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Cap1

Epistemologia

Epistemologia ou teoria do conhecimento (do grego ἐπιστήμη [episteme], ciência,


conhecimento; λόγος logos], discurso) é um ramo da Filosofia que trata dos problemas
filosóficos relacionados à crença e ao conhecimento.
A epistemologia estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento
(daí também se designar por filosofia do conhecimento). Ela se relaciona ainda com a
metafísica, a lógica e o empirismo, uma vez que avalia a consistência lógica da teoria e
sua coesão fatual, sendo assim a principal dentre as vertentes da filosofia (é considerada
a "corregedoria" da ciência). Sua problematização compreende a questão da
possibilidade do conhecimento: Será que o ser humano conseguirá algum dia atingir
realmente o conhecimento total e genuíno, fazendo-nos oscilar entre uma resposta
dogmática ou empirista? Outra questão abrange os limites do conhecimento: Haverá
realmente a distinção entre o mundo cognoscível e o mundo incognoscível? E
finalmente, a questão sobre a origem do conhecimento: Por quais faculdades atingimos
o conhecimento? Haverá conhecimento certo e seguro em alguma concepção a priori?
Há ainda outras questões relativas ao conhecimento, como a apostasia da ciência de seu
verdadeiro sentido e sua aproximação a outras formas de aprendizado com estruturas
ilógicas e irracionais: O senso comum, a filosofia e a ciência, no mais das vezes, dão um
caráter universal ao contingente, tornando-o dogmático. Assim, a ciência, que sempre
julgou-se detentora única do saber, vê-se inserida em seu coexistente princípio de
contradição.
Origem

Provável forma usada por Pitágoras para demonstrar o teorema que leva o seu nome.
Pode-se dizer que a epistemologia se origina em Platão. Ele opõe a crença ou opinião
("δόξα", em grego) ao conhecimento. A crença é um determinado ponto de vista
subjetivo. O conhecimento é crença verdadeira e justificada.
A teoria de Platão abrange o conhecimento teórico, o saber como. Tal tipo de
conhecimento é o conjunto de todas aquelas informações que descrevem e explicam o
mundo natural e social que nos rodeia. Este conhecimento consiste em descrever,
explicar e predizer uma realidade, isto é, analisar o que ocorre, determinar por que
ocorre dessa forma e utilizar estes conhecimentos para antecipar uma realidade futura.
Há outro tipo de conhecimento, não abrangido pela teoria de Platão. Trata-se do
conhecimento prático, o saber que.
A epistemologia também estuda a evidência (entendida não como mero sentimento que
temos da verdade do pensamento, mas sim no sentido forense de prova), isto é, os
critérios de reconhecimento da verdade.
Ante a questão da possibilidade do conhecimento, o sujeito pode tomar diferentes
atitudes:
• Dogmatismo: atitude filosófica pela qual podemos adquirir conhecimentos
seguros e universais, e ter certeza disso.
• Cepticismo: atitude filosófica oposta ao dogmatismo, a qual duvida de que seja
possível um conhecimento firme e seguro, sempre questionando e pondo à prova
as ditas verdades. Esta postura foi defendida por Pirro de Élis.
• Relativismo: atitude filosófica defendida pelos sofistas que nega a existência de
uma verdade absoluta e defende a idéia de que cada indivíduo possui sua própria
verdade, que é em função do contexto histórico do indivíduo em questão.
• Perspectivismo: atitude filosófica que defende a existência de uma verdade
absoluta, mas pensa que nenhum de nós pode chegar a ela senão a apenas uma
pequena parte. Cada ser humano tem uma visão da verdade. Esta teoria foi
defendida por Nietzsche e notam-se nela ecos de platonismo.
Estudos recentes
Segundo Lalande, trata-se de uma filosofia das ciências, mas de modo especial,
enquanto "é essencialmente o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos
resultados das diversas ciências, destinado a determinar sua origem lógica (não
psicológica), seu valor e seu alcance objetivo". Para Lalande, ela se distingue, portanto,
da teoria do conhecimento, da qual serve, contudo, como introdução e auxiliar
indispensável.
Portanto, temos que epistemologia é o estudo sobre o conhecimento científico, ou seja,
o estudo dos mecanismos que permitem o conhecimento de determinada ciência.
Japiassu distingue dois tipos de Epistemologia
• a Epistemologia global ou geral que trata do saber globalmente considerado,
com a virtualidade e os problemas do conjunto de sua organização, quer sejam
especulativos, quer científicos;
• a Epistemologia específica que trata de levar em conta uma disciplina
intelectualmente constituída em unidade bem definida do saber e de estudá-la de
modo próximo, detalhado e técnico, mostrando sua organização, seu
funcionamento e as possíveis relações que ela mantém com as demais
disciplinas.
Segundo Trindade “todo conhecimento torna-se, devido à necessária vinculação do
meio ao indivíduo que pertence ao próprio meio, um auto-conhecimento. Essa interação
faz-se cogente pela gênese unívoca entre os muitos integrantes do mundo da vida, sem
olvidar que o homem é um desses integrantes. [...] Ocorre, deste modo, um acoplamento
estrutural entre o sistema nervoso do observador e o meio proporcionando, assim, uma
mútua transformação/adaptação. O ser é modificado pelo meio ao qual o próprio ser
pertence e modifica”. (2007, p. 97).

O que é a epistemologia?1
Michael Williams
Universidade de Johns Hopkins

Tradução de Vítor João Oliveira


O que é a epistemologia? A resposta é: o ramo da filosofia que se ocupa do
conhecimento humano, pelo que também é designada de “teoria do conhecimento”. Só
que isto diz-nos quase nada. Por que temos necessidade de uma teoria do
conhecimento? E ela é uma teoria acerca de quê, e como é que a defendemos (ou
contestamos)? Aliás, o que implica dizer que a epistemologia é um ramo da filosofia? O
que há de especial nas investigações filosóficas do conhecimento? Em que diferem da
discussão psicológica ou sociológica acerca do “conhecimento” ou da “cognição”?
Muitos filósofos nos dias de hoje negam que as questões filosóficas acerca do
conhecimento tenham um carácter especial. Defendem que a epistemologia precisa de
ser “naturalizada”: quer dizer, aproximá-la de uma ou mais ciências, talvez da
psicologia cognitiva. Outros filósofos defendem que a epistemologia está morta. Estas
perspectivas são dificilmente separáveis: a distinção entre a transformação radical e a
abolição imediata não é nítida. Contudo, penso que o naturalismo está enganado e que
os obituários da epistemologia são prematuros.
Cinco problemas
Para perceber o que há de diferente numa determinada área teórica, a melhor forma de
começar é perguntar que problema (ou problemas) aborda. No que diz respeito à
epistemologia, sugiro que se distinga, cinco tipos de problemas […]. São eles:
1. O problema analítico: O que é o conhecimento? (Ou se preferirmos, o que
entendemos ou devemos entender por “conhecimento”? Por exemplo, como se
distingue (ou se deve distinguir) o conhecimento da simples crença ou opinião?
O que aqui se pretende, idealmente, é uma explicação precisa ou “análise” do
“conceito” de conhecimento.
2. O problema da demarcação: Este divide-se em dois problemas: a) O
problema “externo” pergunta: sabendo-se de algum modo o que é o
conhecimento, poderemos determinar à partida que coisas podemos
razoavelmente esperar conhecer? Ou como se refere amiúde, poderemos
determinar o âmbito e os limites do conhecimento humano? Será que há
assuntos acerca dos quais podemos ter conhecimento, enquanto há outros
acerca dos quais não podemos ter mais do que opinião (ou fé)? Será que há
uma quantidade significativa de formas de discurso que ficam simultaneamente
fora do domínio do “factual” ou do que “tem sentido”? O objectivo é traçar uma
fronteira que separe a província do conhecimento de outros domínios cognitivos
(ou talvez o cognitivo do não cognitivo). b) O problema “interno” pergunta se há
fronteiras significativas no interior do domínio do conhecimento. Por exemplo,
muitos filósofos têm defendido que há uma distinção fundamental entre o
conhecimento a posteriori ou “empírico” e o conhecimento a priori ou “não
empírico”. O conhecimento empírico depende (de uma forma ou de outra) da
experiência ou observação, ao passo que o conhecimento a priori é
independente da experiência, fornecendo a matemática o exemplo mais claro.
Contudo, outros filósofos negam que se possa fazer tal distinção.
3. O problema do método: Este relaciona-se com o modo como obtemos ou
procuramos conhecimento. Sugiro que distingamos três subproblemas. a) O
problema da “unidade” coloca a questão seguinte: Há só uma forma para

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adquirir conhecimento, ou há várias, dependendo do tipo de conhecimento em
questão? Por exemplo, alguns filósofos têm defendido que há diferenças
fundamentais entre as ciências naturais e as sociais ou humanas. b) O problema
do desenvolvimento (progresso) coloca a questão seguinte: Podemos melhorar
as nossas formas de investigação? No séc. XVII este era um problema de
importância capital para os filósofos que defendiam os avanços científicos contra
o que consideravam ser o dogmatismo estéril da escolástica (a versão semi-
oficial das posições filosóficas e científicas de Aristóteles ensinada nas
universidade e “escolas”). c) Finalmente, o problema da “razão” ou da
“racionalidade”. A preocupação aqui é saber se há métodos de investigação, ou
de fixação de crenças, que sejam claramente racionais e, se há, quais são.
4. O problema do cepticismo: Será de facto possível obter algum conhecimento?
Este problema é difícil porque há argumentos poderosos, alguns bastante
antigos, a favor da resposta negativa. Por exemplo, embora o conhecimento não
possa assentar em pressupostos brutos, todos os argumentos têm de acabar por
chegar ao fim. Parece que, em última análise, as opiniões das pessoas assentam
em indícios que elas não podem justificar e não podemos considerar
conhecimento genuíno. O problema que aqui se coloca, então, é o de conhecer
os argumentos do cepticismo filosófico, a tese que defende a impossibilidade do
conhecimento. Uma vez que há uma ligação forte entre conhecimento e
justificação, o problema do cepticismo está intimamente ligado ao problema da
justificação.
5. O problema do valor: Os problemas esboçados são significativos somente se
faz sentido possuir conhecimento. Mas será faz, e se sim porquê? Supondo que
sim, para que o queremos? Queremo-lo de qualquer forma, ou por causa de
determinados objectivos e em determinadas situações? O conhecimento é o
único objectivo da investigação, ou há outros com igual (ou maior) importância?
Obviamente que estes problemas não são independentes. O modo como lidamos com
um impõe constrangimentos ao modo como lidamos com os outros. Mas o modo como
um dado filósofo ajuíza a sua importância relativa determinará o sentido que uma dada
teoria do conhecimento necessita alcançar e como pode ser defendida. Isto é típico na
filosofia, porquanto se verificam profundos desacordos não apenas em relação à
correcção das respostas a um conjunto determinado de perguntas mas também às
próprias questões.
Muitos filósofos atribuem um estatuto privilegiado ao problema do cepticismo na teoria
do conhecimento. Com efeito, identificam praticamente o problema do conhecimento
com este problema. The Problem of Knowledge, de Ayer (1956), é um exemplo cabal
disto.
Há muito a favor desta perspectiva. Há um consenso generalizado relativamente ao
facto de a idade moderna da filosofia começar com Descartes (1596-1650), e que o seu
contributo fundamental foi ter induzido a filosofia a realizar uma viragem enfaticamente
epistemológica.
Descartes escreveu durante um período de grande produção intelectual quando (entre
outras coisas) a visão medieval do mundo, uma síntese de algum modo instável entre a
filosofia aristotélica e a teologia cristã, começou a ser crescentemente pressionada por
novas ideias científicas emergentes. Insatisfeito com o ensino do seu tempo e sedento
de promoção da nova ciência, Descartes defende um corte radical com o passado.
Pretende construir uma visão do mundo e o nosso conhecimento dele a partir dos
alicerces. Ao promover esta reconstrução, afirma que aceita como princípios básicos
apenas aqueles que, logicamente falando, não podem ser colocados em dúvida. Com
efeito, utiliza o argumento céptico como um filtro para eliminar todas as opiniões
duvidosas: devemos aceitar apenas as proposições que resistam ao mais determinado
assalto céptico. Por confiar no facto de ter encontrado tais proposições, Descartes não é
realmente um céptico. Não obstante, a sua “dúvida metódica” coloca os problemas do
cepticismo no centro da reflexão.
Conjuntamente com estas considerações históricas, há razões teóricas fortíssimas a
favor da posição que afirma que os problemas cépticos são a força motriz por detrás
das teorias filosóficas do conhecimento. Uma das formas mais esclarecedoras para
compreender a diferença entre as teorias tradicionais do conhecimento é considerá-las
tentativas de descolagem de ideias concorrentes sobre os erros dos argumentos
cépticos. […]
Colocar as preocupações com o cepticismo no centro da epistemologia torna muito claro
o que distingue a reflexão filosófica acerca do conhecimento. Tal reflexão responde a
preocupações profundas sobre se de facto o conhecimento é possível. Isto não pode ser
considerado uma matéria científica estrita na medida em que o cepticismo questiona
todo o alegado conhecimento, incluindo o científico.
[…] [A] ameaça do cepticismo não foi nunca o verdadeiro motivo da reflexão filosófica
sobre o conhecimento humano. Uma distinção útil aqui é a que se pode estabelecer
entre o objectivo do filósofo e a sua tarefa: isto é, entre o que ele espera alcançar e o
modo como pensa que deve prosseguir (devo esta terminologia útil a RobertFogelin). O
cepticismo tem sido o problema epistemológico dominante na idade moderna não
porque “refutar o céptico” seja sempre o objectivo da reflexão epistemológica mas
porque eliminar a argumentação céptica é quase invariavelmente uma das suas tarefas
fundamentais. Por exemplo, se suspeitamos que certo tipo de afirmações são mais
vulneráveis aos ataques cépticos do que outras, explorar os limites do cepticismo
oferecerá uma via para definir demarcações significativas. Ou, dito de outro modo, se
pudermos mostrar onde erram os argumentos cépticos, é de esperar aprender
importantes lições sobre conhecimento e justificação. Não é necessário estar no espaço
das conclusões cépticas para nos interessarmos pelos argumentos cépticos.
[…] [E]mbora a epistemologia moderna tenha mostrado uma tendência definitiva para
seguir o paradigma cartesiano, colocando o cepticismo em primeiro lugar, a minha
caracterização da epistemologia no que diz respeito à listagem dos problemas, deixa em
aberto a possibilidade de desenvolver outras abordagens. Este aspecto da minha
abordagem da epistemologia será importante quando discutirmos se o tema se esgotou.
Epistemologia e a “tradição ocidental”
Dos meus cinco problemas, o do valor é o menos discutido pelos filósofos
contemporâneos. Mas todos os outros problemas dependem deste. Se o conhecimento
não tivesse importância, não perderíamos tempo a imaginar como o definir, como o
obter, nem a traçar linhas à sua volta. Nem nos interessaria refutar o céptico. Se não
víssemos valor no conhecimento, o cepticismo seria provavelmente ainda um puzzle
mas não um problema. Contudo, parece-me que o conhecimento tem importância (para
a maioria de nós, pelo menos algumas vezes); se não o conhecimento de acordo com
alguns critérios muito estritos, pelo menos outros conceitos epistemológicos, tais como
justificação ou racionalidade. Porquê?
Uma resposta é que a preocupação com o conhecimento (ou com realidades afins) está
de tal modo enraizada na nossa tradição ocidental que não é opcional. Esta tradição,
que nos seus aspectos filosóficos e científicos, tem as suas origens na Grécia clássica, é
globalmente e no seu sentido mais lato uma tradição racionalista e crítica. A ciência e a
filosofia começam quando as ideias acerca da origem e natureza do universo se
separam do mito e da religião e são tratadas como teorias que se podem discutir: isto
é, comparadas com (e porventura superadas por) teorias concorrentes. Como observou
Karl Popper, esta abordagem globalmente racionalista para compreender o mundo pode
ser considerada como um tipo de tradição de “segunda ordem”: o que conta não são
crenças particulares — encaradas como sagradas, ancestrais, e desse modo mais ou
menos inquestionáveis — mas a prática do exame crítico das ideias correntes para que
se possa reter apenas o que fica depois da inspecção. Ter herdado esta tradição explica
a nossa tendência para contrastar conhecimento com preconceito ou com a (simples)
tradição. A distinção é invejosa, o que é uma outra forma de dizer que o conhecimento
importa. E isto não é apenas uma preconceito local. Uma vez desperto para o facto de
mesmo as nossas mais compartilhadas posições poderem ser desafiadas, não há
retorno para um estádio pré-crítico, para uma perspectiva tradicionalista. É por isso que
a preocupação com o conhecimento já não é opcional.
A perspectiva racionalista pode aplicar-se a ela própria. Quando o é temos a
epistemologia: um estudo de terceira ordem, segundo uma tradição de reflexão
metacrítica sobre os nossos objectivos e procedimentos epistemológicos. Temos uma
tradição de investigação centrada no tipo de questões que iniciamos.
Dada esta perspectiva de epistemologia, é fácil ver por que razão o cepticismo é
especialmente difícil de ignorar. O cepticismo é o gato com o rabo de fora do
racionalismo ocidental: um ataque argumentativamente sofisticado à própria
argumentação racionalista. Representa o caso extremo da tradição da investigação
crítica reflexivamente aplicada. Desde os primórdios da filosofia ocidental, tem havido
uma contra-tradição que defende que os limites da razão são muito mais estreitos do
que os epistemólogos optimistas gostam de pensar, que a própria ideia de razão é uma
armadilha e uma ilusão e que, mesmo que não o fosse, o conhecimento científico e
filosófico acaba por não ser o que se pensa que é. Se o cepticismo não pode ser
refutado, a perspectiva racional destrói-se a si própria.

