GOVERNANÇA
CORPORATIVA
B813 Braga, Gilberto
Governança Corporativa / Gilberto Braga. Revisado e atualizado
por Carla Pereira Siebler Branco – 3. ed. rev. atual. e ampl. - Rio de
Janeiro: Grupo Ibmec Educacional, 2018.
CDD 332.6
SUMÁRIO
CAPÍTULO 3 LEIS 54
Unidade 4 Agronegócio 90
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS DA DISCIPLINA
■■ saber o que é a Lei Sarbanes-Oxley, criada nos EUA, e conhecer mudanças na legislação
brasileira à luz dos acontecimentos do início do século XXI em nosso país;
Caro(a) aluno(a),
Você inicia agora uma jornada por um dos mais importantes temas da vida empresarial
contemporânea: a governança corporativa. Trata-se de um conjunto de práticas de gestão
e conceitos empresariais que se constitui em uma nova cultura corporativa e cresce mais
a cada dia. O aprendizado da governança corporativa é uma demanda de um cenário glo-
balizado e a sua prática é adotada por grandes corporações que, mesmo não estando dire-
tamente obrigadas a respeitá-la, mantêm relacionamento comercial com empresas que já
adotam essa prática.
O bom aproveitamento da disciplina requer que você seja um agente ativo nas discussões
e participe das atividades, trazendo a sua experiência e os temas da sua realidade para
o debate coletivo. Lembre-se de aproveitar ao máximo os recursos oferecidos no mate-
rial didático da disciplina e as interações que terá com seu professor online. Discuta com
seus colegas os conceitos tratados em cada módulo e tente conectá-los à sua realidade. Seu
engajamento é essencial para o seu sucesso nesta jornada.
Bons estudos!
Equipe Ibmec online
DIRETRIZES PEDAGÓGICAS
■■ organize o seu tempo e escolha os melhores dias e horários para você estudar;
Não deixe de participar das discussões encadeadas no ambiente virtual de cada capítulo.
Elas são indispensáveis para um melhor aproveitamento do curso.
Bons estudos!
8 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Capítulo 1
GOVERNANÇA CORPORATIVA:
CONCEITOS E EVOLUÇÃO
HISTÓRICA
CAPÍTULO 1 9
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS DO CAPÍTULO
Para melhor compreensão das questões que envolvem a governança corporativa, este
capítulo está dividido em:
UNIDADE 1
CONCEITOS E DEFINIÇÕES DE GOVERNANÇA CORPORATIVA
Nos últimos anos, a governança corporativa entrou na moda, tornando-se um assunto que
afeta as práticas empresariais e motiva muitos estudos acadêmicos. Os conceitos usados
para o tema são bastante amplos e, portanto, não podem ser considerados definitivos, mas
em permanente aperfeiçoamento evolutivo.
Dessa forma, pode-se afirmar que governança corporativa é uma forma de gerenciamento
que agrega valor ao negócio, leva ao aumento do retorno dos investimentos e permite que
os acionistas e os gestores internos controlem e monitorem seus negócios de forma mais
sistematizada, regulada e profissional. Trata-se, portanto, de um conjunto de mecanismos
de incentivo e controle, internos e externos, que visa minimizar os custos decorrentes do
problema de agência1 e/ou do conflito de interesses.
Para Silveira (2015) e para o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), entidade
civil brasileira dedicada a estudar e difundir o tema, governança corporativa diz respeito
à maneira pela qual as organizações são dirigidas e controladas de acordo com a aborda-
gem multidisciplinar e o relacionamento entre os seus principais atores (diretoria, conselho
de administração e acionistas), contemplando questões como a gestão, a liderança, a ética
empresarial, as finanças e a contabilidade.
1 Provocado pela extrema dispersão do capital de uma companhia que pode ter muitos acionistas, o problema
de agência pode gerar custos quando, por exemplo, se contratam agentes (ou administradores) delegando-lhes
a tomada de decisões que pode conflitar com os interesses dos acionistas.
12 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Borges (2008) complementa esse conceito ao afirmar que tal sistema se constitui no con-
junto de princípios, regras, valores, hábitos e procedimentos que regem os sistemas de
poder, de interesses, de administração, de controle e de supervisão de uma organização,
sobretudo as abertas, por contarem com maior dispersão de seu capital.
Por fim, a cartilha de governança da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia fede-
ral subordinada ao Ministério da Fazenda que funciona como agente regulador do mercado
de capitais, define governança corporativa como o conjunto de práticas que busca otimizar o
desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas e facilitar o acesso
ao capital. Quando aplicada ao mercado de capitais, deve envolver transparência, equidade de
tratamento dos acionistas e prestação de contas.
Ao longo dos últimos anos, discutiu-se muito a respeito da forma como as práticas de gover-
nança poderiam afetar o desempenho da empresa, se isso funcionaria e de que maneira
elas poderiam contribuir para a geração contínua de valor e lucro, para sua perenidade e
para a sustentabilidade do planeta. Isso se dava principalmente por se considerar que tais
práticas gerariam mais custos econômicos, demandando mais tempo dos colaboradores,
sem segurança sobre sua real efetividade.
CAPÍTULO 1 13
VOCÊ SABIA? primeira vez em seu livro Strategic Management: A Stakeholder Approach.
A partir dos benefícios percebidos com a melhoria de gestão, a prática da governança vem
crescendo e conquistando cada vez mais o interesse de gestores, investidores, autoridades
públicas, estudantes e – à medida que todos se beneficiam –, também da sociedade em geral.
2 Partes interessadas, pessoas e/ou instituições, direta ou indiretamente envolvidas na operação da organização.
14 GOVERNANÇA CORPORATIVA
No filme “Erin Brockovich”, com base em fatos reais, estrelado por Julia
Roberts, é contada a história de uma cidade que teve seus moradores
afetados pela contaminação da água subterrânea com resíduos tóxicos
emitidos por uma empresa que não os tratava devidamente. Ainda que a
população não fosse consumidora ou usuária dos serviços ou produtos
da empresa em questão, os habitantes são importantes stakeholders que
deveriam ter sido considerados durante todo o processo de operação
e gestão dos negócios. Não à toa, a empresa se viu obrigada a pagar
PARE PARA multas altíssimas por conta de toda sua irresponsabilidade. Vocês
PENSAR conhecem outros casos semelhantes?
Principais valores
Esses valores estão contidos, de forma expressa ou implícita, nos conceitos usuais de gover-
nança corporativa e nos códigos de boas práticas que privilegiam a ética necessária ao exer-
cício das funções e das responsabilidades dos órgãos da companhia.
No Brasil, esses valores ou princípios básicos foram uniformizados pelo IBGC (2010),
seguindo o que vem sendo mais correntemente apresentado na literatura brasileira voltada
ao assunto:
■■ Transparência (disclosure) – disponibilizar, às partes interessadas, informações que
sejam de seu interesse e não apenas as que sejam impostas por leis ou regulamentos.
UNIDADE 2
EVOLUÇÃO CONCEITUAL
Não se sabe ao certo quando as práticas de governança corporativa tiveram início. O uso sis-
tematizado do termo é encontrado no meio empresarial e acadêmico a partir dos anos 70,
provavelmente por meio das discussões realizadas no American Law Institute (ALI), sobre
como melhorar a forma de gerir negócios societários nos Estados Unidos. A partir de então,
o termo ganhou força nos anos seguintes, entre 1980 e 1990, primeiramente nos Estados
Unidos e na Inglaterra e depois nos demais países.
Num primeiro momento, após o trabalho de Berle e Means na década de 30, a governança
das empresas passou a ganhar destaque por conta das mudanças das empresas na década
de 70, quando se começou a pensar de forma mais consistente em maior perenidade para
os negócios, envolvendo todos os stakeholders (SILVEIRA, 2015).
Na década de 80, com a expansão das empresas de capital aberto, com mais acionistas,
começa-se a pensar na melhor forma de geração de valor para esses investidores. Dessa
forma, o conceito de governança corporativa foi se tornando cada vez mais tangível e
importante no fim dos anos 80, por conta do crescimento do mercado com aquisições hostis
e seus mecanismos de defesa, entre outras circunstâncias envolvendo fusões e expansio-
nismo empresarial (SILVEIRA, 2015).
18 GOVERNANÇA CORPORATIVA
O primeiro código de boas práticas sobre o assunto foi divulgado em 1992, na Inglaterra, e
ficou conhecido como Relatório Cadbury devido ao nome do presidente da comissão que
o organizou, Sir Adrian Cadbury. Esse documento foi elaborado a partir de pressões do
governo britânico, derivadas de más práticas adotadas por empresas inglesas. Uma comis-
são organizada por diversas entidades se uniu para investigar o ambiente empresarial do
Reino Unido e, assim, elaborou o material que serviu por muito tempo, e ainda serve, como
inspiração e referência para conteúdos similares produzidos por outros países e institui-
ções, além de diretrizes para boas práticas (SILVEIRA, 2015).
O primeiro livro que utilizou o termo no título foi editado em 1995, com o nome Watching
the Watchers: Corporate Governance for the 21st Century, de autoria de Monks e da escritora
norte-americana Nell Minow, parceira de Monks em pesquisas voltadas para o assunto.
Isso se ampliou consideravelmente a partir da Revolução Industrial, no fim dos anos 1700,
com a expansão das corporações ocorridas principalmente no Ocidente (na Europa e, pos-
teriormente, nos Estados Unidos). Apesar da interrupção desse crescimento, dada pela
grande crise de 1929, o processo expansionista teve, segundo Andrade e Rossetti (2011), os
seguintes fatores determinantes:
■■ Avanços tecnológicos – geraram uma onda de inovações, desenvolvimento de indús-
trias e diversificação de produtos.
■■ Grandes escalas e produção em série – geraram redução dos custos unitários e, por
consequência, do preço final ao consumidor, o que aumentou o poder de compra das
classes de rendas média e baixa.
20 GOVERNANÇA CORPORATIVA
■■ Protecionismo do poder público – deu respaldo aos interesses dessas grandes corporações.
Nos Estados Unidos, por exemplo, esse aumento quadruplicou, passando de 4,4 milhões de
acionistas para 18 milhões nas companhias espalhadas pelo país entre os anos de 1900 até
o fim dos anos 1920. A dispersão do capital e o gigantismo das corporações ocasionaram
mudanças profundas nas companhias, entre as quais destacam-se:
3 A Arthur Andersen, até então uma das cinco maiores empresas de auditoria do mundo, faliu ao ser constatado
seu envolvimento direto com as falências seguidas da WorldCom e da Enron. A atividade de auditoria externa foi
colocada sob suspeita, assim como a confiabilidade de suas demonstrações contábeis.
4 Equity é uma participação, um quinhão, a parte justa de alguém em alguma coisa. Equities são, portanto, ações,
ou seja, as participações que refletem determinado patrimônio.
CAPÍTULO 1 21
Nos mercados de capitais mais desenvolvidos, como o dos Estados Unidos, os custos de
agência normalmente ocorrem por casos de contraposição entre proprietários e administra-
dores profissionais, o problema de agência mais comum. Nesse país, a dispersão do capital
é muito maior do que ocorre no Brasil, como mostra Silveira (2015) no gráfico a seguir.
22 GOVERNANÇA CORPORATIVA
VALE
U$$ 83,0 Bi
52,7%
JBS
76,1%
U$$ 8,5 Bi
Companhias
ItaúUnibanco
brasileiras 89,7%
U$$ 71,3 Bi
Gerdau SA
76,2%
U$$ 13,1 Bi
IBM
6,2% Berkhire Harthaway
U$$ 189,5 Bi
Exxon
Companhias U$$ 385,4 Bi
4,9% Vanguard Group
norte-americanas
GE 4,8% Vanguard Group
U$$ 259,4 Bi
Microsoft
4,5% Bill Gates
U$$ 291,2 Bi
Obs.: para as companhias brasileiras, foi contabilizado o total de ações ordinárias em posse do(s)
acionista(s) controlador(es) participante(s) de eventual acordo de acionistas.
Como é possível verificar na figura, o maior acionista da IBM nos Estados Unidos detém
pouco mais de 6% de suas ações. Sendo assim, sem um acionista majoritário com poder
suficiente para fazer valer sua vontade - como no caso do ItaúUnibanco no Brasil, que possui
quase 90% das ações - é mais fácil ainda haver conflitos entre múltiplos acionistas e os exe-
cutivos gestores de empresas, situação vivida pela gigante da tecnologia norte-americana.
