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2000
Dedico esta dissertação a
Newton Tambara
que não teve medo do meu medo
que confiou na minha luz
e foi parteiro do meu Ser...
2
AGRADECIMENTOS
À Jerold Bozarth...
3
RESUMO
4
ABSTRACT
5
INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 7
1) AS PESQUISAS SOBRE AS CONDIÇÕES NECESSÁRIAS E SUFICIENTES
PARA A MUDANÇA TERAPÊUTICA DA PERSONALIDADE:.............................. 10
2) UMA PREMISSA FUNDAMENTAL: A TENDÊNCIA ATUALIZANTE:........... 12
3) “ NENHUMA OUTRA CONDIÇÃO É NECESSÁRIA”:....................................... 13
4) EMPATIA .................................................................................................................. 15
4.1. REFLEXO DE SENTIMENTOS .................................................................................. 17
4.2. A EXPERIÊNCIA EMPÁTICA................................................................................... 24
4.2.1. A experiência empática e a aceitação incondicional do terapeuta são, em essência, a mesma
experiência: ........................................................................................................................................ 25
4.3. REFLEXO DE SENTIMENTOS SEM EXPERIÊNCIA EMPÁTICA ..................... 26
4.4. EXPERIÊNCIA EMPÁTICA SEM REFLEXO DE SENTIMENTOS ..................... 28
4.4.1. Experiência empática na busca por uma melhor qualidade de vida .......................................... 29
4.4.2. Experiência empática no silêncio do terapeuta ........................................................................ 31
4.5. COMPREENSÃO EMPÁTICA ................................................................................... 32
4.6. COMPREENSÃO EMPÁTICA SEM EXPERIÊNCIA EMPÁTICA ...................... 33
4.7. A NÃO-DIRETIVIDADE .............................................................................................. 34
4.8. EXPERIÊNCIA EMPÁTICA SEM COMPREENSÃO EMPÁTICA ...................... 38
4. 8.1. Experiência empática no silêncio do cliente ............................................................................ 40
4.8.2. As „falhas‟ na compreensão empática ..................................................................................... 42
4.8.3. Ludoterapia ......................................................................................................................... 44
5) CONSIDERAÇÃO POSITIVA INCONDICIONAL ................................................ 46
6) CONGRUÊNCIA .................................................................................................... 49
6.1. GENUINIDADE E TRANSPARÊNCIA ..................................................................... 50
6.2. CONGRUÊNCIA EM RELAÇÃO À EMPATIA E CONSIDERAÇÃO POSITIVA
INCONDICIONAL ............................................................................................................... 53
7) A ESSÊNCIA DA TERAPIA CENTRADA NO CLIENTE .................................... 55
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 59
ANEXO I ........................................................................................................................ 68
ANEXO II ...................................................................................................................... 69
6
INTRODUÇÃO
7
experiência do cliente como sendo parte do cliente”. E compreensão empática é “sentir
o mundo privado do cliente como se fosse o seu, mas sem perder a qualidade de „como
se‟” (Rogers, 1957, pp.97-99).
A hipótese de Rogers é de que essas condições são necessárias e suficientes para
promover o processo de mudança construtiva da personalidade. Apesar dessas
condições terem se tornado as atitudes fundamentais para o terapeuta centrada no cliente
(Rogers, 1959), a hipótese de Rogers postula que estas condições são essenciais para
todas as terapias e para todas as relações de ajuda que tenham a mudança terapêutica da
personalidade como objetivo.
1
“Neither Rogers‟ theory of therapeutic change nor the hypothesis of the necessary and sufficient
conditions are expressed in terms of behavior. (...) Any behavior that has the appearance of a therapeutic
attitude may or may not implement the attitude”.
8
atitudes facilitadoras, como podemos reconhecer, dentro desta ampla variabilidade de
expressões idiossincrásicas, quais os limites a que Bozarth se refere? Apesar de não
existirem comportamentos ou técnicas que estabeleçam a priori a presença das
condições básicas, como reconhecer e identificar estes limites que definem a relação
terapêutica como sendo “centrada no cliente”?
Esta investigação foi realizada a partir de uma perspectiva clinica. Minha própria
experiência clínica e relatos clínicos da literatura foram discutidos e analisados a partir
de considerações teóricas que, por sua vez, foram expandidas e clarificadas por estas
experiências. Em certa etapa desta investigação, decidi gravar uma de minha sessões
terapêuticas a fim de obter novos dados de pesquisa. A análise desta sessão foi
apresentada no 15º encontro anual da ADPCA1 (Association for the Development of the
Person-Centered Approach), num pequeno grupo de discussão que me ajudou no
aprimoramento de minhas conclusões. Posteriormente, algumas destas conclusões foram
apresentadas e discutidas na rede da Internet do Person-Centered International
proporcionando um significativo aprofundamento e clarificação da minha perspectiva2.
Participaram desta discussão Jerold Bozarth, Ph.D., Barbara Brodley, Ph.D, Godfrey
1
Realizado na Universidade da California, em San Diego, de 9 a 13 de agosto de 2000.
2
A Internet tornou-se um instrumento valioso para a minha investigação também por me proporcionar um
contato direto com muitos autores e pesquisadores que me enviaram, através de e-mail, seus trabalhos
teóricos mais recentes. Desta forma, algumas das citações apresentadas ao longo desta dissertação não
contém o número da página pelo fato de terem sido obtidas através deste meio eletrônico.
9
Barrett-Lennard, Ph.D., Marvin Frankel, Ph.D., e Lisbeth Sommerbeck. Ao longo de
toda esta investigação, Jerold Bozarth foi uma constante fonte de inspiração, tanto
através de seus artigos e discussões na rede do Person-Centered International, como
através de comunicações pessoais por e-mail.
10
compreensivos, congruentes, positivos e incondicionais em consideração a eles,
confirmando, portanto, as hipóteses de Rogers.
Truax & Mitchell (1971), numa revisão das pesquisas sobre as condições básicas
concluíram que:
Após a metade da década de 80, as hipóteses de Rogers foram investigadas por onze
estudos (sendo que três destes investigaram somente a empatia) e todos tiveram
resultados positivos (Sexton & Whiston, 1994).
Lambert, Shapiro e Bergin (1986), numa revisão de pesquisas sobre psicoterapia
concluíram que as qualidades atitudinais do terapeuta constituem uma porção
1
“Therapists and counselor who are accurately empathic, nonpossessively warm in attitude and genuine
are indeed effective. Also, these findings seem to hold with a wide variety of therapists and counselors,
regardless of their training or theoretic orientation, and with a wide variety of clients or patients,
including college underachievers, juvenile delinquents, hospitalized schizophrenics, college counselees,
mild or severe outpatient neurotics, and a mixed variety of hospitalized patients. Further, the evidence
11
significativa dos ingredientes eficazes da psicoterapia. Orlinsky e Howard (1986)
concluíram sua revisão de pesquisas sobre as condições atitudinais afirmando que de 50
a 80% dos estudos nesta área eram significativamente positivos, indicando que estas
dimensões estavam relacionadas de maneira muito consistente ao resultado positivo da
terapia. As hipóteses de Rogers foram apoiadas, de forma independente, por Duncan e
Moynihan (1994), que concluíram que a variável operacional mais importante para o
resultado bem-sucedido da terapia é a utilização intencional do marco de referência do
cliente. Esta conclusão ressoa com a concepção rogeriana da empatia (Bozarth et al.,
2000).
Stubbs & Bozarth (1994) concluíram em sua revisão de pesquisas sobre resultado
de psicoterapia que as únicas variáveis do relacionamento terapêutico consistentemente
relacionadas à eficácia são as condições de empatia, genuinidade e consideração
positiva incondicional.
suggests that these findings hold in a variety of therapeutic contexts and in both individual and group
psychotherapy or counseling”
1
“Practice, theory and research make it clear that the person-centered approach is built on a basic trust in
the person... (It) depends on the actualizing tendency present in every living organism‟s tendency to grow,
to develop, to realize its full potential. This way of being trusts the constructive directional flow of the
human being toward a more complex and complete development. It is this directional flow that we aim to
release”.
12
A teoria de Rogers da tendência atualizante é uma teoria organísmica onde as
qualidades fundamentais da natureza humana são as de crescimento, processo e
mudança. Rogers (1980) afirma que toda motivação e a fonte central de energia do
organismo está na tendência organísmica em direção à auto-atualização. O processo de
atualização é dirigido ao crescimento e inclui o movimento em direção à realização,
desenvolvimento e aperfeiçoamento das capacidades e potencialidades inerentes do
indivíduo (Rogers, 1963). A tendência atualizante, segundo Rogers (1980), não pode ser
destruída sem que se destrua também o organismo.