O pensamento epistemológico

Anotações extraídas da obra de Hilton Japiassu - Introdução ao


pensamento epistemológico:

- Cada enfoque epistemológico elucida a atividade científica a seu modo,


cada um tem uma concepção particular do que seja ciência – são tentativas,
não modelos.
- É o conjunto de elementos e instrumentos de reflexão epistemológica
sobre processos de gênese, desenvolvimento, estruturação e articulação de
conhecimentos científicos.
- Conceitos:
- Saber: conjunto de conhecimentos metodicamente adquiridos, mais ou
menos sistematicamente organizados.
- Ciência: conjunto de aquisições intelectuais.
- Epistemologia: estudo metódico e reflexivo do saber, de sua organização,
de sua formação, de seu desenvolvimento e de seus produtos intelectuais.
Epistemologia – logos (discurso), episteme (sobre a ciência). Disciplina
especial da filosofia.
- Autores:
- Piaget: epistemologia genética. Como o conhecimento é possível?(Kant) –
Segundo Piaget, o conhecimento é elaborado a partir de uma concepção
construtivista da aquisição dos conhecimentos: sem pré-formação, nem
exógena (empirismo), enm endógena (ineidade), mas por contínuos
ultrapassamentos das elaborações sucessivas. A psicologia genética estuda
o desenvolvimento das funções mentais
- Bachelar: espírito científico.
- Foucalt: arqueologia das ciências humanas.
- Sobre Piaget:
- Como o conhecimento é possível?(Kant) – Segundo Piaget, o
conhecimento é elaborado a partir de uma concepção construtivista da
aquisição dos conhecimentos: sem pré-formação, nem exógena
(empirismo), nem endógena (ineidade), mas por contínuos
ultrapassamentos das elaborações sucessivas. A psicologia genética estuda
o desenvolvimento das funções mentais.
- Epistemologia genética é a extensão a todo campo das ciências humanas,
da metodologia que possibilitou Piaget a realização de excelentes trabalhos
(formação do número, desenvolvimento da inteligência, aquisição da
linguagem, formação do juízo moral...). É o estudo da constituição dos
conhecimentos válidos – só há ciência quando há: elaboração de fatos,
formalização lógico-matemática, controle experimental.
- Permite a descoberta de um estatuto científico para a as principais
estruturas operatórias das ciências humanas. Tem por objetivo estudar os
conhecimentos em função de sua construção real, bem como considerar
todo o conhecimento como relativo a um certo nível do mecanismo desta
construção. É o estudo da gênese das operações do pensamento e da sua
estabilização lógica.
- A ação precede o pensamento – o pensamento consiste numa composição
mais rica e coerente das operações que prolongam as ações, interiorizando-
as.
- Sobre o papel da epistemologia: desmascarar a ilusão dos que pretendem
conferir à ciência uma importância global que suprime a filosofia, uma vez
que ela quer ser sua própria filosofia, sob as denominações de Metaciências,
de lógica das ciências ou de epistemologia científica. Mas ela tem uma
função complementar: relativizar a filosofia de uma ciência, porque esta
deve ser questionada, não em sua validade ou em sua eficácia, mas em sua
inteligibilidade.

Bachelard e a construção do objeto científico


A obra bachelardiana pode ser dividida, ainda que de forma didática, em duas: a obra
diurna e a obra noturna, como o próprio autor expressa no seguinte trecho da obra
Poética do Espaço: "Demasiadamente tarde, conheci a boa consciência, no trabalho
alternado das imagens e dos conceitos, duas boas consciências, que seria a do pleno dia
e a que aceita o lado noturno da alma". (JAPIASSÚ, 1976, p.47).
Levando-se em conta tal perspectiva do próprio autor, seus analistas passaram a dividir
sua obra relativa à epistemologia e história das ciências como diurna e a sua outra
faceta, que o remete ao estudo no âmbito da imaginação poética, dos devaneios, dos
sonhos, deu-se o adjetivo de obra noturna. Dentre as obras diurnas destacam-se "O novo
espírito científico", de 1934; "A formação do espírito científico", de 1938; "A filosofia
do não", de 1940; "O racionalismo aplicado", de 1949 e "O Materialismo Racional", de
1952. Dentre as obras noturnas destacam-se "A psicanálise do fogo", de 1938; "A água
e os Sonhos", de 1942; "O ar e os sonhos", de 1943; "A terra e os devaneios da
vontade", de 1948; "A poética do espaço", de 1957. Pretendemos nos deter na obra
diurna de Gaston Bachelard, analisando o potencial metodológico implícito na sua
epistemologia e filosofia das ciências, resumida na noção de "construção do objeto
científico" e/ou "construção da alma científica (espírito científico)".
A obra bachelardiana encontra-se no contexto da revolução científica promovida no
início do século XX (1905) pela Teoria da Relatividade, formulada por Albert Einstein.
Todo seu trabalho acadêmico objetivou o estudo do significado epistemológico desta
ciência então nascente, procurando dar a esta ciência uma filosofia compatível com a
sua novidade. E é partindo deste objetivo que Bachelard formula suas principais
proposições para a filosofia das ciências: a historicidade da epistemologia e a
relatividade do objeto. Em resumo, a nova ciência relativista rompe com as ciências
anteriores em termos epistemológicos e a sua metodologia já não pode ser empirista,
pois seu objeto encontra-se em relação, e não é mais absoluto. Nas palavras de
Bachelard (1972):
Várias vezes, nos diferentes trabalhos consagrados ao espírito científico, nós
tentamos chamar a atenção dos filósofos para o caráter decididamente específico
do pensamento e do trabalho da ciência moderna. Pareceu-nos cada vez mais
evidente, no decorrer dos nossos estudos, que o espírito científico
contemporâneo não podia ser colocado em continuidade com o simples bom
senso. (BACHELARD, 1972, p.27)
O "novo espírito científico", portanto, encontra-se em descontinuidade, em ruptura, com
o senso comum, o que significa uma distinção, nesta nova ciência, entre o universo em
que se localizam as opiniões, os preconceitos, enfim, o senso comum e o universo das
ciências, algo imperceptível nas ciências anteriores, baseadas em boa medida nos
limites do empirismo, em que a ciência representava uma continuidade, em termos
epistemológicos, com o senso comum. A "ruptura epistemológica" entre a ciência
contemporânea e o senso comum é uma das marcas da teoria bachelardiana.
Do mesmo modo, segundo Bachelard, dá-se no âmbito da história das ciências. Para ele
o conhecimento ao longo da história não pode ser avaliado em termos de acúmulos, mas
de rupturas, de retificações, num processo dialético em que o conhecimento científico é
construído através da constante análise dos erros anteriores. Nas suas palavras:
O espírito científico é essencialmente uma rectificação do saber, um
alargamento dos quadros do conhecimento. Julga o seu passado condenando-o.
A sua estrutura é a consciência dos seus erros históricos. Cientificamente, pensa-
se o verdadeiro como rectificação histórica de um longo erro, pensa-se a
experiência como rectificação da ilusão comum e primeira. (BACHELARD,
1996a, P.120)
Um dos maiores embates de Bachelard foi justamente com aqueles que defendiam o
continuísmo, ou seja, que defendiam a idéia de que entre a ciência e o senso comum não
existe mais que uma diferença de profundidade, portanto, continuidade epistemológica.
Um defensor desta idéia era o filósofo francês Émile Meyerson (1859-1933), para quem
a física relativista "é conforme aos cânones eternos do intelecto humano, que constitui
não somente a ciência, mas, antes dela, o mundo do senso comum". (JAPIASSÚ, 1976,
p.52). Eis resumido neste trecho as proposições contra as quais lutou Bachelard: a
perenidade das idéias científicas e a continuidade destas com o senso comum . Para
Bachelard, a filosofia das ciências deve progredir conforme os avanços das ciências,
realizando constantemente revisões e ajustes em suas concepções. "Todo conhecimento
é polêmico. Antes de constituir-se, deve destruir as construções passadas e abrir lugar a
novas construções. É este movimento dialético que constitui a tarefa da nova
epistemologia". (JAPIASSÚ, 1976, p.53).
A superação do empirismo, para Bachelard, se dá através do racionalismo. A postura
epistemológica do novo cientista não se satisfaz com aproximações empiristas sobre os
objetos, ao contrário, proclama-se no "novo espírito científico" o primado da realização
sobre a realidade. As experiências já não são feitas no vazio teórico, mas são, ao invés
disso, a realização teórica por excelência. O cientista aproxima-se do objeto, na nova
ciência, não mais por métodos baseados nos sentidos, na experiência comum, mas
aproxima-se através da teoria. Isso significa que o método científico já não é direto,
imediato, mas indireto, mediado pela razão. O vetor epistemológico, segundo
Bachelard, segue o percurso do "racional para o real", o que é contrário à epistemologia
até então predominante na história das ciências. Uma das distinções mais importantes,
pois, entre as ciências anteriores ao século XX é a superação do empirismo pelo
racionalismo. Segundo Bachelard (1972):
Entre o conhecimento comum e o conhecimento científico a ruptura nos parece
tão nítida que estes dois tipos de conhecimento não poderiam ter a mesma
filosofia. O empirismo é a filosofia que convém ao conhecimento comum. O
empirismo encontra aí sua raiz, suas provas, seu desenvolvimento. Ao contrário,
o conhecimento científico é solidário com o racionalismo e, quer se queira ou
não, o racionalismo está ligado à ciência, o racionalismo reclama fins científicos.
Pela atividade científica, o racionalismo conhece uma atividade dialética que
prescreve uma extensão constante dos métodos (BACHELARD, 1972, p. 45).
O racionalismo bachelardiano tem um sentido muito próprio que é a preocupação
constante com a aplicação. O "racionalismo aplicado", que é uma marca fundamental do
"novo espírito científico", atua na dialética entre a experiência e a teoria, o que significa
a dupla determinação do espírito sobre o objeto e deste sobre a experiência do cientista.
"Impõe-se hoje situar-se no centro em que o espírito cognoscente é determinado pelo
objeto preciso do seu conhecimento e onde, em contrapartida, ele determina com mais
rigor sua experiência". (BACHELARD, 1977, p.109).
Um outro ponto importante para a compreensão do que chamamos "metodologia
bachelardiana", é a sua noção de "obstáculos epistemológicos", tratado, sobretudo, na
obra "A formação do espírito científico", de 1938. Bachelard propõe uma psicanálise do
conhecimento, em que o seu progresso é analisado através de suas condições internas,
psicológicas. Na sua avaliação histórica da ciência, o filósofo francês se vale do que
chama de "via psicológica normal do pensamento científico", ou seja, uma análise que
perfaz o caminho "da imagem para a forma geométrica e, depois, da forma geométrica
para a forma abstrata" (BACHELARD, 1996, p.10-11). A própria concepção de espírito
científico nos remete ao universo psicanalítico.
Quanto aos "obstáculos epistemológicos", afirma Bachelard, é através deles que se
analisam as condições psicológicas do progresso científico. Nas suas palavras:
É aí que mostraremos causas de estagnação e até de regressão, detectaremos
causas da inércia às quais daremos o nome de obstáculos epistemológicos (...) o
ato de conhecer dá-se contra um conhecimento anterior, destruindo
conhecimentos mal estabelecidos, superando o que, no próprio espírito, é
obstáculo à espiritualização. (BACHELARD, 1996, p.17)
A noção de obstáculo epistemológico é de fundamental importância para o
desenvolvimento do conhecimento no âmbito das pesquisas. É na superação destes
obstáculos que reside o sucesso de uma pesquisa científica. Porém, condição essencial
para a superação dos obstáculos é a consciência por parte dos cientistas de que eles
existem e que, se não neutralizados, podem comprometer o processo da pesquisa, desde
seus fundamentos até os seus resultados. Dentre tantos exemplos citados por Bachelard
na obra A formação do Espírito Científico, irei deter-me em dois apenas, que penso
serem constantes nas pesquisas: o obstáculo da realidade e o obstáculo do senso comum,
da opinião. Para analisar estes obstáculos, pode-se utilizar o sociólogo francês Pierre
Bourdieu (1930-2002), que construiu na sua obra "A profissão de sociólogo" (1999),
uma metodologia para a Sociologia baseada nos princípios da "construção do objeto
científico", de Bachelard.
O primeiro obstáculo, a realidade, está inserido na crítica já citada anteriormente a
respeito do empirismo. O pesquisador, ao olhar seu objeto de estudo, especialmente
quando este faz parte do universo social, como é o caso da educação, pode incorrer no
perigo de se deixar levar pelo que lhe é visível, dando a este um estatuto de verdade que
ele não tem. Para Bachelard, "diante do mistério do real, a alma não pode, por decreto,
tornar-se ingênua. É impossível anular, de um só golpe, todos os conhecimentos
habituais. Diante do real, aquilo que cremos saber com clareza ofusca o que deveríamos
saber". (BACHELARD, 1996, p.18). A proposta de Bourdieu é que, para tornar-se
objeto científico, a realidade a ser estudada deve passar pelo crivo de uma teoria
rigorosamente construída. A realidade nada responde por si mesma. Somente o faz
através de questões levantadas teoricamente. Estas observações ganham razão de ser
quando nos deparamos muitas vezes com pesquisas da área educacional que se resumem
ao relato narrativo de uma determinada situação, geralmente denominado "estudo de
caso", sem que este tenha qualquer relação com uma questão geral, teórica. Estas
pesquisas, geralmente, constituem-se de um apanhado teórico somado mecanicamente à
descrição de uma situação e, por fim, uma consideração final que tenta sintetizar o
estudo. Tal método, segundo pensamos, é falho e não consegue revelar o que se pode
chamar das "múltiplas relações" inerentes à realidade, contentando-se em descrever tal
situação que, por isso, perde muito do seu valor acadêmico, nada acrescentando ao
conhecimento acumulado.
O segundo obstáculo epistemológico, o senso comum, semelhante ao primeiro,
relaciona-se especificamente com a dificuldade com a qual se depara o cientista social
em separar o seu conhecimento comum, suas opiniões, seus preconceitos, as avaliações
relacionadas à sua posição social e econômica, etc., do conhecimento teórico, científico,
que deve estar comprometido com a busca da verdade, baseada em leis gerais, em
conceitos e não em preconceitos. Muitas pesquisas travestem-se de científicas para
legitimarem determinados preconceitos, dando a eles credibilidade. Não que se pretenda
preconizar a neutralidade científica, como queria o sociólogo alemão Max Weber
(1864-1920). A utilização consciente de um método de pesquisa, como a "construção do
objeto científico", leva o cientista a chegar mais próximo possível da verdade do seu
objeto, sem com isso entender o esgotamento do seu estudo, dada a característica
dialética da sociedade e do conhecimento. A realidade social, e a educacional mais
especificamente, é objeto de avaliação por todos aqueles que vivem na sociedade, o que
torna a tarefa do cientista social ainda mais difícil, pois deve construir seu conhecimento
apesar e contra o senso comum; apesar e contra a realidad

