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BACHARELADO EM DIREITO

Direito Penal – Teoria Geral da Infração Penal.

Professor Mestre Roniery Rodrigues Machado.


Aula 03: Tempo e lugar do crime; Aplicação da lei penal
no espaço; Homologação de sentença estrangeira.
1.1. TEORIAS SOBRE O TEMPO DO CRIME
A) TEORIA DA ATIVIDADE: considera praticado o delito no
momento da conduta, não importando o instante do
resultado;

B) TEORIA DO RESULTADO: reputa cometido o crime no


momento do resultado;

C) TEORIA MISTA OU DA UBIQUIDADE: entende que o momento


do crime pode ser tanto o da conduta, quanto o do resultado.

• É adotado no Brasil, segundo demonstra o art. 4.º do Código


Penal, a teoria da atividade.
• “Tempo do crime
• Art. 4º - Considera-se praticado o crime
no momento da ação ou omissão, ainda
que outro seja o momento do resultado.”
1.2. ALCANCE DA TEORIA DA ATIVIDADE
• A teoria da atividade serve para, dentre outros efeitos:

a) determinar a imputabilidade do agente;


b) fixar as circunstâncias do tipo penal;
c) possibilitar eventual aplicação da anistia;
d) dar oportunidade à prescrição.

• EXEMPLIFICANDO: Adotando-se essa teoria, se houver, por


exemplo, um homicídio (crime material), o mais importante é
detectar o instante da ação (desfecho dos tiros), e não o
momento do resultado (ocorrência da morte). Assim fazendo, se
o autor dos tiros for menor de 18 anos à época dos tiros, ainda
que a vítima morra depois de ter completado a maioridade penal,
não poderá ele responder, criminalmente, pelo delito.
1.3. O TEMPO DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS
PERMANENTES E CONTINUADAS
• Aplicam-se para as infrações penais permanentes (crime cuja
consumação se prolonga no tempo) e continuadas (uma ficção
jurídica idealizada para beneficiar o réu, mas que é considerada uma
unidade delitiva) a mesma regra especial. É considerado tempo do
crime todo o período em que se desenvolver a atividade delituosa.

• Ilustração para o crime permanente: durante um sequestro os prazos


prescricionais só passam a correr após o encerramento da atividade
delituosa.

• Ilustração para o crime continuado: uma série de quatro furtos


realizado pelo mesmo agente, com o mesmo modo de operação, na
mesma comarca e em um prazo curto, os prazos prescricionais só
passam a ser contados a partir do último delito.
1.3.1. O TEMPO DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS
PERMANENTES E CONTINUADAS: inimputalibidade
• O que ocorre se o agente era inimputável no início da execução
de um crime continuado ou permanente e se torna imputável ao
final?

• Resposta para o crime permanente: durante um sequestro,


pode ocorrer de um menor de 18 anos completar a maioridade,
sendo considerado imputável para todos os fins penais.

• Resposta para o crime continuado: caso o agente de quatro


furtos, possua 17 anos, quando do cometimento dos dois
primeiros, e 18, por ocasião da prática dos dois últimos, apenas
estes dois é que servirão para formar o crime continuado.
Despreza-se o que foi cometido em estado de inimputabilidade.
1.4. TEORIAS SOBRE O LUGAR DO CRIME

A) ATIVIDADE: considera local do delito aquele onde foi


praticada a conduta (atos executórios);

B) RESULTADO: reputa o lugar do crime como sendo aquele


onde ocorreu o resultado (consumação);

C) MISTA OU DA UBIQUIDADE: aceita como lugar do crime


tanto onde houve a conduta (atos executórios), quanto
onde se deu o resultado (consumação).

• Adota-se, no Brasil, pelo art. 6.º do Código Penal, a teoria


mista.
• “Lugar do crime 
• Código Penal, Art. 6º - Considera-se praticado
o crime no lugar em que ocorreu a ação ou
omissão, no todo ou em parte, bem como
onde se produziu ou deveria produzir-se o
resultado.”
5. CONFLITO APARENTE ENTRE O ART. 6.º DO CP E O
ART. 70 DO CPP
• Levando-se em consideração que o art. 70 do Código de Processo Penal
estabelece que a competência será determinada pelo “lugar em que se
consumar a infração”, poder-se-ia sustentar a existência de uma contradição
entre a lei penal (teoria mista) e a lei processual penal (teoria do resultado).

