processo acusatório no século XIII, consolidando- se em toda a Europa continental no século XVI, alterou profundamente todo o sistema penal, atribuindo ao juízo humano um papel essencial, condicionado pelas regras racionais do direito. As falhas do antigo sistema demonstravam a ineficácia para o combate à crescente criminalidade. Mas, foi a Igreja que, principalmente, influenciou e incentivou a adoção dos novos procedimentos no sistema penal.
A Igreja proibiu, no IV Concílio de Latrão (1215), a
participação dos clérigos nos ordálios. O ordálio, que apelava à providência divina para estabelecer a culpa ou inocência do réu, requeria a presença de clérigos para abençoar a operação. Estando estes, a partir do Concílio, proibidos de participar dos ordálios, não mais poderiam ser realizados. No processo por inquérito, o desencadeamento da ação penal ainda poderia ser feito pela acusação privada, mas o acusador não tinha nenhuma responsabilidade em caso de inocência do réu.
A denúncia também poderia ser feita por
habitantes de uma comunidade inteira.
Os oficiais do tribunal poderiam intimar um
suspeito de crime com base em informações por eles mesmos obtidas. A iniciação do processo nesta modalidade facilitou não só o julgamento de todos os crimes, como demonstrou-se muito eficaz na caça aos hereges.
Outro fator que diferenciou o processo por
inquérito do processo acusatório, foi a oficialização de todas as etapas do processo judicial a partir da apresentação da denúncia.
O juiz e os demais oficiais do tribunal assumiam a
investigação dos crimes e determinavam a culpabilidade ou não do réu, normalmente através do interrogatório de testemunhas e do próprio réu, A forma secreta e escrita do processo conferia o poder de estabelecer a verdade, única e exclusivamente aos juízes e profissionais do direito, o que em última instância correspondia ao direito de punir do soberano.
As evidências do crime eram investigadas e
avaliadas mediante regras meticulosamente formuladas. As provas dividiam-se em: diretas, indiretas, manifestas, imperfeitas ou, ainda, as provas plenas (testemunho ocular de duas pessoas), indícios próximos (chamados de provas semiplenas) e os indícios longínquos (opinião pública, má fama do suspeito, etc.).
As provas plenas poderiam acarretar qualquer
condenação, as semiplenas ensejar suplícios, mas nunca a pena capital, e os indícios bastavam para declarar um suspeito e iniciar investigações. A enorme importância dada à confissão explica o meio utilizado pelos juízes e inquisidores para obtê-la: a tortura. A utilização “da tortura na heresia, bruxaria e outras causas foi, portanto, o resultado direto da adoção do processo por inquérito. A lógica de um levou à aplicação da outra.”
A Igreja, que até então havia condenado esse
procedimento, autorizou, através da Bula do Papa Inocêncio IV, em 1252, a adoção da tortura pelosinquisidores nos julgamentos de bruxaria e heresia, o que foi seguido pelos juízes dos Tribunais Seculares. O argumento para o uso da tortura era o de que, quando uma pessoa fosse submetida ao sofrimento físico durante o interrogatório, inevitavelmente, confessaria a verdade. Assim nasce o princípio da verdade real.
Após a confissão, vinha a condenação e, em
seguida, a execução da pena. Mas, antes disso, o condenado era obrigado a confessar sua culpa em uma igreja, pedindo perdão a Deus e aos Santos por ter-se entregue ao Diabo. Nesse evento, denominado auto-de-fé, auto-de-fé a multidão comparecia para ouvir o relato de suas maldades e seu arrependimento.