Nos países com mercados de capitais pequenos ou médios (menos “pulverizados”, como no
caso do Brasil) e/ou com forte concentração de ações nas mãos de um acionista ou grupo
controlador, os conflitos são de outra natureza. Os administradores são na maior parte das
vezes os próprios controladores ou executivos indicados por eles, para que seja estabelecida
uma relação de lealdade. Os atos de gestão nesse caso tendem a fortalecer os interesses do
grupo controlador da empresa, opondo-se às preferências dos acionistas minoritários.
Em empresas com capital mais diluído, a contratação dos gestores é validada no Conselho
de Administração, mas não se trata necessariamente de indicação específica de nenhum
acionista ou grupo de acionistas, sendo encaminhada como questão de recrutamento e
seleção no mercado, por meio da política correspondente de Recursos Humanos.
Segundo Donaldson e Preston (1995), após a realização de entrevistas com diversos gesto-
res, os principais interesses dos agentes condutores ou administradores são:
■■ Sobrevivência – procuram controlar as finanças da companhia para evitar que ela deixe
de existir.
UNIDADE 3
MARCOS HISTÓRICOS DA GOVERNANÇA CORPORATIVA
Os três, por sua vez, são considerados complementares em razão dos diferentes focos que
apresentam. Robert Monks, um ativista pioneiro que modificou a governança corporativa
nos EUA, centralizou sua atenção nos direitos dos acionistas, deslocando-os para uma estra-
24 GOVERNANÇA CORPORATIVA
tégia mais ativa no exercício de suas funções dentro da corporação. Desse modo, focou em
dois valores relevantes para a governança corporativa: fairness (senso de justiça) e com-
pliance (conformidade legal, sobretudo em relação aos direitos dos minoritários passivos).
Relatório
Robert Monks OCDE
Cadbury
Fairness governança
Accountability
corporativa nas
companhias atrai
Compliance Disclosure mais investidores.
Monks, por sua vez, refutava justamente essa conclusão, defendendo que “o ‘x’ a receber
com maior envolvimento dos acionistas na corporação poderia ser maior que o ‘x’ resultante
de nenhuma forma de participação” (ANDRADE; ROSSETTI, 2011, p. 159). Monks acreditava
que os acionistas não deveriam apenas investir sem participar das reuniões do conselho
e das assembleias gerais por exemplo. Para ele, quanto maior o engajamento, melhores
os resultados. No campo prático, Monks ajuizou ações contra grandes instituições que, no
começo, não tiveram êxito, mas, finalmente, em 1988, o Departamento do Trabalho dos
EUA declarou que os administradores dos fundos de pensão tinham a obrigação de exercer
o direito de voto de suas ações (declaração conhecida como Avon Letter), para maximizar o
valor das companhias em que os investidores institucionais detinham participação.
Em outra iniciativa, Monks fundou, em 1985, com colegas – duas pessoas de sua equipe no
Departamento do Trabalho –, a empresa Institutional Shareholder Services (ISS), prestadora
de consultoria para investidores institucionais nas questões relativas aos votos em assem-
bleias de acionistas. Assim, após a declaração Avon Letter, em 1988, o número de clientes
aumentou consideravelmente, até que, dois anos depois, Monks optou pela saída da socie-
dade para enfrentar novos desafios, a partir de então, na condição de acionista.
Em 1991, Monks adquiriu cem ações da Sears, Roebuck & Co., uma enorme corporação de
varejo americana, e candidatou-se ao conselho, mas não obteve votos suficientes. No ano
seguinte, fez parte de um grupo que iniciou a reestruturação da Sears e, em seu memorando
sobre estratégia, mencionou: “Onde começar? O lugar onde começar é com o conselho. A
maneira como se transmite o desejo de algum tipo de mudança é por meio da efetivação da
mudança no conselho” (ROSENBERG, 2000, p. 260).
5 Conforme Berle e Means (1932) haviam afirmado antes, ao falarem de empresários como usufrutuários passi-
vos, uma nova terminologia é adotada por Monks ao falar de rentistas – ou investidores, pessoas que vivem de
renda –, que agem como parasitas, ou de forma pouco ativa.
26 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Nessa mesma época, Monks e sua parceira Nell Minow constituíram, como acionistas, o
fundo Lens Investment Management para investir em empresas que enfrentavam dificulda-
des. A partir desse negócio, ele conseguiu modificar a gestão das empresas de alguns clien-
tes, melhorar seus resultados e aumentar o seu valor de mercado. O aludido fundo adquiriu
ações de algumas dezenas de empresa, superando em muito o índice da S&P 5006. Em 2000,
no entanto, Monks vendeu sua participação no fundo e saiu da administração da empresa
para comprovar que a participação efetiva do acionista nas assembleias e conselhos gera
valor para a empresa, sem necessariamente precisar estar envolvido no dia a dia de sua
gestão, valorizando o compromisso de agir como acionista ativo nos fóruns destinados a ele.
O Relatório Cadbury
Assim, o Relatório Cadbury elaborou alguns termos de referência com foco em dois valores
da governança corporativa: accountability e disclosure. A partir disso, orientou os conselhei-
ros e os executivos a se comprometerem e se responsabilizarem com:
■■ a análise e a apresentação das informações para os acionistas e demais stakeholders
acerca da performance da companhia;
6 S&P 500 é a abreviação de Standard & Poor’s 500, um índice com quinhentos ativos ou ações cotado nas bolsas
de NYSE ou NASDAQ. Sua classificação é pelo tamanho de mercado, liquidez e representação de grupo industrial.
CAPÍTULO 1 27
britânica. Com o decorrer do tempo, passou a receber alguns apoios importantes, como o
do próprio governo inglês, principal interessado no resultado do Relatório e na valorização
da implementação de tais práticas.
Ao fim, o documento acabou por influenciar a gestão de companhias no Reino Unido e, pos-
teriormente, no Canadá, nos Estados Unidos, na França e na Austrália.
Os princípios da OCDE
Tais princípios serviram de referência para diversos países, não apenas os 30 países-mem-
bros, mas também outros 40 que são destinatários da mesma consultoria de melhores prá-
ticas de governança corporativa promovida pela OCDE.
Em 2002, a OCDE iniciou um trabalho de revisão do material publicado e, dois anos depois,
divulgou uma nova versão dos princípios, com conclusões atualizadas. Essa atualização
manteve a intenção de não padronizar a governança corporativa, fornecendo referências
para objetivos customizáveis dada a heterogeneidade de culturas, realidades e organiza-
ções dos distintos países envolvidos:
■■ progressão do modelo de shareholders oriented para stakeholders oriented (orientação
para os acionistas transferida para as partes interessadas);
A OCDE, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, vê nos princípios
da governança corporativa uma base sólida para o crescimento econômico e para a integra-
ção global dos mercados. A difusão da governança é considerada por essas entidades como
fundamental para o controle e para a gestão de riscos de investimentos em empresas aber-
tas. Alguns dos países mais ricos do mundo defendem que a governança corporativa é um
dos mais novos e importantes pilares da arquitetura econômica global. A OCDE acrescenta
que a governança corporativa é um dos instrumentos determinantes do desenvolvimento
sustentável em suas três dimensões – a econômica, a ambiental e a social.
UNIDADE 4
A GOVERNANÇA CORPORATIVA NO BRASIL
Por conta da instabilidade econômica anterior à década de 90 no Brasil, foi necessário que a
inflação fosse controlada em 1994 e que começasse o movimento de privatização de empre-
sas, para que o mercado de capitais recuperasse força no país e, assim, a governança corpo-
rativa começasse a fazer sentido por aqui, principalmente para as organizações que tinham
seus papéis vendidos também na Bolsa de Nova Iorque (SILVEIRA, 2015).
Sendo assim, a governança corporativa teve início no Brasil em novembro de 1995, pouco
tempo depois da publicação do primeiro livro de Monks e do Relatório Cadbury, com a cria-
ção do Instituto Brasileiro de Conselheiros de Administração (IBCA), precursor do atual Ins-
tituto Brasileiro de governança corporativa (IBGC). Cinco anos depois, com a evolução do
mercado de capitais e da consolidação da economia, a BM&FBovespa (Bolsa de Valores,
CAPÍTULO 1 29
Mercadorias e Futuros de São Paulo), atual B3, criou os chamados segmentos especiais de
listagem7 com níveis diferenciados de governança (o Nível 1, Nível 2 e o Novo Mercado) que,
mais tarde, seriam complementados pelo Bovespa Mais e Bovespa Mais Nível 2.
O Brasil entrou na lista dos países que estão adotando as práticas de governança corpo-
rativa para, assim, atrair capital e fontes de financiamento para as atividades empresariais
brasileiras. A partir daí, as empresas brasileiras passaram a se desenvolver e aplicar os con-
ceitos de governança corporativa em suas estratégias de negócios, principalmente por conta
de episódios envolvendo corrupção, como o do Mensalão e da Lava Jato, por exemplo, que
terminaram fomentando a criação de novos mecanismos de controle e incentivo às boas
práticas, que serão trabalhados nos capítulos subsequentes.
7 Os segmentos especiais de listagem serão estudados com mais afinco no próximo capítulo.
30 GOVERNANÇA CORPORATIVA
financeiro e ao uso da sua rede para a colocação dos títulos para os investidores, as empre-
sas emissoras de títulos e valores mobiliários se viram obrigadas a uma adesão compulsória
às práticas de governança corporativa.
Com a valorização efetiva da Bolsa de Valores de São Paulo em meados de 2004 até a crise
do subprime8 em 2008, houve uma onda de ofertas públicas de ações no Brasil. Justamente
essa quase obrigatoriedade de adoção da governança corporativa pelas empresas emis-
soras (uma vez que, apesar de importante, a maior parte de suas regras ainda é de ade-
são voluntária) deixou uma dúvida quanto à efetiva entronização das práticas diferencia-
das como uma cultura empresarial. Especula-se que, para certa quantidade de empresas, a
governança corporativa foi muito mais uma consequência inerente a uma oportunidade de
capitalização do que uma vontade real de mudança de gestão. Independentemente dessa
motivação, o fato é que, mesmo em empresas oportunistas, há um ganho de transparência
e de prestação de contas para o mercado e os investidores em geral.
Em 2008, com a obtenção do grau de investimento (investment grade) pelo governo federal,
as práticas de governança corporativa se tornaram um importante mecanismo para diferen-
ciar competitivamente as empresas brasileiras que aderem a tais práticas de outras que não
o fazem. Isso fica muito claro perante os olhos dos analistas internacionais e acaba por atrair
investidores estrangeiros, estratégicos e institucionais.
8 Crédito de risco concedido a um tomador sem garantias suficientes para se beneficiar de taxas de juros mais
vantajosas. O nome vem das hipotecas de alto risco concedidas a clientes que não tinham boa avaliação de cré-
dito nos EUA.
CAPÍTULO 1 31
Em 2012, a CVM colocou em debate e editou uma legislação para disciplinar o funcionamento
e os padrões metodológicos das agências de ratings, empresas que emitem avaliações e
classificam o risco das companhias, por meio da Instrução 521/12. Tais agências haviam sido
muito criticadas na crise nos EUA, em 2008, por não identificarem em seus relatórios as pos-
sibilidades de perdas que acabaram ocorrendo com a crise econômica em muitas empresas.
Após a audiência pública, foram realizados, entre outros, alguns ajustes para ajudar no
esclarecimento das regras:
■■ aprimoramento da redação final do documento, que passou a exigir do administrador
responsável pela agência o cumprimento das regras, dos procedimentos e dos controles
internos; e do responsável pelo compliance, a supervisão de seu cumprimento;
EXTRA
Dessa forma, o governo brasileiro tem se envolvido mais em ações voltadas para a gover-
nança corporativa em empresas públicas, mas ainda há muito espaço para avanços.
CAPÍTULO 1 33
Resumo
Neste capítulo, você viu, de forma introdutória, como as práticas de governança corporativa
podem afetar o desempenho das empresas e de que maneira as boas práticas podem con-
tribuir para a geração contínua de valor e lucro das corporações e, ainda, para a sustentabi-
lidade do planeta.
A governança corporativa deve ser entendida não apenas como uma forma de estabelecer
padrões empresariais de gestão, mas como um conceito que evoluiu para o desenvolvi-
mento e o estabelecimento de uma nova cultura organizacional.
