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João Martins de Athayde

Proprietarios: Filhos d e _ J o s á _ Bernardo da Silva

Eu vou c o n t a r u m a h i s t ó r i a
de um P a v ã o Misterioso
que l e v a n t o u vôo na G r é c i a
com um r a p a z c o r a j o s o
r a p t a n d o uma c o n d e s s a
filha dum conde o r g u l h o s o

Residia n a T u r q u i a
um viúvo c a p i t a l i s t a
pai de dois filhos s o l t e i r o s
o mais velho, J o ã o B a t i s t a
e n t ã o o filho mais n ô v o
chamava-se Evangelista

O velho t u r c o e r a dono
d u m a f á b r i c a de t e c i d o s
c m largas propriedades
dinheiro e bons possuídos
deu de h e r a n ç a a s e u s filhos
p o r q u e e r a m bem unidos
(2)

Depois que o velho m o r r e u


fizeram combinação
p o r q u e J o ã o Batista
c o n c o r d o u com seu i r m ã o
e foram negociar
n a mais p e r f e i t a união

Um dia J o ã o Batista
p e n s o u pela v a i d a d e
e disse a Evangelista:
m e u mano, eu t e n h o v o n t a d e
de visitar o e s t r a n g e i r o
se não t e d e i x a r s a u d a d e

—Olha que n o s s a r i q u e z a
se a c h a muito a u m e n t a d a
e dessa nossa fortuna
a i n d a não gozei n a d a
p o r t a n t o c o n v é m qu'eu p a s s e
um ano em t e r r a a f a s t a d a

Respondeu Evangelista:
vai que aqui f i c a r e i
r e g e n d o o nosso negócio
como sempre trabalhei
g a r a n t o que nossos bens
com cuidado z e l a r e i

-—Quero t e f a z e r um p e d i d o
p r o c u r a no e s t r a n g e i r o
um o b j e t o bonito
[3]

só p a r a r a p a z solteiro
t r a z p a r a mim de p r e s e n t e
e m b o r a c u s t e dinheiro

João Batista prometeu


com muito boa a t e n ç ã o
de c o m p r a r um o b j e t o
de gôsto do s e u i r m ã o
e n t ã o t o m o u um p a q u e t e
e seguiu p a r a o J a p ã o

J o ã o Batista no J a p ã o
esteve 6 meses somente
gozando n a q u e l e i m p é r i o
percorreu o Oriente
depois seguiu p a r a a G r é c i a
o u t r o país d i f e r e n t e

J o ã o Batista e n t r o u na G r é c i a
divertiu-se em p a s s e a r
c o m p r o u p a s s a g e m de b o r d o
q u a n d o ia e m b a r c a r
ouviu um grego dizer:
a c h o bom se d e m o r a r

João Batista perguntou:


amigo, fale a v e r d a d e
por qual motivo o s e n h o r
m a n d a eu f i c a r n a c i d a d e ?
disse o grego: vai h a v e r
uma grande novidade
[6]

— M o r a aqui n e s t a c i d a d e
um conde muito v a l e n t e
m a i s s o b e r b o do que Nero
pai d u m a filha s o m e n t e
é a m o ç a m a i s bonita
q u e há no t e m p o p r e s e n t e

—É a m o ç a que eu falo
filha do tal p o t e n t a d o
o pai t e m ela e s c o n d i d o
e m um q u a r t o do s o b r a d o
chama-se Creusa e criou-se
sem nunca ter passeado

—De ano em ano e s s a m o ç a


b o t a a c a b e ç a de f o r a
p a r a o povo a d o r á - l a
no espaço duma hóra
p a r a s e r vista o u t r a v e z
t e m um ano de d e m o r a

—O conde não c o n s e n t i u
outro homem e d u c á - l a
s ó êle como pai dela
t e v e o poder de ensiná-la
s e r á morto o criado
q u e dela ouvir a fala

—Os e s t r a n g e i r o s t ê m vindo
tomar o conhecimento
a m a n h ã ela a p a r e c e
(5)

ao grande ajuntamento
é proibido pedir-se
a mão dela a c a s a m e n t o

E n t ã o disse J o ã o Batista:
a g o r a vou d e m o r a r
para ver essa princesa
estrela deste lugar
q u a n d o eu c h e g a r na T u r q u i a
t e n h o muito que c o n t a r

Logo no s e g u n d o dia
C r e u s a saiu à j a n e l a
os f o t ó g r a f o s se v e x a r a m
t i r a n d o o r e t r a t o dela
quando inteirou uma hora
d e s a p a r e c e u a donzela