Cap 3

O NOME DA ROSA: Comentário

O filme é sedimento de simbolismos. O debate que ocorreria no mosteiro entre


correntes da Igreja sobre se “Cristo possuía ou não as roupas que usava” é somente
pretexto para demonstrar outro muito mais importante na época: a preocupação dos
defensores da antiga Filosofia, a Escolástica Medieval, de não deixar o pensamento
moderno avançar sobre seu terreno. Isso fica evidente no primeiro diálogo do filme
entre o Abade e a bibliotecária.
O filme baseia-se em três substantivos abstractos que determinam todo o roteiro:
contradição, objecção e contestação. Essas três realidades permeiam a preocupação das
personagens no sentido de que mesmo num ambiente onde os princípios da unicidade e
da não-contradição deveriam imperar, elas fazem-se presentes na maneira com que as
personagens interagem a partir de seus objectivos pessoais.
A época retratada é um tempo de transição paradigmática. A língua oficial da
Igreja, o latim, falada por todos os monges de boa formação no mosteiro, está sendo
substituída pela “língua babélica” do monge com problemas mentais, Salvatore: a língua
vernácula. Essa transição fica patente no simbolismo de uma cena do início do filme em
que, depois de Baskerville e Adso chegarem aos portões do mosteiro e serem recebidos
formalmente pelo Abade, encaminham-se aos seus aposentos e, no trajecto, à direita,
vêem um servo que malha uma barra de ferro numa forja para fazer algum objecto e, à
esquerda, um monge Herbolário ocupado, no horto, com as suas plantas medicinais.
Dois mundos. Dois tempos. Confrontando-se. A forja do ferro, conhecida desde a pré-
história, a tradição, em frente às plantas medicinais que passam a não mais fazer parte
da magia e do feitiço do mundo antigo, mas, no novo tempo que se avizinha, da cura de
doenças e lesões a partir da experimentação e da observação de suas qualidades
terapêuticas: o progresso.
É exactamente essa a ideia da cena em que aquele monge Herbolário, Severinus,
agora aliado de Baskerville nas investigações, é morto por quem se descobriria depois
ser o monge Bibliotecário, Malachia. O monge Bibliotecário – que no filme representa a
tradição, o cerceamento, a restrição a todo o acervo da Biblioteca (que também contém
antigos saberes não-cristãos) –, fere o monge Herbolário na cabeça com uma esfera
armilar, matando-o. A tradição dá ao pensador Anaximandro de Mileto (611-547 a.C.) a
concepção e confecção primeira da esfera armilar, em que, no centro, reside o planeta
Terra representando o olhar do homem em direcção do céu da Antiguidade, o “céu de
Aristóteles”. No filme, ela simboliza a reacção dos que não querem a próxima transição
epistemológica. Representa o desespero dos que atentam para os novos tempos que
chegam, mas querem a continuidade e o reinado do passado clássico.
Esse passado clássico, o “céu de Aristóteles”, reage ao avanço da modernidade e
despensa, na cena, literalmente, sobre a cabeça de Severinus, o monge Herbolário, ou
sobre o que ele representa: o experimento, a observação, a pesquisa indutiva, o
conhecimento empírico: o futuro.
Durante a revelação de Baskerville ao Abade sobre o que ocorreu no mosteiro
entre histórias de livros proibidos e relações pessoais proibidas, é interrompido pelo
ancião Venerável Georg (que é deficiente visual) que lhe diz: “Irmão William, o seu
orgulho deixa-o cego. Seduzido pelas suas razão, deixou de ver o que é óbvio a todos
neste mosteiro.” Um cego, ferrenho defensor da cultura clássica, do pensamento
aristotélico-tomista, da escolástica universalizante, diz que o conhecimento empírico, a
experiência, a pesquisa indutiva é a verdadeira cegueira da razão. Os roteiristas do filme
querem fazer um jogo de espelho onde a personagem deficiente visual (o monge
Venerável Georg) é posta diante de sua cegueira histórica e epistemológica, e acusa o
indutivo Baskerville de não conseguir ver as evidências universalizantes que para todos
no lugar é clara: o demónio fez (e está fazendo) tudo errado dentro do mosteiro.
Conveniente dedução.
Após o Tribunal da Inquisição condenar o monge despenseiro, o monge idiota e
a moça pobre por todos os acontecimentos sombrios ocorridos no mosteiro, uma
sensação de paz retoma os corredores. O monge mais velho e deficiente visual,
Venerável Georg, na missa, faz o sermão.
Nesse momento, as forças reaccionárias às mudanças paradigmáticas sentem-se
fortalecidas e vencedoras no embate contra a observação, a análise indutiva, a
experimentação e o conhecimento empírico das coisas.
Mas o sermão do monge ancião é interrompido pelo baque surdo do corpo de
Malachia, o monge Bibliotecário, estatelando-se no chão do templo. A curiosidade
vence o aliado primeiro do Venerável Georg. Ter de utilizar o método empírico para
conhecer o conteúdo do livro proibido (manusear a borda das páginas que continham
veneno molhando, primeiro, os dedos na língua) foi mais forte em Malachia do que toda
a tradição escolástica que seu lugar de Bibliotecário deveria defender.
Finalmente, ciente de sua derrota histórica (e metodológica em manter intacta e
viva a Teoria do Conhecimento clássica), o monge Venerável Georg fecha-se na
Biblioteca do mosteiro, e é seguido por Baskerville. Encurralado, devora parte do livro
proibido e envenenado e ateia, propositadamente, fogo à Biblioteca. Já que foi derrotado
em sua tarefa de proteger a humanidade de conhecimentos não-religiosos (e métodos
não-ortodoxos para se obter esses conhecimentos) e pré-científicos que, agora,
ocupariam as mentes dos intelectuais, o monge deficiente visual, cegado por sua sede de
preservação da cultura clássica e da maneira como novas metodologias de pesquisa a
abordariam a partir de então, destrói a depositária de toda essa cultura clássica: a
Biblioteca do mosteiro. Se o homem não irá mais abordar a cultura clássica de maneira
tradicional, de forma a preservar a “contínua e sublime recapitulação” do conhecimento
humanístico clássico, esse homem não deve nunca mais, segundo ele, ter contacto com
essa cultura. Ela deve ser preservada de abordagens epistemológicas apartadas da
dedução aristotélicotomista tradicional.
O até então impassível Baskerville, ao ver as chamas e ao perceber que é
impossível salvar o prédio e seu conteúdo, debruça-se sobre uma pilha de livros e chora.
O método de abordagem epistemológica deveria ser renovado, mas para investigar,
inclusive, todo o tesouro da cultura clássica antiga.

Em suma:
A contemporaneidade trouxe algumas respostas ao homem. No campo
científico, por exemplo, o avanço das pesquisas genéticas tem dado, a todos, alento
suficiente para poder enfrentar seus dissabores físicos com esperança. Pelo avanço
dessas pesquisas, é bem provável que nossa geração ainda veja a cura de doenças, hoje
consideradas crónicas, como o diabetes. No campo da pesquisa científica empregada na
tecnologia, temos vários exemplos de avanço considerável.
Mas no campo do pensamento, o homem ainda tacteia. Que modelo
epistemológico utilizar para compreender melhor a realidade? Não há resposta
satisfatória a esta pergunta. Uns defenderão o modelo A; outros, o modelo B; e outros,
ainda o Z. Quem está correcto? Quem erra?