O capítulo mostrou a evolução conceitual do tema, fazendo uma narrativa cronológica asso-
ciada aos avanços tecnológicos, à expansão demográfica, às grandes escalas e à produção
em série, à evolução do mercado de capitais, ao aumento de investimentos públicos, à onda
de fusões e às aquisições e ao protecionismo do poder público.
Como foi possível perceber, os diversos problemas que dizem respeito à governança, de
acordo também com a literatura, estão relacionados ao abuso de poder (acionista contro-
lador/minoritários, diretoria/acionista e administradores/terceiros), aos erros estratégicos
(excesso de poder concentrado em uma única pessoa, em geral o executivo principal), e/ou
fraudes (fornecimento de informações incorretas para benefício próprio).
34 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Capítulo 2
O MERCADO DE CAPITAIS
E AS BOAS PRÁTICAS DE
GOVERNANÇA CORPORATIVA
NO BRASIL
CAPÍTULO 2 35
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS DO CAPÍTULO
Para melhor compreensão das questões que envolvem a governança corporativa, este
capítulo está dividido em:
UNIDADE 1
O CONCEITO DE MERCADO DE CAPITAIS
A introdução das boas práticas de governança corporativa nos negócios está associada à
gestão das empresas listadas nos chamados mercados de capitais, ou seja, as companhias
ou sociedades anônimas (S/A) que têm seu capital aberto. Essas companhias emitem títulos
e valores mobiliários para obter recursos e, assim, financiar suas operações e fazer crescer
seu capital por conta do maior número de investidores.
Ele é constituído por instituições que operam com compra e venda de papéis (ações e títulos
de dívida em geral), de prazo médio, longo ou indefinido, efetuadas entre agentes poupado-
res e investidores por meio de intermediários financeiros. Esses intermediários podem ser:
■■ redes de bolsas de valores;
■■ sociedades corretoras;
As ações, que representam o capital social das empresas abertas, são os principais títulos
negociados em um mercado de capitais. Mas, além das ações, há também:
■■ os empréstimos tomados no mercado pelas empresas (representados por debêntures);
■■ outros derivativos autorizados à negociação, como, por exemplo, as opções que garan-
tem a seus detentores o direito de comprar ou vender um dos ativos listados acima.
Essas opções funcionam basicamente como uma apólice de seguro, dando segurança
do retorno futuro sobre um valor pago anteriormente.
EXTRA
Porém, a opção mais viável é a captação de recursos via mercado financeiro e de capitais,
seja por empréstimos bancários, seja na primeira subscrição de ações feita pelos acionistas.
Esta segunda alternativa seria, para alguns teóricos, o mais eficaz meio de transferência do
capital economizado pela população para o investimento produtivo, pois, além de retirar do
Estado a obrigação de fomentar a indústria, os riscos de tais empreendimentos podem ser
distribuídos entre investidores e empreendedores.
No entanto, para que haja mais riqueza sem sobrecarregar o Estado, o mercado brasileiro
precisa crescer bastante ainda. Mesmo com um período de expansão entre 2004 e 2007,
quando houve uma onda de ofertas públicas de ações no país, o número de empresas com
capital aberto diminuiu de 830 para 637 entre 2001 e 2013. A quantidade de empresas lista-
das foi reduzida de 459 para 366 no mesmo intervalo. A proporção de companhias na Bolsa
no Brasil é de 2 por cada milhão de habitantes. Em outros lugares, essa taxa é bem maior:
22 na União Europeia, 32 no Reino Unido e 12 no Chile (SILVEIRA, 2015).
A seguir, falaremos mais sobre a importância do mercado de capitais para os países e como
a governança corporativa pode contribuir para isso.
UNIDADE 2
A IMPORTÂNCIA DO MERCADO DE CAPITAIS PARA O
DESENVOLVIMENTO DA ECONOMIA E DO PAÍS
A cada dia é mais evidente a contribuição positiva que o mercado de capitais e o papel do
mercado acionário oferecem ao desenvolvimento econômico. A atuação deles permite a
circulação de capital, seja por meio de investimentos financeiros ou da capacidade de pro-
dução da sociedade, necessários para um processo produtivo eficiente e capazes de produ-
zir bens em quantidade acessível à maioria da população. Isso, como consequência, vem a
custear o desenvolvimento econômico.
Nos países capitalistas mais desenvolvidos, onde já existe uma cultura organizacional que
contempla mais empresas de capital aberto, o mercado de capitais é mais forte e dinâmico,
diferente dos países em desenvolvimento, onde ele ainda é incipiente por não contar com
número tão expressivo de sociedades anônimas abertas. Por consequência disso, há uma
dificuldade na formação de poupança das empresas que não conseguem diversificar a ori-
gem do capital de seus potenciais investidores, o que se torna um obstáculo ao crescimento
econômico e leva os países em desenvolvimento a recorrer ao mercado de capitais interna-
cional, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), ou, mais especificamente, a emprésti-
mos, o que acaba por criar um alto nível de endividamento.
Tal raciocínio também pode se aplicar, de certa forma, às empresas, que, previamente aos
investimentos, devem focar suas atenções na operação e na construção de lastro financeiro
em potenciais expansões. No Brasil, algumas empresas que tentaram crescer com a aquisi-
ção de outras acabaram por sofrer sérios reveses. É o caso, por exemplo, da companhia de
40 GOVERNANÇA CORPORATIVA
telecomunicações Oi, que entrou em recuperação judicial em 2016. Situações assim levam
especialistas do setor a apontar uma relação entre a economia realizada e os processos de
crescimento autossustentado e a manutenção do desenvolvimento econômico como um
todo (SICSÚ; CASTELAR, 2009).
Acumulação
Crescimento de capital
econômico (poupança)
Produção
Modelos econômicos tradicionais mais teóricos sugerem que, quanto maior a riqueza gerada
na economia, maior tende a ser a taxa de poupança e vice-versa. Nos países desenvolvidos,
o crescimento econômico sempre tendeu a acompanhar os esforços de acumulação de capi-
tal no passado, que, por sua vez, foi reinvestida na própria produção, criando um vínculo
entre poupança e investimento.
O Banco Mundial, associado ao Sistema das Nações Unidas, é a maior fonte global de assis-
tência para o desenvolvimento e considera as boas práticas de governança corporativa, ao
lado de ações anticorrupção, temas centrais para a sua missão de erradicar a pobreza no
mundo. Se as empresas agem de forma ética, se conseguem compartilhar sua riqueza com
diferentes stakeholders, se geram emprego, contratam fornecedores responsáveis e desen-
volvem projetos sociais para as comunidades com que se relaciona, o mundo passa a ser
mais igualitário.
CAPÍTULO 2 41
Mercado acionário
Ao carregar recursos dos poupadores e disponibilizá-los para uso dos investidores, o mer-
cado de ações incentiva não apenas a formação da poupança interna2, mas, principalmente,
a formação de poupança de longo prazo3), gerando riqueza para o país. A recompensa
obtida via maximização dos retornos do uso eficiente dos recursos e do momento correto
da tomada de decisão torna o próprio mercado cada vez mais eficiente, e esse efeito é trans-
mitido aos demais setores da economia.
A ideia de que esse mercado envolveria apenas negociações na esfera financeira, desprovi-
das de qualquer impacto sobre o setor real da economia, já foi superada. Em outras pala-
vras, é possível afirmar que um mercado acionário desenvolvido, com bom volume, liquidez
e adequada regulamentação, tem contribuído para o aumento da produtividade econômica
em nível global.
3 Poupança de longo prazo é o lastro financeiro duradouro que permite a expansão da riqueza de forma mais longeva.
4 Tipo de contrato em que o Bacen garante a cotação pagando o valor da variação da moeda estrangeira.
42 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Além disso, um mercado de ações eficiente, aliado a outras atitudes que proporcionam visi-
bilidade e segurança aos investidores, como a preparação de relatórios de sustentabilidade
empresarial e outras boas práticas associadas à governança corporativa, por exemplo, atrai
e retém a presença do capital externo em um país. No caso especial dos países em desenvol-
vimento, o bom funcionamento do mercado acionário traz recursos para o financiamento
das empresas, fato que proporciona a expansão do setor privado e o crescimento da econo-
mia, aumentando a renda e a oferta de empregos.
UNIDADE 3
INDICADORES DE GOVERNANÇA CORPORATIVA E SUSTENTABILIDADE
Sendo assim, todas as empresas que pretendem ingressar em um dos cinco níveis de gover-
nança corporativa, ou segmentos especiais de listagem existentes, devem assinar um con-
trato com a B3 e com os administradores, conselheiros fiscais e controladores da companhia.
Bovespa Mais
Criado em 2005, este segmento surge para atender empresas que se interessem em acessar
o mercado de capitais de forma gradativa. Seu alvo principal está nas pequenas e médias
empresas que podem crescer via mercado de capitais. Assim, essas instituições teriam a
chance de se preparar de forma mais qualificada para seu crescimento, de forma mais tran-
quila, sendo acompanhada pelo mercado, aumentando consequentemente sua visibilidade.
Este segmento, lançado em 2014, tem como objetivo tornar o mercado acionário brasileiro
acessível a um número maior de empresas. As que podem pleitear participação em sua lis-
tagem são as que apresentam comprovado potencial de crescimento, e que desejam ingres-
sar no mercado de capitais de forma gradativa. São empresas melhor posicionadas que
as qualificadas para o Bovespa Mais, mas com interesse de ampliar gradualmente a base
acionária para seu crescimento.
44 GOVERNANÇA CORPORATIVA
A principal diferença entre o Bovespa Mais Nível 2, em relação ao Bovespa Mais, é permitir a
negociação de ações preferenciais (PN), e não apenas de ações ordinárias (ON).
Empresas listadas no Bovespa Mais Nível 2 podem migrar mais facilmente, se for de seu
interesse, para o Nível 2 de Governança Corporativa ou para o Novo Mercado.
Novo Mercado
O Novo Mercado, principal segmento da B3, vem sofrendo revisões desde sua criação, em
2000. Sua última atualização, em vigor desde 2 de janeiro de 2018, foi realizada por meio de
colaboração entre B3, participantes do mercado e companhias listadas.
O Novo Mercado é referência no que diz respeito à transparência junto aos stakeholders de
qualquer empresa listada, principalmente aos acionistas. Este segmento é o mais exigente,
com os mais altos níveis de governança corporativa, indo além do que se estipula normal-
mente por lei.
Índices de Governança – B3
Uma vez a empresa tendo aderido aos Níveis 1 ou 2 da BM&FBovespa, todos os tipos de
ações de sua emissão participarão da carteira do índice, exceto se sua liquidez for conside-
rada muito estreita (B3, 2016).
O Índice de Ações com Governança Corporativa Diferenciada (IGC) teve uma valorização
acumulada de 601% de dezembro de 2001 a dezembro de 2015, enquanto o Ibovespa teve
um crescimento acumulado médio de 205,5% no mesmo período.
Em 2015, a média do IGC teve uma queda de 11,94% (de janeiro a dezembro de 2015). Já o
Ibovespa, na mesma época, teve uma queda de 13,31%. É possível atribuir essas quedas ao
momento político e econômico no país naquele período. Boas práticas de governança suge-
rem que empresas sofram impacto negativo menor em situações como as recentemente
vividas no Brasil, ou ainda que tenham seu patrimônio mais valorizado em comparação a
outras que não tenham aderido ao IGC, por exemplo.
1200
1000
800 122%
IGC x IBOVESPA
600 04/2017
400
200
0
JUN/01 DEC/09 SEP/10 JUN/11 MAR/12 DEC/12 SET/13 JUN/14 MAR/15 DEC/15 SET/16 MAR/17 IGC IBOVESPA
Este indicador, que é fruto de uma carteira teórica de ativos, tem como objetivo avaliar a
cotação média dos ativos de emissão de empresas sempre oferecendo melhores condições
aos acionistas minoritários em caso de alienação do controle (BM&FBovespa, 2016b).
O IGCT, índice de retorno total, assim como o ITAG, é um indicador atrelado a uma carteira
teórica de ativos, cujo objetivo é também avaliar o desempenho médio das cotações dos ati-
vos de emissão de empresas que integrem o IGC e atendam a outros critérios estabelecidos
por metodologia da B3 (BM&FBovespa, 2016c).