J o ã o Batista viu depois


um retratista vendendo
a l g u n s r e t r a t o s de C r e u s a
v e x o u - s e e foi lhe dizendo:
q u a n t o q u e r pelo r e t r a t o ?
p o r q u e comprá-lo p r e t e n d o

O fotógrafo respondeu:
l h e c u s t a um c o n t o de réis
J o ã o B a t i s t a a i n d a disse:
e u c o m p r a v a . a t é por dez
s e o dinheiro f o s s e p o u c o
e m p e n h a r i a os a n é i s
(6)

J o ã o Batista voltou
da Grécia p a r a a T u r q u i a
quando c h e g o u em Meca
cidade em que residia
seu m a n o E v a n g e l i s t a
b a n q u e t e o u o seu dia

E n t ã o disse E v a n g e l i s t a :
meu mano, vai me contando
se viste coisa bonita
onde a n d a s t e p a s s e a n d o ?
que me t r o u x e de p r e s e n t e
vai logo me e n t r e g a n d o

R e s p o n d e u J o ã o Batista:
p a r a ti t r o u x e um r e t r a t o
duma c o n d e s s a da G r é c i a
m o ç a que tem íino t r a t o
c u s t o u - m e um c o n t o de r é i s
inda a c h e i muito b a r a t o

Respondeu Evangelista
depois duma g a r g a l h a d a :
n e s t e caso, m e u i r m ã o
p a r a mim não t r o u x e n a d a
pois r e t r a t o de m u l h e r
é coisa b a s t a n t e u s a d a

—Sei que t e m muito r e t r a t o


m a s como o que t r o u x e , n ã o
vais a g o r a examiná-lo
(7)

e n t r e g o na t u a mão
quando vires a beleza
m u d a r á s a opinião

J o ã o Batista retirou
o r e t r a t o duma m a l a
e n t r e g o u ao r a p a z
q u e e s t a v a em pé na s a l a
m a s q u a n d o viu o r e t r a t o
quis f a l a r , t r e m e u a f a l a

E v a n g e l i s t a voltou
c o m o r e t r a t o na m ã o
tremendo quase assustado
p e r g u n t o u a seu i r m ã o
s e a m o ç a do r e t r a t o
tinha aquela perfeição

R e s p o u d e u J o ã o Batista:
C r e u s a é muito mais f o r m o s a
do que o r e t r a t o dela
em b e l e z a é p r e c i o s a
t e m o corpo desenhado
p o r u m a mão m i l a g r o s a

J o ã o Batista perguntou
f a z e n d o um a r de riso:
que é isso, m e u i r m ã o ?
q u e r e s p e r d e r o juizo?
j á vi que e s t e r e t r a t o
vai te causar prejuízo
(8)

R e s p o n d e u Evangelista:
pois meu irmão, eu t e digo
vou sair do m e u país
n ã o posso f i c a r contigo
pois a m o ç a do r e t r a t o
deixou-me a vida em p e r i g o

J o ã o Batista falou sério;


precipício n ã o c o n v é m
de que t e s e r v e ir e m b o r a
por ê s t e mundo além
em p r o c u r a duma m o ç a
que não c a s a com n i n g u é m ?

— T e u conselho n ã o me s e r v e
estou i m p r e s s i o n a d o
r a p a z sem moça bonita
é um d e s a v e n t u r a d o
se eu n ã o c a s a r com ela
findo m e u s dias e n f o r c a d o

—Vamos p a r t i r a r i q u e z a
que t e n h o n e c e s s i d a d e
dar b a l a n ç o no dinheiro
p o r q u e eu q u e r o a m e t a d e
e o que não posso l e v a r
dou-te de boa v o n t a d e

D e r a m balanço ao d i n h e i r o
só 3 milhões e n c o n t r a r a m
t o c o u dois a E v a n g e l i s t a
— 9—

c o n f o r m e se c o m b i n a r a m
c o m r e l a ç ã o ao negócio
da f i r m a se d e s l i g a r a m

Despediu-se Evangelista
abraçou o seu irmão
c h o r a n d o um pelo o u t r o
na triste separação
seguindo um p a r a a G r é c i a
e m uma e m b a r c a ç ã o

Logo que c h e g o u n a G r é c i a
hospedou-se Evangelista
e m um h o t e l dos mais p o b r e s
n e g a n d o assim sua p i s t a
s ó p a r a ninguém s a b e r
q u e e r a um c a p i t a l i s t a