Cap4
As ciências e nos copiar texto em pdf

EPISTEMOLOGIA - Gonçalves, Raquel (1991), Ciência, Pós-Ciência,


Metaciência – tradição, inovação e renovação, Lisboa: Terramar, pp. 11-18
Raquel Gonçalves reflecte no presente ensaio acerca das vertentes da Ciência, da
Filosofia e da Epistemologia a fim de conhecer a metodologia das verdades, da
concordância entre teorias e realidades, interrogando em última instância a linearidade
do conhecimento científico. A Ciência não se isola das outras formas do saber e, neste
ponto de vista, surge a investigação histórica que tem como consequência uma
narrativa estruturada que se impõe perante o passado através de uma sequência
lógica e de uma fidelidade vincada. Perante isto, surge a “Ciência como problema
histórico e como questão filosófica” [Gonçalves, 1991: 12].
A questão fundamental deste excerto de Raquel Gonçalves realça o dualismo que
persiste entre a “História e Filosofia das Ciências” e a “Epistemologia”. A
“Epistemologia debruça-se reflexivamente sobre a obtenção dos conhecimentos pela
Ciência, na tentativa de esclarecê-los em profundidade” [Gonçalves, 1991: 18]. A
Filosofia da Ciência elabora as vias axiomáticas do conhecimento, consoante a análise
dos fenómenos interiores e exteriores ao homem, criando a ciência como actividade
fundamental da Filosofia. A Epistemologia e a Filosofia da Ciência correspondem a
“conteúdos conceptuais diferentes no tempo real e no tempo de actuação face à
Ciência” [Gonçalves, 1991: 18].
Neste âmbito, pretende-se criticar linearmente a importância da Filosofia para o
desenvolvimento evolutivo da Ciência, aparecendo como consequência a aplicação de
leis científicas fundamentais ao meio social. Torna-se relevante incitar que a Ciência
evolui e transforma-se consoante o refutar de leis científicas e, por outro lado, a
Filosofia implica pensar como fazer a Ciência evoluir através das questões empíricas:
“Para quê?”, “Como?”, “Porquê?”.
A Ciência é um processo contínuo e permanente de explicação e interpretação das
experiências físicas. Deste modo, a ciência é um conhecimento certo das coisas, dos
seus princípios e causas. Por outro lado, pode-se dizer que a ciência é um conjunto de
designações, descrições e generalizações que constituem um ramo particular de saber
humano. A mesma resume-se a uma sabedoria, erudição e conhecimento. Pressupõe
a racionalidade sobre as suas condições de existência validando a investigação
metódica das leis dos fenómenos, detendo “um conjunto de conhecimentos
coordenados, relativos a um objecto determinado” [Gonçalves, 1991: 12].
Por conseguinte, em torno da Ciência surge o saber e o conhecimento. “O saber é
muito mais do que o conhecimento” [Gonçalves, 1991: 12]; o saber engloba todo um
conjunto de pressupostos, tais como: a sabedoria ética, a sensibilidade estética, a
justiça e o bem-estar. A par disto, afirma-se que o saber é a virtude própria do
entendimento, tal como defendia Alain.
O conhecimento, advém do saber, já que o mesmo estabelece critérios de falsificação
e veracidade. “O termo Ciência era entendido como o denominador do conhecimento
certo” [Gonçalves, 1991: 13]. A nova concepção de Ciência surge como um
aglomerado homogéneo de elementos de verdade.
Raquel Gonçalves salienta o facto de a Ciência ganhar ambiguidade, na medida em
que existem Ciências Exactas e Experimentais e, por outro lado, as Ciências Sociais e
Humanas. Neste domínio, a Filosofia chegou a requerer o estatuto de Ciência, tendo
como credibilidade a ignorância dos peritos. A Ciência assume a função de procurar
os fragmentos coexistentes e não necessariamente unificadores. “Ciência é a fronteira
da dilatação do espaço cultural” como defende António Brotas. Jean Petitot adepto de
um racionalismo científico radical, conduz-nos à seguinte reflexão: “a ciência é a
expressão cultural que se propõe conter um movimento de determinação objectiva”
[Gonçalves, 1991: 14].
Em oposição, a Filosofia subsiste como “uma indagação racional sobre o mundo e o
homem com propósito de encontrar a sua explicação última” [Gonçalves, 1991: 15];
tendo como objectivo encontrar os princípios básicos da existência e da conduta
humana. Filosofia remete-nos para o conhecimento e sabedoria como uma forma de
ciência geral dos seres.
A Filosofia surge como esforço permanente da Humanidade, achamo-la em todas as
partes: na vida e na reflexão, na ciência e na religião, nas religiões e nas técnicas, na
civilização e na cultura. Tal esforço filosófico da Humanidade realizou-se através das
experiências múltiplas do ser, do pensamento e do valor. “A Filosofia é tendência forte
para o seu objecto, o saber. O filósofo não é apenas um homem afeiçoado ao saber,
mas aquele que tem por ele uma perfeita avidez” [Gonçalves, 1991: 17].
A Filosofia e a Ciência pertencem ao “saber”, estudando o mesmo objecto,
procurando, todavia, diferentes verdades. Nesta sua reflexão, Raquel Gonçalves
reforça as ideias-chave patentes no campo da Ciência e da Filosofia – a “Filosofia é o
princípio e o fim, a indagação primeira e a explicação última, a procura da verdade
absoluta do Homem e do Universo”, – em contrapartida – a “Ciência é um meio, a
investigação e o encontro de verdades parcelares” [Gonçalves, 1991: 16].
A autora desenvolve a noção de Filosofia das Ciências , dando-nos a conhecer o seu
papel primordial na sociedade actual. A Filosofia das Ciências incute-nos a tarefa de
estabelecer os “princípios normativos essenciais da Ciência, como uma unidade, e a
integração reflexiva e superior dos vários conhecimentos científicos especializados”
[Gonçalves, 1991: 16].
“A Filosofia da Ciência é, pois, um movimento elevado no sentido do conhecimento
científico; o filósofo da Ciência, um pensador activo dos seus desígnios” [Gonçalves,
1991: 17]. O termo Epistemologia surgiu como substituto de “Filosofia da ciência”, em
1908, com Émile Meyerson.

Fórum pratica cientifica

Rupturas epistemológicas

Bachelard concebeu a evolução da ciência como um processo dinâmico interacção entre


a razão e a experiência. O progresso científico faz-se através de rupturas
epistemológicas com o senso comum, as tradições, os erros e os preconceitos. A ciência
avança através da superação destes obstáculos. A "ruptura epistemológica" entre a
ciência contemporânea e o senso comum é uma das marcas da teoria bachelardiana.

O espírito científico é essencialmente uma rectificação do saber, um alargamento dos


quadros do conhecimento. Julga o seu passado condenando-o. A sua estrutura é a
consciência dos seus erros históricos. Cientificamente, pensa-se o verdadeiro como
rectificação histórica de um longo erro, pensa-se a experiência como rectificação da
ilusão comum e primeira. (BACHELARD, 1996).

A noção de obstáculo epistemológico é de fundamental importância para o


desenvolvimento do conhecimento no âmbito das pesquisas. É na superação destes
obstáculos que reside o sucesso de uma pesquisa científica. Porém, condição essencial
para a superação dos obstáculos é a consciência por parte dos cientistas de que eles
existem e que, se não neutralizados, podem comprometer o processo da pesquisa, desde
seus fundamentos até os seus resultados.

A ciência, ao longo do século XX, passou por um amplo debate sobre os seus princípios
básicos de construção. O racionalismo, o determinismo e o mecanicismo foram
superados pela incerteza proposta pela própria ciência, dando origem a possíveis
rupturas epistemológicas e a busca por "novos" paradigmas.

Ruptura com o Senso comum


Senso Comum: Designa o conjunto de opiniões e valores que são correntes numa dada
sociedade. Trata-se de um nível de conhecimento que é subjectivo, muito superficial,
pouco crítico e não sistemático. O senso comum está ligado ao processo de socialização.
O modo como vemos o mundo foi profundamente moldado pela cultura na qual
crescemos. O grupo social a que pertencemos transmitiu-nos tradições, costumes,
crenças, em suma, tudo aquilo que modela a nossa atitude natural face às coisas. Estas
estruturas não apenas condicionam a nossa maneira de pensar e agir, como determina as
nossas expectativas de comportamento dos outros.

O filósofo de da ciência do século XX preocupa-se com a distinção entre conhecimento


científico e conhecimento não científico.

O físico e historiador Kunh levou à formulação de uma teoria inovadora para a evolução
da ciência, onde o conceito de «paradigma» ocupa o lugar central. A actividade da
ciência, distinguida entre períodos extensos de normalidade (intraparadigmáticos) e
períodos curtos, fecundos e revolucionários (de alteração de paradigmas), é a tese que
defende.

Para Carnap, a linguagem científica deve ser alvo de critérios rígidos. O sentido
empirista das proposições deve ser traduzido numa linguagem lógica e directamente
referenciado aos dados observáveis. Carnap propôs, então, um conjunto de quatro
critérios enumerados por ordem decrescente de restringimento: «testabilidade
completa», «confarmibilidade completa», «testabilidade» e «confirmabilidade». As
proposições resistentes aos critérios de verificação são designadas por «científicas»; são
as proposições da categoria I.

Na categoria II, Carnap inclui as proposições que designa por «pseudo científicas»,
onde os elementos observáveis se entrelaçam com os mitos e as crendices populares, e
que têm sentido, embora não científico; por fim estabelece uma categoria III proposta
por enunciados sem sentido cognitivo, os «pseudo-enunciados».
O Círculo de Viena defendia um programa de unificação enciclopédica das ciências,
sendo o factor linguístico um dos seus problemas fulcrais. A linguagem designada por
«fenomenista» incidia sobre os dados sensíveis primários; por outro lado, a linguagem
«fisicalista» ou «coisal», versava directamente sobre a matéria e as suas propriedades
observáveis.

Bachelard, opondo-se ao convencionalismo filosófico, desloca o conceito de objecto da


ciência, este passa pertencer ao domínio do construído, é um resultado ou um efeito. O
conhecimento científico tem, pois, uma natureza diferente da do saber comum: produz-
se, progride, é sempre provisório e determina-se pela sua utilidade.

A produção do conhecimento é conseguida por transposição de obstáculos


epistemológicos. A intuição e a percepção, subjectivas, contam-se entre estes
obstáculos. Mas o seu interesse não é negado, uma vez que pode organizar-se como
hipóteses de trabalho.

A verdadeira renovação na filosofia popperiana vem do facto de o filósofo admitir que,


por detrás da descoberta científica, pode existir um universo especulativo: os produtos
da nossa fantasia e intuição – submetidos, evidentemente, ao refreamento da
criticabilidade. A discussão racional na procura da verdade seria despropositada se não
assentasse numa realidade objectiva.

Na antiguidade quem fazia ciência eram os cidadãos amadores, esclarecidos e ricos, na


Idade Média eram os sábios ocultos, clérigos muitas vezes, os sábios inspirados e os
seus discípulos, na Renascença, protegidos dos nobres e no Período Moderno, os
professores das universidades – os académicos – na Época Contemporânea. Na ciência
como em muitas outras «artes», a nobreza e o clero cederam, progressivamente o lugar a
uma nova classe, a um género próprio, o dos cientistas profissionais. E, com essa
mudança, o conhecimento científico teoriza-se, inscreve-se nos manuais escolares e em
tratados de referência.

Fronteiras Científicas

No seu conjunto as ciências afastaram-se de nós, tornando-se, ao mesmo tempo,


ilegíveis para o senso comum. E a cultura, naturalmente, fragmentou-se.

J. Monod ensaia uma alternativa ao ligar a ciência à ética, fundando essa aproximação
no postulado extracientífico de objectividade do conhecimento.

A noção de que a ciência se liga naturalmente a um ethos, a uma moral de desinteresse,


que permite a muitos afirmar ainda hoje que «boa» ciência gera «boa» ética.
Embora, reconheçamos, hoje a dificuldade de associar a ética ao saber científico em si,
temos relutância em aceitar que a ciência seja neutral.

Vemos assim complexificar-se a imagem tradicional do cientista que surge agora como
um infatigável construtor de redes (M. Callon, 1989) que lhe permitam uma relação
favorável com os meios não apenas científicos mas económicos, políticos, religiosos e
uma opinião pública que, indirectamente, suportam a sua actividade. (Novas
competências se lhe exigem e não o estamos a treinar, profissionalmente, para elas).

Relativamente à questão das práticas científicas é importante realçar


a forma como ela evolui. Este factor tem sido amplamente discutido e
existem várias visões da forme de crescimento da conhecimento científico.
Alguns epistemológicos consideram que a ciência evolui de forma contínua,
por acumulação de saber, enquanto outros consideram que a ciência possui
fases de estagnação ou mesmo de retrocesso e períodos de rápido
progresso científico.

Bachelard e Kuhn, autores amplamente abordados nos documentos


propostos para o aprofundar os conhecimentos sobre o tema III (práticas
científicas) do programa da cadeira de Epistemologia e Sistema da Ciências,
defendem a tese de descontinuidade. Assim, Bachelard (1884 - 1962)
defende como ideia principal que no futuro o conhecimento se baseará na
negação do conhecimento actual, introduzindo assim alguns conceitos
como: desfasamento, novo empirismo científico e ruptura. Defende que, há
uma verdadeira ruptura entre a ciência e outros saberes, como o senso
comum. Estes não diferem apenas no grau de aprofundamento, a própria
natureza do conhecimento é diferente. Bachelard introduz o conceito de
"corte epistemológico", ou obstáculo epistemológico, que designa um
impedimento ao desenvolvimento científico; são perturbações e
deturpações que impedem que a ciência evolua em termos de
conhecimento. Para ele, o senso comum não é apenas diferente da ciência,
é um obstáculo ao bom desenvolvimento desta. Segundo Bachelard, “a
opinião pensa mal, não pensa, traduz necessidades em conhecimentos”.
Para este autor é necessário haver uma ruptura com o senso comum, que é
o domínio das opiniões, afirmando que “o que se crê saber ofusca o que se
deve saber”. Devemos cortar com as crenças, preconceitos e falsas
imagens, devemos cortar com a experiência primeira que provoca lentidões
e perturbações no decorrer das investigações científicas. Bachelard afirma
portanto que no progresso científico há sempre uma ruptura com o senso
comum. Na minha opinião, o progresso científico manifesta sempre uma
ruptura entre o conhecimento comum e o conhecimento científico. O
espírito científico não pode ser colocado com o simples bons senso
formulando teses que podem chocar com o senso comum.

Bachelard também defende um descontinuismo histórico. Para ele o


futuro de uma ciência não depende do seu passado. Um momento histórico
na ciência não é continuamente seguido por outro, há cortes, rupturas. Os
conhecimentos científicos anteriores também funcionam como obstáculos
epistemológicos, pois o cientista tem a tendência a se “agarrar” a eles como
sendo absolutamente certos, deixando de ter espírito aberto para colocar
hipóteses que contrariem esses conhecimentos anteriores. Refere assim a
ruptura epistemológica como àquilo que determina o nascimento de uma
nova ciência e «corte epistemológico» àquilo que gera uma evolução ou
evoluções decisivas na mesma. A meu ver, a ruptura epistemológica é o
efeito de ruptura pelo qual se inicia um novo campo científico ultrapassando
um campo ideológico anterior. É o inicio do processo de aparecimento de
uma nova disciplina cientifica. Será portanto sinónimo de evolução
científica.