• Ocorre que o art. 6.º do Código Penal destina-se, exclusivamente, ao


denominado direito penal internacional, ou seja, à aplicação da lei penal no
espaço, quando um crime tiver início no Brasil e terminar no exterior ou vice-
versa (é o denominado “crime à distância”).

• Para delitos cometidos no território nacional, vale o disposto no art. 70 do


CPP, pois, quase sempre os crimes são executados e consumados no mesmo
local. Uma das exceções é o crime de homicídio em que já é pacífico o
entendimento de que deve ser o juízo competente o do local em que houve
impacto social, essa mesma lógica é usada em outros crimes que excetuam a
regra geral.
• Art. 70.  A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a
infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de
execução.

• § 1o  Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a


competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último
ato de execução.

• § 2o  Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será
competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou
devia produzir seu resultado.

• § 3o  Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando
incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou
mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção.

• § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940


 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques
sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado
ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do
domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela
prevenção [aquele juízo que teve o primeiro contato com a causa]”.  
6. LUGAR DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS PERMANENTES OU CONTINUADAS

• No caso de crimes permanentes ou continuados, continua-


se a adotar a teoria mista para a adoção do juízo
competente para o julgamento, permitindo, portanto,
considerar lugar do crime aquele onde se der qualquer ato
de execução ou mesmo onde se concretizou o resultado.

• Exemplo: se houver um sequestro, cujos autores mudam o


local do cativeiro a todo momento, passando por várias
cidades até que soltam a vítima, o lugar do crime é
qualquer um daqueles por onde passou o ofendido.
6. LUGAR DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS
PERMANENTES OU CONTINUADAS

• Para a solução do juízo competente, segue-se a regra


do art. 71 do Código de Processo Penal.

• “CPP, Art. 71.  Tratando-se de infração continuada ou


permanente, praticada em território de duas ou
mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela
prevenção [aquele juízo que teve o primeiro contato
com a causa]”.
7. TERRITORIALIDADE E EXTRATERRITORIALIDADE

• Territorialidade é a aplicação das leis brasileiras aos


delitos cometidos dentro do território nacional (art. 5.º,
caput, CP). Esta é uma regra geral, que advém do
conceito de soberania, ou seja, a cada Estado cabe
decidir e aplicar as leis pertinentes aos acontecimentos
dentro do seu território.

• Excepcionalmente, no entanto, admite-se o interesse do


Brasil em punir autores de crimes ocorridos fora
do seu território. Extraterritorialidade, portanto,
significa a aplicação da lei penal nacional a delitos
ocorridos no estrangeiro (art. 7.º, CP).
• “Territorialidade
• Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de
convenções, tratados e regras de direito internacional,
ao crime cometido no território nacional.

• (...)

• Extraterritorialidade 
• Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora
cometidos no estrangeiro:”

  
8. REGRAS PARA A APLICAÇÃO DA LEI PENAL
NO ESPAÇO
• As regras são basicamente duas:

A) TERRITORIALIDADE (regra geral);

B) EXTRATERRITORIALIDADE (exceção: aplicação da lei penal brasileira a crime


ocorrido fora do território nacional).

• Esta, por sua vez, é regida pelos seguintes princípios:


B.1) defesa ou proteção (leva-se em consideração a nacionalidade brasileira do bem
jurídico lesado pelo delito);
B.2) justiça universal ou cosmopolita (tem-se em vista punir crimes com alcance
internacional);
B.3) nacionalidade ou personalidade (leva-se em conta a nacionalidade brasileira do
agente do delito);
B.4) representação ou bandeira (tem-se em consideração a bandeira brasileira da
embarcação ou da aeronave privada, situada em território estrangeiro).
9. CONCEITO DE TERRITÓRIO E SEUS ELEMENTOS

• Trata-se de todo espaço onde o Brasil exerce a sua soberania, seja


ele terrestre, aéreo, marítimo ou fluvial.
• São elementos do território nacional:
a) o solo ocupado pela nação;
b) os rios, os lagos e os mares interiores e sucessivos;
c) os golfos, as baías e os portos;
d) a faixa de mar exterior, que corre ao largo da costa e que constitui
o mar territorial;
e) a parte que o direito atribui a cada Estado sobre os rios, lagos e
mares fronteiriços;
f) os navios nacionais;
g) o espaço aéreo correspondente ao território;
h) as aeronaves nacionais.
10. TERRITÓRIO BRASILEIRO POR EQUIPARAÇÃO - TERRITORIALIDADE