Ali passou oito m e s e s


s e m se dar a c o n h e c e r
sempre andava disfarçado
só para ninguém saber
a t é que c h e g o u o dia
da donzela aparecer

Os h o t é i s j á se a c h a v a m
r e p l e t o s de p a s s a g e i r o s
passeavam pelas praças
os g r u p o s de c a v a l h e i r o s
h a v i a muitos f i d a l g o s
c h e g a d o s dos e s t r a n g e i r o s
(10J

Às duas h o r a s da t a r d e
C r e u s a saiu à j a n e l a
m o s t r a n d o a sua b e l e z a
entre o conde e a mãe dela
todos t i r a r a m o c h a p é u
em c o n t i n ê n c i a à d o n z e l a

Quando E v a n g e l i s t a viu
o brilho da boniteza
disse: v e j o que m e u mano
quis me f a l a r com f r a n q u e z a
pois e s t a gentil donzela
é r a i n h a da b e l e z a

E v a n g e l i s t a voltou
onde e s t a v a h o s p e d a d o
como n ã o falou com a m o ç a
estava contrariado
foi i n v e n t a r u m a idéia
que lhe d e s s e r e s u l t a d o

No outro dia saiu


passeando Evangelista
e n c o n t r o u - s e na c i d a d e
com um r a p a z j o r n a l i s t a
p e r g u n t o u se n ã o h a v i a
na p r a ç a algum a r t i s t a

Respondeu o j o r n a l i s t a ;
t e m o doutor Edmundo
na r u a dos O p e r á r i o s
[11)

é engenheiro profundo
para inventar maquinismo
é ele o maior do mundo

Evangelista entrou
n a c a s a do e n g e n h e i r o
f a l a n d o em lingua g r e g a
negando ser estrangeiro
l h e propondo um n e g ó c i o
o f e r e c e n d o dinheiro

Assim disse Evangelista:


m e u engenheiro famoso
p r i m e i r o vá me dizendo
se não é homem medroso
p o r q u e eu q u e r o a j u s t a r
um n e g ó c i o v a n t a j o s o

R e s p o n d e u - l h e Edmundo:
na a r t e n ã o t e n h o m ê d o
m a s v e j o que o amigo
q u e r um negócio em s e g r ê d o
como p r e c i s a de mim
m e c o n t e lá ê s s e e n r ê d o

- Eu amo a filha do c o n d e
a mais f o r m o s a m u l h e r
s e o doutor i n v e n t a r
um aparelho qualquer
que eu possa f a l a r com ela,
p a g o o que o s e n h o r q u i s e r
(12J

—Eu a c e i t o o s e u c o n v i t e
m a s p r e c i s o lhe a v i s a r
que vou t r a b a l h a r 6 m e s e s
o s e n h o r vai e s p e r a r
é obra d e s c o n h e c i d a
que a g o r a vou i n v e n t a r

- Q u e r dinheiro a d i a n t a d o ?
eu pago n e s t e m o m e n t o ;
—Não s e n h o r , inda é c e d o
q u a n d o findar m e u i n v e n t o
é que eu lhe digo o preço-
quanto c u s t a o p a g a m e n t o

Enquanto Evangelista
impaciente esperava
o e n g e n h e i r o Edmundo
t o d a noite t r a b a l h a v a
oculto em sua oficina
e n i n g u é m adivinhava

O g r a n d e a r t i s t a Edmundo
d e s e n h o u uma i n v e n ç ã o
f a z e n d o um a e r o p l a n o
de p e q u e n a dimenção
f a b r i c a d o de alumínio
com i m p o r t a n t e a r m a ç ã o

Movido a m o t o r e l é t r i c o
depósito de gasolina
com l o c o m o ç ã o m a c i a
(13J

que não fazia buzina


a obra mais i m p o r t a n t e
que fêz em sua oficina

T i n h a c a u d a como l e q u e
a s a s a s como p a v ã o
p e s c o ç o , c a b e ç a e bico
alavanca, chave e botão
v o a v a i g u a l ao v e n t o
para, q u a l q u e r d i r e ç ã o

Quando Edmundo findou


disse p a r a E v a n g e l i s t a :
sua obra está perfeita
ficou com bonita vista
o s e n h o r t e m que s a b e r
que Edmundo é a r t i s t a

—Eu fiz um a e r o p l a n o
da f o r m a de um p a v ã o
que a r m a e se d e s a r m a
comprimindo n u m b o t ã o
e c a r r e g a dez a r r o b a s
3 l é g u a s a c i m a do c h ã o