Verifiquei, num excerto lido que Khun concebe a evolução da ciência,


à semelhança de uma história política, como uma sucessão de revoluções,
de rupturas, de alterações mais ou menos rápidas e de substituições dos
diferentes paradigmas, sendo os velhos abandonados e substituídos pelos
novos. Isto é, Em suma, o que Kuhn nos propõe é um progresso que se faz
mediante a revolução. Enfim, uma alternativa ao progresso cumulativo,
característico da explicação indutivista da ciência.

Como ultimo reparo, é essencial referir que ciência pode ser definida
como uma “colecção de respostas” a uma permanente interrogação, interior
ou exterior sendo um elemento indispensável do diálogo interminável dos
homens com o seu mundo, um dispositivo cognitivo, retórico e comunitário
de produção de estratégias de sobrevivência do homem, a “mola” do
progresso material das sociedades. Segundo Edgar Morin “um diálogo com
a Natureza”. A ciência e a tecnologia mudaram o mundo, logo, o homem é o
sujeito da natureza, da história e do processo de conhecimento, daí a
ciência não compreender apenas o mundo, mas também procura
ultrapassar e superar através da tecnologia. As fronteiras científicas
definem-se portanto pela delimitação de uma ciência e o começo de outra.

Para concluir, gostaria de realçar um pensamento presente no power-


point referido como material de apoio deste tema. Penso ser uma síntese
sucinta de toda a minha reflexão “ A ciência opera sobre a dúvida e
não sobre a verdade”

Cap 5
Conhecimento
Ato ou efeito de abstrair idéia ou noção de alguma coisa, como por exemplo:
conhecimento das leis; conhecimento de um fato (obter informação); conhecimento de
um documento; termo de recibo ou nota em que se declara o aceite de um produto ou
serviço; saber, instrução ou cabedal científico (homem com grande conhecimento).
O tema "conhecimento" inclui, mas não está limitado a, descrições, hipóteses,
conceitos, teorias, princípios e procedimentos que são ou úteis ou verdadeiros. O estudo
do conhecimento é a gnoseologia. Hoje existem vários conceitos para esta palavra e é de
ampla compreensão que conhecimento é aquilo que se sabe de algo ou alguém. Isso em
um conceito menos específico. Contudo, para falar deste tema é indispensável abordar
dado e informação.
Dado é um emaranhado de códigos decifráveis ou não. O alfabeto russo, por exemplo,
para leigos no idioma, é simplesmente um emaranhado de códigos sem nenhum
significado especifico. Algumas letras são simplesmente alguns números invertidos e
mais nada. Porém, quando estes códigos até então indecifráveis, passam a ter um
significado próprio para aquele que os observa, estabelecendo um processo
comunicativo, obtém-se uma informação a partir da decodificação destes dados. Diante
disso, podemos até dizer que dado não é somente códigos agrupados, mas também uma
base ou uma fonte de absorção de informações. Então, informação seria aquilo que se
tem através da decodificação de dados, não podendo existir sem um processo de
comunicação. Essas informações adquiridas servem de base para a construção do
conhecimento. Segundo esta afirmação, o conhecimento deriva das informações
absorvidas.Se constrói conhecimentos nas interações com outras pessoas, com o meio
físico e natural. Podemos conceituar conhecimento da seguinte maneira: conhecimento
é aquilo que se admite a partir da captação sensitiva sendo assim acumulável a mente
humana. Ou seja, é aquilo que o homem absorve de alguma maneira, através de
informações que de alguma forma lhe são apresentadas, para um determinado fim ou
não. O conhecimento distingue-se da mera informação porque está associado a uma
intencionalidade. Tanto o conhecimento como a informação consistem de declarações
verdadeiras, mas o conhecimento pode ser considerado informação com um propósito
ou uma utilidade.
A definição clássica de conhecimento, originada em Platão, diz que ele
consiste de crença verdadeira e justificada.

O conhecimento não pode ser inserido num computador por meio de uma representação,
pois neste caso seria reduzido a uma informação. Assim, neste sentido, é absolutamente
equivocado falar-se de uma "base de conhecimento" num computador. No máximo,
podemos ter uma "base de informação", mas se é possível processá-la no computador e
transformar o seu conteúdo, e não apenas a forma, o que nós temos de facto é uma
tradicional base de dados.
Associamos informação à semântica. Conhecimento está associado com pragmática,
isto é, relaciona-se com alguma coisa existente no "mundo real" do qual temos uma
experiência directa.
O conhecimento pode ainda ser aprendido como um processo ou como um produto.
Quando nos referimos a uma acumulação de teorias, idéias e conceitos o conhecimento
surge como um produto resultante dessas aprendizagens, mas como todo produto é
indissociável de um processo, podemos então olhar o conhecimento como uma
atividade intelectual através da qual é feita a apreensão de algo exterior à pessoa.
A definição clássica de conhecimento, originada em Platão, diz que ele consiste de
crença verdadeira e justificada. Aristóteles divide o conhecimento em três áreas:
CIENTÍFICA, PRÁTICA e TÉCNICA.

Além dos conceitos aristotélico e platônico, o conhecimento pode ser classificado em


uma série de designações/categorias:

Conhecimento Sensorial: É o conhecimento comum entre seres humanos e animais.


Obtido a partir de nossas experiências sensitivas e fisiológicas (tato, visão, olfato,
audição e paladar).

Conhecimento Intelectual: Esta categoria é exclusiva ao ser humano; trata-se de um


raciocínio mais elaborado do que a mera comunicação entre corpo e ambiente. Aqui já
pressupõe-se um pensamento, uma lógica.

Conhecimento Vulgar/Popular: É a forma de conhecimento do tradicional


(hereditário), da cultura, do senso comum, sem compromisso com uma apuração ou
análise metodológica. Não pressupõe reflexão, é uma forma de apreensão passiva,
acrítica e que, além de subjetiva, é superficial.

Conhecimento Científico: Preza pela apuração e constatação. Busca por leis e


sistemas, no intuito de explicar de modo racional aquilo que se está observando. Não se
contenta com explicações sem provas concretas; seus alicerces estão na metodologia e
na racionalidade. Análises são fundamentais no processo de construção e síntese que o
permeia, isso, aliado às suas demais características, faz do conhecimento científico
quase uma antítese do popular.

Conhecimento Filosófico: Mais ligado à construção de idéias e conceitos. Busca as


verdades do mundo por meio da indagação e do debate; do filosofar. Portanto, de certo
modo assemelha-se ao conhecimento científico - por valer-se de uma metodologia
experimental -, mas dele distancia-se por tratar de questões imensuráveis, metafísicas. A
partir da razão do homem, o conhecimento filosófico prioriza seu olhar sobre a condição
humana.

Conhecimento Teológico: Conhecimento adquirido a partir da fé teológica, é fruto da


revelação da divindade. A finalidade do Teólogo é provar a existência de Deus e que os
textos Bíblicos foram escritos mediante inspiração Divina, devendo por isso ser
realmente aceitos como verdades absolutas e incontestáveis. A fé pode basear-se em
experiências espirituais, históricas, arqueológicas e coletivas que lhe dão sustentação.
Conhecimento Intuitivo: Inato ao ser humano, o conhecimento intuitivo diz respeito à
subjetividade. Às nossas percepções do mundo exterior e à racionalidade humana.
Manifesta-se de maneira concreta quando, por exemplo, tem-se uma epifania.
1.Intuição Sensorial/Empírica: “A intuição empírica é o conhecimento direto e imediato
das qualidades sensíveis do objeto externo: cores, sabores, odores, paladares, texturas,
dimensões, distâncias. É também o conhecimento direto e imediato de estados internos
ou mentais: lembranças, desejos, sentimentos, imagens.” (in: Convite à Filosofia;
CHAUÍ, Marilena).
2.Intuição Intelectual: A intuição com uma base racional. A partir da intuição sensorial
você percebe o odor da margarida e o da rosa. A partir da intuição intelectual você
percebe imediatamente que são diferentes. Não é necessário demonstrar que a “parte
não é maior que o todo”, é a lógica em seu estado mais puro; a razão que se compreende
de maneira imediata.

Cap 6
Epistemologia genética
A Epistemologia Genética defende que o indivíduo passa por várias etapas de
desenvolvimento ao longo da sua vida. O desenvolvimento dá-se através do equilíbrio
entre a assimilação e a acomodação, resultando em adaptação. Segundo esta
formulação, o ser humano assimila os dados que obtém do exterior, mas uma vez que já
tem uma estrutura mental que não está "vazia", precisa adaptar esses dados à estrutura
mental já existente. O processo de modificação de si próprio é chamado de acomodação.
Este esquema revela que nenhum conhecimento nos chega do exterior sem que sofra
alguma alteração pela nossa parte. Ou seja, tudo o que aprendemos é influenciado por
aquilo que já tínhamos aprendido. Piaget somente veio a conhecer as pesquisas de
Vygotsky muito depois da morte deste. Originalmente um biólogo, com a
especialização em moluscos do Lago Genebra, fez seus estudos de psicologia do
desenvolvimento entrevistando milhares de crianças e inicialmente observando como
seus filhos cresciam.
As teorias de Piaget sobre o desenvolvimento psicológico mostraram-se muito
influentes. Entre outros, o filósofo e cientista social Jürgen Habermas as incorporou em
seu trabalho, mais notadamente em A Teoria da Ação Comunicativa. O historiador da
Ciência Thomas Kuhn e o pensador marxista Lucien Goldmann tiveram em Piaget um
interlocutor importante. A influência de Piaget na pedagogia é notável. Na área da
alfabetização temos a obra de Emília Ferreiro. No Brasil, suas ideias começaram a ser
difundidas na época do movimento da Escola Nova, principalmente por Lauro de
Oliveira Lima.
Seymour Papert usou o trabalho de Piaget como fundamentação ao desenvolver a
linguagem de programação Logo. Alan Kay usou as teorias de Piaget como base para o
sistema conceitual de programação Dynabook, que foi inicialmente discutido em Xerox
PARC. Estas discussões levaram ao desenvolvimento do protótipo Alto, que explorou
pela primeira vez os elementos do GUI, ou Interface Gráfica do Usuário, e influenciou a
criação de interfaces de usuário a partir dos anos 80.
Teoria
Através da minuciosa observação de seus filhos e principalmente de outras crianças,
Piaget impulsionou a Teoria Cognitiva, onde propõe a existência de quatro estágios de
desenvolvimento cognitivo no ser humano: sensório-motor, Pré-operacional (Pré-
Operatório), Operatório concreto e Operatório formal.
Karl Popper já é um autor conhecido entre os portugueses. Muitos dos seus livros estão
disponíveis nas nossas livrarias, mas, curiosamente, isso não sucede com as suas três
obras mais significativas (The Logic of Scientific Discovery (traduzida no Brasil),
Conjectures and Refutations (entretanto traduzida em Portugal) e Objective
Knowledge), em que Popper desenvolveu uma teoria da ciência abrangente e inovadora,
que constitui um dos marcos da filosofia do século XX. É claro que também existe a
filosofia política de Popper, mas a importância desta vertente do seu pensamento é
muito mais questionável. O Mito do Contexto, o título agora publicado pelas Edições
70, não exclui essa vertente política, mas situa-se sobretudo no domínio da filosofia da
ciência. Apresenta-se, aliás, como uma defesa da ciência e da racionalidade.
O Mito do Contexto reúne diversos ensaios, muitos baseados em conferências, em que
Popper discute, de forma extremamente acessível, os temas que sempre lhe foram caros.
No ensaio que intitula o livro, desenvolve a sua oposição a uma das teorias filosóficas
mais influentes: o relativismo. Ao aceitarem o mito do contexto, os relativistas
defendem que qualquer discussão racional produtiva exige que os participantes
partilhem um contexto comum de pressupostos básicos. Sem deixar de denunciar os
perigos de um optimismo excessivo quanto aos poderes da razão, Popper tenta mostrar
que esta doutrina está errada. Depois de considerá-la em diversos contextos específicos,
como o da linguagem e o da ciência, conclui com uma apreciação lógica geral: salienta
que o mito do contexto resulta "da visão errónea de que toda a discussão racional tem de
começar a partir de "princípios" ou, como muitas vezes são denominados, "axiomas", os
quais, por seu turno, devem ser aceites dogmaticamente, se pretendermos evitar um
retrocesso infinito."
O mito do contexto, no entanto, não é o único que Popper pretende dissolver. Os mitos
de que a objectividade científica depende do "espírito imparcial dos cientistas", de que a
ciência se baseia em observações puras, não impregnadas de teoria, de que as teorias
científicas, sendo apenas instrumentos para a realização de previsões, não proporcionam
qualquer descrição profunda da realidade, contam-se entre os alvos principais das
críticas de Popper. Todas estas críticas, dispersas pelos restantes ensaios, se integram na
defesa da concepção falsificacionista da ciência. Segundo esta concepção, o método
científico não se caracteriza pelo uso de inferências indutivas, ou seja, fazer ciência não
é estabelecer teorias a partir de dados observacionais. Os dados observacionais só têm
relevância quando são utilizados para tentar refutar ou falsificar teorias científicas. Estas
começam por ser conjecturas ousadas e injustificadas, e só adquirem valor em virtude
de sobreviverem a tentativas severas de refutação. Deste modo, a evolução do
conhecimento científico tem um carácter darwinista.
Uma das questões que recebe mais atenção em O Mito do Contexto é a do estatuto das
ciências sociais. Será que estas diferem crucialmente das ciências naturais? Popper
defende que não, atribuindo a popularidade da resposta contrária a uma imagem errada
do método das ciências naturais. Em "Razão ou Revolução?", sem dúvida o ensaio mais
polémico do livro, esta questão conduz a uma crítica dura ao tipo de investigação
sociológica promovido pela escola de Frankfurt. "Alguns dos expoentes famosos da
sociologia alemã", declara Popper, "que dão o seu melhor em termos intelectuais e que
o fazem com a melhor consciência do mundo estão, todavia, creio, apenas a falar de
trivialidades numa linguagem sonante, tal como foram ensinados." Denunciando o
"culto da incompreensibilidade", que desde Hegel tem afectado um amplo sector da
cultura alemã (e não só), Popper defende que tal culto acaba por traduzir-se em "dizer as
maiores banalidades em linguagem sonante". Para quem foi educado neste culto,
acrescenta, é "inconcebível que possa haver ideias importantes que valha a pena
compreender, com as quais não possamos concordar ou das quais não possamos
discordar de imediato."
Este tipo de crítica não surpreenderá quem já estiver familiarizado com o pensamento
de Popper. Na verdade, O Mito do Contexto, que em diversos momentos se torna
repetitivo e até simplista, não traz nada de significativamente novo ao legado
popperiano. Ainda assim, constitui uma boa introdução. E vem reforçar um aspecto
curioso de Popper: embora tenha sempre insistido na importância de sermos críticos em
relação às nossas próprias ideias, foi um dos filósofos que menos mudou de ideias ao
longo da sua obra.