• Há duas situações que a lei brasileira considera território


nacional por equiparação (art. 5.º, § 1.º, CP):

a) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a


serviço do governo brasileiro onde estiverem. (PRINCÍPIO DA
DEFESA OU PROTEÇÃO)

b) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada,


que estiverem navegando em alto-mar ou sobrevoando águas
internacionais. (PRINCÍPIO DA REPRESENTAÇÃO OU BANDEIRA)
• “Art. 5º § 1º - Para os efeitos penais, [1]
consideram-se como extensão do território
nacional as embarcações e aeronaves
brasileiras, de natureza pública ou a serviço do
governo brasileiro onde quer que se
encontrem, [2] bem como as aeronaves e as
embarcações brasileiras, mercantes ou de
propriedade privada, que se achem,
respectivamente, no espaço aéreo
correspondente ou em alto-mar. ”
A lei penal e a Convenção de Tóquio
• Em 1963, o Brasil subscreveu a Convenção de Tóquio, que cuida das
infrações praticadas a bordo de aeronaves, aprovada pelo Decreto
479/69.

• Pelo texto da Convenção, aplica-se a lei do Estado de matrícula da


aeronave, com relação a todas as infrações penais, com exceção a crimes
que possam imediatamente ameaçar a soberania e ordem do Estado
sobre cujo território se comete o delito.

• Entretanto, o texto da Convenção de Tóquio entra em conflito com o


disposto no art. 5.º, § 2.º, do Código Penal, com a redação dada pela Lei
7.209/84.

• A posição do STF é que conflito entre normas deve ser resolvido pelo
critério cronológico. Portanto, valeria o Código Penal (1984) em
detrimento da Convenção de Tóquio (1963).
TERRITORIALIDADE – Embarcações e aeronaves
estrangeiras sobre o território brasileiro
•  Territorialidade

•         Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de


convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime
cometido no território nacional. 
• (...)

• § 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a


bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de
propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no
território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente,
e estas em porto ou mar territorial do Brasil.
10.1.Competência para o julgamento de crimes cometidos
a bordo de embarcações e aeronaves

• É da Justiça Federal (art. 109, IX, CF), ressalvada a competência da


Justiça Militar, do local onde primeiro pousar a aeronave (art. 90,
CPP), ou atracar o navio (art. 89, CPP) após o delito .

• Entretanto, o STJ tem dado uma interpretação restritiva ao conceito


de embarcação, pois a Constituição Federal menciona a palavra
“navio”. Entende-se por esse termo a embarcação de grande porte,
autorizada e adaptada para viagens internacionais. Portanto, é da
competência da Justiça Estadual a punição de crimes cometidos a
bordo de iates, lanchas, botes e embarcações equiparadas.

• No tocante à aeronave, não há interpretação restritiva, mesmo que


o crime seja praticado dentro de um avião ainda em terra.
• “CPP, Art. 89.  Os crimes cometidos em qualquer [1] embarcação
nas águas territoriais da República, ou nos rios e lagos fronteiriços,
bem como [2] a bordo de embarcações nacionais, em alto-mar, [3]
serão processados e julgados pela justiça do primeiro porto
brasileiro em que tocar a embarcação, após o crime, ou, quando
se afastar do País, pela do último em que houver tocado.”

• “CPP, Art. 90.  Os crimes praticados a bordo [1] de aeronave


nacional, dentro do espaço aéreo correspondente ao território
brasileiro, ou ao alto-mar, [2] ou a bordo de aeronave estrangeira,
dentro do espaço aéreo correspondente ao território nacional, [3]
serão processados e julgados pela justiça da comarca em cujo
território se verificar o pouso após o crime, ou pela da comarca de
onde houver partido a aeronave.”
11. CRITÉRIOS PARA A EXTRATERRITORIALIDADE
• Os critérios para o exercício da extraterritorialidade
dividem-se em:

a) incondicionada, significando que o interesse punitivo


da Justiça brasileira deve ser exercido de qualquer
maneira, independentemente de qualquer condição
(art. 7.º, I e § 1º, do CP);

b) condicionada, demonstrando que somente há


interesse do Brasil em punir o autor de crime
cometido no exterior se preenchidas as condições
descritas no art. 7.º, II e §§ 2.º e 3.º, do Código Penal.
11.a.Hipóteses de extraterritorialidade incondicionada