Foram experimentar
se t i n h a jeito o p a v ã o
abriram alavanca e chave
c a r r e g a r a m num b o t ã o
o m o n s t r o girou s u s p e n s o
m a n e i r o como um b a l ã o
(14J

O pavão de a s a s a b e r t a s
partiu com v e l o c i d a d e
c o r t a n d o todo e s p a ç o
muito a c i m a da c i d a d e
como e r a m e i a - n o i t e
v o a r a m à sua v o n t a d e

E n t ã o disse o e n g e n h e i r o :
j á p r o v e i minha i n v e n ç ã o
íizemos a e x p e r i ê n c i a
t o m e c o n t a do p a v ã o
a g o r a o s e n h o r me p a g a
sem promover discussão

P e r g u n t o u Evangelista:
q u a n t o c u s t a o seu i n v e n t o ?
- D ê - m e c e m c o n t o s de r é i s
acha caro o pagamento?
o r a p a z lhe r e s p o n d e u :
a c h o pouco, dou d u z e n t o s

E d m u n d o inda lhe d e u
uma serra azougada
que s e r r a v a c a i b r o s e r i p a s
s e m que fizesse z u a d a
t i n h a d e n t e s de n a v a l h a
de gume, bem a f i a d a

Deu um l e n ç o e n i g m á t i c o
que quando C r e u s a g r i t a v a
c h a m a n d o pelo pai d e l a
[15]

e n t ã o o moço p a s s a v a
êle no nariz da m o ç a
com isso ela d e s m a i a v a

E n t ã o disse o j o v e m t u r c o :
muito obrigado fiquei
do pavão e dos p r e s e n t e s
para a luta me armei
amanhã à meia-noite
com C r e u s a c o n v e r s a r e i

À meia-noite o p a v ã o
do muro se l e v a n t o u
com a s l â m p a d a s a p a g a d a s
como um f l e c h a voou
bem no palácio do c o n d e
na cumeeira aterrou

E v a n g e l i s t a em silêncio
cinco t e l h a s a r r e d o u
um b u r a c o de dois palmos
caibros e ripas serrou
e pendurou uma corda
por ela se e s c o r r e g o u

C h e g o u no q u a r t o de C r e u s a
o n d e dormia a d o n z e l a
d e b a i x o dum c o r t i n a d o
feito de s ê d a a m a r e l a
êle p a r a a c o r d á - l a
pôs a mão na t e s t a dela
(16)

A moça estremeceu
a c o r d o u no mesmo i n s t a n t e
e viu um r a p a z e s t r a n h o
d e rosto muito e l e g a n t e
q u e sorria p a r a ela
c o m o olhar f a s c i n a n t e

E n t ã o C r e u s a deu um grito:
p a p a i , um d e s c o n h e c i d o
e n t r o u aqui no m e u q u a r t o
s u j e i t o muito atrevido!
v e n h a d e p r e s s a , papai
p o d e s e r algum bandido!

O r a p a z lhe disse: m o ç a
e n t r e nós n ã o há perigo
e s t o u pronto a d e f e n d ê - l a
c o m o um v e r d a d e i r o amigo
v e n h o é s a b e r se a s e n h o r a
q u e r se c a s a r comigo

O jovem puxou o l e n ç o
no nariz dela t o c o u
d e u uma vertigem na m o ç a
d e r e p e n t e desmaiou
e êle subiu na corda
c h e g a n d o em cima t i r o u

O r a p a z a c e r t o u os c a i b r o s
e c o n s e r t o u o telhado
e c a l c a n d o em seu p a v ã o
(17J

voou bastante vexado


foi e s c o n d e r seu p a v ã o
o n d e fôra f a b r i c a d o

O c o n d e a c o r d o u aflito
q u a n d o ouviu a z u a d a
e n t r o u no q u a r t o da filha
desembainhou a espada
m a s e n c o n t r o u - a sem sentidos
d e z minutos d e s m a i a d a

P r o c u r o u por todo c a n t o
c o m a e s p a d a na mão
b e r r a n d o e soltando p r a g a s
c o l é r i c o como um l e ã o
dizendo: onde e n c o n t r á - l o
e u m a t o ê s s e ladrão!

