNA detectado no sêmen
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3) (accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Transmissão
• Excreção viral e período de infecciosidade
• Uma pessoa é considerada infectante desde o início dos sintomas até
que todas as lesões tenham cicatrizado e a reepitelização tenha
ocorrido
• Presença de DNA significa infecciosidade? Não determinar o
isolamento por esse parâmetro
• Estudos soroepidemiológicos na África sugerem que alguns pacientes
podem ter infecção subclínica ou assintomática, mas não está claro
se esses pacientes são capazes de transmitir o vírus da varíola dos
macacos para outras pessoas
Euro Surveill. 2022;27(28):pii=2200503.
https://doi.org/10.2807/1560-7917.ES.2022.27.28.2200503
02 abortamentos espontâneis
01 morte fetal
01 nascido vivo
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3) (accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Manifestações clínicas
• Classicamente, as lesões geralmente começam a se desenvolviam
simultaneamente (não pleomórficas) e evoluiamm juntas em qualquer parte do
corpo.

• No entanto, durante o surto global de varíola dos macacos que começou em maio
de 2022, nem todas as lesões evoluem no mesmo estágio de desenvolvimento
(pleomórficas)

• A erupção associada à varíola dos macacos é frequentemente descrita como


dolorosa, mas na fase de cicatrização (crostas) pode tornar-se pruriginosa
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3) (accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Manifestações clínicas
• Peculiaridades do surto atual
• Alguns casos começaram com a erupção na área genital, com posterior
disseminação para a face e tronco após isso; em outros casos, as lesões não
envolveram a face ou extremidades.
• Dor anorretal, tenesmo e sangramento retal, que foram associados a lesões
cutâneas vesiculares, pustulosas ou ulcerativas perianais visíveis e proctite.
• As lesões às vezes foram estágios indiferentes de progressão em um local
anatômico específico pleomórficas.
• Sintomas prodrômicos, incluindo febre, mal-estar, dor de cabeça e
linfadenopatia, nem sempre ocorreram antes da erupção cutânea e, em alguns
casos, nenhum pródromo foi relatado.
Manifestações clínicas

Dificuldade de Infecções secundárias


alimentação e • Broncopneumonia,
Complicações sepse, infecção Epiglotite
hidratação; dor de bacteriana pele e
difícil controle mucosas

Infecção da córnea A doença clínica


Miocardite Encefalite com consequente também pode diferir
perda de visão pela variante viral.
Manifestações clínicas
• Autolimitada, na maioria dos casos (2-4 sem.)
• Casos graves de varíola dos macacos ocorrem mais comumente entre crianças e
estão relacionados à extensão da exposição ao vírus, estado de saúde do
paciente e natureza das complicações
• Imunossuprimidos
• Gestantes (?)
• Número de lesões elevado (> 100)
• Mortalidade atual maior na África (acesso ao serviço de saúde, comorbidades,
variantes genéticas?)
• Reinfecção?
Achados laboratoriais
Múltiplos achados laboratoriais inespecíficos