De acordo com Bozarth (1998), a posição básica da terapia centrada no cliente é de
que o terapeuta confia na tendência atualizante do cliente e acredita verdadeiramente
que o cliente que experiencia a liberdade de uma clima psicológico que promova a
liberação da sua tendência atualizante será capaz de resolver, de forma autônoma, seus
próprios problemas. O terapeuta confia na autoridade do cliente sobre si mesmo e se
relaciona com ele como um igual, respeitando as suas percepções. O terapeuta não
intervêm e não tem a intenção de interferir pois o papel do terapeuta é somente o de
criar um clima interpessoal que promova a liberação da tendência atualizante do cliente.
Para Bozarth, este é o aspecto mais revolucionário da teoria de Rogers.
Entre o final dos anos 70 e o início dos anos 80 surgiram diversas revisões de
pesquisas que tentaram provar que as condições formuladas por Rogers eram
necessárias mas não suficientes para a mudança terapêutica da personalidade (Stubbs &
Bozarth, 1994). Entretanto, Stubbs e Bozarth (1994) não encontraram nenhum estudo
que apoiasse diretamente a afirmação de que as condições de Rogers são insuficientes
em si mesmas. Segundo Patterson (1984), as conclusões destas revisões estão
completamente equivocadas devido à tendenciosidade e aos preconceitos destes
pesquisadores. Apesar da direção das evidências, as conclusões destas revisões não
reflete acurada ou adequamente o próprio parecer dos revisores em relação às pesquisas
analisadas:
13
Os revisores são mais do que cautelosos em suas conclusões
– eles são freqüentemente inconsistentes, ambivalentes e
incapazes de aceitar os resultados de suas próprias revisões
(Patterson, 1984).1
1
“The reviewers are more than cautious in their conclusions - they are often inconsistent, ambivalent, and
unable to accept the results of their own reviews”.
14
4) EMPATIA
Analisando esta definição apresentada por Rogers, percebemos que ela engloba ao
mesmo tempo três facetas distintas do modo de ser empático, que chamaremos de
„experiência empática‟, „compreensão empática‟ e „reflexo de sentimentos‟:
15
- passamos a ser um companheiro confiante dessa pessoa em seu mundo interior;
- deixar de lado, neste momento, nossos próprios pontos de vista e valores, para
entrar no mundo do outro sem preconceitos;
- num certo sentido, significa pôr de lado nosso próprio eu.
- transmitir a maneira como você sente o mundo dele à medida que examina sem viés
e sem medo os aspectos que a pessoa teme;
- freqüentemente, avaliar com ele a precisão do que sentimos e nos guiarmos pelas
respostas obtidas;
- sem tentar revelar sentimentos dos quais a pessoa não tem consciência, pois isto
poderia ser muito ameaçador;
- mostrando os possíveis significados presentes no fluxo de suas vivências.
Ao longo de todo o artigo, Rogers se refere indistintamente a estas três facetas como
sendo sinônimos de empatia, como sendo diferentes aspectos de um fenômeno único.
Sendo assim, na concepção de Rogers, estas facetas não existiriam independentemente.
A experiência empática, a compreensão empática e o reflexo de sentimento seriam
16
fenômenos interdependentes, isto é, a presença de um implicaria necessariamente na
presença dos outros.
1
“Empathic understanding response process".
17
expressa para o cliente através de „respostas de compreensão empática‟ 1. Brodley
define as respostas de compreensão empática como sendo:
1
“Empathic understanding responses”.
2
“Empathic understanding responses (EURs) refer to a broad category of responses all of which are an
attempt to accurately articulate the experience the client has expressed or has been striving to express.
EURs range from very literal restatements or summaries of what the client has expressed, to more
fragmental responses, to forms of response which involves more inference or guessing about what the
client has been expressing. But in all instances of EURs, they represent the therapist‟s attempt to
articulate the client‟s point of view and are an attempt at an empathic following of the client. They are not
18
tentando dizer a partir de sua própria perspectiva [do cliente]. O terapeuta se
apropria da perspectiva do cliente até sentir que o entende em certa medida (ou
que não tem este sentimento de compreensão e reconhece este fato);
(3) A seguir, o terapeuta pode ou não fazer uma resposta explícita que comunique
sua compreensão interna (ou que reconheça a falta de compreensão) do cliente.
Se o terapeuta não faz uma resposta verbal-oral explícita, ele pode fazer um
movimento afirmativo com a cabeça, um gesto vocal tal como “Uhm-hm”, ou
simplesmente permanecer atento e silencioso de uma maneira que implica uma
compreensão do cliente.
(4) Finalmente, neste “ciclo empático”1, em resposta à presença, à atenção, ou às
respostas explícitas do terapeuta, o cliente pode ter o sentimento de ser
compreendido ou aceito. Estas experiências tendem a estimular o cliente a
avançar na sua auto-reflexão e expressão (Brodley, 1998).
Segundo Bozarth (1997), qualquer que seja o meio de expressão ou forma das
respostas empáticas, elas são do tipo “seguir-tão-perto-quanto-possível”2 o cliente
enquanto ele narra e expressa a si mesmo. Ademais, todas as respostas empáticas são
inerentemente “tentativas”, implicando a pergunta do terapeuta para o cliente: “Isto está
correto?”3.
(1) Na primeira fase uma pessoa (A) está atendendo ativamente com uma atitude
empática à outra pessoa (B) que de alguma maneira está expressando seu
próprio experienciar. Esta postura empática inclui uma abertura ativa para
conhecer a outra pessoa em seu próprio interior, no experienciar imediato do seu
mundo e engajamento do eu4. Esta é uma pré-condição para empatia, e o
começo da escuta empática. Cedo ou tarde, à medida em que este processo
continua, A ressoa experiencialmente com B num imediato reconhecimento da
based on an attempt to interpret the client or get ahead of the client‟s awareness of his or her
experiences”.
1
termo formulado por Barrett-Lennard (1981)
2
“as-close-as-possible-following”.
3
“Is this accurate?”
4
“active openness to knowing the other person in their own inside, immediate experiencing of their world
and engagement of self”
19
experiência e significado sentido que foi compartilhado por B. A principal
característica da experiência de B, algumas vezes toda a sua qualidade e
substância tal como foi expressa e subentendida1, está agora também viva e em
movimento na consciência de A. Este processo interno e esta qualidade de
compreensão experiencial é a primeira essencial fase da empatia. Nesta Fase 1 o
reconhecimento e compreensão interna não é ainda conhecida por B.
(3) A expressão de uma resposta empática real (de A) potencia a etapa culminante
de consciência (de B) de ser empaticamente compreendido. Esta crucial terceira
fase é a de empatia recebida ou apreendida. A consciência de ser literalmente
escutado e profundamente compreendido, em alguma esfera pessoal vital, tem
seu impacto direto próprio, seja de alívio, de algo finalmente fazendo sentido,
um sentimento de uma conexão interna e de estar menos sozinho, e uma maior
abertura para compartilhar sua expressão ou exploração.
1
“implied”
20
parteira habilidosa assistindo a um nascimento literal (Barrett-
Lennard, 1993)1.
1
“Hearing from another the essence of our personal feeling and meaning which we have been struggling
to articulate and express, which perhaps is like a chameleon that keeps changing and disappearing as we
pursue it, and which may evoke sickening anxiety in us, to hear in this context a listener who is devoting
his/her whole attention to what we are going through speak back to us that which we ourselves are
strenuously and barely grasping can have the impact of a skilful midwife assisting in a literal birth”.
2
“client-centered therapist‟s acceptant empathic attitude”
3
“Reflection of feelings communicates to the client that whatever his feelings and behavior are or have
been, no matter how troubling or frightening or socially disapproved of, he is still accepted as a worthy
human being by the therapist”.
21
Somente se as respostas de compreensão empática (ou
qualquer outro tipo de resposta utilizada no contexto da terapia
centrada no cliente) forem utilizadas como expressão das atitudes
genuínas do terapeuta de congruência, aceitação e compreensão
empática, elas são uma expressão da terapia centrada no cliente
(Brodley, 1986).1
1
“Only if empathic understanding responses (or any other types of response used in the context of client-
centered therapy) are used as expression of the therapist‟s genuine attitudes of congruence, acceptance
and empathic understanding are they an expression of client-centered therapy”.
