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CURSO DE LICENCIATURA EM ENFERMAGEM

EC Cuidar de Clientes com Vulnerabilidade


Acrescida e Famílias em Transição
4º Ano - 1º semestre - Ano letivo 2020/2021

Jornal de Aprendizagem – Documento Orientador

Regente: Professora Doutora Eunice Henriques Corregente: Professor José Falé

A reflexão pode ser entendida como um processo no qual os indivíduos pensam


sobre determinadas situações vividas e as avaliam por forma a trazer um novo
entendimento ou uma apreciação das mesmas (Williams et al, 2002 citado por Cabete,
2009), podendo consistir em três etapas:
• Consciência dos pensamentos e emoções;
• Análise da situação, à luz do conhecimento previamente existente;
• Desenvolvimento de uma (nova) visão/perspetiva sobre a situação, através da
análise e aplicação da informação à experiência concreta (Scandlan & Chernomas, 1997,
citados por Cabete, 2009).

A reflexão não é entendida como um processo linear, mas como um processo


integrado e cíclico que facilita a compreensão de si e do outro nas transações da prática
clínica, contribuindo para a competência do pensamento crítico.

A pratica reflexiva constitui-se "como um importante meio de capacitação dos


estudantes e profissionais de enfermagem na aquisição de um profundo conhecimento
dos saberes e das suas praticas" (Santos e Fernandes, 2004, 59).
No exercício da pratica reflexiva pretende-se que o estudante faça o registo de
situações vividas em contexto de prática clínica, constituindo-se por isso um espaço
narrativo de pensamentos e sentimentos, centrados no ato de cuidar, na pessoa cuidada
e na pessoa do cuidador. Deste modo, é possível ao profissional reflexivo, (re)
aval iar permanentemente as suas intervenções, tentando compreender c o m e s s a
experiência, o impacto que as suas ações têm no Outro e em Si (cuidador).
Não se trata da aquisição do conhecimento declarativo (i.e, aquele que vem nos
livros) mas antes de produção de significados para as situações reais com que o
enfermeiro se confronta diariamente na sua pratica. Naturalmente, para tal, o profissional
reflexivo recorre-se ao conhecimento declarativo para melhor sustentar as suas analises,
mas transforma-o na sua mente associando-o à sua própria experiencia, ou seja, atribui-
lhe um significado próprio. Desta forma, adquirem-se aprendizagens significativas, ou
seja, aquelas aprendizagens que nunca mais se esquecem. Este modelo de aprendizagem
inspira- se no paradigma construtivista, que assenta na ide ia de que é o estudante
quem co n stró i ativamente o seu próprio conhecimento.
ELABORAÇÃO DO JORNAL DE APRENDIZAGEM

Para facilitar o processo de reflexao, tradicionalmente segue-se o Ciclo Reflexivo


de Gibbs (CRG) que segue as seguintes etapas (não necessariamente por esta ordem):

1- Descrição - o que aconteceu?


2- Sentimentos -o que estou a pensar e a sentir?

3- Avaliação - o que foi bom e mau na experiencia?

4- Analise - que sentido(s) tem o que se passou?


5- Conclusão - o que é que poderia ter feito melhor?
6- Planear a ação - da próxima vez, faço assim .....

E importante ter em conta que não se trata de uma descrição linear do que
ocorreu. Neste, faz-se um apelo, tanto à experiencia pessoal, como à s fontes te6ricas,
para clarificar e melhor compreender as questões suscitadas na interação com um
determinado evento ou fenómeno. Desta forma, o jornal de aprendizagem, pode refletir
questões pessoais e/ou profissionais. Não obstante, estas questões podem ser
classificadas em três categorias:
a) Visão global do ambiente clinico
• Filosofia dos cuidados;
• Influências ambientais nos cuidados;
• Organização dos cuidados;
• Aspetos multidisciplinares dos cuidados;
• Dias de experiencias particulares;
• Obtenção de resultados de aprendizagem específicos.

b) Cuidados em ação
• Necessidades do doente: fisiológicas, psicológicas, sociais, espirituais.
• Modelos de cu idados;
• Atividades de enfermagem e sua fundamentação;
• Habilidades e perícias de comunicação;
• Promoção da saúde;
• Envolvimento do cliente e/ou outros significativos.

c) Analise dos cuidados prestados


• A descrição;
• A fundamentação;
• A investigação de suporte aos cuidados;
• Reflexão pessoal sobre os cuidados fornecidos e nos padrões de qualidade;
• Estratégias para melhoria dos cuidados.