• aminotransferases anormais
• leucocitose
• trombocitopenia leve
• hipoalbuminemia
Diagnóstico de certeza
• PCR DNA orthopoxvírus ou específico para MPX (material da pústula)
• Os pacientes com varíola do macaco normalmente apresentam níveis detectáveis
​de anticorpos IgM anti-ortopoxvírus durante o período de 4 a 56 dias após o
início da erupção cutânea.
• Anticorpos séricos IgM e IgG foram detectados cinco e oito dias após o início da
lesão cutânea, respectivamente.
• Microscopia eletrônica, na qual podem ser observados vírions característicos de
poxvirus em forma de tijolo/ovais (indistinguíveis).
• A análise histopatológica pode demonstrar degeneração em balão de
queratinócitos, espongiose proeminente, edema dérmico e inflamação aguda; no
entanto, esses achados também podem ser vistos em outras infecções virais.
Farahat RA, et al. Infez Med 2022 Jun; 30(3) (accepted, in press # 184 - 2022 R1)
Diagnóstico diferencial
• Varicela (lesões pleomórficas)
• Herpes simples ou zoster (PCR)
• Úlceras genitais ou erupção macular nas palmas das mãos e solas dos pés, outras
infecções sexualmente transmissíveis devem ser consideradas (por exemplo, sífilis
primária ou secundária, linfogranuloma venéreo, cancróide)
• Varíola (bioterrorismo) não apresenta linfadenopatia
• Tanapox, estomatite bovina (parapox – microscopia eletrônica menores e superfície
irregular), Alaskapoxvirus, Orthopoxvirus Abatino e Akhmeta vírus
• Doença mão-pé-boca (coxsackievirus)
• Dermatoses vesiculares, pustulosas ou bolhosas não infecciosas; eritema
polimórfico grave
Prevenção
• Suspeição e notificação
• Quarto e banheiro privativos
• Higiene das mãos
• Precauções de contato/gotículas (óculos, luvas, gorro, avental)
• Sem necessidade absoluta de pressão negativa (aerossóis ?)
• Indicada máscara N95 para profissionais de saúde
• EPIs completos para os profissionais de saúde
• Transportar o pte com máscara cirúrgica e lesões cobertas (restrito)
• O profissional de saúde deve evitar a autocontaminação com os EPIs
Prevenção
• Higiene e limpeza do ambiente
• Cuidado em não agitar a roupa de cama e banho (aerossóis)
• Cuidados com os resíduos
• Mesmas orientações para isolamento domiciliar
• Só interromper o isolamento após total reepitelização das lesões
• Preservativo por 12 semanas após a recuperação (OMS), pela
probabilidade de transmissão sexual (Reino Unido - 8 semanas)
Conduta clínica
• Maioria dos casos, apenas suporte (complicações)
• Antivirais
• Crianças (?), gestantes/lactantes (?), imunossuprimidos, doença extensa ou
complicada
• Doença em locais atípicos (olhos, boca, genitais)
Conduta clínica
• Tecovirimat - potente inibidor da proteína VP37 do envelope viral, necessárias para a maturação,
inibindo a liberação viral a partir da célula infectada. FDA julho de 2018. Sem ECR em humanos.
• Preparações orais e intravenosas estão disponíveis.
• A dose recomendada de tecovirimat via oral é de 600 mg de 12/12h (de 40kg a 120kg) ou de 600
mg de 8/8h (se mais de 120 kg), com estômago cheio.
• Se usada intravenosa em 6 horas (soro fisiológico ou glicosado), a dose será de 200 mg de 12/12h
(de 35kg a 120kg) ou de 300 mg de 12/12h (se mais de 120 kg) e a duração do tratamento é de 14
dias.
• Não há necessidade de ajusta da dose até depuração de creatinina de 30 mL/min. Menos do que
isso, a medicação está contraindicada.
• Os efeitos colaterais mais frequentemente relatados são cefaleia, náusea e dor abdominal. O seu
uso concomitante com repaglinida pode levar à hipoglicemia.
• Foi administrado a aproximadamente 360 ​voluntários humanos em um estudo de segurança
expandido, que encontrou um perfil de efeitos adversos semelhante ao do placebo.
Conduta clínica

• Cidofovir (IV) ou brincidofovir (oral) – inibidor da DNA polimerase


(diarreia, náuseas, nefro e hepatotoxicidade) Teratogênico (Classe C)

• Experiência em animais de experimentação e em poucos humanos.


Monkeypox Vaccine (JYNNEOS)
• JYNNEOS is the only FDA-licensed (2018) vaccine in the US to prevent monkeypox
disease in individuals 18 years of age and older
– Also licensed to prevent smallpox disease in this age group
– Requires two doses (days 1 and 28)
– Pregnancy and breast feeding? People under 18 yo?
• Non-replicating viral vectored vaccine using Modified Vaccinia Ankara (MVA-BN)
originally developed as alternative to ACAM2000 (live replicating vaccinia virus-based
smallpox vaccine)
– For use in the event of a bioterrorist attack in immunocompromised individuals
in whom such a live replicating virus vaccine was relatively or absolutely
contraindicated

www.fda.gov 59
Monkeypox Current Issues
• Concern regarding spread to other populations is increasing
• Approximately 1.6 to 1.7 million people at risk need vaccination
• Would require total of 3.2 to 3.4 million doses JYNNEOS;
however, only about 1.6-1.8 million doses will be available by
December
• Stockpile material being tested for suitability for use
• Technology transfer in process with doses expected early 2023
• Use of ACAM2000 considered; determined to have excessive risk
• Other potential vaccines not available: LC16m8 (Japan)
www.fda.gov 60
Intradermal Dosing Regimen
• Early on during its development in the 1970’s, MVA was given
intradermally in Germany to thousands of people
• Intradermal MVA has also sometimes been given as a boost in
combination with other vaccines; redness at inoculation site
noted
• Clinical trial conducted in accordance with GCP by NIAID indicates
1/5 of the dose (0.1 mL) given intradermally (ID) on the same
schedule (day 1 and 28) produces similar efficacy to subcutaneous
(SC) with more local redness and itching, less local pain
– Frey SE et al, Vaccine 2015; 33: 5225-5234
www.fda.gov 61
Immunogenicity
Assay SC peak titer ID peak titer Difference 97.5% CI