2
restatement
3
active listening
22
enfatizava a atitude em vez do repertório de respostas (Bozarth,
1998, p.54).1
1
“It was not until Rogers became concerned about the misunderstandings of „reflection‟ and use of
reflection techniques that he talked about the client‟s frame of reference and, then, began to use the term,
„empathy‟. Empathy provided Rogers with a more comprehensive meaning that emphasized attitude
rather than a response repertoire”
2
“It is my view that this quality of restatement is a powerful modality when it does reflect the other's
genuine empathic resonation. Put another way, reflections can be an excellent channel for the flow of
empathy, which is the active ingredient”.
23
4.2. A EXPERIÊNCIA EMPÁTICA
1
cf. item (4).
2
“... the person-to-person blending of the therapist enmeshed in the world of the client with empathic
reactions and „total‟ attunement to the other”.
24
cultura, se adaptando a outra cultura e se acomodando à cultura...
não tanto em termos de conversação mas de apenas estar.1
1
“ [empathic experience is] the therapist walking in the world of the client... being in the world of the
client and so responding/ reacting in ways that are blending with that world without or by minimally
violating it....sort of like an anthropologist living in another culture, adapting to the other culture and
accommodating to the culture... not in terms of conversation so much as just being”.
2
O conceito de consideração positiva incondicional será discutido no item 5, onde sua relação com a
experiência empática será mais uma vez investigada
3
A possibilidade da compreensão empática e do reflexo de sentimentos apresentarem uma qualidade
avaliativa e diagnóstica será discutida nos próximos tópicos.
4
Bozarth se refere à empatia “rogeriana” em contraposição a outros conceitos de empatia, principalmente
à concepção de Kohut, que não subentendem a dimensão da „experiência empática‟.
5
“Rogerian empathy is primarily the purest way to communicate unconditional positive regard. Rogerian
empathy is, in fact, inseparable from unconditional positive regard and, ultimately, I suggest that they are
the same condition”.
25
4.3. REFLEXO DE SENTIMENTOS SEM EXPERIÊNCIA EMPÁTICA
Mas existem situações nas quais o cliente não tem a intenção de se conhecer ou de
empreender uma exploração do eu. Por exemplo, quando o auto-conhecimento implica
em reconhecer sentimentos ou significados que são experienciados pelo cliente como
extremamente ameaçadores. Segundo Prouty (1999), experienciar estes sentimentos
diretamente pode ser desintegrador para o eu. Somente uma lenta entrega ao processo de
experienciação e integração natural do cliente seria um caminho seguro. Nestes casos, o
1
“[the therapists] are trying to empathically understand the client in accord with the client's intentions to
be understood at that moment”.
2
“It seems that the therapist's intention with the empathic understanding responses is not solely to
"check" the accuracy of the therapist's understanding but there is also an intention to "offer" such
understanding to the client. As if the therapist were saying: "Is that what you are looking for?”... So, the
therapist is being empathic with the client's need for self-understanding.”
26
reflexo de sentimentos expressaria uma total falta de empatia do terapeuta em relação
ao cliente.
Indivíduos extremamente deprimidos ou cuja noção de eu está extremamente
debilitada também podem não estar dispostos a empreender uma exploração do eu. Esta
foi uma das conclusões do projeto de pesquisa de Wiscosin, empreendido por Rogers,
Gendlin, Truax e Kiesler, no início da década de 60, com o objetivo de examinar os
resultados terapêuticos das atitudes facilitadoras em indivíduos diagnosticados como
„esquizofrênicos‟ e cronicamente hospitalizados (Rogers et. al., 1976). Foi encontrada
uma diferença de „foco‟, na psicoterapia, entre os clientes denominados „neuróticos‟ e
os denominados „esquizofrênicos‟. O foco central dos clientes „neuróticos‟, segundo
Rogers, seria a exploração do eu ao passo que o foco dos clientes „esquizofrênicos‟ seria
a formação de um relacionamento:
1
“Our therapists were sometimes baffled by the lack of self-exploration among our schizophrenic clients,
since they had come to think of self-exploration as characteristics of most psychotherapy. The
schizophrenic individual seems to be seeking a relationship he can trust, and it is the therapist‟s potential
as a trustworthy, caring person which appears crucial to him. Hence, in terms of our measures, his
perception of the congruence and positive regard of the therapist are central. Only later does empathic
understanding become more important, and perceptible to a higher degree”.
27
questão para eles não é primariamente a de liberdade, mas a de
segurança. Não é primariamente a de se sentir compreendido,
mas a de se sentir cuidado. Eu sinto isto como o choro de uma
criança: você não reflete empaticamente, você demonstra
compreensão empática trocando suas fraldas (Sommerbeck,
2000)1
Bozarth (1997) afirma que empatia não é reflexo de sentimentos. Empatia, segundo
o autor, é um processo em que o terapeuta entra no mundo do cliente como se fosse o
cliente. O reflexo é somente uma das maneiras de se entrar no mundo do cliente, ou uma
técnica que pode ajudar neste processo. O que é facilitador para o cliente não é o
reflexo em si, mas o „caminhar no mundo do cliente‟. Outras formas de respostas
empáticas, verbais ou não-verbais, que tentam representar o quadro de referência
interno do cliente na interação imediata também são possíveis. Bozarth, portanto, sugere
que outros „modos‟ de empatia também sejam observados e analisados.
1
“They do not feel understood and they do not experience unconditional positive regard by the therapist's
exclusive adherence to empathic reflection. When "tracking" them with empathic reflections, they may
rather feel persecuted, intruded upon, overwhelmed, oppressed, and coerced. The issue for them is not
primarily one of freedom, it is one of safety. Not primarily one of feeling understood, but one of feeling
cared for. To me it feels like the crying of the infant: you don't empathically reflect, you demonstrate
empathic understanding by changing his diapers”.
28
4.4.1. Experiência empática na busca por uma melhor qualidade de vida
Bozarth (1999) apresenta alguns relatos de sua experiência clínica com indivíduos
internados num hospital psiquiátrico público no final da década de 50. Este relatos
demonstram que o compromisso do terapeuta com o quadro de referência do cliente
não envolve necessariamente o repertório usual de respostas de compreensão empática.
O terapeuta, Bozarth, fora contratado pelo hospital como um Psychiatric Rehabilitation
Counselor, com a função de ajudar os pacientes, internados há muitos anos no hospital,
a realizar um treinamento profissionalizante, conseguir um emprego e sair do hospital.
Bozarth era recém-formado e esta era a sua primeira experiência profissional. Diz
Bozarth (1999):
1
“Knowing little about what to do, I depended upon the individuals with whom I worked. I listened,
cared for and trusted them”.
2
“there was seldom focus on depth of self exploration or experiencing or any other particular process. (...)
There was no systematic way that I dealt with individuals; they dictated the means, the mode and
directions of contact”.
3
Ver no Anexo I o texto original em inglês.
29
Howard havia sido hospitalizado vinte anos antes de eu conhecê-lo, diagnosticado
como Esquizofrênico, tipo Paranóide. Ele apunhalara vários indivíduos anteriormente
à sua admissão. (...) Ele ouviu falar de mim através de outro residente e pediu ao seu
médico para encaminhá-lo a mim. Nós conversamos duas vezes a respeito de seus
pensamentos de sair do hospital. Ele decidiu que isto não era a coisa para ele fazer, era
ameaçador demais! Eu principalmente o escutei, e falei a ele sobre algumas das
possibilidades educacionais e de treinamento com as quais eu poderia ajudá-lo se ele
decidisse desenvolver planos fora do hospital. Aproximadamente um ano depois, ele
retornou para retomar aonde tinha deixado. Ele me perguntou sobre a possibilidade
da “Escola de Barbeiros”. Nós conversamos semanalmente durante vários meses com
ele assumindo o comando. Ele falava sobre sua filha, seus relacionamentos no hospital
e coisas que a maioria de nós falaria em conversas normais. Sua consistência na
procura de treinamento resultou em ele ser aceito num financiamento para ingressar
nessa escola. Havia um período de espera antes de ir para a escola e ele decidiu
procurar emprego na comunidade. Embora houvesse o peso de uma recessão na
comunidade industrial, eu apoiei seu desejo de procurar emprego. Nós conversávamos
antes e depois de viagens para a cidade. A maioria da equipe estava bastante céptica
dele encontrar emprego quando indivíduos “normais” não conseguiam encontrar nem
mesmo trabalho de turno parcial. Uma semana depois, Howard tinha três ofertas de
trabalho. Ele aceitou um trabalho para depilar indivíduos antes de irem para cirurgia.