Assim como os indicadores anteriores, o IGC-NM tem como objetivo medir o desempenho
médio das cotações dos ativos de emissão de empresas, mas neste caso considerando as
que apresentem bons níveis de governança corporativa, e que estejam listadas no Novo
Mercado da B3 (BM&FBovespa, 2016).
Os indicadores seguir, cada vez mais valorizados pelo mercado, estão relacionados à
sustentabilidade.
Indicadores de sustentabilidade
Cada vez mais, ao considerarmos a finitude dos recursos por exemplo, a sustentabilidade
tem se tornado pauta quando o assunto é gestão empresarial e, mais especificamente ainda,
ao falarmos de governança corporativa e suas boas práticas.
5 Mecanismo que visa proteger acionistas minoritários no caso de mudança de controle de uma empresa.
CAPÍTULO 2 47
Em 2005, quando foi criado, esse indicador contou com financiamento da International
Finance Corporation (IFC), organização vinculada ao Banco Mundial.
PARE PARA exclusão tenha sido a tragédia ambiental em Mariana, Minas Gerais, que
contaminou praticamente todo o Rio Doce. E você, o que acha?
PENSAR
Tudo que se conhece hoje sobre sustentabilidade começou a se desenrolar por conta da
preocupação crescente com o aquecimento global.
O Brasil, assim como outros países, também foi desafiado a cumprir as metas acordadas
durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em 2015, e a 21.ª
sessão anual da Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
48 GOVERNANÇA CORPORATIVA
as Alterações Climáticas (COP 21), no final daquele ano em Paris, na França. As principais
metas envolvem a redução de 37% nas emissões de gases de efeito estufa até 2025. A título
de comparação, o ponto de partida são as emissões de 2005, com potencial redução de 43%
das emissões até 2030 (CEBDS, 2017).
Como as empresas são grandes responsáveis por emissões de GEE (gases de efeito estufa),
a B3 aliada ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criou um
índice de mercado – o ICO2 – de forma a classificar as empresas do ponto de vista ambiental.
UNIDADE 4
ÓRGÃOS REGULADORES
Apesar de o CMN contar com demais órgãos reguladores, como a Susep – Superintendên-
cia de Seguros Privados e outros relacionados a seguros e previdência, focaremos na CVM
e Bacen, que além de complementares, são mais relevantes para o assunto que tratamos
durante o curso já que são supervisores do segmento de Moeda, crédito, capitais e câmbio
do Sistema Financeiro Nacional.
No que diz respeito às empresas de capital aberto, o principal órgão regulador é a Comis-
são de Valores Mobiliários (CVM), autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda do governo
federal. A CVM tem o dever de fiscalizar todos os títulos e valores mobiliários admitidos no
mercado de capitais brasileiro e, justamente pelo papel de fiscal e aplicador de punições, é
também conhecido como “xerife do mercado”. Nesse sentido, as atribuições da CVM são,
basicamente:
■■ proteger os investidores;
A CVM tem um corpo próprio de funcionários, mas é dirigida por diretoria indicada, que fun-
ciona de forma colegiada e é formada por um presidente e quatro diretores. Cada diretor
colegiado, incluindo o presidente, é indicado pelo presidente da República e aprovado em
votação do Senado para a função.
O mandato da diretoria é de quatro anos, não coincidentes. Isso significa que cada um
assume em um ano diferente, mas nem todos cumprirão necessariamente o mandato de
forma integral (por desejarem sair antes ou serem afastados por conta de alguma irregulari-
dade ou situação que indique o afastamento por exemplo), embora o período seja igual para
todos. Assim, se cada diretor cumprir o seu mandato de forma integral, a cada ano haverá
uma troca ou renovação de mandato. Dessa forma, evita-se, como já ocorreu no passado,
que exista a substituição integral de todo o corpo diretor ao mesmo tempo, o que gera
mudanças nas orientações do órgão e cria um clima de insegurança no mercado de capitais.
A Lei 6.385, de 1976, que criou a CVM e disciplina o mercado de capitais, sofreu poucas alte-
rações desde sua promulgação. Em 2015, o então presidente do órgão, Leonardo Pereira,
defendia a necessidade de revisão das penalidades que a autarquia pode aplicar. Em 2017,
a Lei 13.506, que disciplina o processo administrativo do Banco Central e da CVM, elevou
o valor das multas em caso de crimes contra o mercado de capitais. Antes, o máximo que
poderia ser cobrado a uma empresa era 500 mil reais e, agora, pode chegar a 50 milhões.
Nos processos instaurados pela CVM para apurar desvios e infrações às normas do mercado
de capitais, cabem os seguintes desfechos:
■■ Absolvição
■■ Inabilitação temporária – pode ser aplicada até o máximo de 20 anos para o exercício de
cargo de administrador ou de conselheiro fiscal.
■■ Proibição temporária – pode ser aplicada até o máximo de 10 anos e envolve a função de
atuar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado
de valores mobiliários
dos fatores desencadeadores da operação Lava-Jato (Isto É Dinheiro, 2018). Outra situação
que demandou avaliação da CVM foi uma oferta de ações da Oi em 2014 por conta de ven-
das a descoberto, envolvendo compradores e emissores simultaneamente antes da data de
fixação do preço das ações, algo que é considerado infração grave.
Estima-se que em cerca de 80% dos processos julgados pela CVM há algum tipo de punição
para os investigados. No entanto, entre 2008 e 2012, aproximadamente 98% das pessoas,
físicas ou jurídicas, punidas pelo órgão postergaram suas sanções recorrendo ao Conselho
de Recursos do Sistema Financeiro Nacional – CRSFN (SILVEIRA, 2015). Em 2000, em artigo
preparado para a então Bovespa, uma equipe técnica liderada pelo ex-ministro da Fazenda,
Maílson da Nóbrega, já expunha a situação da instituição dizendo que “no terreno da regula-
ção, a CVM é ainda institucional e materialmente frágil. A instituição tende a perder quadros
e tem dificuldades para substituí-los de forma adequada” (NÓBREGA, 2000, p. 10).
Os participantes do mercado de capitais costumam criticar a CVM pela demora na solução dos
casos que investiga. Isso tende a reduzir a credibilidade na instituição e fomentar a continuidade
de más práticas por parte de algumas empresas. Alguns processos demoravam mais de dez
anos para serem julgados, e o tempo médio de tramitação de um processo era de quatro anos.
Entre 2011 e 2016, foram contratadas 236 pessoas após o último concurso público realizado
em 2010, e o tempo médio de tramitação dos processos foi diminuído, ficando entre 12 e 18
meses. No entanto, apesar de poder contar com até 610 servidores em seu quadro de profissio-
nais, a autarquia tem previsto um déficit de 31% de colaboradores no período entre 2018/2019:
eram 477 ativos em julho de 2018 com 43 aposentadorias e 15 exonerações sendo tramitadas
(DURÃO, 2017). O presidente da instituição em relatório tornado público em julho de 2018 infor-
mou que teriam problemas em sua operação se não fosse realizado novo concurso público.
A CVM é superavitária, obtendo receitas das multas aplicadas e das taxas de fiscalização que
as empresas submetidas ao seu controle são obrigadas a pagar. Entretanto, por ser uma
autarquia e não ter autonomia financeira, os recursos obtidos com sua atuação vão para o
governo federal. Suas despesas de custeio são incluídas no orçamento federal.
O Banco Central do Brasil (BACEN), conhecido como “Banco dos Bancos”, é responsável pela
fiscalização dos mercados financeiro e de capitais e também cumpre importante papel junto
às empresas com controle acionário aberto, tendo em vista que todas as transações econô-
micas em território nacional são reguladas e fiscalizadas por ele.
As funções do BACEN estão instituídas na Lei 4.728, de 1965, que disciplina o mercado de
capitais e estabelece medidas para o seu desenvolvimento. Entre as suas responsabilidades
está a preocupação com a estabilidade financeira do país e, por isso, é de sua competência
a emissão de moeda em papel e metal e a regulação da compensação de cheques e outros
papeis e títulos, como as ações. Sendo assim, precisa regular e supervisionar as ações de
nossas instituições financeiras (BACEN, 2018).
O Banco Central ainda pode vir a inspecionar, se necessário, livros e documentos de insti-
tuições financeiras, sociedades e empresas e também de pessoas físicas. Isso deriva de seu
poder legal de instaurar processo administrativo sancionador, no caso de constatação de
infrações por parte de qualquer dos entes mencionados.
Uma das atribuições do Bacen é punir instituições sob sua supervisão, e seus dirigentes se
for o caso, quando descumpridas as normas estabelecidas pela Lei de Lavagem de Dinheiro
(Lei nº 9.613, de 1998).
CAPÍTULO 2 53
Justamente por conta das exigências específicas demandadas pelo Banco Central, as empre-
sas que tendem a adotar e seguir um programa mais estruturado de compliance , um dos
pilares das boas práticas da governança corporativa, são as do mercado financeiro (SIL-
VEIRA, 2015). Essas instituições, pela natureza de seu negócio e suas cobranças específicas,
acabam estando mais preparadas para atender determinações esperadas pelos investido-
res que buscam mais segurança.
Em seu website, o Banco Central informa que sua missão é assegurar a estabilidade do poder
de compra e um sistema financeiro sólido e eficiente (BACEN, 2018). Quando a governança
corporativa consegue apoiar o desenvolvimento econômico de um país, está contribuindo
para todo um ecossistema financeiro, impactando múltiplos stakeholders e ajudando nosso
Bacen a cumprir suas metas e objetivos de uma forma geral.
Resumo
A introdução das boas práticas de governança corporativa está associada às práticas de
gestão das empresas listadas nos chamados mercados de capitais. As companhias emitem
títulos e valores mobiliários para obter capitais e, assim, financiar suas operações.
Neste capítulo, foram estudados a criação, na B3, dos segmentos especiais de listagem de
boas práticas de governança corporativa, os índices de sustentabilidade, bem como o papel
da CVM, que é o de ser “xerife do mercado”, ou “cão de guarda”, ou ainda “porto seguro”,
como algumas pessoas da área a têm chamado.
Aprendemos também que o Banco Central do Brasil (BACEN) é responsável pela fiscalização
dos mercados financeiro e de capitais.
Capítulo 3
LEIS
CAPÍTULO 3 55
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS DO CAPÍTULO
Para melhor compreensão das questões que envolvem a governança coorporativa, este
capítulo está dividido em:
UNIDADE 1
SARBANES-OXLEY E ENRON
No início dos anos 2000, quando a gigante norte-americana Enron, especializada em ener-
gia, protagonizou a falência mais emblemática do mundo, os Estados Unidos não esperaram
muito tempo para evitar novos escândalos financeiros acontecessem em seu território.
Assim, em 25 de julho de 2002, o Congresso norte-americano aprovou a Lei Sarbanes-Oxley,
ou simplesmente SOX, com o propósito de proteger os interesses de investidores e definir
uma série de obrigações para as empresas que possuem ações listadas na Bolsa de Valores
de Nova Iorque (New York Stock Exchange – NYSE), principal mercado acionário do planeta.
Tal legislação tornou obrigatória a adoção de boas práticas de governança corporativa para
essas empresas, o que acabou por tornar mais difícil a ocorrência de fraudes contra o sis-
tema financeiro por conta de vários mecanismos legais de proteção. Entre suas exigências
está a implantação de sistema de controles financeiros internos e a criação de um comitê
de auditoria. A legislação ainda promoveu o aumento do nível de responsabilização de seus
principais executivos e das restrições a determinados tipos de serviço prestados por consul-
torias especializadas em auditoria para que não haja conflito de interesse (SILVEIRA, 2015).
A lei foi batizada com o nome de seus autores, o senador Paul Sarbanes
e o deputado federal Michael Oxley. Da junção dos dois sobrenomes
nasceu o termo Sarbanes-Oxley. Entretanto, é usual fazer referência à lei
de forma abreviada, com as expressões SOX ou Sarbox.
VOCÊ SABIA?
Embora inovadora, a lei também foi, ao mesmo tempo, considerada muito rígida, pois não
ficou restrita apenas aos administradores das empresas, ao contrário da legislação até
então existente. Como pretendia atingir um grande número de empresas ligadas à Bolsa de
Valores, ela estabeleceu penalidades severas aos infratores, desde regras básicas regulató-
rias do mercado de valores até mais complexas e elaboradas, tanto no aspecto pecuniário
quanto no penal.