Filosofia da ciência
Filosofia da Ciência é o campo da pesquisa filosófica que estuda os fundamentos,
pressupostos e implicações filosóficas da ciência, incluindo as ciências naturais como
física e biologia, e as ciências sociais, como psicologia e economia. Neste sentido, a
filosofia da ciência está intimamente relacionada à epistemologia e à ontologia. Busca
explicar coisas como:
• a natureza das afirmações e conceitos científicos,
• a forma como são produzidos,
• como a ciência explica, prediz e, através da tecnologia, domina a
natureza,
• os meios para determinar a validade da informação,
• a formulação e uso do método científico,
• os tipos de argumentos usados para chegar a conclusões,
• as implicações dos métodos e modelos científicos para a sociedade e
para as próprias ciências.
Uma visão é que todas as ciências possuem uma filosofia subjacente independente do
que se afirme ao contrário:
Não há tal coisa como ciência livre de filosofia; há apenas ciência
cuja bagagem filosófica é tomada a bordos sem examinação —Daniel
Dennett, Darwin's Dangerous Idea, 1995.

Natureza das afirmações e conceitos científicos


A Ciência tira conclusões sobre o modo que o mundo é, e o modo que a teoria científica
se relaciona a esse mundo.Tira-as por meio de evidências de experimentação, dedução
lógica, e pensamento racional a fim de examinar o mundo e os indivíduos que existem
dentro da sociedade. Em fazer observações dos indivíduos e seus arredores, a ciência
procura explicar os conceitos que estão envolvidos com a vida diária.
Empirismo
Um conceito central em filosofia da ciência é o empirismo, ou dependência da
evidência. Empirismo é a visão de que o conhecimento deriva da experiência do mundo.
Nesse sentido, afirmações são sujeitas e derivadas de nossas experiências ou
observações. Hipóteses científicas são desenvolvidas e testadas através de métodos
empíricos consistindo de observações e experimentos. Uma vez reproduzidos o
bastante, a informação resultante conta como evidência sobre as quais a comunidade
científica desenvolve teorias que se propõem a explicar fatos sobre o mundo.
Observações envolvem percepção, e então se tem os actos cognitivos propriamente
ditos. Isto é, observações não são por si só enquadradas em nossa compreensão de como
o mundo funciona; conforme esta compreensão mude, as observações por elas mesmas
podem aparentemente mudar.
Os cientistas tentam usar a indução, a dedução e os métodos quasi-empíricos e invocar
metáforas conceituais chaves para trabalhar as observações em uma estrutura coerente e
autoconsistente.
Realismo científico e instrumentalismo
O realismo científico, ou empirismo ingênuo, é a visão de que o universo é explicado da
forma que realmente é pelas afirmações científicas. Realistas defendem que coisas como
elétrons e campos magnéticos realmente existem. É ingênuo no sentido de tomar
modelos científicos como sendo a verdade, e é a visão que a maior parte dos cientistas
adota.
Em contraste ao realismo, o instrumentalismo defende que as nossas percepções, idéias
e teorias científicas não necessariamente refletem o mundo real com precisão, mas são
instrumentos úteis para explicar, predizer e controlar nossas experiências. Para um
instrumentalista elétrons e campos magnéticos podem ou não podem existir de fato.
Para os instrumentalistas, o método empírico é usado para fazer não mais do que
mostrar que teorias são consistentes com observações. O instrumentalismo é
grandemente baseado na filosofia de John Dewey como também Pierre Duheme, de um
modo mais geral, o pragmatismo, o qual foi influenciado por filósofos como Willian
James e Charles Sanders Peirce.
Construtivismo social
Uma área de interesse entre historiadores, filósofos, e sociólogos da ciência é a extensão
na qual teorias científicas são moldadas por seus contextos políticos e sociais. Esse
conceito é usualmente conhecido construtivismo social. O construtivismo social é em
um sentido uma extensão do instrumentalismo que incorpora os aspectos sociais da
ciência. Em sua forma mais forte, vê a ciência como um mero discurso entre cientistas,
com o fato objetivo desempenhando pouco papel, se desempenhar algum. Uma forma
mais fraca da posição construtivista pode defender que fatores sociais desempenham um
grande papel na aceitação de novas teorias científicas.
Do lado mais forte, a existência do planeta Marte é irrelevante, desde que tudo o que
realmente temos são observações, teorias e mitos, os quais são por si só construídos por
interação social. Deste lado, as afirmações científicas são a respeito de uma sobre a
outra, e o teste empírico é não mais que algo para verificar a consistência entre
diferentes conjuntos de teorias sociologicamente construídas. Esse lado rejeita o
realismo. Torna-se difícil, então, explicar como a ciência se difere de qualquer outra
disciplina; igualmente, contudo, torna-se difícil dar um parecer do extraordinário
sucesso da ciência em produzir tecnologia aplicável.
Do lado mais fraco, pode-se dizer que o planeta Marte tem uma existência real, separada
e distinta de nossas observações, teorias e mitos a respeito. Porém as teorias e
observações são socialmente construídas, parte do processo de construção envolve
assegurar a correspondência de algum tipo com essa realidade. Deste lado, as
afirmações científicas são sobre o mundo real. A questão crucial para esse lado é em
explicar essa correspondência. Qual a justificação da reivindicação de que as fotos da
última leva são em algum sentido mais reais do que o mito romano sobre Marte? É
importante, então, para os Construtivistas Sociais considerar como afirmações
científicas são justificadas.
Análise e reducionismo
Análise é a atividade de quebrar uma observação ou teoria em conceitos mais simples a
fim de compreendê-los. A análise é tão essencial para a ciência quanto para todos os
empreendimentos racionais. Seria impossível, por exemplo, descrever matematicamente
o movimento de um projétil sem separar a força da gravidade, o ângulo de projeção e a
velocidade inicial. Apenas depois dessa análise é possível formular uma teoria do
movimento adequada.
Reducionismo em ciência pode ter vários diferentes sentidos. Um tipo de reducionismo
é a crença que todos os campos de estudo estão em última instância sujeitos a
explicação científica. Talvez um evento histórico possa ser explicado em termos
sociológicos e psicológicos, os quais por suas vezes poderiam ser descritos em termos
de psicologia humana, a qual por sua vez poderia ser descrita em termos de química e
física. O evento histórico foi reduzido a um evento físico. Isso poderia ser visto como
implicação de que o evento histórico não é nada porém evento físico, negando a
existência de um fenômeno emergente.
Daniel Dennett inventou o termo greedy reductionism (reducionismo ganancioso) para
descrever o pressuposto de que tal reducionismo era possível. Ele afirma que é apenas
"má ciência", buscar encontrar explicações que são apelativas ou eloqüentes, mais do
que aquelas que estão em uso em predizer um fenômeno natural.
Argumentos feitos contra o reducionismo ganancioso através de referência ao fenômeno
emergente confiam no fato de que em sistemas auto-referenciais pode-se dizer conter
mais informação do que pode ser descrita por meio de análise individual de suas partes
componentes. Exemplos incluem componentes que contêm loops estranhos, organização
fractal e atratores estranhos em espaço de fase. Análise de tais sistemas é
necessariamente destruidora de informações porque o observador tem de selecionar uma
amostra do sistema que possa ser na melhor das hipóteses parcialmente representativa.
A teoria da informação pode ser usada para calcular a magnitude de informação perdida
e é uma das técnicas aplicadas pela teoria do caos.

Interdisciplinaridade
Trata-se de um movimento, um conceito e uma prática que está em processo de
construção e desenvolvimento dentro das ciências e do ensino das ciências, sendo estes,
dois campos distintos nos quais a interdisciplinariedade se faz presente.
Definir um objeto que está em construção, co-existindo com aquele que o estuda é uma
tarefa difícil e até certo ponto parcial, uma vez que este objeto está se transformando e
se alterando, assim, toda discussão sobre interdisciplinaridade é passível de análise
comparativa com o material contemporâneo sobre o tema até que este esteja melhor
desenvolvido e articulado, muito mais pela prática do que pela teoria, uma vez que a
interdisciplinariedade esta acontecendo, e a partir disso, uma teria tem sido
desenvolvida.
Um estudo epistemológico é proveitoso para a delimitação do tema: Existem quatro
palavras que são particularmente relacionadas entre si e todas delimitam uma
abordagem cientifica e educacional:
Pluridisciplinaridade; Multidisciplinaridade; Interdisciplinaridade e
Transdisciplinaridade.
O que há em comum nestas palavras é a palavra disciplinaridade/disciplina, que deve
ser entendida como aquelas "fatias" dos estudos cientificos e das disciplinas escolares,
tais como matemática, biologia, ciencias naturais, historia, etc. e de um esforço em
superar tudo o que esta relacionado ao conceito de disciplina. Assim,
interdisciplinaridade é parte de um movimento que busca a superação da
disciplinaridade

Origem e conceitos
A interdisciplinaridade tem suas raízes na historia da ciência moderna, sobretudo aquela
produzida a partir do seculo XX, por isso para compreender este movimento, é
necessário apresentar algumas considerações sobre esta tematica.
Principio dos estudos cientificos
Desde o século XV a ciência passou por uma grande mudança em toda a sua estrutura, o
que resultou numa explosão de novos conhecimentos, novas praticas e técnicas de
pesquisa, isso tem inicio com o renascimento e com a perda, por parte da igreja, do
poder que exercia sobre o homem e a sociedade. Pesquisas até então condenadas e
censuradas começavam a ser feitas, por exemplo pesquisa da anatomia humana através
da dissecação de cadáveres. Galileu, Da Vinci, Copernico, entre outros, surgem com
grandes inovações e idéias que alterariam o pensamento humano. Com tudo isso surge
definitivamente a ciência e a pesquisa cientifica, tomando lugar entre a teologia e a
filosofia, com a missão de apresentar a razão em oposição a fé e a pesquisa em oposição
ao discurso e a retórica.
Disciplinarização do conhecimento
Num período muito curto, a ciencia tem seus fundamentos desenvolvidos e sua principal
função torna-se a de compreender as coisas partindo do macro, do todo, até chegar no
micro, na menor particula, na menor parte, a fim de ter uma visão mais profunda do
todo. Então o movimento que a ciencia passa a realizar é partir da compreensão já
existente das coisas, por exemplo, das ideias postas do que é o homem, seu corpo, seus
membros, seus sistemas, o funcionamento do corpo, etc. em direção a menor particula
que possa ajudar a definir e compreender esse mesmo homem, assim iniciam-se as
pesquisas em anatomia humana, pesquisas em microbiologia humana, até, bem
recentemente, chegar-se a um grande contingente de informações e conhecimentos do
que é o homem, tendo chegado até o DNA. Importante observar que, segundo o
exemplo dos estudos do homem, com o tempo o volume de estudos e de informações
levantadas foi ficando grande ao ponto de ser necessária a criação de novas
subcategorias que dessem conta de continuar as pesquisas e dominar os conhecimento
adquiridos, em outras palavras, a disciplina de ciencias passa a ter uma nova disciplina
especifica que responderia então por um conhecimento especifico da ciencia absoluta.
Esse processo se repete exatamente como se dá a divisão celular, quando uma disciplina
esta desenvolvida o suficiente, ela se divide e da origem a outra disciplina, distinta da
primeira em seu objeto de estudo e exigente quando ao pesquisador que deve dominá-la,
que é o especialista. Através deste movimento, partindo do século XV, em que existia
somente a disciplina de ciência, que era dominada por todos os estudiosos envolvidos,
chega-se ao século XXI com uma infinidade de disciplinas especializadas nas mais
diversas frações da ciência, tais como ciencias sociais, sociologia, antropologia,
psicologia, anatomia geral, anatomia especifica ou neurologia, cardiologia, fisiologia,
etc. ciências da natureza, biologia, microbiologia, ciencias exatam, quimica, fisica, e
muitas outras, cada uma sendo responsável por uma pequena fração, ou especialidade da
ciencia, e cada uma com um especialista diferente, que domina somente a sua
especialidade, aquela fração do conhecimento.
[Diferenciação entre disciplina escolar e cientifica
Embora o termo disciplina seja empregado para mencionar tanto as frações do
conhecimento científico, como frações dos estudos escolares, e em muitos casos tenham
os mesmos nomes, tais como historia, matemática, química, física, etc. As ligações entre
umas e outras esta somente nisso. Não há relação direta entre uma disciplina cientifica e
uma disciplina escolar com mesmo nome, o que se dá é que remotamente o objeto de
estudo de uma e outra disciplina é o mesmo, porem a disciplina escolar não apresenta
todos os conhecimentos da disciplina cientifica, por vezes até foge um pouco desses
conhecimentos, como no caso da disciplina escolar de Geografia, que não comtempla a
cartografia, a geologia, dentre outras. Isso se dá porque as funções de uma e outra
disciplina são diferentes. É importante observar que as disciplinas escolares tomam
muito daquilo que é produzido pelas disciplinas cientificas e reveste esses
conhecimentos de funções didáticas que tem a função de levar os alunos a conhecerem,
mesmo que minimamente, o que é produzido pelo homem em termos de conhecimento e
estudos.
Aplicação na ciência
Como indicado anteriormente, a interdisciplinaridade surge no século XX como um
esforço de superar o movimento de especialização da ciencia e superar a fragmentação
do conhecimento em diversas areas de estudo e pesquisa. A ciencia, no século XX,
tornou-se especializada ao ponto de não ser mais possível realizar o movimento
pretendido quando do inicio da especialização, que era chegar ao micro para conseguir
ver o todo de forma plena e completa, e também, chegou-se ao ponto em que em
algumas areas não era mais possível continuar aprofundando no conhecimento, tendo
chegado ao limite do que era possivel a determinadas especialidades pesquisar. Então a
interdisciplinaridade surge como proposta para a realização do movimento inverso,
partir do micro e retornar ao todo. Com isso, com a aplicação da interdisciplinaridade na
ciencia, surgem novas disciplinas agregadoras, que unem areas especificas do
conhecimento a fim de compreender fenômenos que seriam incompreensiveis com os
conhecimento de apenas uma área, como é o caso da bioengenharia, que une as areas da
biologia e engenharia a fim de dar conta de estudos que uma ou outra disciplina sozinha
não daria conta.
[
Principais autores
A pesquisa sobre interdisciplinaridade ainda é muito recente, mesmo assim existem
alguns autores já destacados por sua produção sobre o tema, são eles: Ivani Fazenda,
que possui varias publicações sobre o tema e sua relação com a educação e é
coordenadora de uma equipe de pesquisadores da PUC-SP que desenvolve diversas
pesquisas sobre o tema; Hilton Japiassu, que possui também diversas publicações sobre
o tema, tanto em sua manifestação na educação como na ciencia; em Portugal se destaca
a autora Olga Pombo, que é também pesquisadora sobras as manifestações do tema no
Brasil e em Portugal e já esteve no país ministrando diversas palestras sobre o assunto.
Interdisciplinaridade é a integração de dois ou mais componentes curriculares na
construção do conhecimento. A interdisciplinaridade surge como uma das respostas à
necessidade de uma reconciliação epistemológica, processo necessário devido à
fragmentação dos conhecimentos ocorrido com a revolução industrial e a necessidade
de mão de obra especializada. A interdisciplinaridade buscou conciliar os conceitos
pertencentes às diversas áreas do conhecimento a fim de promover avanços como a
produção de novos conhecimentos ou mesmo, novas sub-áreas.