Mais tarde, ele foi para a escola e trabalhou como barbeiro até sua aposentadoria. Eu
sempre pensei que estes seriam empregos interessantes para ele já que ele foi
originalmente admitido no hospital por um ato de violência com uma faca que resultou
em ferimentos em algumas pessoas (Bozarth, 1999).
Eleanor foi encaminhada a mim por um atendente da enfermaria. Ela tinha sido
diagnosticada vinte e um anos atrás como Esquizofrênica, tipo Indiferenciado. Ela
estava numa enfermaria fechada do hospital. O atendente disse que ela tinha
expressado um interesse em sair da enfermaria e ele se perguntava se eu poderia ajudá-
la de alguma maneira. Quando eu cheguei, Eleanor estava sentada no chão brincando
com suas fezes. Eu não tinha idéia do que fazer ou dizer. Eu me apresentei e disse a ela
um pouquinho sobre o meu papel no hospital. Ela não foi responsiva exceto por um
arrebatado sorriso de dentes pretos enquanto continuava a brincar com suas fezes. Eu
continuei sem saber o que dizer ou fazer. De vez em quando eu fazia uma pergunta ou
dizia alguma coisa. Eu tentava experienciá-la da melhor maneira que eu podia me
perguntando o que eu poderia fazer para estar mais certo do meu contato com ela. Em
desespero, eu finalmente deixei escapar alguma coisa como: “Você acha que você
poderia gostar de ir para uma escola de beleza?” Talvez eu tivesse lembrado de sua
criatividade e destreza manual enquanto brincava com suas fezes.
Surpreendentemente, ela descartou sua atividade com as fezes e sentou-se na cadeira
ao meu lado. Eu lhe falei que poderia voltar na próxima semana para checar com ela
de novo. Pouco tempo depois, ela começou a parar com alguns de seus
comportamentos bizarros. Ela se asseou durante os meses seguintes e mudou para uma
enfermaria aberta. Ela finalmente trabalhou um pouco no comissariado do hospital. Eu
não creio que ela tenha alguma vez saído do hospital mas a qualidade de sua vida
melhorou significativamente (Bozarth, 1999).
30
4.4.2. Experiência empática no silêncio do terapeuta
Teresa iniciou a psicoterapia afirmando que o seu problema era que o seu marido
bebia. Ela se sentia extremamente deprimida, tensa e ansiosa. Ela utilizava os
cinqüenta minutos da sessão para se queixar do marido e para relatar, em minuciosos
detalhes, os fatos acontecidos na sua vida ao longo da semana anterior. Havia
momentos em que ela entrava em contato com seus sentimentos de desespero, mágoa e
raiva, como também havia momentos em que ela simplesmente descrevia fatos e
diálogos, com extremo preciosismo. Teresa falava de forma ininterrupta, não me
deixando „espaço‟ para dizer nada. Quando eu falava algo na sessão, era no máximo
duas frases que pareciam sequer não serem ouvidas por ela. Ela continuava a seu
fluxo verbal como se eu não tivesse lhe dito nada. Percebi, assim, que ela queria
„apenas‟ ser escutada, ou, talvez, se escutar. Percebi que não havia necessidade de eu
me expressar verbalmente para expressar a minha empatia e aceitação incondicional.
Confesso que eu mesma me surpreendi com o seu progresso ao longo do processo
terapêutico. Dois meses após o primeiro atendimento, Teresa mudou radicalmente sua
atitude em relação a si mesma, ao marido e à própria vida. Reconheceu que o seu
problema não era o seu marido porque era ela que devia ir atrás da sua felicidade.
Ela passou a se valorizar, a „cuidar‟ de si mesma e a sofrer menos com as atitudes do
marido. Sua qualidade de vida mudou significativamente. E a única coisa que eu „fiz‟
para ajudá-la foi permanecer em silêncio.
31
Este parece ser um exemplo de experiência empática no silêncio do terapeuta.
1
cf. item (4)
32
4.6. COMPREENSÃO EMPÁTICA SEM EXPERIÊNCIA EMPÁTICA
É possível o terapeuta obter uma compreensão dos significados vividos pelo cliente
sem ter uma experiência empática do cliente na relação?
A cliente começou a sessão dizendo que não tinha nada para falar. Então, eu
utilizei a técnica de reflexo de sentimentos e após alguns minutos ela disse que não
sabia quem ela era realmente. Ela não expressou nenhuma emoção ao dizer isto,
parecia, naquele instante, ser uma “casca” morta sem vida interior. A seguir, ela
começou a falar sobre todas as coisas que ela “tinha que ser”. Ela disse que tinha que
ser forte, organizada, responsável, competente, ativa, esperta, etc... Mas eu não
consegui aceitar que ela se impusesse tantas “condições de valor” para si mesma e
quis “convencê-la” que ela deveria se libertar destas auto-imposições. No entanto, eu
não tentei convencê-la através de afirmações diretas, mas fiz isto sutilmente, através
da técnica de reflexo de sentimentos, dizendo-lhe: “Parece que tem sido muito pesado
para você ter que carregar todos esses „tenho que‟...”. Esta afirmação expressou uma
compreensão empática acurada do seu mundo. Ela estava realmente se sentindo
sobrecarregada e cansada por tantas auto-exigências; ela concordou com minha
percepção/compreensão, mas de alguma maneira ela se sentiu ameaçada por esta
percepção. Então recuou e se fechou ainda mais na sua “casca morta”. E eu me senti
irritada e frustrada porque ela continuou defendendo o seu ponto-de-vista de que ela
tinha que ser isto e aquilo... Neste momento eu percebi que não estava experienciando
consideração positiva incondicional e empatia em relação a ela apesar de eu ter obtido
uma compreensão empática do seu mundo e ter feito um acurado reflexo de sentimento.
Eu teria tido uma experiência empática se tivesse percebido/aceito que ela não queria
olhar para o seu ser real naquele exato momento.
33
Após o término da sessão, eu fiquei me perguntando porquê eu não tinha conseguido
experienciar empatia e consideração positiva incondicional pela cliente, apesar de ter
alcançado uma compreensão do significado vivido de sua experiência. A resposta,
então, surgiu rápida e claramente à minha mente. Eu não consegui aceitar e ser
empática com a experiência da cliente de se impor rígidas condições de valor porque as
minhas expectativas em relação ao seu processo terapêutico eram que ela se tornasse
uma pessoa aberta à experiência e que conseguisse experienciar auto-consideração
positiva incondicional. Estas expectativas me levaram a assumir uma posição de expert
na relação, tentando guiá-la e conduzi-la na direção de uma maior abertura ao seu fluxo
experiencial. A minha necessidade de me mostrar “competente” profissionalmente, de
fazer com que o seu processo terapêutico fosse „bem-sucedido‟, não me permitiu aceitar
a sua experiência e respeitar a sua direção e o seu ritmo. Eu tentei conduzi-la em
direção a um maior contato com o seu fluxo experiencial, por ser este o meu “objetivo”
para o seu processo terapêutico e a minha expectativa em relação a um processo
terapêutico bem-sucedido. Percebi, portanto, que ter este objetivo impediu-me de estar
aberta a receber o seu mundo de forma incondicional.
Desta forma, minha experiência nesta sessão sugeriu-me uma investigação a
respeito dos objetivos na relação terapêutica centrada no cliente, o que acabou por me
conduzir à discussão da não-diretividade no contexto da teoria de Rogers.
4.7. A NÃO-DIRETIVIDADE
34
terapeuta liberta a operação desta tendência no cliente (Patterson,
2000, p128 e p. 183)1.
1
“It is the nature of the organism, a characteristic of the actualizing tendency, to grow, to develop, to
strive to actualize its potentials, to become what it is capable of becoming – to be more self-actualizing.
(...) The three conditions offered by the therapist frees the operation of this drive in the client”
2
“surrender to client self-direction”
35
Brodley (1998) afirma que o terapeuta centrado no cliente “por princípio, e no seu
íntimo, não tem a intenção de produzir efeitos no cliente”1 (p.26). Brodley (2000)
também observa que as respostas de compreensão empática do terapeuta centrado no
cliente, têm como efeito, muitas vezes, com alguns clientes, de promover uma maior
relação da sua expressão comunicativa com seus sentimentos e reações internas. Mas
ela salienta que esta não é a intenção imediata do terapeuta centrado no cliente:
Rogers (in Baldwin, 1987) é bastante explícito ao afirmar que o seu único objetivo
como terapeuta diz respeito a ele mesmo, ao seu jeito de estar3 na relação com o cliente.
