Você está na página 1de 2

Hart, na tentativa de fixar o conteúdo da moral, propõe características fundamentais, que

entende neutras o suficiente para serem aceitas pelas diversas correntes filosóficas como
critérios identificadores dos "princípios, regras e padrões de conduta que são mais comumente
considerados morais.

Alguns exemplos de semelhança indicados por Hart são: direito e moral vinculam os
indivíduos independentemente de seu consentimento; as obrigações e deveres morais e jurídicos
são sustentados pela pressão social; cumprir essas obrigações são uma contribuição mínima
para a vida social.

Essas semelhanças entre regras jurídicas e morais, que sustentam afirmações de uma
suposta identidade, é equivocada. Isso porque as semelhanças não podem ofuscar as
diferenças, pois é a presença destas que justificam a distinção entre Direito e moral.

Após analisar as semelhanças, Hart defende que, nas sociedades jurídicas existem
quatro características, relacionadas entre si, que são fundamentais para distinguir a moral das
demais regras sociais:

I) Importância: as regras morais se revestem de um sentimento de maior importância


do que as demais regras sociais. Ao contrário de uma regra jurídica, que mesmo tendo a
importância negada pela sociedade ostenta a mesma condição até ser revogada, a existência
das regras morais está atrelada à importância social que lhe é reconhecida.

II) Imunidade à alteração deliberada: as regras morais não podem ser diretamente
criadas, alteradas ou eliminadas por ato legislativo deliberado, ao contrário do que ocorre com
as regras jurídicas.

III) Caráter voluntário dos delitos morais: para que se configure a responsabilidade
moral de um indivíduo é condição necessária a voluntariedade. A prova da não-intencionalidade
afasta a reprovação moral. O mesmo não acontece para as regras jurídicas.

IV) Forma de pressão moral: ao contrário das regras jurídicas, que baseiam tipicamente
a pressão social para seu cumprimento na ameaça de castigo físico, a pressão pela observância
das regras morais fundamenta-se na conscientização de sua importância, partilhada pelos
membros da sociedade.

Na visão de Hart, estas quatro características, quando conjuntamente consideradas,


permitiriam identificar as regras morais dentre as demais regras sociais.

Hart defende uma conexão entre direito e moral, em que pese sua autonomia. A
constatação de que o desenvolvimento do direito tem sido profundamente influenciado pela
moral não permite concluir que o sistema jurídico deve se adequar necessariamente à moral ou
justiça, ou mesmo, que há uma obrigação moral de lhe obedecer. Os critérios de validade jurídica
de leis concretas de um sistema jurídico não necessariamente devem incluir uma referência à
moral ou justiça.

Após discorrer sobre a doutrina do Direito Natural, Hart conclui que parte considerável
do ponto de vista teleológico sobrevive em alguns dos modos pelos quais pensamos os seres
humanos, como por exemplo, ao identificarmos certas coisas como necessidades humanas boas
ou ruins. O que fundamenta este modo de pensar é a aceitação de que o fim do ser humano é
sua sobrevivência, sendo esta característica elemento central do Direito Natural.

Diante disso, pode-se concluir que existem regras de conduta que viabilizam para
qualquer organização social, sendo estas regras algo em comum do direito e da moral de
qualquer sociedade. Hart chama esses princípios de conduta reconhecidos universalmente, de
conteúdo mínimo do Direito Natural.

Assim, para entendermos esse mínimo de interação entre o direito e a moral, devemos
analisar as características salientes da natureza humana sobre as quais este mínimo se baseia:

I) Liberdade: todos os homens têm o igual direito de serem livres.

II) Vulnerabilidade humana: devido a fragilidade física humana, surge a necessidade


de regras protetivas. Dentre estas se destacam as que restringem o uso da violência para matar
ou causar ofensas corporais.

III) Igualdade aproximada: para que exista entre os homens exige um sistema de
abstenções mútuas e de compromissos, que está na base das obrigações jurídicas e morais.

V) Altruísmo limitado: como os seres humanos pretendem não só o bem, mas também
o mal ao próximo, torna-se necessário um sistema de abstenções recíprocas.

V) Recursos limitados: os recursos naturais necessários à sobrevivência humana têm


sua existência limitada. Esse fato, potencial gerador de conflitos, exige regras mínimas de
propriedade.

VI) Compreensão e força de vontade limitadas: a sanção não deve ser o motivo normal
de obediência, mas uma garantia de que aqueles que obedeceriam voluntariamente não serão
sacrificados pelos que não obedeceriam. Assim, o esperado e recomendável é o cumprimento
voluntário das regras, sendo prevista (e aplicada) sanção apenas em caso de descumprimento.

São estas verdades que motivam a existência de um núcleo jurídico e moral mínimo,
sem o qual as regras sociais confrontariam de tal modo com a natureza e objetivos humanos,
que seriam de quase impossível aceitação ou obediência.

De modo a exaurir o estudo acerca do que pretende ser a comprovação da conexão


entre o direito e a moral, Hart aponta seis outras formas pelas quais esta relação pode ser
demonstrada:

I) Poder e autoridade: para que ambos sustentem um sistema jurídico, deve haver uma
aceitação moral do povo.

II) Influência da moral sobre o direito: para uma regra valer, ela deve estar de acordo
com a moral. Isso comprova que Hart tem um posicionamento juspositivista inclusivo. Isso porque
inclui uma certa moral na Regra de Reconhecimento.

III) Interpretação: recorrendo ao conceito de "textura aberta do direito", Hart defende


que diante da necessidade de interpretação das leis, os juízes ponderam e aplicam valores
morais da sociedade.

IV) Crítica do direito: críticas morais não podem tirar a validade da regra, mas podem
fazer com que as regras mudem.

V) Princípios de legalidade e justiça: há na legalidade uma moral interna (isso reflete


várias características das regras).

VI) Validade jurídica e resistência ao direito: Hart defende um conceito de direito no


qual se incluem regras jurídicas contrárias à moral social.

Você também pode gostar