Capítulo XI - A elaboração de relatos de atendimento e psicodiagnóstico
interventivo: sua importância na formação do aluno-estagiário
Ensinar os alunos a como produzir um documento psicológico, tem sido, cada
vez mais um motivo de preocupação das instituições de ensino como faculdades de Psicologia, como também do CFP e dos CRPs, de cada região, visando uma melhor orientação na produção de documentos importantes como laudos, relatórios, entre outros, pois há uma exigência cada vez maior sobre a organização dessas informações, devendo-se levar em conta o que se deve inserir ou não em um laudo/relatório por quem será utilizado e quais os interesses. O psicólogo-supervisor ocupa uma posição de suma importância na formação do aluno-estagiário, porque, além da responsabilidade técnica sobre o que acontece num atendimento e sobre o que o estagiário relata sobre o cliente, também se constitui como modelo e referência para este. Não se pode desvincular o psicodiagnóstico interventivo do processo de formação acadêmica, como também não podemos dissociá-lo da ética envolvida nesta prática que tem como principal objetivo desenvolver no aluno a integração dos conhecimentos, como o contato e/ou experiência de relatar, descrever e observar, experienciando o conjunto de conhecimento adquirido nas disciplinas que antecederam ao estágio de Psicodiagnóstico. O Conselho Federal de Psicologia tem por exigência, que o aluno passe pelo período de estágio para poder concluir a sua faculdade. Durante o período de estágio, o aluno aprender a elaborar diversas documentações como o prontuário (que é de livre acesso ao cliente e/ou responsável, composto por documentos padronizados com as informações do paciente, e de cada atendimento realizado) e o registro documental (que se compõe dos relatos de cada atendimento realizado, dos relatórios conclusivos sobre o caso e das decisões sobre o encaminhamento, e tudo que foi discutido na supervisão clínica). Todos os documentos e informações passam pela orientação do supervisor, e devem ser expressados com objetivo e clareza, usando uma linguagem acessível ao paciente ou responsável. No “registro de evolução dos atendimentos”, deve conter uma descrição semanal do acompanhamento realizado, não relacionado a melhora ou não do paciente, mas sim, para que a família consiga reconhecer através da descrição, as etapas pelas quais passaram os processos de acolher, observar, refletir, compreender e intervir. Para complementar, Archanjo e cols. (1998 apud Freitas e Noronha, 2005, p. 88) apontam os supervisores como: [...] responsáveis pelo conteúdo prático do psicodiagnóstico. [A eles] são atribuídas as responsabilidades de planejar as supervisões, para que o supervisionado tenha o mínimo de experiência e competência para a livre prática profissional, uma vez que a supervisão fornece uma orientação formalizada para suprir as necessidades de formação dos alunos. Levando em consideração que todo fenômeno clínico nunca é totalmente passível de descrição, relatar uma sessão é um desafio para o aluno-estagiário e também para o supervisor e nesse processo ocorre um estado permanente de construção e desconstrução, codificação e decodificação do conhecimento. De acordo com a configuração proposta por M. Ancona-Lopez (2002, p. 77), o psicólogo supervisor deve ser incluído no setting do atendimento com a finalidade de “acompanhar os atendimentos realizados e zelar pela saúde psíquica dos clientes, formando profissionais competentes, orientando a prática dos estagiários e fornecendo os conhecimentos necessários para a atuação clínica". A experiência de discutir em supervisão antes de o aluno elaborar seu relato tem se mostrado extremamente proveitosa. Em muitos casos, o supervisor participa do atendimento, e isso pode causar um impacto e gerar um desconforto no aluno, mas cabe ao supervisor desfazer fantasias persecutórias, dirigindo-o para que a percepção de que estas experiências fazem parte do processo ensino-aprendizagem. Sendo que tal modelo de supervisão, do ponto de vista do supervisor, facilita o acesso a forma de descrição e a compreensão dos fatos e de fenômenos psicológicos ocorridos, realizada pelo aluno, assim como, auxilia a avaliação de conhecimentos previamente adquiridos pelos alunos. O psicodiagnóstico interventivo se dá em grupo, portanto,a ênfase que se dá no atendimento grupal e participativo como potencializador de novas significações e explorações subjetivas e possibilidades de a tríade cliente, aluno e professor chegarem a uma compreensão conjunta do fenômeno que queriam entender. Para a confecção de relatos semanais e laudo, o supervisor oferecem aos alunos, dispositivos norteadores que estão apoiados nas bases teóricas que direcionam o olhar e percepção clínica do caso, na qual facilita o desenvolvimento de competências e de habilidades necessárias a experiência clínica do psicodiagnóstico interventivo infantil, permitindo que o aluno se desenvolva por meio de suas próprias descobertas. Os primeiros relatos a serem produzidos são referentes às primeiras entrevistas clínicas realizadas com os pais ou responsáveis como a entrevista inicial