Ç r e u s a l h e disse: p a p a i
pois eu vi n e s s e m o m e n t o
um j o v e m rico e e l e g a n t e
m e falando a casamento
n ã o vi quando êle e n c a n t o u - s e
p o r q u e deu-me 1 p a s s a m e n t o

Disse o conde: n e s s e c a s o
t u já e s t á s a ' s o n h a r
m o ç a de dezoito a n o s
j á p e n s a n d o em se c a s a r
se te aparecer casamento
eu saberei desmanchar
(18J

Evangelista chegou
às duas da m a d r u g a d a
a s s e n t o u o seu pavão
sem que fizesse zuada
d e s c e u pela m e s m a t r i l h a
na c o r d a d e p e n d u r a d a

Creusa estava deitada


dormindo o sono i n o c e n t e
seus cabelos como um v é u
que enfeita p u r a m e n t e
como um anjo t e r r e a l
que t e m lábios s o r r i d e n t e s

O r a p a z muito sutil
foi pegando na mão dela
e n t ã o a moça a c o r d o u - s e
êle garantiu a ela
que não e r a malfazejo;
—Não teDha mêdo, donzela

A m o ç a interrogou-o
dizendo: quem é o s e n h o r ?
disse êle: sou e s t r a n g e i r o
t e c o n s a g r e i grande a m o r
se não f o r e s minha e s p o s a
a vida não tem valor

C r e u s a a c h o u impossível
o moço e n t r a r no s o b r a d o
e n t ã o p e r g u n t o u a êle
[19)

d e que jeito t i n h a e n t r a d o
e disse: vai me dizendo
s e é s vivo ou e n c a n t a d o

— C o m o eu t e t e n h o a m o r
m e a r r i s c o f o r a de h o r a
m o ç a , n ã o me n e g u e o sim
a q u e m t a n t a lhe a d o r a ;
C r e u s a aí gritou: p a p a i
venha ver o homem agora!

Ê l e aí p a s s o u a l e n ç o
e l a caiu sem sentido
ê l e subiu pela c o r d a
p o r onde t i n h a descido
a o c h e g a r em cima disse:
o conde será vencido

Ouviu-se tocar c o m e t a
o b r a d o do s e n t i n e l a
o c o n d e se dirigiu
a o q u a r t o da donzela
viu a filha d e s m a i a d a
n ã o pôde f a l a r com e l a

A t é que a m o ç a t o r n o u
disse o conde é um casa sério
s o u f i d a l g o muito r i c o
a t e n t a d o em m e u c r i t é r i o
m a s nós v a m o s d e s c o b r i r
o a u t o r d ê s t e mistério!
(20)

—Minha filha, eu já p e n s e i
um plano muito s a g a z
p a s s a essa b a n h a a m a r e l a
na cabeça desse audaz
sótassim descobriremos
ê s s e a n j o ou s a t a n á s

- S ó sendo u m a visão
que e n t r a n e s t e s o b r a d o
só c h e g a à meia-noite
e n t r a e sai sem ser n o t a d o
se é g e n t e d ê s t e mundo
u s a feitiço e n c a n t a d o

Evangelista também
d e s a r m o u o seu p a v ã o
a cauda, c a p o t e e bico
diminuiu sua a r m a ç ã o
e s c o n d e u o seu m o t o r
em um p e q u e n o c a i x ã o

Depois de s e s s e n t a dias
a l t a noite em n e v o e i r o
Evangelista c h e g o u
em seu pavão t ã o m a n e i r o
d e s c e u pela m e s m a t r i l h a
a seu modo t r a i ç o e i r o

J á e r a a t e r c e i r a vez
que Evangelista e n t r a v a
no q u a r t o em que a c o n d e s s a
[21)

à noite se a g a s a l h a v a
pela í ô r ç a do a m o r
o r a p a z se a r r i s c a v a

Com pouco a m o ç a a c o r d o u - s e
foi logo dizendo assim:
t u t e n s dito que me a m a s
com um b e n q u e r e r sem fim
se me a m a s com r e s p e i t o
t e s e n t a s p e r t o de mim

Evangelista sentou-se
pôs-se a c o n v e r s a r com ela
t r o c a n d o risos e s p e r a v a
a r e s p o s t a da d o n z e l a
ela pôs-lhe a mão na c a b e ç a
espalhou a banha amarela

A condessa levantou-se
com v o n t a d e de g r i t a r
o rapaz tocou-lhe o lenço
s e n t i u ela d e s m a i a r
deixou-a numa síncope
t r a t o u de se r e t i r a r

E logo E v a n g e l i s t a
v o a n d o da c u m e e i r a
foi e s c o n d e r seu p a v ã o
n a s f o l h a s duma p a l m e i r a
disse: na q u a r t a v i a g e m
levo a condessa estrangeira
(22J

C r e u s a passou o r e s t o
d a noite mal s o s s e g a d a
a c o r d o u pela m a n h ã
m e d i t a t i v a e cismada
se o pai n ã o p e r g u n t a s s e
e l a n ã o dizia n a d a