Para Rogers, o único objetivo apropriado para o terapeuta é o de estar realmente
presente com o cliente naquele momento4. Para Bozarth (1999) isto se justifica
teoricamente na medida em que o fundamento da teoria da terapia centrada no cliente é
a existência de um processo construtivo natural em cada indivíduo. Este processo
natural é promovido quando o indivíduo percebe a experiência de consideração positiva
incondicional em relação a ele. O objetivo de Rogers era estar de uma certa maneira na
relação com o cliente porque ele confiava que este jeito de estar promoveria a liberação
da tendência de crescimento do indivíduo. Bozarth, portanto, conclui:
1
“in principle and in the heart, not intending to produce effects on or in the client when doing therapy”
2
“We make empathic understanding type responses primarily to seek verification or modification of our
inner empathic understandings of the client's immediate internal frame of reference. We are not intending
to promote more experientially focused activity in the client”.
3
way of being
4
“Am I really with this person in this moment?” (p.48)
5
“There are no goals of the person-centered therapist for the client. The only goal of the therapist is to be
a certain way. There is not a goal of experiencing, or of depth of self-exploration or of self-actualization.
There is no particular process or behaviors or direction that any particular person is expected to follow”.
36
Quando o terapeuta tem objetivos para o cliente, ele se coloca numa posição de
autoridade na relação terapêutica. Ao invés de confiar no processo de auto-atualização,
na direção e auto-determinação do cliente, o terapeuta passa a confiar na suas técnicas e
expertise. Esta falta de confiança impossibilita o terapeuta de experienciar uma
aceitação incondicional do quadro de referência do cliente. Bozarth (1998), ao
considerar a dificuldade que alguns terapeutas enfrentam em implementar a atitude de
consideração positiva incondicional (cf. Lieater, 1984), conclui que esta dificuldade
surge quando o terapeuta assume um papel de expert clínico que pretende influenciar o
cliente a ser de uma certa maneira. A confiança no quadro de referência do cliente e na
tendência atualizante é “contaminada” pela dedicação do terapeuta a influenciar o
cliente numa pré-determinada direção:
1
“There is a subtle but critical difference between the view that there is a natural process within the client
that the therapist fosters and the view that the therapist must urge this process. No wonder the therapist
begin to have difficulties with their capacity to hold „unconditionality‟... Their trust in the client‟s self-
determination and self-authority is diminished”.
37
experiência empática, como vimos na definição de Rogers1, significa deixar de lado
nossos próprios pontos de vista e valores, para entrar no mundo do outro sem
preconceitos; significa pôr de lado nosso próprio eu. Esta é uma experiência de entrega
e de aceitação do outro que só é possível na relação terapeuta/cliente se houver uma
confiança do terapeuta na auto-direção e auto-determinação do cliente. É portanto, uma
experiência sem objetivos do terapeuta para o cliente, ou seja, é uma experiência
inerentemente não-diretiva.
A compreensão empática e o reflexo de sentimentos, portanto, se forem utilizados
como meios para a obtenção dos objetivos do terapeuta para o cliente, então estarão
dissociados da experiência empática propriamente dita.
1
“For those who believe the critical foundation of client-centered theory, i. e., that the client is his or her
own best expert about his or her life, non-directivity is a natural stance that emerges from the theory”.
38
empatia, consideração positiva incondicional e congruência (Rogers, 1987), Rogers
afirma que, nos grandes grupos “não existe sequer esperança de compreender o que está
acontecendo...”2 e que “através da entrega de si mesmo ao processo, certas coisas
acontecem”3 (in Baldwin, 1987, p.50). Ou seja, a experiência empática vivida nos
grandes grupos não dá origem a nenhuma forma de „compreensão‟ empática. Podemos
afirmar que a implementação ou manifestação da experiência empática nos grandes
grupos centrados na pessoa se dá através da „entrega‟ ao processo e não através da
compreensão empática ou das respostas de compreensão empática.
1
cf. item (4)
2
“there is not even hope of understanding what is going on...”
3
“by surrendering yourself to the process, certain things happen”.
4
“like an anthropologist living in another culture, adapting to the other culture and accommodating to the
culture... not in terms of conversation so much as just being”
39
mas ao mesmo tempo eu estava experienciando seus mundos
perceptuais de outra maneira... (Bozarth, 2000)1
[Jill] não disse nada quando chegou. Eu digo isto literalmente. Ela bateu na
porta, eu fui abri-la e a cumprimentei agradavelmente. A meu convite, ela se sentou, e
olhamos uma para a outra. Eu esperei ela dizer alguma coisa, se explicar, se queixar,
ou fazer perguntas. Eu olhei para ela tentando ser tão agradável e aceitadora quanto
eu podia. Seus olhos se encheram de lágrimas e as lágrimas rolaram por suas faces,
mas ela não disse nada. Eu me perguntei o que eu deveria fazer. A coisa mais simples e
mais natural poderia ter sido dizer: “O que está lhe aborrecendo?” Mas há que ser
lembrar que eu tinha sido treinada precisamente a não fazer perguntas ou dar
conselhos, e então, me sentindo bastante tola, eu simplesmente me mantive olhando
para a garota. Durante meia hora, nada aconteceu. Eu então lhe disse: “Está na hora
de terminar nossa sessão. Você gostaria de me ver novamente?” Um tanto para minha
surpresa e alívio, ela concordou com um movimento de cabeça, e quando eu sugeri
outro encontro na mesma hora na próxima semana, ela novamente concordou com a
cabeça e saiu sem ter dito uma única palavra.
1
“I was only interested in their world... what it was like for them from their perspective... I could not be
clear on my experience of their worlds most of the time and when I did I did not understand... I could not
relate it to experiences of my own....being abducted by flying saucers... but on the other hand they did talk
about things I understood...they wanted to get out of the hospital, work...could talk about the frustrations
in the hospital... I could respond to this with empathic understanding so then I would use empathic
understanding responses to some extent but at the same time I was experiencing their perceptual world in
another way...”
2
high school
3
Ver no Anexo II o texto original em inglês.
40
A sessão seguinte foi uma repetição da primeira. Nós nos olhamos, ela chorou
silenciosamente, eu esperei, e então ela uma vez mais aceitou meu convite para outra
sessão sem nenhuma palavra ser dita. Para não fatigar o leitor, nós tivemos mais duas
sessões e todas elas foram duplicatas exatas das duas primeiras, apesar de que diversas
vezes eu pensei que a estudante estivesse a ponto de falar. Ao final da quarta sessão,
quando eu lhe perguntei novamente se ela queria ter outra sessão, ela sacudiu sua
cabeça [significando „não‟], e saiu caminhando. Na última semana do semestre, eu
recebi outra solicitação de Jill e a vi imediatamente. Sua declaração foi um incidente
crucial para mim. “Eu quero lhe agradecer muitíssimo pelo que você fez por mim, Mrs.
- ” “Mas eu não fiz nada!” eu impulsivamente protestei. “Eu queria tanto ajudá-la,
mas eu não fiz nada a não ser olhar para você.”
“Você fez muitíssimo. Você mudou toda a minha personalidade. Porque você
teve a generosidade e o amor para me esperar para falar, para apenas estar ali e não
me fazer perguntas ou tentar me fazer falar, porque você esteve disponível para
apenas estar ali e não ser crítica, e não se queixar que eu estava desperdiçando seu
tempo, foi a coisa melhor e a mais maravilhosa. Enquanto nós estávamos olhando
uma para a outra, eu estava pensando como o silêncio é maravilhoso, como era bom
para você me compreender e fazer eu me sentir boa e importante; você foi amorosa e
confortadora. Eu simplesmente não consegui falar e se eu tivesse teriam sido
banalidades. Porque você me valorizou tanto, porque você estava simplesmente
disponível para estar comigo, eu me dei conta que meus pensamentos loucos de que
ninguém me amava ou se importava comigo estavam todos errados. Você me amou e
cuidou de mim, você foi paciente, bondosa, compreensiva e calorosa, você não
colocava nenhuma pressão em mim ou tentava me fazer falar ou me manipular. Eu me
senti tão confortável com você e o relacionamento foi tão real. Não, você fez muitíssimo
por mim e, como resultado, eu decidi que eu tinha valor, que eu era uma pessoa boa,
que eu era alguém para ser respeitada, que eu era capaz de resolver os meus
problemas que eu tinha dolorosamente exagerado”
Depois dessa longa declaração, nós conversamos um pouco e ela realmente
pareceu ter se transformado da garota que ela me disse que tinha sido antes da terapia
para a garota que ela era agora. Ela insistiu que as quatro sessões comigo tinham
representado um ponto de mutação na sua vida.
