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Fernando Pessoa,

Poesia do ortónimo
Índice
Contextualização Nostalgia da infância

Temáticas Sonho/Realidade

Linguagem, estilo e
Fingimento artístico
estrutura

Dor de pensar Exercícios

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Contextualização
A palavra «ortónimo» significa «em nome próprio». Designa a poesia escrita
por Fernando Pessoa, sem recurso a personalidades fictícias que o poeta criou.

Este conjunto de poemas revela-se um labirinto de contradições, de


pensamentos complexos e arrojados.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Contextualização
Fernando Pessoa utilizou as palavras como ecos de um tempo por si vivido,
marcado pelo:
o êxtase e entusiasmo;
o progresso e rutura;
o questionamento constante.

É um tempo de crise da razão e da verdade dogmática, no qual se levantam


questões políticas, sociais, filosóficas.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Contextualização
A própria vida e personalidade do poeta são atingidas por uma crise: a crise
identitária.

Fernando Pessoa sente-se…

o … sedento de tudo e de nada;


o … um ser inquieto, lúcido e racional;
o … condenado ao vício de pensar.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Contextualização
O Sonho e a Infância surgem, consequentemente, como os únicos espaços
onde o poeta se pode refugiar, encontrando, momentaneamente, alguma felicidade.

«Outrora em criança/ O mesmo pregão.../ Não lembres...


Descansa,/ Dorme, coração!...»
Poema «No meio da rua», vv. 9-12

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Temáticas
Podemos distinguir na poesia do ortónimo
quatro temáticas complexas e dotadas de
dramaticidade (constante «diálogo» entre
diversas dicotomias ou entre diversos eus):

o Fingimento artístico;
o Dor de pensar;
o Nostalgia da infância;
o Sonho/Realidade.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Fingimento artístico
Conceção de poema:

o construção mental;
o produto que não deriva direta e imediatamente de uma emoção;
o elaboração «fingida» (encenada, intelectualizada, imaginada).

«Dizem que finjo ou minto/ Tudo que escrevo. Não./ Eu


simplesmente sinto/ Com a imaginação.»
Poema «Isto» vv. 1-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Fingimento artístico
Conceção de poeta:

o um ser fingidor (aquele que simula);


o intelectualizador, pensador;
o recriador das emoções, através da imaginação e do intelecto.

«O poeta é um fingidor.»
Poema «Autopsicografia», v. 1

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Fingimento artístico
Dicotomias:

o sinceridade/fingimento;
o imaginação/coração;
o pensamento/emoção (pensar/sentir).

«Dizem que finjo ou minto/ Tudo que


escrevo. Não/ Eu simplesmente sinto/
Com a imaginação. / Não uso o coração»
Poema «Isto» vv. 1-5

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
uso excessivo da razão (da consciência), da qual o eu não consegue libertar-
se;

«Maldito o dia em que pedi a ciência! […] Que é feito dessa


minha inconsciência/ Que a consciência como um traje, veste?
[…] Prouvera a Deus que eu não soubesse tanto!»
Poema «Maldito o dia em que pedi a ciência!», vv. 1, 3, 4 e 8

«Doo-me até onde penso,/ E a dor


«Sem querer a gente pensa.» é já de pensar»
Poema «Não sei ser triste a valer», v. 13
Poema «Marinha», vv. 5-6

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
Atitude permanente de intelectualização das emoções (inibição e
incapacidade de viver os sentimentos puros);

«Não uso o coração.» «O que em mim sente está pensando»


Isto», v. 5 Poema «Ela canta, pobre ceifeira», v. 14

«Ditosos a quem acena/ Um lenço na despedida!/ São felizes: têm


pena…/ Eu sofro, sem pena a vida»
Poema «Marinha», vv. 1-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
Consciência da efemeridade da vida;

«Ó campo! Ó canção! A ciência/ Pesa tanto e a vida é tão breve!»


Poema «Ela canta, pobre ceifeira», vv. 20-21

Incapacidade de usufruir do momento (a realidade exterior é pretexto para


a reflexão interior);

«Chove. Que fiz eu da vida?/ Fiz o que ela fez de mim…/ De pensada,
mal vivida…/ Triste de quem é assim!»
Poema «Chove. Que fiz eu da vida?», vv. 1-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
Sentimentos de frustração,
angústia e infelicidade;

«Eu vejo-me e estou sem mim,/


Conheço-me e não sou eu.»
Poema «Gato que brincas na rua», vv. 11-12

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
Fragmentação do eu e incapacidade de aceder à totalidade, ao absoluto
(do eu e da realidade);

«Não sei quantas almas tenho./ Cada momento mudei./ Continuamente


me estranho./ Nunca me vi nem achei.»
Poema «Não sei quantas almas tenho», vv. 1-4

«Contemplo o que não vejo. […] Tudo é do outro lado,/ No que há e no


que penso.»
Poema «Contemplo o que não vejo», vv. 1, 9 e 10

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Dor de pensar
Ambição de ser inconsciente.