Em boa medida, essa rigidez da Sarbanes-Oxley pode ser justificada como uma resposta
à altura do Estado americano à sua sociedade após a série de escândalos e fraudes contá-
beis e financeiras que envolveram também outras grandes corporações empresariais, além
da Enron. Como consequência desse período, os Estados Unidos sofreram um prejuízo de
bilhões de dólares que impactou em toda sua a economia e teve reflexos globais. Tais frau-
des acabaram descobertas porque os números disfarçados não conseguiam se manter por
muito tempo: as quantidades e valores apresentados nos balanços dessas empresas não
coincidiam com o dinheiro apresentado. E quando ele não existia, as fraudes passaram a
ser desmascaradas.
CAPÍTULO 3 59
Falência da Enron
Quando da sua falência, a Enron era uma das empresas onde os americanos mais deseja-
vam trabalhar por conta, especialmente, dos altos pagamentos de participação nos lucros
e resultados aos funcionários. Por esse e outros motivos, ela foi considerada, por diversas
vezes, a empresa mais admirada do mundo.
Sua ruína ocorreu por fraudes contábeis, após ficar comprovado, por meio de investiga-
ções de órgãos reguladores e do Congresso dos Estados Unidos, que a empresa manipulava
receitas bilionárias inexistentes, com base em um critério legal de contabilização chamado
de Marcação a Mercado (MaM)1, utilizado de forma não apropriada. Conforme divulgado
pela mídia, a empresa costumava lançar, de forma imediata, em seu balanço trimestral, os
lucros e potenciais benefícios que contratos recém celebrados teriam somente no futuro,
“ainda que fosse impossível de avaliar se esses ganhos realmente se materializariam dentro
de alguns anos (SANDRINI, 2013).
1 Marcação a Mercado (MaM) é uma atualização diária do preço de um ativo de renda fixa, que faz com que o
investidor saiba com antecedência quanto receberia se resgatasse os papéis que compõem sua carteira.
60 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Um ano após o início do processo que levou à falência da Enron, o Congresso norte-ame-
ricano aprovou a Lei Sarbanes-Oxley, mas estabeleceu um prazo de adaptação para as
empresas que seriam obrigadas à implantação de suas regras: aquelas que possuem sede
nos Estados Unidos estão praticando suas disposições desde 2006, enquanto as estrangei-
ras que estão listadas na Bolsa de Nova Iorque, desde 2007.
Além disso, não foram apenas as empresas listadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque
que sentiram os efeitos da SOX. Muitas empresas de capital estrangeiro ao redor do mundo
também passaram a adotar a cultura e os princípios da governança corporativa a partir da
aprovação da referida lei, uma vez que tal prática se propaga a partir da influência que a
legislação passa a ter no relacionamento das empresas com seus fornecedores e clientes e
nos códigos de conduta interna dos colaboradores. Uma companhia com sede nos Estados
Unidos e que está listada na Bolsa de Nova Iorque, por exemplo, é obrigada a praticar os
rígidos padrões de governança corporativa também nas operações que realiza no Brasil,
caso mantenha atuação no país por meio de uma subsidiária - mesmo que não publique
no Brasil os seus demonstrativos contáveis, nem esteja listada na BM&FBovespa e sujeita à
fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
De acordo com a Deloitte (2003), é possível afirmar que a lei Sarbanes-Oxley trasnscreve lite-
ralmente as regras de governança corporativa em seus dispositivos, principalmente aque-
las relacionadas à divulgação e emissão de relatórios. Por outro lado, os pontos que a lei
delimita o processo de alteração dos controles envolvem a definição de responsabilidades,
o estabelecimento de obrigações e normas para um bom compliance e accountability e as
sanções em caso de infração, que são os seguintes:
■■ Fixou de forma inquestionável a responsabilidade do diretor-presidente e do diretor
financeiro pelos controles internos da empresa. Antes, havia uma grande distância entre
o papel dos gestores e a responsabilidade da empresa, que ficava praticamente toda
para a pessoa jurídica, como se ela não fosse composta de pessoas físicas.
■■ Tornou obrigatória a guarda de arquivos de auditoria por cinco anos, sob pena de reclu-
são de até 10 anos e multa que pode chegar a até 5 milhões de dólares. Tal prática tor-
na-se necessária para resguardar executivos e equipes técnicas e também para que não
seja ocultado nenhum erro apontado pelas auditorias interna e externa.
62 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Além disso, a Bolsa de Nova Iorque também elaborou um conjunto de recomendações para
elevar a patamares mais altos as práticas de governança corporativa das empresas. Embora
não sejam obrigatórias, as companhias que as adotam ficam marcadas como aquelas que
prezam por padrões de governança corporativa superior - assim como no Brasil existe o
Novo Mercado, segmento de listagem mais alto, ou mais complexo, na B3.
■■ A remuneração dos membros do comitê de auditoria tem de ser a única forma de remu-
neração devida a eles pela companhia.
Comitê de auditoria
Uma das novidades introduzidas pela Lei Sarbanes-Oxley foi a obrigatoriedade da criação de
um comitê de auditoria. É de incumbência desse comitê supervisionar a forma como é feita
a administração dos processos de gestão de riscos e de avaliação e certificação da eficácia
dos controles internos da empresa, questões exigidas pelas diretrizes da Lei Sarbanes-Oxley.
No Brasil, boa parte das atribuições desse comitê é cumprida pelo conselho fiscal. A Security
Exchange Commission (SEC) – equivalente à CVM nos Estados Unidos –, facultou às empre-
sas brasileiras listadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque delegar aos seus conselhos fiscais
o desempenho, de forma cumulativa, das funções previstas na legislação norte-americana
e na brasileira.
■■ aprovar a contratação de serviços junto aos auditores externos, avaliando, com base
nas normas vigentes, se tais tarefas não comprometem a independência da auditoria
externa na execução regular da sua verificação das demonstrações contábeis.
Legislação brasileira
De acordo com Giublin (2016), no Brasil, a governança corporativa vem sendo identificada
como algo que ultrapassa a ideia de administração pura e simples realizada por uma com-
panhia, fazendo com que as obrigações dos administradores sejam maiores e consigam ir
além daquelas impostas pela legislação e materializadas no estatuto social. O mundo hoje
espera coerência e credibilidade de figuras públicas e seus líderes e, portanto, os adminis-
tradores precisam servir de exemplo para que as práticas de governança corporativa se
tornem atos naturais e não somente algo exigido por determinada legislação.
Segundo o IBGC (2017), considerando que as sociedades de economia mista (ou SEM) têm
alto risco de conflitos de interesse por contar com diferentes tipos de acionistas e envol-
verem o governo, é essencial pensar em uma melhor estrutura de governança corporativa
para as mesmas para que não estejam tão distantes das demais companhias listadas na
Bolsa brasileira.
CAPÍTULO 3 65
Após a edição da Lei das Sociedades por Ações, as S/A (Lei nº 6.404, de 1976), ampliaram-se os
instrumentos de fiscalização pelos acionistas e passou-se a conferir maior proteção aos mino-
ritários no decorrer do tempo, principalmente quando o Brasil começou a implementar práti-
cas associadas à governança corporativa. A introdução do Novo Mercado, segmento de lista-
gem diferenciado da Bolsa, por exemplo, fez com que o patamar de qualidade para empresas
de capital aberto fosse elevado e que novas e maiores obrigações fossem estabelecidas.
Em 2004, a administração pública, por meio da Lei das Parcerias Público-Privadas (Lei nº
11.079, de 2004), passou a contemplar algumas regras para fomentar a governança corpo-
rativa para além do universo das S/As, incluindo também, em seu escopo, orientações para
processo de licitação pública (BRASIL, 2004). Isso incentivaria, por exemplo, que governos
em diferentes instâncias passassem a adotar as boas práticas ao contratar fornecedores ou
fazer compras de produtos, otimizando o recurso obtido por meio da tributação junto às
empresas e cidadãos.
Depois disso, em 2005, a Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e de Falência (Lei nº 11.101)
também contribuiu para as boas práticas de empresas no que diz respeito à transparência,
um dos pilares da governança corporativa. A essência da referida legislação está relacionada
com a preservação da atividade empresarial na recuperação das empresas, uma vez que os
casos conhecidos de falências já demonstraram todo o impacto nefasto derivado disso, não
apenas para os funcionários, fornecedores e outros stakeholders ligados diretamente a elas,
mas também para toda a comunidade e a economia de um país.
Essa lei, junto a outras como Lei das Estatais e da Empresa Limpa, que serão estudadas mais
adiante, por exemplo, tem permitido acompanhar cada vez mais a evolução das empresas
brasileiras, principalmente no momento sociopolítico atual, que tem apresentado episódios
envolvendo governo, iniciativa privada e corrupção.
UNIDADE 2
LEI DA EMPRESA LIMPA OU LEI ANTICORRUPÇÃO
Por conta de todo o histórico de corrupção dos últimos anos envolvendo grandes empresas
brasileiras, o Brasil passou a ocupar o segundo lugar na lista dos países mais corruptos do
mundo em pesquisa apresentada em 2017 no Relatório de Competitividade Global e reali-
66 GOVERNANÇA CORPORATIVA
zada pela agência suíça International Institute for Management Development (MOREIRA, 2017).
Portanto, era essencial que houvesse uma lei para combater práticas de corrupção que esti-
vessem ligadas ao poder público e a funcionários do governo.
Em 2013, então, o Brasil formulou a chamada Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846), que entrou
em vigor em 2014 e cujo principal intuito é responsabilizar organizações e seus controlado-
res por qualquer prática que venha a causar dano à administração pública. “As companhias
passaram a responder nas esferas administrativa e civil por atos de corrupção e fraude em
licitações e contratos com o poder público” (IBGC, 2017).
Com a criação da referida lei é possível afirmar que houve avanços, como aqueles apon-
tados pela Controladoria-Geral (CGU) em junho de 2018 que dizia respeito à inovação, aos
incentivos aos mecanismos de integridade e à obrigatoriedade dos chamados cadastros anti-
corrupção, como o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS) e o Cadastro
Nacional de Empresas Punidas (CNEP).
No entanto, apesar das conquistas obtidas com sua implantação, poucas condenações
foram realizadas. Depois do resultado de 2017, e de mais ações da sociedade relacionadas
à Lei Anticorrupção, o Brasil registrou discreto crescimento no ranking do mesmo Relató-
rio Global de Competitividade e, em 2017/2018, ocupou a quarta colocação, mostrando já
algum amadurecimento institucional.
Todas as práticas defendidas pela lei aqui mencionada, e cobradas pela sociedade civil cada vez
mais engajada, permitem ao Brasil contar com ambiente mais propício à inovação e mudanças,
fundamental para a retomada do crescimento econômico e do desenvolvimento social.
Uma das alternativas que a Lei Anticorrupção estabeleceu ao Brasil para que avançasse na
política é o chamado acordo de leniência, celebrado entre a Secretaria de Desenvolvimento
Econômico (SDE) da União e autores de infração contra a ordem econômica. Por meio dessa
previsão da lei, o potencial infrator (aquele que, por exemplo, trabalha em uma empresa
que faça parte de algum inquérito administrativo ou criminal) pode colaborar com as inves-
tigações, apresentando novas provas para a condenação de outros possíveis envolvidos,
além dele próprio. Em contrapartida a essa colaboração, o infrator teria benefícios como a
extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de sua penalidade deter-
minada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).
Tal acordo é previsto nos artigos 16 e 17 da Lei nº. 12.846, de 2013, e muito se assemelha
ao instituto da delação premiada, previsto no Direito Processual Penal. O objetivo é funda-
mentar a condenação de membros de uma organização criminosa que tenham lesado os
cofres públicos (PACTO GLOBAL, 2015). A diferença básica entre os dois instrumentos é que
o acordo de leniência se dá na esfera Executiva do governo e a delação premiada ocorre via
Poder Judiciário aliado ao Ministério Público da União.
Segundo o Pacto Global (2015), buscas e apreensões têm sido realizadas em diversas
empresas por meio de informações obtidas por meio de um acordo de leniência. Algumas
instituições buscam celebrá-lo com o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da
União, por atos de corrupção praticados por funcionários para manter seus contratos com
o governo federal.
