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FISIOTERAPIA NA MIELOMENINGOCELE

INTRODUÇÃO

As doenças que envolvem o tubo neural são responsáveis por um número


considerável de pacientes no consultório do fisioterapeuta pediátrico.
O tubo neural normalmente desenvolve-se a partir da placa neural e começa a
fundir-se aproximadamente no 27º dia de gestação e fecha-se no 28º dia
gestacional, de forma que somente as extremidades do tubo permanecem
abertas. O não fechamento adequado deste tubo é responsável pelo
aparecimento de defeitos congênitos da linha média denominados de
disrafismos. As malformações esperadas podem ser detectadas ainda intra-
uterinamente, através da ultra-sonografia e de achados de elevados níveis
séricos maternos de alfafetoproteína – AFP.
Dentre as principais malformações do tubo neural, pode-se citar a anencefalia
(ausência do cérebro, com defeitos associados no crânio, meninges e couro
cabeludo); iniencefalia (cabeça retrofletida com defeitos da coluna vertebral);
craniorraquisquise (necrose do cérebro e da medula secundariamente à
exposição ao líquido amniótico); cefalocele (protusão parcial do cérebro por
defeito do crânio); e espinha bífida. A espinha bífida é aquela que pode ser
considerada menos grave, enquanto as outras praticamente não apresentam
compatibilidade com a vida.
Espinha Bífida
1. Definição: Distúrbio do tubo neural (DTN), que gera malformação da medula
espinhal ou coluna vertebral, geralmente a nível torácico e lombar, por não
fechamento do tubo neural inferior.
2. Prevalência: a prevalência é de 1 em cada 400 nascimentos, sendo que em
um terço dos casos, a causa pode estar associada a fatores genéticos,
enquanto que em 50%, a causa é desconhecida.
3. Tipos:
Espinha Bífida Oculta:
É considerada a forma benigna. Caracteriza-se pelo não fechamento do arco
vertebral, sem que haja outro defeito associado, ou seja, não há envolvimento
da medula espinhal, portanto, não há paresias, plegias ou outros déficits
neurológicos. Normalmente está localizada a nível de L5-S1. O aspecto externo
pode ser normal, uma vez que a integridade da camada epidérmica se
mantém, ou apresentar-se com tufos de pêlos, depressão, lipoma subcutâneo,
nevo hemangiomatoso ou lesão circunscrita na pele.
Espinha Bífida Aberta ou Cística:
É a forma mais grave. Caracteriza-se pela perda da integridade da camada
epidérmica, de forma a deixar em contato com o meio externo estruturas do
sistema nervoso, como medula espinhal e meninges. Verifica-se a presença de
cisto na região dorsal, que pode romper-se durante o parto, deixando a medula
e/ou raízes nervosas que são cobertas pela pia-aracnóide, em contato com o
meio ambiente. Encontra-se subdividida em:
* Meningocele: Nesse caso, os arcos vertebrais não se fundiram como
esperado, e existe herniação das meninges, que forma uma saliência que
contém líquido cefalorraquidiano (LCR). O acometimento está restrito a pele,
ossos e dura-máter. Este é um fenômeno considerado raro;
* Mielomeningocele: Mais grave e mais comum do que a meningocele, a
mielomeningocele acomete pele, ossos, dura-máter, medula espinhal e raízes
nervosas, que podem se encontrar externa ao canal vertebral;
• Espondilosquise: a mais grave, já que o tecido nervoso (medula espinhal)
encontra-se exposto na superfície da lesão, como uma placa achatada.

