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Resumo
(1)
Mestrando em Pedagogia do Movimento
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP-SP)
Abstract
The purpose of this study was to interrelate sports pedagogy and the complex thinking. The period of
sporting initiation was selected as the aim of it. On the one hand, there was a concern to defend the idea
that conventional pedagogy of sports in general, according to a simplistic point of view, summarises its
intervention in the rationality field. As a result, sensitive human dimensions such as affection, morality and
sociability are somehow considered inferior. This point of view leads to some pedagogical attitudes such as,
the choice of an ideal model of athlete to be followed, high esteeming of competition, precocious formation
of competitive teams and precocious refinement of technical and tactical skills. On the other hand, there was
a concern to present an aspect that opposes what traditional pedagogy assures, that sporting initiation is an
extremely complex human phenomenon. Therefore, some units which co-exist and interact with sporting
initiation and some likely evidence of complexity which result from these different units interrelation were
highlighted.
Considerações Iniciais
Suponho que um dos primeiros passos em direção a rejeitar o pensamento simplista que em geral
permeia a pedagogia do esporte tradicional está no reconhecimento da complexidade dos fenômenos. Neste
texto em particular, refiro-me à iniciação esportiva. Por um lado, julgo-a absolutamente complexa -
permeada de unidades, de relações entre essas unidades, de imprevistos, de incertezas, de casualidades e
de diferentes significados -, e, de outro lado, julgo sê-la, em grande parte, excessivamente simplificada pela
pedagogia do esporte.
Em linhas gerais, a pedagogia do esporte na infância sustenta uma prática pedagógica que se resume a
intervenções no campo da racionalidade. Quais seriam as possíveis atitudes dos professores de esporte que
ratificariam essa assertiva?
d) Investem na seleção de crianças que atendam às exigências de um modelo de atleta ideal e que
componham as equipes menores de competição;
A meu ver, essa maneira de pensar alimenta a crença de que o esporte obedece a um processo linear
de desenvolvimento, ou seja, que existe a priori uma gênese em que há um ponto de partida e outro de
chegada - o ideal de atleta pretendido. Por conseqüência, define as tarefas dos professores e das crianças
esportistas: para os primeiros basta que selecionem as segundas e implementem procedimentos
pedagógicos que dêem conta de capacitá-las nas diferentes etapas de treinamento. Às crianças basta que se
submetam às exigências preestabelecidas em cada etapa do treinamento.
Não se trata de excluir da iniciação esportiva as áreas de conhecimento que se encarregam de clarificar,
por exemplo, os estágios de desenvolvimento motor, os períodos indicados para se desenvolver as
diferentes capacidades, a melhor fase para aprender as habilidades motoras, as implicações maturacionais e
fisiológicas. Tampouco de excluir o surgimento de crianças talentosas ou de desconsiderar o fato de que as
equipes de base contêm possíveis crianças que chegarão ao esporte profissional. Trata-se de pontuar que
não dá para reduzir a ação do pedagogo esportivo apenas à consideração e consecução destes e de outros
fatores racionais. Há outras dimensões humanas - como a afetividade, a sociabilidade, a moralidade -, e
toda uma série de evidências resultantes da interação entre diferentes unidades complexas que precisam ser
tratadas pela pedagogia do esporte. Aliás, qual seria o papel da razão no entendimento humano? Para Morin
, é instrumental, tornando-se "[...] bárbara quando se quer como juízo supremo no tribunal do
entendimento humano".
Por conseguinte, ainda que muitos não percebam, o sistema humano - professores (as), técnicos (as),
pais e dirigentes -, cria estruturas onde à criança é reservada apenas a tarefa de alcançar o máximo de
rendimento esportivo, atendendo, na maior parte das vezes, coercitivamente, mais os interesses desse
próprio sistema e menos os da criança. Deduz-se que a participação da criança se transforma num produto
sujeito ao juízo de valor dos adultos . A mensagem subliminar (e, por vezes, explícita) que a pedagogia
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Wilton Carlos de Santana
tradicional propaga é a de que tem um ponto que todos podem chegar e aqueles que não atingirem o
resultado final são incompetentes. De certo modo, esse tipo de mensagem chega a ser inconseqüente e
demagógica. Inconseqüente, por conta de negligenciar as relações de força de um conjunto de unidades
complexas e de implicações resultantes das interações entre essas unidades que interferem
significativamente no processo de crescimento e desenvolvimento da criança no esporte; demagógica , pelo
fato de ocultar, em grande parte, as ambições e interesses escusos do sistema humano.
Isso posto, penso que o esporte na infância não se justifica como um elemento da cultura se resumir a
sua pedagogia ao cumprimento de etapas e premissas de um treinamento que se preocupa com quem joga
apenas com o objetivo exclusivo de uma preparação futura. Araújo tece comentários sobre a educação atual
que, a meu ver, se estendem à pedagogia do esporte tradicional "[...] encontra-se alicerçada em uma forma
simples de compreensão da realidade, pautada em princípios de disjunção, redução e abstração". Logo, é
uma pedagogia que deve ser rejeitada.