Patterson (in Calia & Corsini, 1973) comenta que, apesar do desconforto da
terapeuta na primeira sessão, ela comunicou à cliente seu interesse, atenção e respeito
simplesmente por estar ali, lhe oferecendo o seu „tempo‟. Apesar da terapeuta não ter
compreendido o significado da sua experiência e ter se sentido inicialmente insegura
em relação à validade da sua atitude de permanecer em silêncio, podemos considerar
que esta foi uma experiência empática, na medida em que a terapeuta aceitou a
necessidade da cliente de ficar em silêncio e esteve presente com ela, acompanhando-a
em seu silêncio.
41
O cliente solicita ao terapeuta uma sessão extra. É a primeira vez que ele faz esta
solicitação. Ele entra no consultório, se senta e fica 50 minutos em silêncio. Ele chora,
ri, se mexe na poltrona, mas não verbaliza nada. Ao final dos 50 minutos, o terapeuta
lhe diz que o tempo da sessão terminou. O cliente, então, diz: “Só para te acalmar, foi a
melhor coisa que eu fiz na minha vida, pedir esse horário, é a primeira vez que eu
consigo pedir algo, eu estou cansado de falar, falar, e quero me escutar, me ouvir
mais...” (Tambara & Freire, 1999, p.168)
A fim de obter novos dados para esta investigação da relação entre compreensão
empática e experiência empática, analisei a gravação de uma de minhas sessões
terapêuticas1. Esta análise revelou que ao longo de quase toda a sessão eu utilizei a
técnica do reflexo de sentimentos. Eu tive 129 falas no total da sessão, sendo que 13
delas ficaram inaudíveis na gravação. Das minhas 116 falas analisadas, apenas 9 não
eram reflexos de sentimentos, pois eram inferências feitas a partir do meu quadro de
referência. Deste total de 107 respostas-reflexo, 15 foram respostas não acuradas.
Um exemplo de reflexo de sentimento „não acurado‟:
1
ver Anexo III
42
Terapeuta: Não sei se o seu medo é de que: será que ela vai
mudar agora, depois de tanto tempo?
1
ameaçador para o seu auto-conceito
43
incondicional1... isto freqüentemente leva à re-estruturação do
eu... possivelmente sempre mas este desenvolvimento ocorre por
causa da auto-consideração positiva incondicional que é
desenvolvida a partir do recebimento da consideração positiva
incondicional... (Bozarth, 2000c)2.
4.8.3. Ludoterapia
1
o papel da auto-consideração positiva incondicional na teoria da terapia centrada no cliente será
discutida no item (5).
2
“I think that there is confusion that progress is dependent upon the client‟s clarification/re-organization
of self... not that this doesn‟t happen but that it is not the cognitive or emotional clarification and
understanding that is curative in the theory... it is the development of unconditional positive self regard....
this often leads to there-structuring of self... possibly always but this development is because of the upsr
that is developed from receiving upr...”
44
atentivamente e respeitosamente estar com a criança nós já
estaremos em certa medida estando com e aceitando os
sentimentos da criança (Moon, 2000)1.
Durante quatro sessões consecutivas, Rodrigo me pediu para jogar bola com ele.
Começamos a jogar sentados no chão, lançando uma pequena bola de plástico de um
para o outro. Rodrigo logo começou a contar „pontos‟. Quando um de nós não
conseguia pegar a bola, o outro marcava um ponto. Rodrigo começou jogando a bola
na minha direção, mas depois de algum tempo passou a jogar a bola com força e em
direções que era impossível para mim pegá-la. À medida em que jogávamos, Rodrigo ia
modificando as regras do jogo. Ele decidia quais eram as regras e quando elas valiam
ou deixavam de valer. Por exemplo, se a bola batia na cadeira, não era ponto, ou
então ele jogava três bolas ao mesmo tempo e se eu não pegasse todas eu não fazia
nenhum ponto. Do chão, passamos a jogar em pé. Primeiro, só „valia‟ usar a mão,
depois só „valia‟ usar o pé, depois „valia‟ qualquer coisa. Todas as regras eram
decididas por Rodrigo e aceitas incondicionalmente por mim. A contagem dos pontos
era feita por Rodrigo e ele sempre modificava as regras em seu próprio benefício.
Rodrigo, manipulando as regras, conseguia ficar muitos pontos de vantagem à minha
frente. Quando a diferença entre nossos pontos ficava muito grande, ele dizia que me ia
me dar uma „chance‟ e me dava muitos pontos de presente a fim de que nossa diferença
ficasse pequena. Todas as decisões de Rodrigo eram aceitas por mim sem questionar.
Eu aceitava ser „roubada‟ por ele, sem reclamar, como também aceitava os seus
pontos „de presente‟. Durante as sessões eu não tentava „compreender‟ o significado
do seu jogo ou os sentimentos que ele estava expressando através da brincadeira. Meu
único propósito era estar com ele, aceitando-o incondicionalmente. Para estar com ele
desta maneira, eu precisava deixar de lado o meu próprio quadro de referência, ou
como diria Rogers, pôr de lado o meu próprio eu, com todas as minhas expectativas,
necessidades e valores. Eu odeio jogar bola. No entanto, deixei de lado o meu eu, que
não gosta de jogar bola, e ofereci a minha presença para jogar bola com ele. Eu não
concordo que as regras de um jogo possam ser modificadas arbitrariamente mas eu
deixei de lado a minha posição pessoal para estar incondicionalmente com ele,
aceitando a sua decisão de alterar as regras do jogo. Eu gostaria que Rodrigo tivesse
ficado sentado, bem quietinho, simbolizando seus conflitos emocionais com os bonecos
da família de pano, mas eu deixei de lado as minhas expectativas e necessidades e o
aceitei da maneira como ele queria estar e se relacionar comigo. Após estas sessões, fui
informada de que o comportamento de Rodrigo na família e na escola se modificou
significativamente. De uma criança tímida e insegura ele se tornou uma criança
extrovertida e auto-afirmativa.
1
“This is a form of empathy a therapist and client might experience together as their relationship
develops in the absence of our more routinely expected therapeutic dialog of client statement followed by
an empathic understanding response by the therapist. It seems to me that children embody their feelings
and that if we can attentively and respectfully be with the child we are to some extent already being with
and accepting the child's feelings”.
45
Este relato clínico de ludoterapia sugere mais uma vez a independência da
experiência empática em relação à compreensão empática. Parafraseando Rogers, pode-
se afirmar que eu penetrei no mundo do Rodrigo; eu vivi temporariamente sua vida,
sem julgar; eu passei a ser um companheiro confiante do Rodrigo em seu mundo,
deixando de lado, neste momento, meus próprios pontos de vista e valores para entrar
no mundo dele sem preconceitos. Isto é, a minha experiência na relação com Rodrigo
foi uma experiência empática. Entretanto, esta experiência não me proporcionou uma
compreensão empática do seu mundo, pois os significados desta experiência para o
Rodrigo não foram compreendidos por mim. Desta forma, o processo terapêutico de
Rodrigo ilustra a posição de Bozarth (1998) de que o mais importante para a mudança
terapêutica não é o cliente se sentir „compreendido‟, mas se sentir plenamente aceito
naquilo ele está sendo no momento:
1
“If the individual can be affirmed in being who he or she is at the moment, then that is good enough”.