«Invejo a sorte que é tua»


Poema «Gato que brincas na rua», v. 3

«Ter a tua alegre inconsciência/ e a consciência disso […].»


Poema «Ela canta, pobre ceifeira», vv. 18-19

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Nostalgia da Infância
Refúgio no tempo de infância (evasão à sua deceção com a vida, à dor de
pensar);

«E é tão lento o teu soar,/ Tão como triste da vida,»


Poema «Ó sino da minha aldeia», vv. 5-6

Infância como tempo de inocência e inconsciência;

«Quando era criança/ Vivi, sem saber,/ Só para hoje ter/ Aquela lembrança.»
Poema «Quando era criança», vv. 1-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Nostalgia da Infância
Possibilidade de ser feliz;

«E eu era feliz? Não sei:/ Fui-o outrora agora.»


Poema «Pobre velha música!», vv. 11-12

«Sinto mais longe o passado,/ Sinto a saudade mais perto.»


Poema «Ó sino da minha aldeia», vv. 15-16

Idealização da infância enquanto «paraíso perdido».

«Não sei, ama, onde era, […] Que azul tão azul tinha/ Ali o azul do céu! […] E o
jardim tinha flores»
Poema «Não sei, ama, onde era», vv. 1, 5, 6 e 9

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Sonho/Realidade
Evasão à realidade cruel, por ser racionalizada/intelectualizada (dor de
pensar), através do sonho;
«Toda beleza é um sonho, inda que exista./Porque a
beleza é sempre mais do que é.»
Poema «Toda a beleza é um sonho», vv. 1-2

«Bem sei que há ilhas lá ao sul de tudo/ Onde há paisagens que não pode haver./
Tão belas que são como que o veludo/ Do tecido que o mundo pode ser.»
Poema «Bem sei que há ilhas lá ao sul de tudo», vv. 1-4

«É a que ansiamos. Ali, ali/ A vida é jovem e o amor sorri/ Talvez palmares
inexistentes,/ Áleas longínquas sem poder ser,/ Sombra ou sossego deem aos
crentes/ De que essa terra se pode ter»
Poema «Não sei se é sonho, se realidade», v. 5-10

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Sonho/Realidade
Consciência da felicidade efémera e ilusória vivida no sonho;

«Felizes, nós? Ah, talvez, talvez,/ Naquela terra,


daquela vez./ Mas já sonhada se desvirtua,»
Poema «Não sei se é sonho, se realidade», vv. 11-13

«Sei, sim, é belo, é luz, é impossível,/ Existe, dorme, tem a cor e o fim,»
Poema «Bem sei que há ilhas lá ao sul de tudo», vv. 13-14

Intensificação do estado de desilusão ao regressar à realidade.

«Mas já sonhada se desvirtua,/ Só de pensá-la cansou pensar,»


Poema «Não sei se é sonho, se realidade», vv. 13-14

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
Na poesia de Pessoa ortónimo, predominam:

o Vocabulário simples, mas simbólico;


«E assim nas calhas de roda/ Gira, a entreter a
razão,/ Esse comboio de corda/ Que se chama
coração»
Poema «Autopsicografia», vv. 9-12

o Pontuação expressiva;
«Sentir? Sinta quem lê!»
Poema «Isto», v. 15

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Construções sintáticas simples.

«Eu simplesmente sinto/ Com a imaginação.»


Poema «Isto», vv. 3-4

o Predomínio de quadras e quintilhas;


«Dizem que finjo ou minto
«O poeta é um fingidor. Tudo que escrevo. Não.
Finge tão completamente Eu simplesmente sinto
Que chega a fingir que é dor Com a imaginação.
A dor que deveras sente.» Não uso o coração.»
Poema «Autopsicografia», vv. 1-4 Poema «Isto», vv. 1-5

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Preferência pelos versos em redondilha maior ou octossilábicos;

«O poeta é um fingidor.» «Ela canta, pobre ceifeira»


Poema «Autopsicografia», v. 1 Poema «Ela canta, pobre ceifeira», v. 1

o Tendência para a regularidade rimática:


presença de um esquema rimático
ao longo do poema; «O poeta é um fingidor. A
Finge tão completamente B
uso privilegiado das rimas cruzadas, Que chega a fingir que é dor A
seguindo a tradição literária. A dor que deveras sente.» B
Poema «Autopsicografia», vv. 1-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
Os poemas pessoanos apresentam musicalidade e ritmo e exploram alguns
recursos expressivos que lhes imprimem uma pluralidade rica de sentidos.
o Aliteração;

«Sério do que não é./ Sentir? Sinta quem lê!» «Raiva nas trevas o vento»
Poema «Isto», vv. 14-15 Poema «Fúria nas trevas o vento», v. 9

o Metáfora; o Antítese;
«A morte é a curva da estrada» «Ouvi-la alegra e entristece,»
Poema «A morte é a curva da estrada», v. 1 Poema «Ela canta, pobre ceifeira», v. 9