Disse o conde: m i n h a filha


p a r e c e que e s t á s d o e n t e
s o f r e n d o de algum a c e s s o ?
p o r q u e t e u olhar n ã o m e n t e
o tal r a p a z e n c a n t a d o
te apareceu certamente

C r e u s a lhe disse: p a p a i
e u c u m p r i o seu m a n d a d o
o rapaz apareceu-me
m a s a c h e i - o delicado
passei-lhe a banha amarela
e êle saiu m a r c a d o

O conde disse aos s o l d a d o s


que a cidade p a t r u l h a s s e m
toumassem os chapéus dos h o m e n s
que nas ruas encontrassem
um de c a b e l o a m a r e l o
o u rico ou p o b r e p e g a s s e m

Evangelista vestiu-se
em r o u p a de a l u g a d o
e n c o n t r o u com a p a t r u l h a
(23J

o seu c h a p é u foi t i r a d o
v i r a m o cabelo a m a r e l o
disseram: e s t e j a intimado!

Os soldados l h e disseram:
cidadão, n ã o e s t r e m e ç a
e s t á p r e s o às o r d e n s do c o n d e
a c h o bom que n ã o se c r e s ç a
vai à p r e s e n ç a do c o n d e
se é duro, n ã o e s t r e m e ç a

— V o c ê h o j e vai p r o v a r
por s u a vida r e s p o n d e
como é que t e m f a l a d o
com a filha do nosso c o n d e
q u a n d o êle lhe p r o c u r a v a
onde é que v o c ê se e s c o n d e ?

R e s p o n d e u Evangelista:
t a m b é m me f a ç a m um f a v o r
e n q u a n t o eu vou v e s t i r
minha roupa superior
na c l a s s e de g e n t e r i c a
n i n g u é m pisa em meu v a l o r

Disseram: pode m u d a r
sua r o u p a de n o b r e z a
a m o ç a bem que dizia
que o r a p a z t i n h a r i q u e z a
vamos ganhar umas luvas
e o conde uma surprêsa
(24)

E saiu E v a n g e l i s t a
c o n v e r s a n d o com o g u a r d a
a t é que se a p r o x i m o u
duma palmeira copada
e n t ã o disse E v a n g e l i s t a :
minha r o u p a e s t á t r e p a d a

E os soldados o l h a r a m
em cima viram o c a i x ã o
m a n d a r a m ele subir
f i c a r a m de prontidão
pegaram a conversar
p r e s t a n d o pouca a t e n ç ã o

E v a n g e l i s t a subiu
pôs o dedo 110 b o t ã o
s e u m o n s t r o de alumínio
e r g u e u sua a r m a ç ã o
dali foi se l e v a n t a n d o
saiu v o a n d o o pavão

E os soldados gritaram:
amigo, o s e n h o r d e s ç a
d e i x e de t a n t a d e m o r a
é bom que não a b o r r e ç a
s e n ã o com pouco u m a bala
visita s u a c a b e ç a

E n t ã o m a n d a r a m subir
um s o l d a d o de c o r a g e m
disseram: pegue na perna
(25)

a r r a s t e com a f o l h a g e m
e s t á p a s s a n d o da h o r a
de v o l t a r m o s da viagem

Quando o soldado subiu


gritou; p e r d e m o s a ç ã o
f u g i u o moço v o a n d o
de longe v e j o o p a v ã o
zombou da n o s s a patrulha;
a q u ê l e m o ç o é o cão!

V o l t a r a m , d i s s e r a m ao c o n d e
que o rapaz tinbam encontrado
m a s do ôlho d u m a p a l m e i r a
o rapaz tinha voado
disse o conde: é o diabo
que com C r e u s a t e m f a l a d o

C r e u s a s a b e n d o da história
c h o r a v a de a r r e p e n d i d a
por t e r m a r c a d o o r a p a z
com b a n h a d e s c o n h e c i d a
disse: n u n c a mais t e r e i
s o s s ê g o na minha vida!

Disse a moça: ora, p a p a i


me priva da l i b e r d a d e
n ã o c o n s e n t e que eu g o z e
a d i s t r a ç ã o da c i d a d e
vivo como c r i m i n o s a
s e m gozar a m o c i d a d e !
(26)

— A q u i não t e n h o direito
de falar com um criado
um r a p a z p a r a me v e r
p r e c i s a vir e n c a n t a d o
m a s t a l v e z que inda f u j a
d ê s t e maldito sobrado!