2
The need for positive regard: a contribution to client-centered theory
46
Esta incongruência surge, inicialmente, na formação do auto-conceito, quando certas
experiências organísmicas não são simbolizadas ou integradas no auto-conceito devido
às condições de valor impostas por pessoas significativas na vida do indivíduo. A
consideração positiva „condicional‟ ou „seletiva‟ é, portanto, o fator crucial na causa do
desajustamento psicológico. Desta forma, a „restauração da aceitação‟ é o fator crucial
no reajustamento psicológico (Standal, 1954). Na relação terapêutica, a vivência da
consideração positiva incondicional do terapeuta em relação ao cliente possibilita a
experiência de auto-consideração positiva incondicional pelo cliente. Esta experiência
possibilita a integração das experiências organísmicas anteriormente negadas ou
distorcidas no seu auto-conceito. Rogers (1951) descreve esse processo da seguinte
maneira:
47
Patterson & Hidore (1997) descrevem a consideração positiva incondicional como
um tipo de cuidado não-possessivo. O cliente é considerado como uma pessoa de valor
exatamente pelo que ele é, simplesmente por ser. Não há condições para a aceitação. O
cliente não precisa mudar ou ser diferente para ser aceito pelo terapeuta. O cliente pode
ter seus próprios sentimentos e experiências e dar a estes sentimentos e experiências o
seu próprio significado.
Num artigo publicado recentemente, (Freire, 2000), eu assinalo que para o terapeuta
conseguir aceitar incondicionalmente o quadro de referência do cliente, ele tem que,
necessariamente, abandonar o seu próprio quadro de referência (com todas as suas
condições de valor)1. O terapeuta tem que tirar do caminho do cliente os seus próprios
valores, expectativas, preconceitos e tudo o mais que compõe o seu quadro de
referência. Isto significa tirar o seu „eu‟ do caminho do cliente. Rogers (1951) descreveu
o terapeuta como um alter ego acolhedor do cliente, como “um eu que se despiu
temporariamente (tanto quanto possível) de sua própria vestimenta de eu” (Rogers,
1992, p.51). Neste meu artigo (Freire, 2000) eu assinalo, entretanto, que quando o
terapeuta retira o seu eu do caminho do cliente, ele pode se transformar simplesmente
numa „casca morta‟ ou numa „marionete sem vida‟. Mas a consideração positiva
incondicional significa, na definição de Rogers, a experiência de uma aceitação
calorosa de cada aspecto da experiência do cliente. O que torna esta aceitação calorosa,
não fria, é que ela é ativa. De outro modo, seria apenas indiferença. A aceitação é
calorosa e ativa porque o terapeuta, ao retirar o seu eu do caminho do cliente, oferece o
seu ser, oferece a sua presença para estar com o cliente no mundo do cliente:
1
Pode-se objetar que a confiança na tendência atualizante é uma crença que pertence ao quadro de
referência do terapeuta e que, portanto, o terapeuta não abandona totalmente o seu quadro de referência
na relação com o cliente. Esta constatação, entretanto, não altera o sentido fundamental de „entrega‟ do
terapeuta ao „ser‟ do cliente. Neste caso, é uma „entrega confiante‟.
2
“Offering our being makes the difference between warm acceptance and just indifference. That is the
therapist‟s willingness to enter into the client‟s world, or the therapist‟s willingness to be with the client
in whatever way the client wishes her to be”.
48
Esta disponibilidade do terapeuta para entrar no mundo do cliente e para estar com
ele é a mesma disponibilidade que caracteriza a experiência empática (cf. item 3). Aqui
retomamos a conclusão de Bozarth (1998) de que a consideração positiva incondicional
e a experiência empática são, em última instância, a mesma experiência.
6) CONGRUÊNCIA
49
terapeuta. Desta forma Brodley (id.) conclui que, na terapia, a congruência não precisa
ser comunicada, apesar de ser uma das condições necessárias para a mudança
terapêutica. O estado de congruência se refere a uma condição subjetiva do terapeuta:
Congruência é um estado integrado no qual [o indivíduo] se sente total e transparente1.
(Brodley, 1998c).
1
“Congruence is an integrated state in which one feels whole and transparent”.
2
“The inner side refers to the degree to which the therapist has conscious access to, or is receptive to, all
aspects of his flow of experiencing. This side of the process will be called „congruence‟; the consistency
to which it refers is the unity of total experience and awareness. The outer side, on the other hand, refers
to the explicit communication by the therapist of his conscious perceptions, attitudes and feelings. This
aspect is called „transparency‟: becoming transparent to the client through communication of personal
impressions and experiences.”
50
Haugh (id.) considera que esta sutil mudança de significado proposta por Lietaer
(1993) é “perigosa” pois o terapeuta pode ser encorajado a fazer afirmações a partir do
seu quadro de referência com a intenção de ser experienciado pelo cliente como
transparente ou autêntico. Para Brodley (1998b), esta perspectiva identifica
erroneamente congruência com franqueza e conduz a distorções não apenas na terapia
centrada no cliente como também em situações de grupos centrados na pessoa. Na
terapia centrada no cliente, a distorção se apresenta quando o terapeuta
sistematicamente declara suas próprias reações ou pensamentos em relação ao cliente e
justifica esta prática como sendo uma forma de vivenciar a atitude terapêutica de
congruência. Nos grupos, a distorção aparece quando interpretações, acusações e
insultos são justificados como sendo uma forma de comunicação “congruente”.
Brodley (1998c) salienta que a honestidade pode existir num contexto de incongruência:
Patterson & Hidore (1997) consideram que o terapeuta é genuíno na relação com o
cliente quando ele é verdadeiro, real, e não uma fachada. Ser genuíno significa estar
envolvido no relacionamento e não ser um simples espelho ou tela em branco:
1
“A person may be incongruent – not accurately symbolizing in awareness some aspect of his experience,
but is being honest – that is, speaking an accurate representation of his inner symbolizations. Honest but
not congruent”.
2
“The sessions are real encounters. Therapists are freely and deeply themselves, without facades, not
phony. They are not feeling and thinking one thing and saying something different”.
51
quer que seja expresso seja real e genuíno e não incongruente no contexto do ambiente
terapêutico. Wyatt (2000) observa que, sob o pretexto da genuinidade, o terapeuta pode
facilmente projetar suas incongruências no cliente e sutilmente controlar o processo
terapêutico a fim de satisfazer suas próprias necessidades ou até, em casos extremos, se
tornar abusivo.
Carkhuff e Berenson (1967) sugerem que o conceito de genuinidade deva ser
diferenciado do conceito de genuinidade facilitadora:
1
“genuineness must not be confused, as is so often done, with free license for the therapist to do what he
will in therapy, especially to express hostility. Therapy is not for the therapist”.
52
autores, portanto, sugerem que o termo genuinidade seja abandonado e que ao invés
dele seja utilizado um termo negativo que inclua a noção de defensividade e „fachada‟.
Brodley (1998b) conclui que toda a comunicação do terapeuta deve ser moldada
pela presença da aceitação, compreensão empática e da atitude não-diretiva. Estas
atitudes influenciam a forma da resposta do terapeuta que procura se comunicar
congruentemente. O terapeuta deve se expressar de uma maneira que também transmita
consideração incondicional e compreensão empática.
Rogers (in Rogers & Wood, 1978) ao “especular” sobre a ordem de importância da
três atitudes do terapeuta (consideração positiva incondicional, congruência e empatia)
considerou que a congruência é a “mais básica” de todas:
Em 1984, Rogers reafirma que a “genuinidade parece ser a mais básica: as outras
duas são importantes, mas provavelmente menos”1 (Rogers & Sanford, 1984, p.1378).
Bozarth (1998), entretanto, assinala que a natureza da congruência é diferente da
natureza das outras duas condições básicas. A congruência é primariamente um estado
do terapeuta. O terapeuta „está‟ congruente. Ela é, portanto, uma característica
contextual do terapeuta. A compreensão empática e a consideração positiva
incondicional são condições para serem experienciadas pelo terapeuta em relação ao
cliente e, de acordo com a teoria de Rogers (Rogers, 1957, 1959) somente estas tem que
ser percebidas pelo cliente.
1
“genuineness appears to be the most basic: the other two are important but probably less so”.
53
Para Lietaer (1984), as atitudes de congruência e consideração positiva
incondicional estão tão intimamente relacionadas que podem ser consideradas como
partes de uma atitude mais básica de “abertura”. Abertura em relação a si mesmo
(congruência) e abertura em relação ao outro (consideração positiva incondicional):
Bozarth (2000d) considera que a congruência não está separada mas integralmente
relacionada às condições de consideração positiva incondicional e compreensão
empática do quadro de referência do cliente. Existe um loop2 entre genuinidade e
empatia, de maneira que estas são, funcionalmente e em última instância, uma única
condição. A capacidade do terapeuta de estar consciente de sua própria experiência
(genuinidade) lhe permite estar mais consciente da experiência do cliente. À medida em
que o terapeuta está mais consciente da experiência do cliente, ele também se torna
mais consciente da sua própria experiência no relacionamento. Assim, a congruência é
uma forma de preparação do terapeuta para ser maximamente receptivo. Isto é, a
congruência é um desenvolvimento atitudinal que habilita o terapeuta a ser mais capaz
de experienciar compreensão empática e consideração positiva incondicional em relação
ao cliente. Estas considerações de Bozarth clarificam a posição de Rogers (id.) de que a
genuinidade do terapeuta é mais importante das condições, na medida em que é a
genuinidade que propicia ao terapeuta a capacidade de experienciar empatia e
consideração positiva incondicional em relação ao cliente.