• Os seguintes são as hipóteses que se fundam no princípio da defesa ou da


proteção (art. 7.º, I, a, b e c):

a) crimes cometidos contra a vida ou a liberdade do Presidente da


República (arts. 121 e 122 e 146 a 154 do Código Penal e arts. 28 e 29 da
Lei de Segurança Nacional – Lei 7.170/83).

b) crimes contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal,


de Estado, de Município, de empresa pública, sociedade de economia
mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público (são os arts.
155 a 180 e 289 a 311-A do Código Penal).

c) crimes contra a administração pública, por quem está a seu serviço (são
os arts. 312 a 326, em combinação com o art. 327, do Código Penal).
11.a. Hipóteses de extraterritorialidade
incondicionada
• Os seguintes são as hipóteses que se fundam no princípio da justiça universal (art.
7.º, I, d, CP):

a) crime de genocídio (extermínio, no todo ou em parte, de grupo nacional, étnico,


racial ou religioso, matando ou causando lesão grave à integridade física ou
mental de seus membros; submetendo o grupo, deliberadamente, a condições de
existência capazes de proporcionar-lhe a destruição física, integral ou parcial;
adotando medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo, bem como
efetuando a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo,
conforme art. 1.º da Lei 2.889/56), quando o agente for brasileiro ou domiciliado
no Brasil.

• OUTRA HIPÓTESE FORA DO CÓDIGO PENAL: crime de tortura, conforme previsão


da Lei 9.455/97, que estabeleceu a possibilidade de se aplicar a lei brasileira ao
torturador, onde quer que o delito seja cometido, desde que a vítima seja
brasileira ou esteja o autor da infração penal sob jurisdição brasileira (art. 2.º).
Como se trata de lei especial, que não fixou condições para se dar o interesse do
Brasil na punição do torturador, trata-se de extraterritorialidade incondicionada.
Dispositivos sobre a extraterritorialidade
incondicionada
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: 
I - os crimes: 
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; 
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado,
de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista,
autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; 
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; 
(...)
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que
absolvido ou condenado no estrangeiro.
(...)

Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo


mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.
DEBATE SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE
DO ART. 8.º DO CÓDIGO PENAL
• Tratando-se de extraterritorialidade condicionada, a pena cumprida no
estrangeiro faz desaparecer o interesse do Brasil em punir o criminoso.
Entretanto, nos casos de extraterritorialidade incondicionada, o infrator,
ingressando no País, estará sujeito à punição, pouco importando já ter
sido condenado ou absolvido no exterior.

• Para tentar amenizar a não aplicação do princípio que proíbe a dupla


punição pelo mesmo fato, fixou-se, no art. 8.º do Código Penal uma
fórmula compensadora. Caso a pena cumprida no exterior seja idêntica à
que for aplicada no Brasil (exemplo: pena privativa de liberdade no
exterior e pena privativa de liberdade no Brasil), será feita a
compensação; caso a pena cumprida no exterior seja diversa da que for
aplicada no Brasil (exemplo: multa no exterior e privativa de liberdade no
Brasil), a pena a ser fixada pelo juiz brasileiro há de ser atenuada.
DEBATE SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE DO
ART. 8.º DO CÓDIGO PENAL
• O entendimento majoritário da doutrina atualmente é o de que o
art. 8º do Código Penal não se coaduna com a garantia
constitucional de que ninguém pode ser punido ou processado
duas vezes pelo mesmo fato – consagrada na Convenção
Americana sobre Direitos Humanos de 1969, em vigor no Brasil, e
cuja porta de entrada no sistema constitucional brasileiro dá-se
pela previsão feita no art. 5.º, § 2.º, da Constituição Federal. Esse
é um PRINCÍPIO DO DIREITO PENAL CHAMADO DE NE BIS IN
IDEM.