Mielomeningocele

1. Conceito: esta é uma das formas de disrafismo espinhal, ocasionada por


uma falha de fusão dos arcos vertebrais posteriores e displasia (crescimento
anormal) da medula espinhal e das membranas que a envolvem. As meninges
vão formar um saco dorsal, o qual no seu interior contém líquido e tecido
nervoso, provocando uma deficiência neurológica (sensitiva e motora) abaixo
do nível da lesão, que podem gerar paralisias (principalmente flácidas) e
hipoestesias dos membros inferiores.
2. Incidência: graças à queda na incidência de patologias como a poliomielite
e a tuberculose osteoarticular, a mielomeningocele assume hoje o segundo
lugar, ficando atrás apenas da paralisia cerebral, como responsável por
deficiências crônicas do aparelho locomotor em crianças. A incidência varia
em média um indivíduo afetado para cada mil nascimentos, embora possa
haver uma variação de uma região para outra. Por exemplo, é muito mais
freqüente em países anglo-saxônicos, onde a incidência pode ultrapassar de
quatro indivíduos afetados para cada mil nascimentos, em determinadas
regiões.

Mais freqüente no sexo feminino, de cor branca, classes menos favorecidas,


primeiro nascimento e a partir do quinto filho.

3. Etiologia:
A maioria dos autores considera que a mielomeningocele tem etiologia
desconhecida. Porém, estudos mais recentes fazem uma associação entre a
patologia e alguns fatores. Dentre eles:
Fatores Genéticos:
Esta patologia é mais freqüente em indivíduos de raça branca, com menor
ocorrência nas raças negra e amarela. Outro fato importante é que casais que
já possuem uma criança portadora de mielomeningocele possuem um risco
maior de gerarem outra criança portadora dessa patologia;

Fatores Ambientais:
Indivíduos pertencentes a um mesmo grupo étnico que migraram para outro
continente, apresentaram em seus descendentes uma incidência diferente
dessa patologia, quando comparados ao local de origem;

Fatores Nutricionais:
Mulheres que receberam complementação vitamínica com ácido fólico,
apresentaram uma incidência muito menor de filhos portadores de
mielomeningocele.

4. Anatomia Patológica:
Medula e Raízes Nervosas: A medula espinhal pode se encontrar presa na
parte inferior do canal vertebral, fazendo com que as raízes nervosas passem
horizontalmente pelos buracos de conjugação, ao invés de se dirigirem para
baixo. Isto pode causar uma série de deficiências, dentre elas: hiperreflexia,
paresias musculares, diminuição de sensibilidade. Geralmente, as alterações
acontecem abaixo do nível do tumor formado pela mielomeningocele.
Vértebras: O defeito nas vértebras encontra-se nas lâminas e processos
espinhosos, de forma que eles não se fundem na região posterior da vértebra,
podendo, inclusive, estar ausentes.

Pele: A área da lesão não se encontra revestida por tecido cutâneo normal. No
entanto, a área de tumoração é rodeada lateralmente e na base por cútis
normal. A superfície pode apresentar ulceração ou tecido granuloso.

Cérebro: A maior manifestação a nível de cérebro (mais de 80% dos casos), se


dá sob a forma de hidrocefalia, que é resultado de uma estenose do aqueduto
de Sylvius ou bloqueio do fluxo cefalorraquidiano entre o quarto ventrículo e o
espaço subaracnóideo do cérebro, provocando dilatação dos ventrículos
cerebrais, com conseqüente aumento da cabeça.