Sendo o objetivo final do jornal de aprendizagem desenvolver o pensamento crítico,


importa avaliar em que medida os estudantes conseguem fazê-lo em profundidade, ajudando-os
a prosseguir para níveis cada vez mais elevados. Para isso, importa saber como é que o docente
pode fazer essa análise, com objetividade, e como conduzir o aluno no processo.
Williams, Sundelin, Foster-Sargent & Norman (2000) citados por Cabete (2009)
desenvolveram uma escala em 5 níveis, com base em critérios testados e validados, que se passa
a apresentar, desde o nível 1 (menor nível de reflexão) ao nível 5 (maior nível de reflexão).

Níveis de reflexão no jornal de aprendizagem


1. Descreve o evento, assunto/problema ou situação – descreve os conhecimentos,
emoções ou atitudes anteriormente existentes e os recentemente desenvolvidos. De uma
forma geral responde à questão. “O que aconteceu?”. É um relato de natureza descritiva, não
fazendo análise do vivido.
2. Analisa a situação de aprendizagem, problema ou evento relacionando-o com
conhecimentos, emoções ou atitudes anteriores. Pode incluir respostas de tipo cognitivo ou
emocional e de uma forma geral responde às questões: “Porque é que isto aconteceu?”, “Qual a
minha reação perante o problema ou situação?”
3. Confronta a situação de aprendizagem/problema/ acontecimento, com conhecimentos,
emoções ou atitudes anteriores – por outras palavras, interroga-se sobre o valor do que
aconteceu e tenta responder à questão: “Serão corretos os conhecimentos ou atitudes
desenvolvidas naquela situação?”.
4. Adquire uma nova compreensão sobre a situação ou problema vivido - ao longo do registo,
responde à questão “Qual é o meu novo entendimento sobre a situação?”.
5. Indica de que forma a situação vivida (ou reflexão efetuada) vai influenciar
comportamentos futuros – determina a clarificação de um assunto/problema, o
desenvolvimento de uma competência ou a resolução de um problema. Manifesta a resposta à
questão: “Como é que abordarei no futuro a mesma situação ou situações semelhantes?”.

O desenvolvimento do jornal de aprendizagem pode ser de temática livre ou dirigida, ou seja, pode
simplesmente ser dito aos estudantes que escrevam sobre situações vividas ou questões problemáticas que
os interpelaram de alguma forma, ou colocar questões específicas relacionadas com os resultados de
aprendizagem em determinado momento ou contexto.

Apesar do jornal de aprendizagem ser um instrumento individual, podem ser encorajadas partilhas
de grupo, para discutir pontos comuns e aprofundar a análise de situações, privilegiando-se a escuta e o
suporte mútuo.
A realização e supervisão do jornal de aprendizagem pressupõem alguns princípios
fundamentais:
• Não há respostas ou conteúdos certos ou errados. Tudo o que o estudante escreve é
importante e deve ser respeitado enquanto reflexão;
• A discussão dos conteúdos deve ter em vista o aprofundamento da análise do estudante e
o seu desenvolvimento pessoal isento de juízos de valor por parte do docente;
• Podem ser dados tópicos/temas/questões para reflexão, mas o conteúdo não deve ser
orientado;
• Deve ser dada a liberdade ao estudante de poder partilhar ou não toda a sua produção
escrita;
• Deve ser garantida a confidencialidade relativamente ao conteúdo ou registos entregues
ao docente.
• A avaliação do jornal de aprendizagem resulta do facto de ter sido efetuado com a
regularidade solicitada ou ter sido concluído e do nível de profundidade de reflexão
conseguida e nunca em função do conteúdo ou situações descritas. O jornal de
aprendizagem não se destina a ser instrumento de avaliação de desempenho de
competências clínicas.
• O estabelecimento de um clima de confiança, desenvolvendo o docente uma atitude de
escuta e clarificação, reforçando as aprendizagens e trabalhando as dificuldades e as
soluções encontradas.

Em síntese, pode dizer-se que o jornal de aprendizagem é um instrumento que conduz à


implicação e responsabilização do estudante enquanto ator no seu processo formativo, através da
procura do significado das suas experiências, desenvolvendo uma capacidade de reflexão e análise
crítica, indispensáveis ao seu pleno desenvolvimento pessoal e profissional.

Referências:

Cabete, D. (2009) Jornal de Aprendizagem: Conceito e utilização. UC de Projeto Pessoal em


Enfermagem Clínica I, ESEL
ESEL (2012) Ensino Clínico de Enfermagem ao Adulto e Idoso. Jornal de Aprendizagem –
Documento de orientação.
Santos, E. & Fernandes, A. (2004) Prática reflexiva: Guia para a reflexão estruturada.
Referencia. 2004, 1 1:59-62.

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