• Em 2019 o STF julgou o HC 171.118, que versava sobre lavagem


de dinheiro envolvendo o Brasil a Suíça e a pessoa havia sido
condenado e cumprido pena por lá, a partir desse entendimento.
• “Pena cumprida no estrangeiro 
•         Art. 8º - A pena cumprida no
estrangeiro atenua a pena imposta no
Brasil pelo mesmo crime, quando
diversas, ou nela é computada, quando
idênticas. ”
11.b. Hipóteses de extraterritorialidade condicionada
• São as seguintes:

a) crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir (Ex.: tráfico
ilícito de drogas, a pirataria, entre outros). É o princípio da justiça universal (art. 7.º,
II, a, CP);

b) crimes praticados por brasileiros no exterior. A justificativa para a existência desse


princípio é a proibição de extradição de brasileiros, vedada pela Constituição Federal
(art. 5.º, LI). Assim, caso um brasileiro cometa um crime no exterior e se refugie no
Brasil, deve ser punido por um tribunal pátrio. Cuida-se do princípio da
nacionalidade ou da personalidade (art. 7.º, II, b, CP);

c) crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de


propriedade privada, quando realizado em território estrangeiro e aí não sejam
julgados. Trata-se do princípio da bandeira ou da representação (art. 7.º, II, c, CP);

d) crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, desde que não
tenha sido pedida ou tenha sido negada a extradição e quando houver requisição
do Ministro da Justiça. É a aplicação do princípio da defesa ou da proteção (art. 7.º,
§ 3.º, CP).
11.1. Condições para a extraterritorialidade
• Nos casos descritos no subitem anterior, é preciso o advento de cinco condições para
que surja o interesse punitivo da Justiça brasileira (art. 7.º, § 2.º, CP). São eles:

a) entrada do agente no território nacional.

b) existência de dupla tipicidade, ou seja, o fato praticado no exterior e considerado


crime no Brasil necessita ser também infração penal no exterior. Quando o crime for
cometido em lugar não pertencente a país algum, aplica-se a lei da pátria do agente
do delito, pois são os nacionais responsáveis pelo cumprimento das leis do seu país;

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição
(a pena máxima prevista deve ser necessariamente superior a um ano).

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou, tendo sido condenado, não ter aí
cumprido pena.

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por qualquer outro motivo, não
estar extinta a punibilidade, conforme a lei mais favorável.
Dispositivos sobre a extraterriorialidade
condicionada
 Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
(...)
II - os crimes:  
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; 
b) praticados por brasileiro; 
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando
em território estrangeiro e aí não sejam julgados. 
(...)

§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: 
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; 
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; 
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade,
segundo a lei mais favorável. 
§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do
Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: 
a) não foi pedida ou foi negada a extradição;
b) houve requisição do Ministro da Justiça.
    
Diferença entre a extraterriorialidade
condicionada e a incondicionada

• Art. 7º, II, c/c art. 7º, §§ 2º e 3º, todos do CP


(extraterritorialidade condicionada): se o agente é
condenado e cumpre pena no exterior, cessa o
interesse do Estado Brasileiro em punir.

• Art. 7º, I c/c arts. 7º, § 1º e 8º, todos do CP


(extraterritorialidade incondicionada): se o agente é
condenado e cumpre pena no exterior apenas pode
ser compensada ou atenuada a pena a ser cumprida
no Brasil.
12. EXTRADIÇÃO

• Trata-se de um instrumento de cooperação internacional na repressão à


criminalidade por meio do qual um Estado entrega a outro uma pessoa
acusada ou condenada, para que seja julgada ou submetida à execução
da pena. A sua relevância surge a partir do momento em que
consideramos os princípios da territorialidade e da extraterritorialidade.

• Caso alguém cometa um crime em solo nacional (territorialidade),


refugiando-se em país estrangeiro, cabe ao Brasil solicitar a sua
extradição, a fim de que possa responder, criminalmente, pelo que fez.

• Em igual prisma, se o agente comete o crime no exterior, mas


ofendendo interesse ou bem jurídico brasileiro, aplicando-se a regra da
extraterritorialidade, terá o Brasil interesse em puni-lo, havendo
necessidade de se utilizar do instituto da extradição.
12. EXTRADIÇÃO
“Art. 5º, CRFB (...) LI – [1] nenhum brasileiro será extraditado, [3] salvo o
naturalizado, em caso de crime comum, [3.1] praticado antes da
naturalização, [3.2] ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, [3.2.1] na forma da lei;
LII – [2] não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de
opinião;”

Ou seja:
1)é vedada a concessão de extradição de brasileiro nato de modo absoluto.

