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A POESIA DEPOIS DE 1945

Juliana Gonçalo
A poesia de 1945

◦ 1944- I Congresso Brasileiro de escritores:


◦ Autores nacionais e estrangeiros reuniram-se para manifestar oposição ao
governo de Getúlio Vargas, principalmente ao que se percebia como ataque
à liberdade de expressão.
◦ Os congressistas, entre eles Jorge Amado, produziram um manifesto pela
liberdade de pensamento e pela eleição presidencial por meio
de sufrágio universal. 
A poesia de 1945
◦ Contexto histórico:
◦ Fim da Segunda Guerra Mundial;
◦ Transição da Ditadura do Estado Novo para um regime mais democrático, por meio da lei nº 9 – Previa
eleições diretas no prazo de 90 dias.
◦ Vivia-se um clima de transformação e de conquista social, com a defesa das liberdades individuais.
◦ De 1930 a1945 - salto na modernização brasileira: instalação de siderúrgicas  e a construção de
hidrelétricas e de rodovias.
◦ O início da Guerra Fria  (1947) marcou uma corrida armamentista – Fomentando a extração
de minérios e de outros recursos naturais brasileiros quanto fortaleceu as Forças Armadas nacionais.
A poesia de 1945

◦ Terceira Geração modernista: Preocupação com a linguagem, efeitos que


as palavras sugerem nos textos e consciência da realidade do país.
◦ Sem abandonar os temas sociais e as representações dos muitos países
dentro de um país, os autores de 1945-1960, acreditavam no poder
transformador da poesia.
João Cabral de Melo Neto

◦ Nasceu em 1920 – Recife.


◦ Passou a infância nos engenhos de açúcar no interior de
Pernambuco.
◦ Aos 10 anos, mudou-se com a família para Recife.
◦ Estreia literária - 1942:  Pedra do sono.
◦ 1945 – Iniciou a carreira diplomática.
Características - João Cabral de Melo Neto
◦ Sua produção é marcada pela lapidação linguística.
◦ Buscava produzir poemas que desafiassem a interpretação do leitor a cada nova palavra, a
cada novo verso.
◦ Predominância da racionalidade.
◦ É conhecido como "poeta engenheiro"
Características - João Cabral de Melo Neto
◦ Preocupação com as escolhas das palavras;
◦ Metalinguagem;
◦ Versos objetivos;
◦ Trabalho de lapidação dos poemas;
◦ Estreita relação entre forma e conteúdo;
◦ Texto como produto que deve expressar seu entorno;
◦ Relação com a vanguarda construtivista ( para os construtivistas, textos, quadros, esculturas são
construções em si, não apenas objeto)
Obras:
◦ Pedra do sono – 1942
◦ O engenheiro – 1945
◦ O cão sem plumas – 1950
◦ Morte e vida severina ( auto de Natal pernambucano) - 1955
◦ A educação pela pedra - 1966
Em Pedra do Sono (1942), sua obra inaugural, apresenta uma inclinação para a objetividade
embora predomine aspectos surrealistas.

◦ Pedra do Sono
◦ Meus olhos têm telescópios
Espiando a rua.
Espiando a alma
Longe de mim mil metros.
◦ Mulheres vão e vêm nadando
Em rios invisíveis.
Automóveis como peixes cegos
Compõem minhas visões mecânicas.
◦ Há 20 anos não digo a palavra
Que sempre espero de mim:
Ficarei indefinidamente contemplando
Meu retrato eu morto.
O cão sem plumas II
... Como o rio 

aqueles homens 
O poema faz uma comparação entre
são como cães sem plumas  os moradores da região do
(um cão sem plumas é mais que um cão saqueado; 
manguezal do rio Capibaribe, e a
imagem do cão sem plumas ( sem
É mais que um cão assassinado.  adereço, enfeites).
Um cão sem plumas Essa metáfora explica ao leitor  o
 é quando uma árvore sem voz. 
problema do poema: a descrição da
miséria e do desmantelamento dos
É quando de um pássaro  habitantes do Capibaribe. 
suas raízes no ar. 

É quando a alguma coisa 

roem tão fundo 

até o que não tem). 


◦ O Engenheiro
◦ A Antônio B. Baltar

A luz, o sol, o ar livre


envolvem o sonho do engenheiro.
O engenheiro sonha coisas claras:
superfícies, tênis, um copo de água.

O lápis, o esquadro, o papel;


o desenho, o projeto, o número:
o engenheiro pensa o mundo justo,
mundo que nenhum véu encobre.

