Você está na página 1de 3

Nuno Craveiro Lopes

Director do Serviço de Ortopedia e Traumatologia


Hospital Garcia de Orta, Almada - Portugal
Comentários, sugestões e contactos podem ser dirigidos para: nuno.lopes@netvisao.pt

COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
O efeito da tunelização transfisária cervico-cefálica. Um modelo experimental de um
método preventivo para a doença de Legg-Calvé-Perthes.(1993)

Desenvolvemos um modelo experimental na anca do coelho White New Zealand, de


modo a estudar os efeitos hemodinâmicos da tunelização transfisária cervico-cefálica (TTCC) e
as suas consequências no crescimento da extremidade superior do fémur.

Guia e broca de vários diâmetros desenvolvidas para efectuar Esquema da TTCC


a TTCC no coelho.
Concluímos que a TTCC induz um marcado aumento da micro-vascularização da
epífise femoral superior, devida a passagem e anastomose de pequenos vasos sanguíneos entre
as redes metafisária e epifisária.
Observamos que para ser eficaz e produzir a passagem de vasos sanguíneos através da
cartilagem de crescimento cervico-cefálica, a perfuração necessita ser suficientemente grande
para criar uma ponte óssea, pois as perfurações de pequeno tamanho são encerradas
rapidamente pela cartilagem de crescimento. A perfuração de menos de 10% da área total da
cartilagem de crescimento, utilizando uma técnica atraumática, não interferiu com o
crescimento e desenvolvimento normal da extremidade superior do fémur.

Aspecto arteriográfico do aumento da micro-vascularização Anastomose entre as redes vasculares metafisárias e


na epífise femoral após TTCC à esquerda, comparando com epifisárias através da cartilagem de crescimento.
a anca controle à direita.

Corte oblíquo à cartilagem de crescimento. A) Cartilagem de crescimento. B) Ponte óssea.


E) Epífise. M) Metáfise. Vasos sanguíneos atravessando a cartilagem de crescimento (Setas).
Observámos que, a paragem ou abrandamento do crescimento provocado pela ponte
óssea, é uma questão de equilíbrio de forças. Se a força de crescimento da cartilagem de
crescimento restante, é maior do que a resistência mecânica da ponte óssea, não existe
paragem ou abrandamento do crescimento ósseo. Observámos no nosso modelo experimental
que, se a área perfurada é menor de 10% da área total da cartilagem de crescimento, não
existe alteração do crescimento ósseo. Se é maior de 20%, existe paragem de crescimento.
Entre esses valores, produz-se um abrandamento do crescimento.
Estes valores foram mais tarde confirmados em estudos sobre pontes ósseas pos-
traumáticas no fémur distal por Peterson.

Perfuração inferior a 10% da área da cartilagem de Perfuração superior a 20% da área da cartilagem de
crescimento na anca à esquerda. Anca controle à direita. crescimento na anca à esquerda. Anca controle à direita.
Não existe alteração de crescimento. Paragem de crescimento cervico-cefálica.

ILAÇÃO CLÍNICA: A tunelização transfisária cervico-cefálica do fémur (TTCC) pode


ter uma importância fundamental como método preventivo da doença de Legg-Calvé-Perthes
(DLCP), se for aplicada na fase de isquémias repetidas que precede a DLCP, fase que
denominamos "doença isquémica da anca em crescimento (DIAC). Pode também ter uma
utilização favorável na fase precoce de necrose da DLCP, devido a aumentar a micro-
vascularização e aporte sanguíneo á zona necrosada epifisária que forma um verdadeiro
sequestro, permitindo a sua mais rápida reabsorção e reconstrução.

Imagem de DIAC tipo III (esquerda) e tipo II (direita) na Mesmas imagens do mesmo caso na RMN em T1.
Gamagrafia com Tc 99m de uma criança de 6 anos de
idade.
Rx do mesmo caso de DIAC tipo III. Um mês após TTCC. O osso Rx 6 anos após TTCC. Não houve
Notar a porose epifisária que precede necrosado foi remodelado por um alterações do crescimento da
a fractura sub-condral. processo de ossificação primária e a extremidade proximal do fémur.
evolução para DLCP foi abortada.

Os resultados deste trabalho de investigação experimental, permitiram o desenvolvimento


de um meio de prevenção da DLCP, quando associado ao protocolo de despiste de DIAC.
O protocolo pode ser consultado em
http://www.geocities.com/craveiro01/pagedlcp/index1.htm
O modelo experimental em que se baseou o protocolo pode ser consultado em
http://www.geocities.com/craveiro01/dlcp01.htm

Actualmente já utilizámos a TTCC em mais de 200 casos de crianças com mais de 5 anos
de idade que apresentavam quadros de DIAC ou DLCP, metade dos quais já atingiram o fim
do crescimento, não apresentando em nenhum caso alterações do crescimento ósseo. Nenhum
dos 78 casos de DIAC submetidos a TTCC progrediu para DLCP e nos 44 casos de DLCP em
que foi empregue a TTCC precocemente, observámos o aparecimento da fase de fragmentação
avançada em metade do tempo usual ( média de 5 meses ), e apenas 41% dos casos assim
tratados necessitaram posteriormente ser submetidos a uma contenção cirúrgica.

Em cima: Evolução sem TTCC Em baixo: Evolução comTTCC

Você também pode gostar