O engajamento da alta liderança é, aliás, outro ponto considerado crucial para ajudar na
redução de casos de corrupção e más práticas empresariais. Esse aspecto, na verdade, deve
ser considerado prioritário e talvez o mais importante pilar para programas juridicamente
eficazes de conformidade ou compliance, um dos valores da governança corporativa. Por
essa razão, é tão importante o papel do Conselho de Administração de uma empresa, que
representa os interesses dos acionistas. “O conselho é responsável por determinar a natu-
reza e a extensão de riscos significativos que está disposto a assumir para atingir seus obje-
tivos estratégicos. O conselho deve manter sólidos sistemas de controle interno e gestão de
risco” (PACTO GLOBAL, 2015).
A Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527, de 2011), por sua vez, também não deixa de
ser uma iniciativa de apoio aos temas da anticorrupção, pelo simples fato de fortalecer o
sentido da transparência, outro valor essencial da governança corporativa (BRASIL, 2011).
No entanto, antes ainda da criação das leis voltadas para o poder público, o setor privado,
principalmente as grandes empresas, já apresentavam maior preocupação e entendimento
sobre como trabalhar para criar e/ou manter uma cultura de integridade. As empresas con-
tavam com formas de mensurar resultados de algumas práticas.
O Pacto Global, iniciativa das Nações Unidas voltada ao fomento de políticas de responsabili-
dade social corporativa e sustentabilidade junto a empresas, preparou um guia de avaliação
de risco de corrupção que mapeia riscos, como suborno de autoridades fiscais, suborno
para obter permissões de varejo, manipulação de propostas pelo fornecedor e propinas
para pedidos de vendas, e mensura sua probabilidade e impacto possível. Além disso, dos
16 passos sugeridos pelo Pacto Global (2015) para se atingir perfeito compliance nos negó-
cios, o de número 15 afirma a importância de se monitorar o programa de integridade de
forma contínua.
No processo de avaliação de riscos, a escolha e o design dos mapas de riscos são também
mais eficientes se forem criados em consulta com vários níveis de gestão e partes relacio-
nadas relevantes de diferentes funções, locais e unidades de negócios. Deve-se ressaltar
também que os riscos aos quais a empresa estiver exposta mudam com o tempo e, por isso,
é importante atualizar os mapas de riscos periodicamente para entender as questões mais
pertinentes de forma pontual. Obviamente, para fazer isso, a organização precisa dispor
de bastante informação, compilando um Mapa de Riscos a partir de um volume grande de
dados. Assim é possível criar categorias de corrupção específicas criando diferentes níveis
de mensuração para então classificar os controles e o risco inerente (PACTO GLOBAL, 2013).
Para a avaliação de risco, é sugerido um processo de seis etapas (PACTO GLOBAL, 2013):
2. identificação de riscos;
O tema da gestão de riscos é relativamente recente no Brasil, mas é possível acreditar que
toda a gestão de conhecimento realizada pelas instituições brasileiras nesse sentido irá
apoiar bastante o crescimento de nosso país, fazendo com que voltemos a despertar maior
interesse de investidores de uma forma geral.
UNIDADE 3
LEI DAS ESTATAIS OU LEI DE RESPONSABILIDADE DAS ESTATAIS
Como forma de garantir lisura das empresas que contam com dinheiro público em seu capi-
tal social, associada à ética e boas práticas de governança corporativa, criou-se em 2016 a
chamada Lei das Estatais ou de Responsabilidade das Estatais (Lei nº 13.303), que trata do
estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias.
Tal normativa é regulamentada pelo artigo 10 do Decreto nº 8.956 do mesmo ano, que deter-
mina que as sociedades de economia mista devem se apresentar como sociedade anônima
sendo submetidas assim à Lei das S/As. Especialistas em governança corporativa afirmam
que não seria necessária uma legislação específica caso o que já está previsto pela Lei das S/
As fosse efetivamente cumprido (VALOR, 2018).
70 GOVERNANÇA CORPORATIVA
No entanto, existem diferenças entre as duas leis (S/A e estatais) dada a natureza diferen-
ciada das sociedades de economia mista ou estatais. Tais distinções se relacionam com:
No texto referente à Lei das Estatais, as menções à governança corporativa têm relação com:
■■ a política de participações societárias proporcionais à relevância, materialidade e riscos
do negócio;
Segundo Giublin (2016), o que se pretende com a implementação de novas regras de gover-
nança por meio da Lei das Estatais é a profissionalização dos envolvidos, por meio das deci-
sões a serem tomadas pela Diretoria e pelo Conselho de Administração das empresas públicas
e de economia mista. Espera-se também que tais decisões sejam tomadas da forma mais ética
e transparente possível, sem deixar de lado a preocupação com bom resultado financeiro.
A vigência da Lei das Estatais começa a contar a partir de 1º de julho de 2016. Seu artigo 91
amplia o prazo de adaptação à lei para empresas públicas e sociedades de economia mista
para 24 meses, prazo este também necessário à adaptação às novas leis de licitações e con-
tratos das estatais (NOHARA, 2016). Sendo assim, a lei passa a valer em toda sua efetividade
a partir de julho de 2018. No entanto, tem havido tentativas de se burlar o que foi deter-
minado pela lei após passado o período de dois anos. O principal intuito da lei das estatais
era impedir a indicação de dirigentes por políticos, mas após 11 dias de vigência efetiva, o
Congresso propôs veto a essa regra (VALOR, 2018).
PENSAR negocios-estatais-ainda-descumprem-nova-lei.html
Também conforme Nohara (2016), “o Estatuto das Estatais e de suas subsidiárias procurou
ser estabelecido, de acordo com o art. 6º da lei, em observância às regras de governança
corporativa”.
Na Lei das Estatais está prevista a criação de um “código de conduta e integridade” interno,
que deverá, entre outras coisas, tratar expressamente sobre a vedação de atos de corrup-
ção e fraude. A lei também prevê o estabelecimento de “canal de denúncias” voltado para o
público interno e externo.
Por conta dos escândalos de corrupção envolvendo diferentes setores e esferas, houve um
aumento na demanda por seguro de responsabilidade civil para administradores e gestores,
também chamado de Seguro D&O (Directors and Officers). Esse procedimento protege também
todos os diretamente envolvidos com a administração da empresa, incluindo diretores esta-
tutários e não estatutários, membros do conselho de administração, membros do conselho
72 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Esse tipo de seguro, no entanto, não conta com cobertura no caso de negociação de ações
feita com informações privilegiadas, prática conhecida no mercado como insider trading3,
segundo informa o STJ (2017).
NA PRÁTICA
Nota-se também que a importante mudança que contempla as exigências necessárias para
que se ocupe um cargo no Conselho de Administração das Empresas Públicas e Sociedades
de Economia Mista e os cargos de direção. Dessa forma, não serão mais permitidas nome-
ações por apadrinhamento ou de indivíduos que não contem com a qualificação técnica
inerente ao cargo. A empresa pública e a sociedade de economia mista deverão criar um
comitê para verificar a conformidade do processo de indicação para o Conselho de Adminis-
tração e para o Conselho Fiscal.
O artigo 23 da Instrução Normativa Conjunta CGU/MP nº. 001, de 10 de maio de 2016, afirma
que o Poder Executivo Federal deve contar com comitê de governança, riscos e controles. As
estatais federais devem implementar políticas de conformidade e gerenciamento de riscos
adequadas ao seu porte e consistentes com a natureza, complexidade e risco das operações
por elas realizadas (CGU, 2016).
De acordo com Silveira (2010), o Brasil ainda apresenta um grande diferencial em sua com-
petitividade e eficiência tendo em vista que as empresas sob controle estatal (ECE) represen-
tavam 22,8% da composição do Ibovespa no início da atual década, por exemplo.
2 O gerente ou gestor de riscos é responsável pelo processo sistemático de planejamento estratégico dentro das
empresas com o objetivo de identificar, analisar e responder aos riscos aos quais podem estar expostas.
3 Uso indevido de informação privilegiada de uma empresa para obter vantagens no mercado.
CAPÍTULO 3 73
Nosso mercado de capitais também tem avançado bastante e agora é possível encontrar
mais informação e serviços destinados a empresas estatais.
Por conta de questões políticas associadas a empresas dessa natureza e a crise instaurada
no Brasil nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais necessárias ações que possam
contribuir para o restabelecimento da confiança entre investidores e estatais, notadamente
para reduzir incertezas e para fomentar a melhor divulgação de informações, pensando
sempre no interesse público e seus limites.
Como na adesão aos segmentos de listagem diferenciados da Bolsa, a adesão a esse Pro-
grama é voluntária e, para a obtenção da habilitação para tal, as empresas devem atender
às medidas de governança corporativa requeridas pela B3.
Após a promulgação da Lei 13.303/16 (BRASIL, 2016), que estabeleceu o estatuto jurídico
das empresas estatais, a B3 teve o cuidado de alinhar as indicações de seu texto com o Pro-
grama pré-existente após discussões com companhias e demais agentes do mercado.
TRANSPARÊNCIA
CONTROLES INTERNOS
COMPOSIÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO
Governo e Transparência
É importante que o Governo dê respaldo e ferramentas para que suas determinações pos-
sam ser cumpridas. Dessa forma, o poder público no Brasil tem se implicado mais em ações
voltadas para a governança corporativa em empresas que contam com capital da União.
Com relação à divulgação de informações, o IBGC (2015) afirma que os administradores das
SEMs devem dar transparência e ampla divulgação às informações de interesse da popula-
ção, nos termos da Lei de Acesso à Informação e à regulamentação emitida pela CVM.
O IBGC (2015) também destaca a importância da lealdade dos administradores que não
podem se beneficiar pelo acesso a informações sigilosas. Algo que deve ser considerado é o
cuidado com a divulgação de informações pelos colaboradores de estatais para que não haja
desequilíbrio e/ou inexatidão entre o que acionistas e investidores de uma forma geral sabem.
Apesar dos avanços previstos nas leis que vêm surgindo para garantir boas práticas na
governança corporativa de empresas, principalmente estatais, e da relativa simplicidade
para se adequar ao que elas determinam, a compreensão delas pode contar com diferentes
percepções. Tal fato pode fazer com que sofram ajustes no curto e/ou médio prazo, con-
forme o que diz Ferraz (2017) sobre o entendimento que existia quando a Lei 13.303/2016
foi criada. Não estava claro, por exemplo, o alcance da exigência dos requisitos de ingresso
na administração das empresas participadas. Assim, a CVM terminou por utilizar interpre-
tação mais ampla depois do Decreto 8.945/16, que uniformizava seu entendimento pelo
menos no âmbito do Poder Executivo Federal.
Dessa forma, acredita-se que após a implementação total da lei das estatais, a partir do
segundo semestre de 2018, as SEM terão seu processo de amadurecimento institucional
fortalecido, tornando-as ainda mais competitivas principalmente quando comparadas às
empresas privadas de capital aberto.
Resumo
No Capítulo 3 falamos sobre a Lei Sarbanes-Oxley (“SOX” ou “Sarbox”), de 2002, que definiu
uma nova série de obrigações para as empresas listadas na bolsa de valores americana
(mesmo que de origem estrangeira). O objetivo macro é a precisão dos demonstrativos
financeiros (contábeis).
Para atingir esse objetivo geral, foi estabelecida uma série de obrigações para as empresas,
seus administradores e funcionários. Tais obrigações afetam também auditores, advogados,
investidores, analistas de mercado, jornalistas e qualquer pessoa que tenha relevância, de
forma direta ou indireta, com a preparação e a divulgação de demonstrativos contábeis.
A legislação inovou por extrapolar seu alcance para além dos dirigentes das empresas e das
instituições financeiras, diferentemente do que ocorria durante vigência da legislação ante-
rior. Na SOX, foram estabelecidas penalidades severas, tanto no aspecto monetário quanto
no penal, para as irregularidades e os crimes cometidos no mercado financeiro e de capitais.
Foi criada a obrigatoriedade da instituição de um comitê de auditoria – a fim de supervisionar
as práticas de auditoria e ser responsável por elas – e de as empresas terem códigos de ética.
No Brasil, temos observado avanços que mostram a importância de regulação para apoiar
as empresas de diferentes setores a incorporarem as boas práticas de governança corpo-
rativa em seus negócios. Duas leis criadas no início do século XXI, Lei Anticorrupção e das
Estatais, garantem a preocupação de se investir em governança corporativa em qualquer
empresa, e não só nas privadas, e de se garantir ética e confiabilidade para o mercado.