Complexidade
As idéias do pensador francês que inspiraram o pedagogo brasileiro me remetem à iniciação esportiva,
pois, ao contrário do que em geral apregoa a pedagogia tradicional, percebo o esporte na infância como um
fenômeno absolutamente complexo. O próprio Edgar Morin nos dá uma dica ao dizer que "[...] é complexo o
que não pode (...) reduzir-se a uma lei ou a uma idéia simples (p.8)". Simples, como por exemplo, as idéias
da pedagogia do esporte tradicional de seleção esportiva, da eleição de um modelo ideal de atleta, de
projetar nas crianças das categorias menores os atletas das seleções futuras, de tratar o esporte infantil
mercadologicamente. Outro ponto que Morin toca é o de "[...] que há complexidade onde quer que se
produza um emaranhamento de ações, de interações e retroações", a exemplo do que ocorre com o período
de iniciação esportiva que contempla os olhares de diferentes áreas de conhecimento e os valores distintos
de diversos segmentos da sociedade como professores (as), pais, técnicos (as), dirigentes esportivos,
diretores (as) escolares, profissionais da mídia.
Logo, penso que a criança que faz esporte ao longo de temporadas pode, entre outras coisas, atingir
níveis de performance que levem-na ao esporte profissional . O fato é que em geral há a crença de que
esporte é apenas para quem tem talento, ainda que estes sejam minoria. Por conta disso, quantas crianças
têm sido submetidas a um tipo de pedagogia que não respeita as diferenças, que elege os resultados em
curto prazo como objetivo e apenas a competição como referencial de avaliação do aprendizado? Quantas
crianças são coagidas a alcançar resultados que satisfaçam os desejos deste ou daquele professor, ou pais,
ou quem quer que seja? O que se esconde por detrás das chamadas "escolinhas" especializadas? A quem
interessa, por exemplo, a especialização precoce?
A pedagogia, neste caso, ignora o todo em detrimento das partes. Em outras palavras: ignora que a
criança que se interessa por esporte é a mesma que tem necessidade de brincar, de se divertir, de ser
aceita, de transpor limites, que imagina ser este ou aquele craque, que tem o desejo de jogar, que precisa
ser respeitada, aprender a conviver, a cooperar e a construir autonomia. Portanto, a criança que faz esporte
não é apenas o atleta em potencial que a pedagogia tradicional - alimentada pelos desejos unilaterais de um
pensamento simplista - se empenha em atender.
Por conseguinte, penso que uma pedagogia comprometida apenas em revelar talentos e formar
campeões tende a não se comprometer com os fenômenos humanos, entre eles, o de iniciação esportiva.
Esse sistema é dinâmico - está em movimento, - complexo -, na medida que contempla várias unidades
e uma quantidade imprevisível de interações entre essas unidades que, por sua vez, produzem uma série de
evidências de complexidade -, e sem hierarquia. Por exemplo, que evidências de complexidade resultariam
das interações entre professor (a), pedagogia do clube, pais e pedagogia da rua? Professor, diretor escolar,
competição e pedagogia da escola? Técnicos (as), pais e competição? Técnicos (as), pais, criança? Ciência e
pedagogia da rua? Dirigentes esportivos, mídia e ciência?
Penso que seria possível enumerar das interações entre essas unidades acima, se nos propuséssemos a
exercitar, uma quantidade generosa de evidências de complexidade. Prestei-me, ainda que de forma
generalizada, a esse exercício (figura 2). Recorri a Bosco para me auxiliar nessa tarefa. Elaborei a figura em
rede, de modo que desse a impressão de coisas entrelaçadas. Essa rede, a meu ver, merece os olhares dos
pedagogos esportivos na medida que sinaliza para a necessidade de ampliar a visão e o tratamento que se
dá à iniciação esportiva.
Considerações Finais
De minha parte, estou convicto de que o pensamento simplista que em geral a pedagogia do esporte
impõe à iniciação esportiva precisa ser substituído por outro que considere a complexidade. É reducionista
pensar que o pedagogo esportivo cumpre o seu papel quando ensina as habilidades técnicas e táticas,
propicia o desenvolvimento das capacidades motoras e orienta o competir. Competência técnica (saber
fazer) é dever do professor. A meu ver, atitudes recorrentes como as de selecionar crianças, revelar
talentos, ganhar competições - tão desejadas por grande parte dos professores -, não dão conta de uma
pedagogia que respeite a complexidade da iniciação esportiva e das pessoas. Para ratificar essa assertiva
basta considerar as evidências de complexidade em parte levantadas neste texto.
Logo, quais são os caminhos que a pedagogia do esporte terá de percorrer para dialogar com as
evidências de complexidade da iniciação esportiva? Penso, a exemplo de Freire , que não poderão ser os
conhecidos, pois não a levarão a lugares diferentes de onde se encontra. A pedagogia talvez precise, como
apregoa Morin, ser capaz de "[...] exercer um pensamento capaz de tratar o real, de dialogar e de negociar
com ele ". Esse é o desafio.
Referências Bibliográficas:
BENTO, Jorge Olímpio, GARCIA, Rui, GRAÇA, Amândio (1999). Contextos da Pedagogia do Desporto.
Lisboa: Livros Horizonte.
BENTO, Jorge Olímpio (1989)"A criança no treino e desporto de rendimento". In: Kinesis, Porto, v.5,
n.1, pp.9-35.
FREIRE, João Batista (2002). O Jogo: entre o riso e o choro. Campinas: Autores Associados.
MORIN, Edgar (2001). Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Instituto Piaget. (s/d).
MORIN, Edgar, LE MOIGNE, Jean-Louis (2000). Inteligência da Complexidade. São Paulo: Peirópolis.
PAES, Roberto Rodrigues (2000). "Esporte competitivo e espetáculo esportivo". In: MOREIRA, Wagner
W. SIMÕES, Regina (org). Fenômeno Esportivo e o Novo Milênio. Piracicaba: UNIMEP, pp. 33-9.
SANTANA, Wilton Carlos de (2001). Futsal: metodologia da participação. 2a.impressão. Londrina: Lido.