5. Manifestações Clínicas:
Os sintomas da mielomeningocele dependem da localização e do grau de
extrusão da medula espinhal. As alterações neurológicas geralmente
manifestam-se através de alterações motoras, sensitivas, tróficas e
esfincterianas.
Levando-se em consideração que a mielomeningocele manifesta-se na grande
maioria dos casos a nível da região lombossacra (L5-S1), os sintomas mais
relatados na literatura são:
> Paralisia flácida;
> Diminuição da força muscular;
> Atrofia muscular;
> Diminuição ou abolição dos reflexos tendíneos;
> Diminuição ou abolição da sensibilidade exterioceptiva e proprioceptiva;
> Incontinência dos esfíncteres de reto e bexiga;
> Deformidades de origem paralíticas e congênitas e;
> Hidrocefalia (acomete 100% das crianças com mielomeningocele torácica;
90% das lombotorácicas; 78% das lombares; 60% das lombossacras e 50%
das sacrais).
Além desses sinais, podem ainda surgir outras manifestações secundárias a
mielomeningocele, como:
> Úlceras de decúbito, já que há perda de sensibilidade, má nutrição da
epiderme e o paciente passa muito tempo na mesma posição (acamado ou em
cadeira de rodas);
> Alterações vasomotoras graves;
> Osteoporose e com ela, fraturas;
> Atraso do desenvolvimento mental, físico e psíquico, devido a incapacidade
da criança de se locomover e explorar seu ambiente e relacionar-se com outras
crianças;
> Contraturas dos tecidos moles e;
> Deformidades ósseas, devidas a falta de oposição à ação dos músculos, da
gravidade e da postura.
Também podem ser constatadas uma série de outras anomalias congênitas
associadas, como:
> Luxações da coxo-femural;
> Pé eqüinovaro;
> Presença de hemivértebras;
> Lábio leporino;
> Fenda palatina;
> Malformações cardíacas e;
> Malformações das vias urinárias.

6. Prognóstico:
O prognóstico da mielomeningocele está ligado ao nível da lesão, isto é,
quanto mais alta for a lesão (nível da paralisia), pior será o prognóstico relativo
a morbidade e mortalidade. Ele pode tornar-se ainda pior se houver
hidrocefalia, deformidades da coluna ou ainda lesões adicionais somadas ao
quadro.

7. Diagnóstico:
Pode ser feito ainda intra-uterinamente pela ultra-sonografia ou pelo elevado
nível de alfafetoproteína (AFP), que é a proteína circulante no início da vida
fetal e encontra-se aumentada quando as membranas e superfícies vasculares
sangüíneas fetais estão expostas e o tubo neural aberto.

8. Exames Complementares:
Radiologia Simples:
Geralmente o raio X da coluna tem como finalidade a avaliação do grau de
escolioses e cifoses, além de detectar anomalias ósseas nos corpos das
vértebras e lâminas;
Tomografia Computadorizada (TC):
É muito utilizada para identificar as malformações anatômicas dessa patologia
e;
Ressonância Magnética (RM):
Também se mostra de grande valia para a verificação de anormalidades na
coluna vertebral e na medula espinhal, além de orientar o tratamento.
Ultrassonografia Morfológica: detecta a má formação.

9. Tratamento:
Muitos são os problemas decorrentes da mielomeningocele, os quais não
podem ser considerados isoladamente. Portanto, faz-se necessário a
integração de uma equipe multidisciplinar, composta por médicos, cirurgiões
ortopédicos e neurológicos, fisioterapeuta, psicólogo e assistente social. É
importante que os profissionais trabalhem de forma harmoniosa com a criança
e seus pais, que são de fundamental importância para o bom andamento do
tratamento.

9.1. Tratamento Cirúrgico:


No caso de mielomeningocele a cirurgia torna-se inevitável. É realizada para o
fechamento da lesão e normalmente solicitada até 48 horas após o
nascimento, já que acredita-se que isso possa reduzir ao mínimo o risco de
infecções e novas lesões medulares, as quais o paciente está suscetível.
Consiste em técnicas microcirúrgicas que buscam a reconstituição anatômica
da medula espinhal e a preservação da maior quantidade possível de tecido
nervoso funcionante. Após isso, as costas devem ser cobertas com uma
compressa úmida e estéril para que o saco formado pela dura-máter se
epitelize.
É importante que a hidrocefalia, se presente, seja tratada simultaneamente,
pois caso contrário, uma vez fechada a lesão, haverá aumento da pressão
intracraniana, podendo levar a um extravasamento de LCR e não cicatrização
da lesão. Normalmente ela é tratada com a implantação de um shunt
ventrículo-peritoneal, cujo objetivo é drenar o LCR do ventrículo lateral para o
peritônio, onde será reabsorvido.

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