2) é vedada a concessão de extradição do estrangeiro por crime político ou de


opinião.

3) é vedada a concessão de extradição de brasileiro naturalizado, 3.1) salvo em


relação a crime comum cometido antes da naturalização 3.2) ou envolvido em
tráfico de entorpecentes e drogas afins, 3.2.1) essa lei ainda não foi aprovada.
12.1. Espécies de extradição e fonte legislativa

• Chama-se extradição ativa o pedido formulado por um Estado


para a entrega de alguém e extradição passiva a entrega de uma
pessoa por um Estado em razão do pedido formulado por outro.

• A fonte legislativa principal é a Lei 6.815/80 (alterada pela Lei


6.964/81) – denominada Estatuto do Estrangeiro – e o Decreto
86.715/81. Na Constituição Federal há dispositivo expresso
determinando que somente a União pode legislar sobre
extradição (art. 22, XV).

• O princípio básico que rege a extradição é que a punição do


crime deve ser feita no local onde foi praticado, em virtude do
abalo causado na sociedade.
12.2. Requisitos para a concessão da extradição

Os requisitos para concessão de extradição são:

a) exame prévio do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, g, CF);

b) existência de convenção ou tratado firmado com o Brasil ou,


em sua falta, oferecimento de reciprocidade;

c) existência de sentença final condenatória do Estado


requerente;

d) ser o extraditando estrangeiro (o naturalizado não pode ter


adquirido essa condição após o fato que motiva o pedido e/ou
não pode estar envolvido em tráfico ilícito de entorpecentes –
art. 5.º, LI, da CF);
12.2. Requisitos para a concessão da extradição
• Os requisitos para concessão de extradição são:

e) o fato imputado deve constituir crime – e não contravenção penal –


perante a lei brasileira e a do Estado requerente;

f) a pena máxima para o crime imputado ao extraditando deve ser


privativa de liberdade superior a um ano, pela legislação brasileira;

g) o crime imputado ao extraditando não pode ser político ou de opinião,


incluídos nestes os de fundo religioso e de orientação filosófica (art.
5.º, LII, da CF, e art. 77, VII, do Estatuto do Estrangeiro);

h) o extraditando não pode estar sendo processado, nem pode ter sido
condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o
pedido. É a aplicação do princípio do ne bis in idem;
12.2. Requisitos para a concessão da extradição
• Os requisitos para concessão de extradição são:

i) o Brasil tem que ser incompetente para julgar a infração, segundo suas leis,
e o Estado requerente deve provar que é competente para julgar o
extraditando;

j) o extraditando, no exterior, não pode ser submetido a tribunal de exceção,


que é o juízo criado após o cometimento da infração penal, especialmente
para julgá-la; não pode estar extinta a punibilidade pela prescrição, segundo
a lei do Estado requerente ou de acordo com a brasileira;

k) o extraditando não pode ser considerado, oficialmente, como refugiado pelo


Governo brasileiro (art. 33, Lei 9.474/97).

• Vale lembrar o disposto na Súmula 421 do STF: “Não impede a extradição a


circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho
brasileiro”
13. OUTRAS EXCEÇÕES À REGRA DA TERRITORIALIDADE

• Como regra geral, aplica-se a lei penal brasileira aos crimes cometidos no
território nacional. Entretanto, há duas exceções:

a) as convenções, tratados e regras de direito internacional podem afastar a


aplicação da lei penal, conforme dispõe o art. 5.º, caput, do Código Penal.
Exemplo disso é a Convenção de Viena, que trata das imunidades
diplomáticas, desse modo, o diplomata que cometer um crime no Brasil
não será preso, nem processado no território nacional, por força da exceção
criada;

b) as imunidades parlamentares, instituídas pela Constituição Federal,


configuram outra hipótese de não aplicação da lei penal brasileira a
infrações de opiniões, palavras e votos cometidas no território nacional
(art. 53, caput, da CF).
14. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
E SOBERANIA NACIONAL
• Em razão da soberania da nação, uma sentença estrangeira não pode produzir
efeitos no Brasil sem a homologação feita por um tribunal pátrio, porque, se
assim fosse feito, estar-se-ia, em última análise, aplicando em território
nacional leis estrangeiras.