SLU PRNT 8.37 8.36 0.005 0.43, 0.44

BN PRNT 5.63 5.90 -0.27 -0.77, 0.23

SLU ELISA 9.66 9.52 0.14 -0.21, 0.49

BN ELISA 9.59 9.57 0.02 -0.31, 0.35

www.fda.gov 62
Reactogenicity
Reactogenicity event SC (%) ID (%)
N=166 N=190
Feeling Tired 49.7 51.3
Muscle Aches 41.3 30.4
Headache 43.1 41.4
Nausea 21.6 23.0
Change in Appetite 15.0 20.4
Chills 12.6 14.7
Joint Pain 9.0 17.8
Pain at injection site 91.0 65.4
Erythema at injection site 81.4 99.5
Induration at injection site 69.5 99.5
Itchiness 48.5 89.0
Underarm pain 18.0 20.9
Underarm swelling 6.0 10.5
www.fda.gov 63
Vaccination Strategies

Strategy Definition
Post-Exposure Prophylaxis (PEP) Vaccination after known exposure to
monkeypox

Expanded Post-Exposure Vaccination after known or presumed exposure


Prophylaxis (PEP++) to monkeypox

Pre-Exposure Prophylaxis (PrEP) Vaccination before exposure to monkeypox

https://www.cdc.gov/poxvirus/monkeypox/considerations-for-monkeypox-vaccination/overview.html
Interchangeability
• A person aged 18 years or older who received one JYNNEOS
vaccine dose with the standard (subcutaneous) regimen may
receive a second dose with the alternative (intradermal) regimen to
complete the vaccination series.
• For example, a person who received only one dose of the standard
regimen before August 9 may receive one dose with the alternative
regimen to complete the series.
• Also, a person whose 18th birthday occurs between their first and
second dose may complete the series with the alternative regimen.

https://www.cdc.gov/poxvirus/monkeypox/considerations-for-monkeypox-vaccination/jynneos-vaccine.html#interchange
Duration of Immunity and Dosing Intervals
• Peak immunity is expected 14 days after the second dose
• Duration of immunity after two doses of JYNNEOS is unknown
• Recommended interval: 28 days (or up to 35 days)
 If the second dose is not administered during the recommended
interval, it should be administered as soon as possible.
 There is no need to restart or add doses to the series if there is an
extended interval between doses.
• Minimum interval: 24 days
 4-day grace period applies

https://www.cdc.gov/poxvirus/monkeypox/considerations-for-monkeypox-vaccination/jynneos-vaccine.html#dosing
Acompanhamento pós-exposição
• Exposição sem EPI monitorar sintomas 21 dias
• Se assintomáticos, não isolar
• Expostos devem se abster de doar sangue, células, tecidos, leite materno, sêmen
ou órgãos durante o período de 21-28 dias
• Se contato de risco e sintomas, coletar PCR de swab oral e anal, mesmo antes das
leões cutâneas aparecerem
Profilaxia pós-exposição com vacinas
• Risco alto, intermediário, baixo/incerto (EPIs, contato direto, tempo de
contato, distância)
• Alto risco - sim, intermediário - avaliar, baixo/incerto - não
• Idealmente até 4 dias, mas até 14 dias
• Vacinas disponíveis
• ACAM2000 – vários riscos (miocardite) 2ª geração
• Vacina vaccinia Ankara modificada (MVA) – mais segura e usada em
imunossuprimidos (aprovada nos EUA, Europa e Canadá) 3ª geração
• LC16m8 (Japão) ?
• Imunoglobulina Vaccinia – imunossuprimidos (apenas em estudos)
Profilaxia pré-exposição
• Vacinados contra a varíola, no passado (cicatriz braço E, BCG braço D)
• Vacina MVA aprovada nos EUA para trabalhadores em laboratórios
clínicos e de pesquisa que lidam com orthopoxvírus
• Usada, no passado, em controle de surtos localizados
• Profissionais de saúde expostos (?)
MUITO OBRIGADO!
paulo.abrao.ferreira@gmail.com

Você também pode gostar