Por fim, Bozarth (2000d) conclui que é a auto-consideração positiva incondicional
do terapeuta que dá origem a este loop entre as três condições:
1
“The more I accept myself and am able to be present in a comfortable way with everything that bubbles
up in me, without fear or defense, the more I can be receptive to everything that lives in my client”.
2
Expressão de difícil tradução para o português. Literalmente significa laço. Neste contexto, significa
um circuito completo, que se retro-alimenta.
54
a compreensão empática do quadro de referência do cliente
(Bozarth, 2000d)1.
1
“The relationship among the conditions results in a “conditions loop” that is begotten by the
unconditional positive self-regard of the therapist. It is the unconditional positive self-regard that fosters
congruency, unconditional positive regard and empathic understanding of the client‟s frame of reference”.
55
- Consideramos que a não-diretividade é uma conseqüência inevitável da
experiência de empatia/consideração positiva incondicional.
- Consideramos que a congruência é uma forma de preparação do terapeuta para a
vivência da empatia/consideração positiva incondicional.
1
“I am inclined to think that in my writing perhaps I have stressed too much the three basic conditions.
Perhaps it is something around the edges of those conditions that is really the most important element of
therapy – when myself is very clearly, obviously present”.
56
qualitativa com seis notáveis terapeutas centrados na pessoa, concluíram que estes
terapeutas, ao reconhecerem a autoridade do cliente sobre sua própria vida, entraram no
mundo do cliente de forma a „desaparecer‟ no interior do seu processo de crescimento.
Desta forma, podemos concluir que o terapeuta centrado no cliente, ao implementar as
atitudes facilitadoras na relação terapêutica, retira o seu „eu‟ do caminho do cliente,
com todas os seus valores e expectativas e oferece a sua presença, o seu „ser‟, para
entrar no mundo do cliente. A implementação das atitudes facilitadoras que caracteriza
a essência da terapia centrada no cliente, portanto, pode ser definida como sendo:
1
“the therapist‟s dedication to going with the client's direction, at the client's pace, and in accordance
with the client's unique way of being”.
57
THE VALIDITY OF THE MOMENT
Jerold D. Bozarth
58
REFERÊNCIAS
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67
ANEXO I
Original em inglês dos casos Howard e Eleanor1
Howard had been hospitalized twenty years before I saw him, diagnosed as,
Schizophrenic, Paranoid type. He had stabbed several individuals prior to his
admittance. He had a grounds pass at the hospital and worked at a paper route in the
hospital. He heard about me from other residents and asked his doctor to refer him to
me. We talked twice about his thoughts of getting out of the hospital. He decided that
this was not the thing for him to do, too threatening! I mostly listened, told him about
some of the training and educational possibilities that I could help him with if he did
decide to develop out hospital plans. Nearly a year later, he returned to pick up where he
left off. He inquired about the possibility of “Barbers School”. We talked weekly for
several months with him taking the lead. He talked about his daughter, his relationships
at the hospital and things most of us might talk about in normal conversations. His
consistency with seeking training resulted in him being accepted for funding to attend
such a school. There was a wait period before going to school and he decided to seek
employment in the community. Although, it was the height of a recession in an
industrial community, I supported his wish to seek employment. We talked before and
after trips to the city. Most of the staff were quite skeptical about him finding
employment when “normal” individuals could not find even part time work. One week
later, Howard had three job offers. He accepted one job as a “prep” person shaving
individuals before they went to surgery. Later, he went to the school and worked as a
barber until his retirement. I always thought that these were interesting jobs for him
since he was originally admitted to the hospital for a rampage with a knife that resulted
in injuries to a number of people (Bozarth, 1999).
Eleanor was referred to me by a ward attendant. She had been diagnosed twenty one
years before as, Schizophrenic, Undifferentiated Type. She was on a locked ward in the
hospital. The attendant said that she had expressed an interest in getting out of the ward,
and he wondered if I could help her in any way. When I arrived, Eleanor was sitting on
the floor playing with her feces. I had no idea what to do or say. I introduced myself and
told her a little bit about my role in the hospital. She was not responsive except for a
wild black toothed smile as she continued to play with her feces. I stayed not knowing
what to say or do. Now and then I asked a question or made a statement of some kind. I
tried to experience her as best as I could wondering what I could do to be more sure of
my contact with her. In desperation, I finally blurted out something like, "Do you think
that you might like to go to beauty school?” Maybe I was reminded of her creativity and
manual dexterity as she played with her feces. Amazingly, she discarded her activity
with the feces and sat in the chair next to me. I told her I would come back next week to
check with her again. A short time later, she began to discontinue some of her bizarre
behavior. She cleaned herself up over the next months and moved to an open ward. She
eventually worked some in the hospital commissary. I do not think that she ever got out
of the hospital but the quality of her life increased significantly (Bozarth, 1999).
1
Bozarth, J.D. (1999) Forty years of dialogue with the Rogerian hypothesis. Trabalho apresentado no 14º
Encontro Anual da Association for the Development of The Person-Centered Approach, Ruston,
Louisiana
68
ANEXO II
Original em inglês do caso Jill1
[Jill] said nothing when she came in. I mean this literally. She knocked on the door,
and I went to open it, and greeted he pleasantly. At my invitation she sat down, and we
looked at each other. I waited for her to say something, to explain, complain, or ask
questions. I looked at her trying to be as pleasant and as accepting as I could. Her eyes
filled with tears and the tears rolled down her face, but she said nothing. I wondered
what I should do. The simplest and most natural thing might have been to say, "What is
bothering you?" But it must be remembered that I had been trained precisely not to ask
questions or to give advice, and so, feeling quite foolish, I just kept looking at the girl.
For half an hour, nothing happened. I then said to her, "It is time to end our session.
Would you like to see me again?" Somewhat to my surprise and relief, she nodded, and
when I suggested another appointment at the same time next week, she nodded again,
and went out without having said a single word.
The following session was a repeat of the first one. We looked at each other, she
cried silently, I waited, and then she once again accepted my invitation for another
session without a word being said. Not to weary the reader, we had two more sessions
and they were all exact duplicates of the first two, though several times I thought that
the student was about to talk. At the end of the fourth session, when I again asked if she
wanted to have another session, she shook her head, and walked out. During the last
week of the semester I got another request from Jill, and I saw her immediately. Her
statement was a critical incident for me. "I want to thank you very much for what you
did for me, Mrs.-" "But I did nothing!" I impulsively cried out. "I wanted to so much
help you, but I just did nothing but look at you."
"You did a great deal. You changed my whole personality. That you had the
kindness and love to wait for me to talk, to just be there, and not to ask me questions, or
try to make me talk, that you were willing to just be there, and not be critical, and not
complain that I was wasting your time was the best and most wonderful thing. While we
were looking at each other I was thinking how wonderful the silence was, how good it
was for you to understand me, and make me feel good and important; you were loving
and comforting. I just couldn't talk, and if I had it would have been banalities. Because
you valued me so much, that you just were willing to be with me, I realized that my
crazy thoughts that no one loved me or cared for me, were all wrong. You loved me and
you cared for me and you were patient and kind and understanding and warm, and you
couldn't put any pressure on me or try to get me to talk or to manipulate me. I felt so
comfortable with you, and the relationship was so real. No. you did a great deal for me,
and as a result I decided I was worthwhile and I was a good person and I was one to be
respected, and I was able to solve my problems which I had sorely exaggerated."
After this long statement, we talked a bit and indeed she seemed to have really
changed from the girl she told me she had been prior to the counseling to the girl she
was now. She insisted that the four sessions with me had represented a turning point in
her life (apud Calia & Corsini, 1973).
1
Calia, V. & Corsini, R. (1973) Critical Incidents in School Counseling. Englewood Cliffs, NJ: Prentice
Hall.
69
70