CAPÍTULO 4 77
Capítulo 4
GOVERNANÇA DA
GOVERNANÇA CORPORATIVA
78 GOVERNANÇA CORPORATIVA
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS DO CAPÍTULO
Para melhor compreensão das questões que envolvem a governança corporativa, este
capítulo está dividido em:
Unidade 4 – Agronegócio
UNIDADE 1
ÓRGÃOS SOCIAIS
Órgãos sociais de uma empresa nada mais são do que a assembleia geral (composta pelos
acionistas), o conselho de administração, a diretoria, o conselho fiscal e, eventualmente, o
comitê de auditoria. O funcionamento deles é vital para a governança corporativa de uma
organização. Afinal, é por meio de suas ações e de sua integração que as boas práticas
podem ser efetivamente implementadas e boa parte dos stakeholders têm conhecimento do
que acontece nos negócios.
Dois desses órgãos sociais, a assembleia geral e o conselho fiscal, serão tratados nessa uni-
dade. Já a administração das organizações e o importante órgão social intitulado conselho
de administração, sua contraposição e complementariedade à diretoria, serão o tema da
próxima. A figura a seguir mostra esse sistema, proposto pelo Código das Melhores Práticas
de Governança Corporativa do IBGC (2015):
Sócios
Secretaria de
Auditoria Governança
Interna
C. Auditoria Comitês
Diretor-
-Presidente
Diretores
Administradores
Assembleia geral
A assembleia geral de acionistas, ou sócios, é a instância máxima decisória de uma socie-
dade empresária. Trata-se, basicamente, de uma reunião formal, em que eles comparecem
para votar, quando for o caso, e para expressar sua vontade e expectativas com a compa-
nhia. Os assuntos que costumam ser deliberados em colegiado versam sobre temas que vão
desde branding1 a investimentos financeiros, contemplando os interesses dos shareholders,
investidores familiares ou institucionais e fazendo valer também o engajamento pregado
por Monks - que defendia a participação ativa dos acionistas de companhias abertas em sua
gestão e tomada de decisões.
■■ Devem ser realizadas uma vez por ano, ■■ Não há frequência definida. Serão rea-
nos primeiros quatro meses. lizadas quando houver algum assunto
urgente ou extraordinário para ser
deliberado.
Deliberações: Deliberações:
■■ São tomadas as prestações de contas ■■ São debatidos e definidos quaisquer
dos administradores assuntos que sejam relevantes e de inte-
resse da sociedade e que caibam aos
■■ São analisadas e aprovadas, ou não, acionistas na condição de proprietários.
as demonstrações contábeis, o orça-
mento de capital e a remuneração dos
administradores
Para a realização da assembleia em si, indica-se um presidente que irá comandar os traba-
lhos do dia, escolhido entre os próprios acionistas ou seus representantes (executivos que
representam seus interesses, por exemplo). A escolha do presidente da assembleia pode
ocorrer uma única vez e se repetir durante todas as outras, ou, então, no início da sessão
de cada encontro. Além disso, tudo que for debatido e definido deve ser registrado em ata,
a ser elaborada durante a reunião e concluída após sua realização. Tal documento deve,
posteriormente, ser enviado à Comissão de Valores Mobiliários e à Bolsa de Valores de São
Paulo (B3) e registrado na Junta Comercial, já que a CVM é a instância que regula o mercado
de valores mobiliários e precisa estar a par do que é deliberado em cada assembleia e a
B3, como local de venda de ações a potenciais investidores (Balcão), deve ter o máximo de
informações possíveis sobre os negócios das companhias listadas para garantir segurança
na realização de novos investimentos.
Conselho fiscal
De acordo com a lei das S/A, em seu art. 163, o papel do conselho fiscal é de fiscalizar as
ações dos gestores de companhias abertas e zelar pelo cumprimento de todas as práticas
relacionadas a compliance e accountability, protegendo os negócios e seus acionistas. Para
Romano (2016, s./p.) “o conselho fiscal é órgão considerado obrigatório de uma sociedade
anônima. Porém, seu funcionamento é facultativo, ou seja, se os acionistas consideram des-
necessário o seu funcionamento, o órgão fica desativado”.
CAPÍTULO 4 83
O conselho fiscal é um órgão independente e, por isso, seus membros não estão vinculados
à instituição. O seu estatuto social, por sua vez, disporá sobre seu funcionamento de modo
permanente ou nos exercícios sociais em que for instalado a pedido dos acionistas. Ele é
composto de, no mínimo, três membros e, no máximo, cinco, todos eles eleitos pela assem-
bleia geral. Quando o conselho fiscal for não permanente, será instalado pela assembleia
geral a pedido de quaisquer acionistas que alcancem 10% das ações com direito a voto e 5%
das ações sem direito a voto.
O mandato do conselheiro fiscal vai de uma assembleia geral ordinária até a seguinte e o
ocupante pode ser reeleito. Não podem ser eleitos para o cargo de conselheiro fiscal os
membros dos órgãos da administração e os empregados da companhia, de sociedade con-
trolada ou do mesmo grupo, e nem o cônjuge ou parente, até terceiro grau, do administra-
dor da companhia.
VOCÊ SABIA?
■■ denunciar, por meio de qualquer um dos seus membros, aos órgãos de administração
– e, se estes não tomarem as providências necessárias para a proteção dos interesses
da companhia, à assembleia geral – os erros, as fraudes ou os crimes que venham a ser
descobertos e sugerir providências úteis à empresa;
84 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Já a remuneração do conselho fiscal será estabelecida de acordo com o valor total pago aos
executivos da empresa, mantendo proporcionalidade justa e igualitária, na medida do pos-
sível. Isso inclui aquilo que foi recebido pelos gestores em outras organizações do mesmo
grupo, o que deve estar adequada à dedicação de tempo esperada de cada membro, à
complexidade dos negócios da organização, à experiência e à qualificação necessárias ao
exercício da função (IBGC, 2015). Além disso, todas as despesas que eles tiverem com o
desempenho de sua função deverão ser reembolsadas pela empresa.
UNIDADE 2
ADMINISTRAÇÃO DA COMPANHIA – CONSELHO DE
ADMINISTRAÇÃO E DIRETORIA
A administração de uma empresa precisa contar com duas frentes importantes: o conse-
lho de administração e a diretoria. Esses dois órgãos sociais são responsáveis por toda a
gestão de uma companhia e, portanto, devem estar alinhados entre si para que o negócio
seja bem-sucedido e para que as boas práticas de governança corporativa possam fazer
parte de sua realidade. Enquanto o conselho de administração envolve investidores e acio-
nistas, a diretoria diz respeito à operação rotineira, executada por todos os colaboradores
de uma empresa.
CAPÍTULO 4 85
Conselho de administração
O conselho de administração é o órgão que faz a ligação entre as decisões dos acionistas e
os gestores da sociedade. O IBGC (2015) o define como um guardião do processo de decisão
de uma empresa em relação ao seu direcionamento estratégico.
O conselho de administração é eleito pela assembleia geral de acionistas e pode ser com-
posto por três tipos de conselheiros:
■■ Internos – diretores ou empregados da administração.
O IBGC (2015) recomenda um número ímpar de conselheiros, que pode variar entre cinco
e onze, como forma de evitar o empate durante as deliberações. Esse número, no entanto,
muda conforme o setor de atuação, porte, complexidade das atividades, estágio do ciclo de
vida da organização e necessidade de criação de comitês (IBGC, 2015).
86 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Nas empresas de capital fechado ou limitadas, as funções realizadas pelo conselho adminis-
tração, quando ele não existir, podem vir a ser exercidas por um conselho consultivo, uma
espécie de instância transitória que promove a evolução das práticas de governança corpo-
rativa até que um conselho de administração convencional seja eleito.
Para cumprir com sua missão, o conselho de administração tem uma série de ações a serem
desenvolvidas, que variam desde a definição de propósito, princípios e valores da organiza-
ção até o monitoramento do desempenho financeiro e operacional e da atuação da direto-
ria. Em razão de todas essas funções, o conselho deve possuir um regimento interno capaz
de disciplinar seu funcionamento e garantir que sua atuação esteja de acordo com o esta-
belecido no estatuto/contrato social. Esse regimento é importante também para formalizar
os processos de funcionamento desse órgão social fomentando as práticas de governança.
Nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais forte a cobrança da sociedade e das insti-
tuições de promoção de igualdade e justiça social para que as empresas apresentam mais
diversidade e heterogeneidade nos conselhos de administração. Essa seria uma forma
de garantir que o máximo de interesses seja considerado sem privilégio a nenhum grupo
ou indivíduo específicos. Uma das ações estimuladas principalmente pelo IBGC é a inclu-
são de mulheres, não só em posições de alta liderança na empresa, mas também como
membros de conselhos de administração. Em 2018, o IBGC junto com a International Finance
Corporation (IFC) e o Women Corporate Directors (WCD) organizou, por meio do seu grupo
Diversidade em Conselho, uma convocatória para que executivas se candidatassem a um
programa de mentoria que prepara mulheres para inclusão e potencial participação delas
em conselhos administrativos. Isso vem sendo realizado desde 2015 a exemplo do que
também já ocorre em programas internacionais (IBGC, 2015b).
Por fim, a remuneração dos conselheiros considera as qualificações e o valor agregado que
sua presença gera de valor para a organização, além dos potenciais riscos da atividade. O
IBGC recomenda que a remuneração não seja feita de acordo com a participação em reu-
nião (jeton). O mais indicado é que o valor fixo mensal pago a cada conselheiro seja igual a
todos eles.
Diretoria
Conforme apresentado pelo IBGC (2015), a diretoria é o órgão que se encarrega da gestão
da organização. Seu principal intuito é garantir que seu objeto e sua função social sejam
cumpridos de forma adequada. A diretoria é responsável pela execução da estratégia e dire-
trizes gerais aprovadas pelo conselho de administração, gerindo os ativos da empresa e
CAPÍTULO 4 87
liderando seus negócios. Por meio de processos e políticas formalizados, a diretoria viabiliza
e dissemina os propósitos, princípios e valores da organização.
A diretoria deve ser composta por membros indicados pelo diretor-presidente, aprovados
por meio de eleição e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho de administração ou,
em sua falta, pela assembleia geral na figura de seus sócios. O estatuto de cada sociedade
deverá estabelecer os números máximo e mínimo permitidos de diretores, o modo de subs-
tituição e o mandato. O estatuto também deve dispor sobre as atribuições de cada diretor e
que determinadas matérias sejam decididas em reunião de diretoria.
UNIDADE 3
EMPRESAS FAMILIARES
Nas empresas familiares, por exemplo, o conselho de administração pode ser um dos agen-
tes catalisadores para a criação de riquezas, se considerada a possibilidade de se traba-
lhar com mais foco estratégico e com governança mais profissional e independente. Muitas
empresas, devido a suas características, tamanho, faturamento e propriedade, buscaram
outras formas de se estruturar por meio do conselho de família, conselho superior ou con-
selho de sócios em lugar do conselho de administração, algo muitas vezes encarado como
formal ou necessário apenas para grandes companhias de capital aberto. Se a empresa, no
entanto, possuir uma estrutura familiar mais complexa e tiver um porte médio ou grande,
a instituição de um conselho de administração pode ser fundamental para alavancar outras
práticas de governança corporativa mais qualificada (BORNHOLDT, 2004).
No entanto, para empresas familiares, o desafio de adotar tais práticas, voltadas principal-
mente para o desenvolvimento da governança corporativa, é ainda maior por conta do per-
sonalismo e das relações pessoais envolvidas, em maior ou menor medida, em sua gestão.
Silveira (2015) chama atenção para os seguintes riscos envolvidos em negócios familiares:
88 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Algo para o qual se deve atentar é o fato de a maior parte das S/A no Brasil possuir grandes
percentuais de suas ações concentradas nas mãos de poucos grupos e não tantos fundos de
investimento, por exemplo. A experiência mostra que, muitas das vezes, esses poucos gru-
pos são na verdade as famílias que fundaram as empresas e que acham que podem ainda
ter todo o controle sobre o negócio, mesmo com capital aberto.
Sendo assim, a chance de conflitos de interesse é ainda maior porque tais grupos tendem a
priorizar seus objetivos em detrimento dos demais investidores minoritários.