Edgar Morin
Edgar Morin, pseudônimo de Edgar Nahoum (Paris, 8 de Julho 1921), é um
antropólogo, sociólogo e filósofo francês judeu de origem sefardita.
Pesquisador emérito do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique). Formado
em Direito, História e Geografia, realizou estudos em Filosofia, Sociologia e
Epistemologia. Autor de mais de trinta livros, entre eles: O método (6 volumes),
Introdução ao pensamento complexo, Ciência com consciência e Os sete saberes
necessários para a educação do futuro.
Durante a Segunda Guerra Mundial, participou da Resistência Francesa.
É considerado um dos principais pensadores contemporâneos e um dos principais
teóricos da complexidade.
Pensamento
A principal obra de Edgar Morin é a constituída por seis volumes, "La Méthode" (em
português, O Método). Foi escrita durante três décadas e meia. Trata-se de uma das
maiores obras de epistemologia disponível. Morin inicia os primeiros escritos de "La
Méthode" em 1973, com a publicação do livro "O Paradigma Perdido: a Natureza
Humana", uma transformação epistemológica por questionar o fechamendo ideológico e
paradigmático das ciências, além de apresentar uma alternativa à concepção de
"paradigma" encontrada em Thomas Kuhn. Seu primeiro livro traduzido para o
português é O cinema ou o homem imaginário, em 1958.
O pensamento complexo
Complexo vem do Latim complexus, que quer dizer “aquilo que é tecido em conjunto”.
Segundo o próprio Morin, nós somos:
Homo (gênero) Homo sapiens sapiens
Edgar Morin diz que é sistemático demais possuirmos um sapiens ou dois, em nossa
autodenominação; é preciso acrescentar um demens, ficando: Homo sapiens sapiens
demens, o que mostra o quanto somos descomedidos, loucos. Todo homem é duplo: ao
mesmo tempo que é racional apresenta certa demência.
Na busca do verdadeiro pensamento complexo de Morin, esbarramos no entendimento
de outros conceitos, entre eles, é o de operadores de complexidade:
• Operador dialógico que é diferente de operador dialético
• Operador recursivo
• Operador hologramático
O operador dialógico envolve o entrelaçar coisas que aparentemente estão separadas:
Exemplos:
• Razão e emoção
• Sensível e inteligível
• O real e o imaginário
• A razão e os mitos
• A ciência e a arte
Trata-se da não existência de uma síntese. Tudo isto consiste o chamado dialogizar.
O operador recursivo, trata principalmente do fato de que sempre aprendemos que uma
causa A produz um efeito B. Na recursividade a causa produz um efeito, que por sua
vez produz uma causa.
Exemplo: Somos produto de uma união biológica, entre um homem e uma mulher e por
nossa vez seremos geradores de outras uniões.
O operador hologramático, trata de situações em que você não consiga separar a parte
do todo. A parte está no todo, assim como o todo está na parte. Esses três operadores
são as bases do pensamento complexo. Em resumo temos:
• Juntar coisas que estavam separadas
• Fazer circular o efeito sobre a causa
• Idéia de totalidade: Não dissociar a parte do todo. O todo está na
parte assim como a parte está no todo.
Com esses três operadores, você criará a noção de totalidade, mas ao mesmo tempo,
criará uma concepção de que a simples soma das partes não leva a esse total. A
totalidade (no pensamento complexo), é mais do que a soma das partes e
simultaneamente menos que a soma das partes.
- Nós somos considerados seres que:
• Falam;
• Fabricam seus próprios instrumentos;
• Simbólicos, pois criamos nossos símbolos, nossos mitos, e nossas
mentiras.
O pensamento complexo afirma também que, além disso, somos complexos. Isto porque
estamos inscritos numa longa ordem biológica e porque somos produtores de cultura.
Logo, somos 100% natureza e 100% cultura. O conhecimento complexo não está
limitado à ciência, pois há na literatura, na poesia, nas artes, um profundo
conhecimento. Todas as grandes obras de arte possuem um profundo pensamento sobre
a vida. Segundo o próprio Morin, devemos romper com a noção de que devemos ter as
artes de um lado e o pensamento científico do outro.
Tetragrama organizacional
Qualquer atividade de seres vivos é guiada por uma tetralogia. Envolve relações de:
• Ordem;
• Desordem;
• Interação;
• (re)Organização.
Isto é o tetragrama organizacional.
Unindo este tetragrama aos operadores de complexidade, temos as bases do pensamento
complexo.
Diz Marx: “Qualquer reforma do ensino e da educação começa com a reforma dos
educadores.” Esta é uma das citações mais utilizadas por Morin quando trata da questão
do pensamento complexo e da reforma dos educadores no processo de criação de uma
nova educação. A razão cartesiana impôs um paradigma. Ela nos ensinou a separar a
razão da des-razão. Temos que religar tudo o que a ciência cartesiana separou, segundo
Morin.

Cap 7

UMA BREVE ANÁLISE DO "DISCURSO SOBRE


AS CIÊNCIAS" DE BOAVENTURA DE SOUSA
SANTOS
A resenha desta obra será feita da seguinte maneira: inicialmente farei um resumo
abrangendo os três pontos centrais da obra (“O paradigma dominante”, “A crise do
paradigma dominante”, “O paradigma emergente”), posteriormente, irei expor
considerações críticas. Saliento que os dois primeiros capítulos serão tratados com
maiores detalhes na parte do resumo. Deixarei para analisar e esclarecer o terceiro
capítulo na parte crítica deste trabalho, juntamente com as exposições de minhas idéias
sobre o assunto/texto.
1. INTRODUÇÃO

A obra “Um discurso sobre as Ciências” apresenta em suas primeiras páginas a crise de
identidade das ciências no tempo em que vivemos. Esse assunto será desdobrado ao
longo da obra, sendo analisados aspectos históricos das ciências naturais e sociais, bem
como o atual contexto cientifico em que nos encontramos e as perspectivas para o futuro.

O autor sustenta, inicialmente, que nos encontramos em uma fase de transição entre
“tempos” científicos. Para uma melhor compreensão, Boaventura utiliza-se do exemplo de
Rousseau, que na obra “Discours sur Le Sciences et lês Arts”, de 1750, buscou respostas
por meio de perguntas elementares e simples. Para tanto, o autor estrutura a sua obra da
seguinte maneira: 1º) caracteriza a ordem científica hegemônica; 2º) analisa, sob
condições teóricas e sociológicas, a crise dessa hegemonia; 3º) propõe um perfil de uma
ordem científica emergente, novamente sob condições teóricas e sociológicas.

2. O PARADIGMA DOMINANTE

A ordem científica dominante, tratada na obra como “O paradigma dominante”, diz respeito
ao modelo de racionalidade herdado a partir do século XVI e consolidado no século XIX.
Essa nova racionalidade científica vislumbra uma única forma de se atingir o conhecimento
verdadeiro, aquela decorrente da aplicação de seus próprios princípios epistemológicos e
de suas regras metodológicas. Sendo um modelo totalitário, esta nova visão de mundo
apresentava distinções fundamentais aos modelos de “saberes” aristotélicos e medievais:
1º) opunham-se conhecimento científico e conhecimento do senso comum (desconfiava-se
das evidências da experiência imediata e do senso comum e buscava-se respostas na
observação científica sistemática, rigorosa e controlável dos fenômenos naturais); 2º)
opunham-se natureza e pessoa humana (buscava-se conhecer a natureza para poder
controlá-la e dominá-la).

Para que ocorresse uma observação e experimentação que levasse a um conhecimento


mais profundo e rigoroso da natureza, empregava-se, como instrumento privilegiado de
análise, a matemática. A matemática permitia que a natureza, bem como os seus
fenômenos, fossem analisados e estruturados sob dois pilares: 1º) quantificação como
sinônimo de conhecimento, pelo emprego rigoroso das medições; 2º) redução da
complexidade do mundo, por meio da divisão e classificação sistemática (tendo como
divisão primordial aquela entre condições iniciais (reino da complicação e do acidente,
onde é necessário selecionar as condições a serem observadas) e leis da natureza (reino
da simplicidade e da regularidade, onde há a possibilidade de se observar e medir de
forma rigorosa a natureza).

A descoberta das leis da natureza, o isolamento das condições iniciais relevantes, a


produção de resultados independentemente do lugar e tempo das condições iniciais, o
conhecimento causal da ciência moderna (que busca entender o “como” ao invés do “por
quem” ou “para que”) promoveram, dentre outras conseqüências, a previsibilidade dos
fenômenos naturais. É por meio dessa suposta previsibilidade que se firmou o
conhecimento na idéia de ordem e estabilidade do mundo, sendo este “estável” e
“determinável” por meio de leis físicas e matemáticas que poderiam o decompor. Eis aí o
fundamento do chamado determinismo mecanicista que irá sustentar a ciência moderna (o
mundo-máquina) com a sua idéia de um mundo cognoscível pela decomposição dos seus
elementos constituintes.
Por se tratar de um modelo de racionalidade hegemônica da época, a ciência moderna,
por intermédio de precursores como Bacon, Vico e Montesquieu, não demorou a
permeabilizar o campo do comportamento social. Como bem afirma o autor, “tal como foi
possível descobrir as leis da natureza, seria igualmente possível descobrir as leis da
sociedade”(1).

Decorre daí, em meados do século XIX, a emergência das chamadas ciências sociais, as
quais assumiriam duas correntes distintas de absorção do modelo mecanicista: 1ª)
aplicava, dentre as possibilidades existentes, os princípios epistemológicos e
metodológicos do estado da natureza (ciências sociais como extensão das ciências
naturais); 2ª) estabelecia uma metodologia própria para as ciências sociais, com base na
“especificidade do ser humano e sua distinção polar em relação à natureza”(2).

A primeira vertente defendia a aplicação de um modelo de ciências sociais erigido a partir


de pressupostos das próprias ciências naturais, tendo portanto um caráter de
conhecimento universalmente válido. Como bem assinala Boaventura, ao esclarecer essa
corrente, “por maiores que sejam as diferenças entre os fenômenos naturais e sociais é
sempre possível estudar os últimos como se fossem os primeiros”(3). Apesar das
dificuldades, essa vertente admite a possibilidade de as ciências sociais se
compatibilizarem com os critérios rigorosos das ciências naturais. Dessa vertente fazem
parte Durkheim e Ernest Nagel.

A segunda vertente irá defender uma metodologia própria, na qual as dificuldades em


compatibilizarem-se os dois campos das ciências, naturais e sociais, são instransponíveis.
O fundamento detrás desse pensamento é a subjetividade do comportamento humano, o
qual, revestindo-se de complexa estrutura, não pode ser analisado e explicado da mesma
maneira que é explicada a natureza (por suas características exteriores observáveis).
Como ressalta o autor, ao explicar a segunda corrente, “a ciência social será sempre essa
ciência subjetiva e não objetiva como as ciências naturais; tem de compreender os
fenômenos sociais a partir das atitudes mentais e do sentido que os agentes conferem às
suas ações, para o que é necessário utilizar métodos de investigação e mesmo critérios
epistemológicos diferentes das correntes nas ciências naturais”(4). Como doutrinadores
dessa corrente pode-se citar Max Weber e Peter Winch.