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Comparação;
«Estou preso ao meu pensamento/ Como o
«É como que um terraço» vento preso ao ar.»
Poema «Poema «Isto», v. 8 Poema «Fúria nas trevas o vento», vv. 11-12

o Repetição;
«Finge tão completamente/ Que chega a
fingir que é dor/ A dor que deveras sente.»
Poema «Autopsicografia», vv. 2-4

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Personificação;

«A vida é jovem e o amor sorri»


Poema «Não sei se é sonho ou realidade», v. 6

o Anáfora;

«E os que leem o que escreve, […] E assim nas calhas de roda»


Poema «Autopsicografia», vv. 5 e 9

«É brando o dia, brando o vento./ É brando


o sol e brando o céu.»
Poema «É brando o dia, brando é o vento», vv. 1-2

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Interrogação retórica; o Oxímoro (paradoxo);

«Releio e digo: “Fui eu?”» «Contemplo o que não vejo»


Poema «Não sei quantas almas tenho», v. 21 Poema «Contemplo o que não vejo»; v. 1

«Eu sofro sem pena a vida.»


Poema «Marinha», v. 4
o Apóstrofe;
«Ó céu,/ Ó campo! Ó canção […].»
Poema «Ela canta, pobre ceifeira», v. 20

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Linguagem, estilo e estrutura
o Gradação.

«Ó céu!/ Ó campo! Ó canção!» (da realidade mais vasta para a mais específica)»
Poema «Ela canta, pobre ceifeira», vv. 19-20

«Uma porta entreaberta.../ Um sorriso em descrença.../ Uma ânsia que não


acerta/ Com aquilo em que pensa.» (do mundo exterior, físico, para o interior,
mais abstrato)
Poema «Alga», vv. 4-7

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios Solução

1. Selecione a única opção que completa corretamente as frases.

1.1 A poesia do ortónimo abrange…

a) … apenas os poemas que escreveu em nome de personalidades fictícias.


b) … o conjunto
conjunto de
de poemas
poemasescritos
escritosem
emnome
nomepróprio.
próprio.
c) … todos os poemas escritos por Fernando Pessoa.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios Solução

1. Selecione a única opção que completa corretamente as frases.

1.2 O período vivido por Pessoa é marcado por…

a) … uma mudança
mudança na
na forma
formade
depensar,
pensar,representada
representadanas
nassucessivas
sucessivasquestionações
questionaçõese ecrises. .
crises.
b) … uma estabilidade ao nível cultural e social.
c) … uma estabilidade histórico-política, que deu origem a uma onda de novas correntes
literárias.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios Solução

2. Assinale como verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações acerca da


poesia do ortónimo.

A. Na poesia ortónima de Pessoa exploram-se habitualmente quatro temáticas: o


fingimento artístico, a dor de pensar, a nostalgia de infância e a dicotomia sonho/realidade.
• Verdadeira

B. O sujeito poético considera que o poeta é um fingidor, dado que nunca experienciou o
que escreve.
• Falsa

C. O eu lírico olha o poema enquanto expressão objetiva da realidade, não devendo transmitir
as suas convicções ou dores.
• Falsa

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios Solução

2. Assinale como verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações acerca da


poesia do ortónimo.

D. A infância é um período de inocência, em que se vive plenamente as emoções e, por


isso, é considerada como um refúgio, uma fuga à dor que o eu vive no presente.
• Verdadeira

E. A frustração e a angústia existencial vividas pelo eu conduzem-no ao sonho, com o


objetivo de se evadir da realidade e buscar felicidade.
• Verdadeira

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa


Exercícios Solução

3. Complete as afirmações selecionando a opção correta.

2.2 Os
A. Mensagem
poemas aproxima-se
pessoanos apresentam
da obra Os Lusíadas,
_(1)_ (irregularidade/regularidade)
(irregularidade/regularidade)
uma vez que… formal, tanto a nível
estrófico como a nível métrico e rimático, predominando a rima _(2)_ ((cruzada/interpolada
cruzada/interpolada ) e
a) a…seguinte
ambas asclassificação
obras têm como
estrófica:
tema_(3)_
central((sextilhas/quadras
sextilhas/quadras
o nacionalismo. ) e _(4)_ ( quintilhas/oitavas).
quintilhas/oitavas ).
b) … têm ambas a mesma autoria.
B. Na poesia do ortónimo, encontramos _(5)_ ((abundância/escassez
abundância/escassez ) de recursos expressivos
c) … são as duas obras de caráter poético.
C. Destacam-se alguns recursos, como _(6)_ ( a metáfora/a metonímia )metonímia
(a metáfora/a e _(7)_ )
d) … ambas são escritas em português contemporâneo.
pleonasmo/a
(o pleonasmo /a comparação ), entre outros.

Poesia do ortónimo – Fernando Pessoa

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