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Nutrição e fertilidade
A fertilidade de mulheres e homens pode ser comprometida pela inadequação do
estado nutricional e/ou do padrão alimentar. As mulheres com baixo peso, assim como as
atletas, que apresentam reduzida adiposidade corporal, costumam cursar com alterações no
ciclo ovariano, uma vez que baixas concentrações de leptina e maiores concentrações séricas
de grelina e peptídeo YY (PYY), comuns nesses casos, influenciam a regulação hormonal do
eixo hipotálamo-hipófise-ovários (HHO), comprometendo o padrão ovulatório.
Por outro lado, a obesidade também impacta negativamente a fertilidade. Além das
alterações relacionadas à regulação hormonal do HHO em mulheres obesas, devido à
resistência à leptina e perfil de inflamação crônica, a adiposidade corporal excessiva prejudica
a integridade dos oócitos, por meio de modificações no desenvolvimento folicular, danos
mitocondriais, lipotoxicidade e produção aumentada de espécies reativas de oxigênio. Há
menor chance de implantação e desenvolvimento do embrião na parede uterina.
De forma semelhante, a obesidade masculina promove desregulação hormonal no eixo
hipotálamo-hipófise-testículos (HHT), reduzindo a produção de testosterona e a
espermatogênese, portanto, comprometendo a fertilidade. Outra questão importante, é a
presença de enzimas que atuam na interconversão de hormônios esteroides nos adipócitos, de
forma que, na obesidade, esse mecanismo também influencia o balanço hormonal que regula
HHT e HHO.
Com relação à influência de nutrientes e do padrão alimentar sobre a fertilidade,
recente estudo apresentou uma ampla revisão sobre o assunto, cujos resultados estão
sumarizados a seguir (quadros 1 e 2). Nutrientes isolados parecem não influenciar diretamente
a fertilidade, mas sim, o padrão alimentar.
Frente ao exposto, o cuidado nutricional para adequação do peso, da adiposidade
corporal e manutenção de hábitos alimentares saudáveis deve ser contínuo ao longo do
período reprodutivo feminino e masculino, com intenção de melhorar as condições de
fertilidade dos casais.
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Assistência pré-natal
A assistência à saúde para o público materno-infantil está no cerne dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS), iniciativa da Organização das Nações Unidas para
melhorar as condições globais de vida e saúde até 2030. Assegurar o acesso à saúde sexual e
reprodutiva e promover a redução das taxas de mortalidade materna, neonatal e infantil fazem
parte desses objetivos. Para isso, a qualidade da atenção ao pré-natal é fundamental.
Dentre diversos aspectos a serem aprimorados, destaca-se o cuidado nutricional, pois
são amplamente conhecidos na literatura científica os desfechos maternos e infantis
desfavoráveis relacionados ao estado nutricional inadequado e/ou ao ganho de peso
gestacional insuficiente ou excessivo, dentre eles: síndromes hipertensivas da gestação e
diabetes mellitus materna, retenção de peso pós-parto com propensão para obesidade futura da
mulher, dificuldade na amamentação, restrição de crescimento intrauterino, parto prematuro,
parto cirúrgico, criança pequena ou grande para a idade gestacional e propensão para
obesidade e doenças crônicas futuras nas crianças/adultos.
A atuação do nutricionista no atendimento de pré-natal pode ser decisiva frente a tais
condições. Para tanto, o acompanhamento deve ser iniciado o mais precocemente possível e
seguido ao longo da gestação, estendendo-se ao pós-parto.
Avaliação nutricional
Na primeira consulta, uma avaliação clínica e nutricional cuidadosa precisa ser
realizada, e reavaliada nas consultas seguintes. Alguns itens relevantes serão comentados a
seguir.
Idade gestacional (IG): não havendo acesso à ultrassonografia, a IG pode ser calculada
como a diferença entre a data da consulta e o primeiro dia da última menstruação (DUM).
Exemplo:
DUM: 20/01/2018, data da consulta: 03/03/2018
IG em dias = 42 dias, IG em semanas (dividir por 7) = 42 / 7 = 6 semanas
Data provável do parto (DPP): considerar 280 dias ou 40 semanas após a DUM.
Anamnese: utilizar o instrumento para conhecer a gestante, sua rotina, seu histórico
clínico e obstétrico. Precisa ser ajustado ao tempo de consulta, lembrando que quanto mais o
Suplementação
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Recomendações nutricionais
Até 6 semanas após o parto, espera-se que ocorra a perda do peso de produtos da
gestação, exceto tecido mamário. A perda esperada de peso remanescente (RPPP), sem
intervenção, é de 0,5 a 1kg/mês nos primeiros 6 meses de lactação. Mulheres com sobrepeso
ou obesidade podem ter perda saudável de até 2 kg mensais.
Observação importante: Pode ser aplicada restrição energética de até 500 kcal após o
primeiro mês de lactação para mulheres com sobrepeso e obesidade, desde que o VET se
mantenha superior a 1800-1900 kcal.
Suplementação
O Ministério da Saúde recomenda a continuidade da suplementação diária de ferro (40
mg de ferro elementar) por 3 meses após o parto. A suplementação de outros nutrientes deve
ser avaliada individualmente, não havendo recomendação para uso geral.
Aspectos relacionados à lactação
A alimentação materna parece influenciar a composição do leite, porém os estudos
sobre esse assunto apresentam resultados controversos. Entretanto, evidências indicam que
ácidos graxos ômega-3, vitaminas lipossolúveis e vitamina C têm suas concentrações
aumentadas no leite quando há maior consumo pela mulher. Tais nutrientes apresentam
associação com melhores padrões de desenvolvimento físico e cognitivo da criança.
A composição do leite materno é única, completa e específica para cada fase do
desenvolvimento e da mamada do lactente. Devido a seus inúmeros benefícios, a promoção ao
aleitamento materno deve ser conduta de todo profissional de saúde, desde o início do pré-
natal.
De acordo com o Ministério da Saúde, são restrições para o aleitamento materno:
mães infectadas pelo HIV;
mães infectadas pelo HTLV1 e HTLV2 (vírus da leucemia humana T-cell);
mães em uso de medicamentos incompatíveis com a amamentação, como por exemplo
os antineoplásicos e radiofármacos, usados no tratamento contra o câncer.
criança portadora de galactosemia, doença rara em que não pode ingerir leite humano
ou qualquer outro que contenha lactose.
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18,5 – 24,9 Eutrofia 0,12 – 0,49 0,64 – 0,94 0,50 – 0,83 16,8 – 24,5
25 – 29,9 Sobrepeso 0,03 – 0,39 0,57 – 0,87 0,42 – 0,81 14,1 – 22,7
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