Apesar de serem aparentemente diversas, as duas correntes acabam por dar maior
relevância às ciências naturais do que às ciências sociais. De fato, a segunda vertente
serviria como um indício da crise do modelo até então hegemônico.

3. A CRISE DO PARADIGMA DOMINANTE

A crise do modelo hegemônico decorre da interatividade de uma série de condições


teóricas e sociais. O autor destaca, inicialmente, quatro condições teóricas que
contribuíram para a crise do paradigma dominante: 1ª) a teoria da relatividade de Einstein;
2ª) a mecânica quântica; 3ª) o questionamento do rigorismo matemático; 4ª) o avanço do
conhecimento nas áreas da microfísica, química e biologia na segunda metade do século
XX. Nos últimos parágrafos do capítulo, o autor apresenta, em aspectos genéricos,
algumas condições sociais proporcionadas pela crise do paradigma dominante.

A primeira condição teórica diz respeito à teoria da relatividade de Einstein. O ponto-chave


aqui repousa na divisão feita pelo cientista entre simultaneidade de eventos no mesmo
local e simultaneidade de eventos em locais diferentes (à distância). Partindo dessa idéia,
as concepções até então concebidas de espaço e tempo seriam revolucionadas. “Não
havendo simultaneidade universal, o tempo e o espaço absoluto de Newton deixam de
existir”(5). Passa-se, portanto, a conclusão de que as leis da física e da geometria
assentam-se em medições locais, pois dois acontecimentos simultâneos num sistema de
referência não são simultâneos noutro sistema de referência.

A segunda condição teórica refere-se à mecânica quântica. Aliada ao princípio da


incerteza de Heisenberg e à teoria de Boher, a mecânica quântica demonstra que não é
possível observar ou medir um objeto sem interferir nele, “a tal ponto que o objeto que sai
de um processo de medição não é o mesmo que lá entrou”(6). Três são as principais
conseqüências trazidas pela mecânica quântica: 1ª) sendo limitada a estrutura do
conhecimento que pode ser adquirido, as leis da física são meramente probabilísticas; 2ª)
o mecanicismo é inviabilizado uma vez que a totalidade do real não é reduzível à soma
das partes da divisão feita para a medição do objeto; 3ª) é muito mais complexa a divisão
entre sujeito e objeto.

A terceira condição teórica está baseada na teoria de Gödel, a qual acaba por questionar o
rigorismo matemático como regra absoluta da constituição da natureza. A principal
conseqüência dessa teoria é possibilitar a formulação de proposições “indecidíveis”
mesmo à matemática, proporções que não podem ser matematicamente nem refutadas,
nem demonstradas.

A quarta e última condição teórica, representada principalmente pela teoria de Prigogine,


está relacionada à quebra do modelo de mecanicismo linear do modelo newtoniano. Há, a
partir da segunda metade do século XX, o desenvolvimento de um movimento convergente
entre ciências naturais e sociais, caracterizado em grande parte pela transdicisplinaridade,
designado por Jantsch como o “paradigma da auto-organização”(7).

Esta série de condições teóricas apresentadas propiciaram uma profunda reflexão


epistemológica sobre o conhecimento científico. Duas grandes reflexões podem ser
destacadas: 1ª) questiona-se o conceito de lei e de causalidade; 2ª) releva-se antes o
conteúdo do conhecimento do que a sua forma.

Nos últimos parágrafos do texto são apresentadas, em aspectos genéricos, algumas


condições sociais proporcionadas pela crise do paradigma dominante.

4. O PARADIGMA EMERGENTE

O autor propõe um modelo emergente, o qual denomina “paradigma de um conhecimento


prudente para uma vida decente”(8). Este modelo estrutura-se em um paradigma científico
de conhecimento prudente e em um paradigma social de uma vida decente. Para justificar
o seu modelo, Boaventura utiliza-se de quatro princípios sobre o conhecimento: 1º) todo
conhecimento científico-natural é científico-social; 2º) todo conhecimento é local e total; 3º)
todo conhecimento é autoconhecimento; 4º) todo conhecimento científico visa constituir-se
em senso comum.

5. ANÁLISE CRÍTICA

Aproveito esta parte do trabalho para propor algumas observações sobre assuntos já
apresentados por Boaventura em sua obra. Também neste momento, creio que seja
relevante uma análise dos quatro pontos propostos pelo autor em seu novo paradigma
(último capítulo da obra).
Boaventura de Sousa Santos propõe um novo modelo de ciência a partir da inter-relação
entre ciências naturais e ciências sociais, fraturando o modelo totalitário das ciências
naturais, via única e possível para atingir-se uma “verdade universal”. “Verdade” essa
adquirida por herança do deslumbramento ocasionado pelas teorias surgidas,
principalmente a partir do século XIX, como o evolucionismo de Darwin, o positivismo de
Comte e a criminologia de Lombroso. Essas teorias possuíam em seu âmago uma
semelhança universal, a de sustentarem os seus estudos, como o a origem da natureza e
a natureza do homem, em valores matemáticos, os quais explicariam o mundo
racionalmente (e mensuravelmente), garantindo a previsibilidade fenomenológica da
natureza.

Não distantes do século XIX, os dias atuais ainda demonstram que a impregnação da idéia
deslumbrante da cientificidade (natural) moderna ainda persiste no ensino prestado pelas
mais diversas instituições de ensino. Não que as ciências naturais não possuam relevante
valor, pelo contrário, contribuem e muito. Porém, ocorre que o modelo mensurável de
“verdade” parece ser, ainda hoje, por muitos almejado como maneira perfectibilizada de
alcançar-se o onicompreensivismo, mesmo nos campos em que haja tremenda
subjetividade, como são aqueles em que a sociedade e, principalmente, o homem, como
indivíduo, aparecem como principais objetos de análise.

Ora, me baseio nessa observação por meio de uma experiência propriamente vivida. A
matemática, verdadeiro paradigma de ciência natural, onde a regra dos “números
previsíveis” impera, sempre foi sobremaneira valorizada em detrimento das disciplinas que
envolviam o estudo de questões onde suas regras não poderiam ser aplicadas diretamente
(em grande parte pela presença da subjetividade), como por exemplo a filosofia. Não por
acaso, uma vez que a herança de teorias como a darwinista persiste em nosso meio,
demonstrando clara necessidade de reavaliação dos métodos e valores acerca ensino
acadêmico. Deve-se almejar um sistema de ensino do conhecimento onde prevaleçam
conjuntamente, em paridade de relevância, disciplinas inerentes tanto às ciências sociais
quanto às ciências naturais. Permite-se com essa conduta, um melhor acesso ao
conhecimento da sociedade, do ser humano e da cultura pelos aprendizes.

À segunda proposta de conhecimento do festejado paradigma emergente proposto por


Boaventura de Sousa Santos (“Todo o conhecimento é local e total”(9)) gostaria de
associar a Teoria dos Sistemas. De relevante iniciativa do biólogo alemão Ludwig von
Bertalanffy, esta teoria demonstra-se cada dia mais presente nos estudos interdisciplinares
acadêmicos e institucionais. O autor português demonstra que o conhecimento propagado
pela ciência moderna estava pautado no avanço da especialização, podendo ser
sucintamente compreendido no binômio progressivo parcelização-rigorismo, ou seja,
quanto mais restrito é o objeto em que incide o estudo mais rigoroso será o conhecimento
sobre ele. Logo após, sustenta que não basta que o conhecimento seja adquirido de forma
local, isto é, que sejam desenvolvidas análises, descrições e estudos em geral sobre um
único objeto ou em um único campo disciplinar, é necessário além disso que haja um
compartilhamento sobre a pluralidade de possibilidades de condições a serem
“introjetadas” naquele estudo. Esse compartilhamento revela-se pelas vias da
transdisciplinaridade e da interdisciplinaridade. “E como Geertz, podemos perguntar se
Foucault é historiador, filósofo, sociólogo ou cientista político”(10).

A Teoria Geral dos Sistemas, desenvolvida ao longo do século XX, tendo o biólogo Karl
Ludwig von Bertalanffy como relevante precursor teórico, vai, em grande parte, ao
encontro da proposta de paradigma emergente apresentado por Boaventura de Sousa
Santos, senão vejamos. A Teoria dos Sistemas, tendo hoje grande representação literária
na obra “A teia da Vida” (cujo título original é “The Web of Life”) de Fritjof Capra, apresenta
dentre suas linhas mestres uma valorização maior do “comportamento coletivo” em relação
à atuação independente dos sujeitos que compõem um determinado sistema. A questão
nevrálgica a ser explorada pela Teoria dos Sistemas não é a
compreensão/controle/previsibilidade sobre um objeto isolado de uma análise (como a
ciência moderna pretendeu), mas sim compreender a estrutura organizacional e as
conexões interiores e exteriores entre o objeto de estudo e o ambiente do qual ele faz
parte(11). Dito de outra maneira, o estudo isolado de um objeto (ou parte dele) ou o estudo
de uma simples causalidade de um determinado problema (determinismo mecanicista)
dificilmente explicará, completamente, a relação que existe entre o objeto da pesquisa e o
ambiente que o cerca. Portanto, é necessário que o estudo desenvolvido considere ao
mesmo tempo as multirelações (seja entre objeto-objeto, seja entre objeto-ambiente, seja
entre outro tipo de relação) e as multicausalidades (seja entre objeto e resultado, seja
entre ambiente e influência em resultado, seja, novamente, em outro tipo de relação)
existentes entre ambos, objeto e ambiente.

Para a busca de um conhecimento mais amplo e universal é fundamental que sejam


conciliadas as diversas áreas da ciências existentes hoje em dia (sejam as naturais,
sociais, humanas, ou aquelas sob quaisquer outras denominações). A interdisciplinaridade
bem como a transdisciplinaridade entre campos como filosofia e história, antropologia e
direito, biologia e informática, apresentam-se cada vez mais relevantes. Os limites entre
uma área e outra tendem a desaparecer gradativamente, fazendo com que um
conhecimento universal, multiteórico e multidisciplinar seja, aos poucos, alcançado.

A terceira proposta feita pelo autor lusitano ao novo paradigma que emerge é a de que
“todo o conhecimento é autoconhecimento”(12). Dentre outras observações, apresenta-se
a separação que a chamada ciência moderna (principalmente no campo das ciências
naturais) fez entre o sujeito de investigação e objeto de investigação. O sujeito que
investiga não se confundiria com o objeto que estaria por ser estudado, como no exemplo
da antropologia que tinha como sujeito de investigação o europeu civilizado e como objeto
de investigação o indivíduo “primitivo”. Toda a subjetividade da natureza humana que
pudesse interferir nos resultados da pesquisa era afastada. Da mesma maneira, a religião
também havia sido afastada, evitando-se que valores morais ou éticos pudessem interferir
nos estudos realizados.

Hoje em dia, percebe-se outro modelo de relação sujeito-objeto na prática científica.


Clausewitz, citado na obra, sustenta que “podemos afirmar hoje que o objecto é a
continuação do sujeito por outros meios”(13). Pode-se dizer, portanto, que, ao contrário da
propugnação científica moderna de que os sujeitos deveriam conformar-se com o que por
ela fosse determinado, hoje em dia, tem-se que o determinismo científico não é mais o
único parâmetro a reger a vida das pessoas (realidade/previsibilidade). Há outras maneiras
de se “saber viver”. Como observado pelo autor, “hoje não se trata tanto de sobreviver
como de saber viver”(14). O “saber viver” conecta-se à compreensão íntima do homem,
enquanto ser vivo, de que há uma união entre ele e o objeto alvo de estudo. O objeto
passa a ser, portanto, uma própria extensão do sujeito, implicando que em uma pesquisa
seja adquirido conhecimento sobre o objeto, diretamente, e sobre o próprio sujeito,
indiretamente.

O quarto e último item integrante do modelo de paradigma emergente proposto é aquele


em que “todo o conhecimento cientifico visa constituir-se em senso comum”(15). A ciência
moderna considerava o senso comum como “superficial, ilusório e falso”(16), e por isso, o
repugnava. A ciência pós-moderna, por sua vez, resgata o valor presente no senso
comum. O senso comum permitirá que as diversas formas de conhecimento (das ciências
e do próprio cotidiano) interajam entre si, orientando as ações do ser humano e dando
sentido à vida (“saber viver”), ao ponto em que coincidem causa e intenção (ciência +
senso comum). É neste sentido que Boaventura de Sousa Santos sustenta que “a ciência
pós-moderna, ao sensocomunizar-se, não despreza o conhecimento que produz
tecnologia, mas entende que, tal como o conhecimento se deve traduzir em
autoconhecimento, o desenvolvimento tecnológico deve traduzir-se em sabedoria de vida”
A ciência moderna não é a única explicação possível da realidade e não há sequer
qualquer razão científica para a considerar melhor que as explicações alternativas da
metafísica, da astrologia da religião, da arte ou da poesia.»
Esta afirmação inacreditável foi retirada do livro Discurso sobre as Ciências, do
professor catedrático da Universidade de Coimbra Boaventura Sousa Santos, destacado
pós-moderno português.
Considerando que as crenças desta corrente de pensamento são como certos vírus que,
expostos ao ar e à luz, se inactivam, o físico António Manuel Baptista expõe-nas ao
pensamento crítico dos leitores, mostrando como elas assentam, na hipótese mais
generosa, numa profunda incompreensão do que é a ciência, infectando, numa
sociedade pouco instruída e nada crítica como a nossa, tudo o que é mais importante
para o país, desde a educação e a saúde até à política.

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