Apesar dessas dificuldades, há também vantagens que podem ser exploradas em empre-
sas familiares quando o assunto é governança corporativa. Silveira (2015) destaca a maior
possibilidade de convergência entre alta gestão e acionistas, maior comprometimento
dos executivos familiares tendo em vista a defesa de seus próprios interesses, maior
facilidade de pensar considerando ações de mais longo prazo, com vistas ao desenvolvi-
mento mais sustentável e perene preocupado com as futuras gerações e mais rapidez na
tomada de decisão.
CAPÍTULO 4 89
Para apoiar esse tipo de organização com relação à implementação de órgãos sociais e
desenvolvimento de boas práticas de governança, Silveira (2015) sugere que devam existir
diferentes fóruns considerando a natureza específica de cada questão, ou seja, um órgão de
governança para cada estrutura de poder:
■■ conselho de família para a esfera familiar
Em casos de empresas com forte cultura familiar, ainda que com capital aberto, o conselho
de família será criado a partir de acordo celebrado entre os acionistas. Deve-se garantir a
representatividade de todos os ramos familiares, sugerindo-se um número máximo de 10
membros para que as reuniões sejam produtivas, entre outras coisas. No mais, o conselho
de família segue todas as formalidades como qualquer outro órgão social.
O IBGC (2006) desenvolveu pesquisa com empresas de administração familiar que derivou
na publicação de um livro - Governança corporativa em empresas de controle familiar: casos
de destaque no Brasil - que apresenta cases bem-sucedidos de gestão desse tipo de organi-
zação após adotarem boas práticas de governança corporativa.
A instituição lista nesse material as diferentes motivações de empresas com esse perfil para
seguirem assim. Todas na verdade convergem para assegurar cada vez mais alto nível de
profissionalização e competitividade (apud SILVEIRA, 2010, p. 307).
Quanto aos benefícios externos citados pelas empresas pesquisadas, nota-se que há maior
geração de valor para potenciais investidores externos, além de maior credibilidade e
reputação.
Ao falarmos de reputação, não podemos deixar de lembrar que nos últimos anos, várias
empresas familiares brasileiras, de capital aberto, estiveram envolvidas em escândalos de
corrupção (Gerdau, Odebrecht e outras). Por conta disso, muito tem sido feito para que esse
tipo de situação seja cada vez mais isolado.
90 GOVERNANÇA CORPORATIVA
UNIDADE 4
AGRONEGÓCIO
O agronegócio brasileiro tem fortes chances de se tornar o maior produtor mundial de ali-
mentos. Isso se deve, entre outras coisas, à extensão de nosso território, com clima favo-
rável ao desenvolvimento de diferentes culturas, além de boa disponibilidade de acesso à
água de uma forma geral.
Porém, temos ainda dilemas difíceis de serem contornados, como o desmatamento ilegal
que é bastante superior às boas práticas certificadas (reflorestamento de áreas degradadas,
por exemplo), e questões associadas a regulação que deixam muitos brasileiros desconfor-
táveis, como o caso do “PL do Veneno”, discutido no primeiro semestre de 2018, por conta
da aparente liberação excessiva de uso de agrotóxicos em nossa produção de alimentos.
2 Hashtag (representada pelo símbolo #) é aquilo que as pessoas geralmente utilizam para identificar o tema
do conteúdo que estão compartilhando nas redes sociais. É associada a um hiperlink que direciona a pesquisa
para todas as pessoas que também marcaram os seus conteúdos usando a mesma #.
CAPÍTULO 4 91
período de tempo, depois que a Polícia Federal deflagrou a chamada Operação Carne Fraca,
que apontou 21 frigoríficos acusados de pagarem propina a fiscais sanitários. Na mesma
época, outro escândalo de corrupção, envolvendo outra empresa do mesmo setor, também
veio à tona. A JBS, que buscava incentivos fiscais por meio de propinas pagas a políticos para
obtenção de recursos via BNDES e de investimento via fundos de pensão, viu a sua alta lide-
rança ir parar na prisão.
Nada pode ser tão nefasto para um negócio quanto o envolvimento em situações como
essas, que a perder reputação, credibilidade e dinheiro. E não só ele. O Brasil inteiro sofreu
prejuízos internacionais de grande vulto por conta da Operação Carne Fraca, que levou
diversos outros países a embargar a carne brasileira.
Empresas rurais familiares têm buscado ampliar sua atuação em outros nichos, conside-
rando, especialmente, a falta de espaço interno para crescimento e a possibilidade de cres-
cimento de produtividade. No entanto, para que isso se concretize, com maior espaço fora
do Brasil e com mais destaque junto ao mercado já existente, essas famílias precisarão aper-
feiçoar a gestão de seus negócios com cada vez mais profissionalização.
Quando recebemos notícias relacionadas à forma de produção agrícola, por exemplo, existe
a preocupação desde o tipo de fertilizante adotado até a origem da água e outras técnicas
de irrigação. A visibilidade que se dá para esse tipo de assunto só cresce, principalmente
devido ao interesse que as pessoas têm adquirido por formas mais saudáveis de vida, com
maior qualidade, mas também por preocupação das mesmas com a lisura dos atos de todos
os envolvidos na produção agropecuária.
É possível notar, aqui, como tudo é integrado e, por isso, como é importante, mais uma vez,
garantir adoção de boas práticas. No caso do setor agropecuário, os cuidados devem ser
sempre maiores. A Monsanto, empresa global, com representação e operação também no
Brasil, é uma das instituições que sofre por decisões mal tomadas no passado. Em matéria
publicada em 2018, afirma-se que a empresa vem sendo julgada por ambientalistas, acadê-
micos e também pelos agricultores. Estes últimos alegando sofrerem prejuízo pelo monopó-
lio no fornecimento de sementes com mutação genética. “A empresa é alvo de críticas por
parte de ambientalistas, que questionam a segurança de seus transgênicos e defensivos;
por acadêmicos, que dizem que a companhia distorce pesquisas científicas” (GAZETA DO
POVO, 2018).
Por conta do passivo criado por esses problemas, envolvendo distintos stakeholders, a
empresa após ser adquirida pela Bayer, que também enfrenta desgastes de imagem asso-
ciados à própria marca, deixará de usar o nome Monsanto como uma das estratégias para
melhora de sua imagem e consequente valorização de seus ativos junto a produtores, con-
sumidores e sociedade em geral.
Para assegurar ações corretas nesse setor e melhorar a visibilidade brasileira junto ao cená-
rio internacional, o governo brasileiro adotou uma medida no fim de 2017 almejando maior
transparência e ética: o Programa Agro+ Integridade. A intenção do projeto é incentivar boas
práticas na produção e relacionamento institucional do agronegócio.
CAPÍTULO 4 93
UNIDADE 4
ALIANÇAS COM A SOCIEDADE CIVIL
Segundo a Organização dos Estados Americanos (OEA), a sociedade civil é constituída por
instituições voluntárias, cívicas e sociais e outras organizações que dão base a uma socie-
dade em funcionamento que servem como mecanismos de articulação e oposição às estru-
turas apoiadas pela força de um Estado.
É cada vez maior a necessidade das empresas se unirem entre si ou com outras instituições
representativas de classe ou de desenvolvimento sustentável para contribuir com a solução
de problemas que não sejam só seus, mas também do todo e em diferentes esferas. Essas
instituições de classe, ou defensoras de pautas específicas, nada mais são do que represen-
tantes da sociedade civil já que não são governo nem setor produtivo.
Por conta da escassez de recursos das mais variadas espécies e das dificuldades inerentes a
um mundo que muda o tempo todo, as instituições podem se beneficiar da possibilidade de
agirem em conjunto. Empresas como a Coca-Cola e a AMBEV têm começado a atuar juntas
para solucionar problemas comuns como a logística reversa de garrafas pet, por exemplo.
No entanto, nem sempre é possível esse tipo de aliança empresarial, ou é melhor buscar
esse tipo de união utilizando algum representante da sociedade civil que possa ser cataliza-
dor desse relacionamento, como uma ONG que pode ser especialista em logística reversa
ou economia circular por exemplo, que pode apoiar as empresas no desenvolvimento de
melhores soluções para o descarte das garrafas plásticas.
Para Oliveira e Biderman (2013), promover alianças é importante para influenciar poten-
ciais políticas públicas, considerando a chance de que sejam desenvolvidas soluções para
3 Expressão originária do inglês, bottom line significa a última linha do balanço social, a demonstração de resul-
tados. Mostra, também, como se pode migrar de uma visão de curto prazo, de resultados trimestrais, para uma
visão de mais longo e médio prazos.
94 GOVERNANÇA CORPORATIVA
problemas comuns que podem ser escaláveis. Esse tipo de preocupação mostra não só o
desprendimento relacionado ao fato de que é melhor ter mais “cabeças” envolvidas para
tomadas de decisão mais assertivas e heterogêneas, garantindo maior riqueza e criatividade
em seu escopo, mas também adequação ao estado cada vez mais restritivo quando falamos
de recursos - naturais, financeiros e humanos. Alianças “diminuem custos de transação, pro-
movem o aprendizado coletivo e a troca de boas práticas, ajudam a divulgar tecnologias e a
oferecer boa escala para ações de mudança” (OLIVEIRA e BIDERMAN, 2013, p. 149).
Em prol de um planeta mais justo, com organizações mais éticas e comprometidas com a
sociedade e com o impacto futuro de suas ações no presente, a governança corporativa
deve se aliar cada vez mais fortemente a assuntos que não necessariamente dialoguem com
o “core business4” das organizações.
As empresas devem considerar em seus negócios o conceito de triple bottom line, que res-
peita o tripé ambiental, social e econômico, pensando especialmente em ações que promo-
vam o retorno à sociedade do que aquelas vêm recebendo da mesma em forma de lucro.
4 Parte central, ou núcleo, de um negócio. Pode habitualmente também determinar o ponto forte e estratégico
da atuação de uma determinada empresa.
CAPÍTULO 4 95
Espalhadas pelo mundo existem diversas instituições sem fins lucrativos que já atuam nesse
sentido e discutem muitas pautas específicas:
■■ Corrupção – IBGC, Pacto Global, Instituto Ethos
Duas delas têm foco em desenvolvimento sustentável e reúnem grandes empresas de dife-
rentes setores que juntas buscam soluções para diversas problemáticas relacionadas a sus-
tentabilidade que possam ser replicadas por outros setores, empresas de diferentes tama-
nhos e inclusive e principalmente pelo poder público:
A World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), primeira instituição criada no
mundo com foco em desenvolvimento sustentável como estratégia de grandes empresas, e
o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), com repre-
sentação no Brasil, foram as instituições que prepararam o primeiro relatório de sustenta-
bilidade empresarial no país.
Criou-se, assim, a Fundação Renova, que busca gerir e executar medidas socioeconômicas
e socioambientais por meio de assistência social aos moradores da região impactada pelo
rompimento da barragem em Mariana.
As empresas precisam desenvolver cada vez mais sua responsabilidade com relação à socie-
dade, devolvendo a elas parte de seus ganhos. Assim, cumpre-se mais facilmente o que é
esperado como boas práticas de governança corporativa onde todos ganham.
96 GOVERNANÇA CORPORATIVA
Resumo
Neste capítulo tivemos a oportunidade de ver os meandros da governança corporativa, seja
na forma de organizar administrativamente as empresas, considerando a alta liderança,
mas também de conhecer os mecanismos de controle exercidos pelas diferentes instâncias
destinadas a esse fim: auditoria, conselho fiscal, comitês.
Tratamos também sobre como boas práticas de governança corporativa podem fazer a dife-
rença em empresas de capital fechado, ou também familiares. Muitas dessas organizações
são facilmente encontradas em nosso país dentro do setor agropecuário. Nos últimos anos,
e considerando os desafios relacionados à sua agenda, o setor vem sofrendo uma série de
mudanças derivadas também do crescimento da população e dos avanços que todas as
organizações do mundo, independente do tipo de seu negócio, precisam perseguir para se
manterem em plenas condições de funcionamento.
Uma das formas de se buscar soluções para problemas coletivos, que impactem o planeta,
mas também individualmente pessoas e organizações, é através das alianças que empresas
podem fazer com a sociedade de uma forma geral e com outras instituições com preocupa-
ções similares. Em boa parte das vezes, é possível também encontrar formas de colaboração
até quando não há tanta obviedade na convergência de interesses.
Concluímos assim o material esperando que tudo que tratamos possa ser integrado as suas
realidades profissionais e principalmente que tenha sido possível visualizar a governança
corporativa em quase tudo que fazemos e não só no trabalho.
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