(Em certas tardes nós subíamos


ao edifício. A cidade diária,
como um jornal que todos liam,
ganhava um pulmão de cimento e vidro).

A água, o vento, a claridade


de um lado o rio, no alto as nuvens,
situavam na natureza o edifício
crescendo de suas forças simples.

Publicado no livro O engenheiro (1945)


Morte e vida severina

◦ Retrata a saga de um retirante nordestino que sai do


sertão em direção ao Recife, na luta pela sobrevivência.
◦ Ao longo do caminho, a sobrevivência de Severino vai se
tornando cada vez mais precária.
◦ Morte e Vida Severina

◦ — O meu nome é Severino,


não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria;
Como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias. (...)
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte Severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia.
◦ — Severino retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte e da vida;
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga;
é difícil defender,
só com palavras, a vida,
ainda mais quando ela é
esta que vê, severina;
mas se responder não pude
à pergunta que fazia,
ela, a vida, a respondeu
com sua presença viva.
E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
Morte e vida Severina
...
FERREIRA
GULLAR
José de Ribamar Ferreira
– 1930 –2016
Nasceu em: São Luís do
Maranhão.
Tinha 10 irmãos.
Publicou seu primeiro
livro aos 18 anos.
Ferreira Gullar
◦ Obras: 
◦ Um pouco acima do chão - 1949
◦ A luta corporal – 1954
◦ Poema sujo – 1975
Ferreira Gullar
Divergências com o grupo: Haroldo de Campos,
Augusto de Campos e Décio Pignatari – ocasionaram
uma ruptura em 1959. Assim iniciou o
◦ "Sua poesia, muito dinâmica, apresenta desde Neoconcretismo.
aspectos intimistas a aspectos críticos da
realidade política e social nacional. Além disso, O concretismo foi um movimento artístico e cultural que
ousou quanto à forma, sendo um dos fundadores surgiu na Europa em meados do século XX, o qual
visava a criação de uma nova linguagem, uma arte
do concretismo e do neoconcretismo." abstrata.
FERREIRA GULLAR •

CARACTERÍSTICAS:
Produção poética variada;
• Tom intimista;
• Temáticas ligadas à reflexão
◦ Tem uma produção literária muito ampla, que acompanhou política;
diferentes momentos e contextos brasileiros, sendo impossível • Preocupação social;
estabelecer suas principais características. • Arte feita pelo e para o
povo;
◦ No entanto, há um elemento que sempre foi importante para o • Rememoração de passagens
poeta: a ideia de que o fazer literário era uma luta corporal entre os da infância e descrições de
sujeitos e as palavras. cenas do cotidiano;
• Poema é resultado de uma
luta corporal entre o poeta e
as palavras.
MEU POVO, MEU POEMA
Meu povo e meu poema crescem juntos
Como cresce no fruto
A árvore nova

No povo meu poema vai nascendo


Como no canavial
Nasce verde o açúcar

No povo meu poema está maduro


Como o sol
Na garganta do futuro

Meu povo em meu poema


Se reflete
Como espiga se funde em terra fértil

Ao povo seu poema aqui devolvo


Menos como quem canta
Do que planta
Mas que importa um nome
debaixo deste teto de telhas encardidas vigas

POEMA SUJO à mostra entre


entre cadeiras e mesa entre uma cristaleira e
um armário diante
de garfos e facas e pratos de louça que se
quebraram já
um prato de louça ordinária não dura tanto
◦ POEMA SUJO - FERRE as facas se perdem os garfos
IRA GULLAR se perdem pela vida caem
pelas falhas do assoalho e vão conviver com os
POEMA SUJO -RECITADO ratos
e baratas ou enferrujaram no quintal
esquecidos entre os pés de erva cidreira
Escrito em Buenos Aires, no ano de 1976, o Poema e as grossas orelhas de hortelã
sujo foi composto enquanto o poeta Ferreira Gullar quanta coisa de perde
estava exilado por motivos políticos. Os mais de dois nesta vida
mil versos criados na solidão do exílio são uma como se perdeu o que eles falavam ali
espécie de hino pela liberdade. mastigando
misturando feijão com farinha e nacos de
carne assada
e diziam coisas tão reais como a toalha
bordada
ou a tosse da tia no quarto
e o clarão do sol morrendo  na platibanda em
frente à nossa janela
tão reais que
se apagaram para sempre
ou não?

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