• Um povo somente é efetivamente soberano quando faz suas próprias normas,


não se submetendo a ordenamentos jurídicos alienígenas.

• Por isso, quando, em determinados casos, for conveniente que uma decisão
estrangeira produza efeitos no Brasil é preciso haver homologação. O objetivo
é nacionalizar a lei penal estrangeira que deu fundamento à sentença a ser
homologada.

• A competência para a homologação é do Superior Tribunal de Justiça (art. 105,


I, i, CF).
• “Eficácia de sentença estrangeira

• Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei


brasileira produz na espécie as mesmas conseqüências, pode
ser homologada no Brasil para: 
• I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a
outros efeitos civis;   
• II - sujeitá-lo a medida de segurança.

• Parágrafo único - A homologação depende: 


• a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte
interessada; 
• b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição
com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença,
ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça.”
14.1.a HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO

• 1) Reparação civil do dano causado à vítima Busca-se facilitar


a posição da vítima do crime, que não terá que dar início a um
processo de indenização, na esfera cível, provando novamente
a culpa do infrator, uma vez que, feita a homologação da
sentença condenatória estrangeira, concretiza-se a formação
de um título executivo (art. 9.º, I, CP).

• A discussão, quando a decisão homologada for executada,


volta-se apenas ao valor da reparação do dano. Nessa
hipótese, deve o ofendido requerer a homologação no
Superior Tribunal de Justiça (art. 9.º, parágrafo único, a, CP).
14.1.b HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO
• 2. Aplicação de medida de segurança (art. 9.º, II) ao inimputável, absolvido e
sujeito à medida de segurança, isto é, à internação ou ao tratamento
ambulatorial (art. 97, CP).

• O semi-imputável, por sua vez, pode ser condenado e ter sua sanção penal
substituída por medida de segurança, que seja internação ou tratamento
ambulatorial (art. 98, CP).

• Utiliza-se a aplicação da medida de segurança imposta por autoridade


estrangeira em benefício do próprio sentenciado e também da sociedade, que
evitará o convívio desregrado com um enfermo perigoso.

• Para essa hipótese, é preciso requerimento do Procurador-Geral da República


no STJ, desde que exista tratado de extradição entre o país de onde vem a
sentença impondo a medida de segurança, ou, na falta de tratado, de
requisição do Ministro da Justiça.
14.1.c HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO

• 3. Hipótese prevista na Lei de Lavagem de Dinheiro A Lei


9.613/98, no art. 8.º, assegurou a possibilidade de serem
decretadas medidas assecuratórias, como o sequestro dos
bens, direitos e valores decorrentes do crime de “lavagem”,
de forma que, findo o processo, quando se tratar de delito
internacional, poderão o Brasil e o país solicitante da
medida assecuratória dividir o que foi amealhado.

• Para tanto, é preciso a homologação da sentença


estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça, a fim de que a
perda dos bens se consume em definitivo.
14.2. EFEITOS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA ESTRANGEIRA QUE INDEPENDEM DE HOMOLOGAÇÃO

• Há casos em que a sentença estrangeira produz efeitos no Brasil, sem


necessidade de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça. São situações
particulares, nas quais não existe execução da sentença alienígena, mas
somente a consideração das mesmas como fatos jurídicos.

• São as seguintes hipóteses: a) gerar reincidência (art. 63, CP); b) servir de


pressuposto da extraterritorialidade condicionada (art. 7.º, II, § 2.º, d e e, CP);
c) impedir o sursis (art. 77, I, CP); d) prorrogar o prazo para o livramento
condicional (art. 83, II, CP); e) gerar maus antecedentes (art. 59, CP). Para
tanto, basta a prova da existência da sentença estrangeira.

• Note-se que, mesmo não sendo a sentença estrangeira suficiente para gerar a
reincidência, é possível que o juiz a leve em consideração para avaliar os
antecedentes, a conduta social e a personalidade do criminoso.
REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

• NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de


Direito Penal / Guilherme de Souza Nucci. –
10. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro:
Forense, 2014.

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