—O r a p a z que me t e m a m o r
só q u e r i a vê-lo a g o r a
p a r a cair em seus b r a ç o s
como a infeliz que c h o r a
e m b o r a que eu depois
m o r r e s s e na m e s m a hora!

—Eu sei b e m que p a r a êle


não mereço confiança
e n q u a n t o êle vinha a q u i
eu ainda t i n h a e s p e r a n ç a
d e sair d e s t a c a d e i a
que dá s e n t e n ç a a criança!

Ás q u a t r o da m a d r u g a d a
Evangelista desceu
Creusa estava acordada
n u n c a mais a d o r m e c e u
a moço e s t a v a c h o r a n d o
o rapaz apareceu

O jovem cumprimentou-a
d e u - l h e um a p ê r t o de mão
a condessa ajoelhou-se
(27)

p a r a lhe pedir p e r d ã o
disse: p a p a i me m a n d o u
eu f a z e r - t e a t r a i ç ã o

O r a p a z disse: m e n i n a
a mim n ã o íizeste mal
tôda moça é inocente
t e m s e u p a p e l virginal
c e r i m ô n i a de donzela
é coisa mui n a t u r a l

—Todo m e u sonho d o u r a d o
é t e f a z e r minha s e n h o r a
se q u e r e s c a s a r comigo
te arrumas e vamos embora
se n ã o o dia a m a n h e c e
e se p e r d e a n o s s a h o r a

—Se o s e n h o r é h o m e m s é r i o
e comigo q u e r c a s a r
pois t o m e c o n t a de mim
a q u i não quero f i c a r
se eu f a l a r em c a s a m e n t o
p a p a i m a n d a me m a t a r

— E m b o r a que t e u pai m a n d e
t r o p a e navios nos m a r e s
minha viagem é a é r e a
m e u c a v a l o a n d a nos a r e s
n ó s v a m o s fugir daqui
c a s a r em o u t r o s l u g a r e s
(28)

Creusa estava empaeotando


o vestido mais e l e g a n t e
o conde e n t r o u no q u a r t o
e dando um b e r r o v i b r a n t e
dizendo: filha m a l d i t a
vais m o r r e r com t e u a m a n t e !

O conde r a n g e u os d e n t e s
a v a n ç o u com 1 passo e x t e n s o
d e u um p o n t a - p é n a filha
dizendo: sou eu q u e m v e n ç o !
logo no nariz do c o n d e
o rapaz passou o lenço

Ouviu-se o b a q u e do c o n d e
p o r q u e rolou d e s m a i a d o
a utima c e n a do l e n ç o
deixou-o m a g n e t i z a d o
disse o moço: t e m 10 m i n u t o s
p r a s a i r m o s do sobrado

C r e u s a disse: e s t o u p r o n t a
j á p o d e m o s ir embora;
subiram por uma corda
a t é que s a i r a m fora
se aproximava a alvorada
p e l a c o r t i n a da a u r o r a

Com p o u c o o conde a c o r d o u
viu a c o r d a p e n d u r a d a
n a c o b e r t a do s o b r a d o
(29)

d i s t i n g u i u - s e um z u a d a
e a s l â m p a d a s do a p a r e l h o
m o s t r a n d o luz v a r i a d a

A g a i t a do p a v ã o
t o c a n d o com r o u c a voz
o m o n s t r o de olhos de íogo
p r o j e t a n d o os s e u s f a r ó i s
e conde mandando pragas
d i s s e C r e u s a : é c o n t r a nós

O s s o l d a d o s da p a t r u l h a
e s t a v a m de p r o n t i d ã o
d i s s e r a m : vem ver, f u l a n o
l á vai p a s s a n d o o pavão!
o m o n s t r o fêz uma c u r v a
para tomar direção

E n t ã o disse um dos soldados:


o r g u l h o é uma ilusão
u m pai g o v e r n a u m a filha
m a s não m a n d a o c o r a ç ã o
a g o r a a condessinha
v a i fugindo no p a v ã o

O c o n d e olha pra c o r d a
viu o b u r a c o no t e l h a d o
corno t i n h a sido v e n c i d o
p e l o r a p a z atilado
a d o e c e u só de r a i v a
m o r r e u por não ser vingado
(30)

Logo que E v a n g e l i s t a
foi c h e g a d o na T u r q u i a
com a c o n d e s s a da G r é c i a
fidalga da m o n a r q u i a
em c a s a de J o ã o B a t i s t a
c a s a r a m no m e s m o dia

Em c a s a de J o ã o B a t i s t a
deu-se g r a n d e a j u n t a m e n t o
dando vivas ao noivado
p a r a b é n s de c a s a m e n t o
á noite t e v e r e t r e t a
com visita e c u m p r i m e n t o

Enquanto E v a n g e l i s t a
gozava imensa alegria
c h e g a v a um t e l e g r a m a
da G r é c i a p a r a a T u r q u i a
chamando a condessa Creusa
pelo motivo que havia

Dizia o t e l e g r a m a :
«Creusa, v e m com t e u m a r i d o
«receber a tua herança
«o c o n d e já é falecido
«tua m ã e d e s e j a v e r
«o g e n r o desconhecido»

A condessa estava lendo


com o t e l e g r a m a na m ã o
entregou a Evangelista
(31)

q u e m o s t r o u a seu irmão
dizendo: v a m o s v o l t a r
por uma justa razão

D e m a n h ã q u a n d o os noivos
a c a b a r a m de a l m o ç a r
C r e u s a em t r a j e de noiva
pronta para viajar
d e palma, v é u e c a p e l a
p o i s só v i e r a m c a s a r

Diziam os convidados:
a c o n d e s s a é t ã o novinha!
e v e s t i d a assim de noiva
s e t o r n a mais bonitinha
e s t á com um b u q u ê de f l o r e s
s é r i a como u m a r a i n h a

O s noivos t o m a r a m a s s e n t o
no p a v ã o de a l u m í n i o
e o monstro levantou-se
foi f i c a n d o p e q u e n i n o
c o n t i n u o u o seu vôo
n o r u m o do s e u d e s t i n o

Na c i d a d e de A t e n a s
estava a população
esperando pela volta
do a e r o p l a n o p a v ã o
o u o c a v a l o do e s p a ç o
q u e imita o avião
(32J

Na t a r d e do outro dia
que o pavão íoi c h e g a d o
em c a s a de Edmundo
ficou o moço h o s p e d a d o
s e u amigo de c o n f i a n ç a
que foi bem r e c o m p e n s a d o

E t a m b é m a m ã e de C r e u s a
já e s p e r a v a v e x a d a
a filha mais t a r d e e n t r o u
muito bem a c o m p a n h a d a
de b r a ç o com o s e u noivo
disse: m a m ã e , e s t o u c a s a d a

Disse a velha: m i n h a filha


s a í s t e do cativeiro,
f i z e s t e bem em f u g i r
e c a s a r no e s t r a n g e i r o
t o m e m c o n t a da h e r a n ç a
meu genro é meu herdeiro

— FIM —
Se O a m i g o d e s e j a r m a n d a fazer seu
H o r ó s c o p o p o r q u e deseja saber p s r a
q u e p a r t e d e v e ir, c a s a m e n t o , v i a g e n s
r a m o s de n e g ó c i o , p r o f i s s õ e s n n m e r o s ,
dias, p e d r a s felizes, épocas desfavO
r á v e i s e t o d o os a c o n t e c i m e n t o s q u e l h e
e s t ã o s u j e i t o s d u r a n t e a «ua e x i s t ê n c i a
Basta m a n d a r a d a t a dr n a s c i m e n t o
a c o m p a n h a d a de C r S 20.00, a T i p S ,
F r a n c i s c o , r n a S t a Luzia 263 — J u a z e i
ro do Nor.tè-Ce A t e n d e m o s urgente,
O dinheiro deve vir num envelopecomoro
lar declarado.
Tip. São Francisco
José Bernardo da Silva
Rua Sta. Luzia, 263-Juazeiro do Nôrte-Ce
a g e n t e s :
EDSON PINTO DA SILVA
Mercado S. José-Cimpartimento N. 7
Recife — Pernambuso
BENEDITO ANTONIO DE MATOS
Café S. Miguel, dentro do Mercado Cen-
tral - Fortaleza — Ceará
Exclusivo em Natal
ANTOMIO SMÍDIO DA HLVA
Rua Cei. Bstôvam, 1886 Natal-R.ff.K
Exclusivo para todo o Pará:
RAIMUNDO OLIV1IRA
Mercado de Ferro A par a dor, '26
Belém — Pará
SEVERINO JOSÉ DOS SANTOS
Rua Eng. Paulo Lopes, 695—Lote 4
Bangu — Rio — GB
JOSÉ DE SOUZA CASTRO
Mercado de Baturité
Quarto n. 63 — Baturité - Ceara.
BANCA TROVAS DO NORTE
Lino Ferreira Neto - Mercado Publico
Santa Inês — Maranhão

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