semidirigida e a entrevista de anamnese, sendo que para Tavares (2000, p. 45) é um conjunto de técnicas de investigação, que utiliza conhecimentos psicológicos, com o objetivo de descrever e avaliar aspectos pessoais, relacionais e sistêmicos, em um processo que visa a fazer recomendações, encaminhamentos ou propor algum tipo de intervenção em benefício das pessoas entrevistadas. A investigação possibilita o levantamento de informações das quais se torna possível fazer inferências, estabelecer conclusões e tomar decisões. As informações trazidas pela família sobre a criança são de extrema importância para entendimento da queixa, porém não podemos reduzir a visão que temos da criança apenas ao manifesto pelo desejo ou queixa dos pais ou responsáveis. Todas as informações trazidas são de extrema importância, desde a gravidez da mãe, informações sobre a infância dessa criança, comportamento escolar, entre outras, cabendo ao estagiário, juntamente com o supervisor, evidenciar o que achar necessário para um melhor entendimento da queixa e assim dar continuidade ao trabalho. Um dos procedimentos mais significativos do psicodiagnóstico interventivo infantil, realizado em grupo, é a hora do jogo, uma técnica muito explorada por diversos teóricos, aquele momento lúdico que tem por objetivo investigar as fantasias, suas dificuldades e conflitos, trazidas pela criança em seu primeiro contato com o terapeuta. A hora do jogo é um momento em que a criança vai trazer sua “fantasia inconsciente de enfermidade e de cura”. Nós oferecemos uma caixa de brinquedos variados e material gráfico, onde a criança é deixada livre para brincar livre e espontaneamente. É importante que o estagiário relate de forma clara de muito detalhada cada movimento, gesto e atitude da criança, sendo esperado que seja capaz de dissertar sobre: a experiência de observar o livre brincar como forma de comunicação e expressão do conflito; a experiência da criança brincar em grupo, a forma como ela se expressa, se existe liderança ou submissão; às características do brincar individual que a criança apresenta e seu conflito numa esfera individual, dentro de sua história de contexto; as intervenções realizadas e a reação da criança frente a elas, o que indica ou não estarmos no caminho certo adequado à compreensão. Deve-se relatar o comportamento da criança desde o momento que a buscou para iniciar o atendimento, sobre como escolheram seus brinquedos na caixa lúdica, e exatamente o que fizeram em cada brincadeira escolhida. Devemos descrever minuciosamente cada detalhe, o que já nos permite levantar hipóteses sobre as fantasias vividas no espaço do brincar, pois mesmo se a criança ficar em silêncio já representa alguma coisa. As condições das fantasias mostram também os recursos intelectuais da criança e também sua forma de lidar com a realidade. O relato deve conter dados do seu vínculo com a equipe técnica e como a criança estabelece a ligação com o próprio processo do psicodiagnóstico. Na fase de discussão teórico-clínica dos dados, deve-se perceber a capacidade do estagiário interligar situações e fatos observados a teoria e a técnica de hora do jogo e verificar o uso adequado de bibliografia complementar espontaneamente pesquisada por ele, observando suas condições de interligar de modo reflexivo e crítico teoria, técnica e experiência clínica. Como já sabemos, o psicodiagnóstico compreende várias etapas, sendo uma delas a administração de testes psicológicos, devendo estar sempre de acordo com o referencial teórico, o objetivo e a finalidade, a fim de colaborar com o diagnóstico que atende outras técnicas além dos testes. De acordo com a regulamentação do CFP, para se alcançar o status de um “teste psicológico" percorre-se um ”[...] processo de criação, validação e aprovação [...]. Pautados nos princípios éticos que orientam a prática profissional, o uso dos testes e o modo como a análise dos seus resultados são apresentados seguem os indicadores contidos em seu manual. Quando se pensa na utilização de qualquer instrumento de avaliação, é devido questionar se terá a função de responder a alguma questão relacionada ao caso clínico, sendo que o teste só será adotado desde que realmente venha contribuir nesse sentido. É imprescindível sempre comunicar à criança o que está acontecendo, o que estamos percebendo ou o que iremos fazer, sendo fundamental para manter a aliança de trabalho, devendo ser oferecida uma comunicação adequada para a linguagem e vocabulário dela. Devemos sempre deixar claro qual atividade será realizada e o porquê da mesma. Villemor Amaral (2012) ressalta o cuidado de evitar qualquer informação que de falsa noção daquilo que a técnica avalia ou que induza a certo tipo de resposta. Algumas indagações como do tipo: "Você gosta de desenhar?”, "Você gosta de contar histórias?", podem servir para enriquecer o rapport, mas correm o risco de servirem a outro propósito quando a resposta for negativa, podendo interferir na aplicação, se o aplicador estiver despreparado. Seguem sugestões que devem ser observadas e que podem colaborar com a análise do material produzido na sessão: 1) Dados de identificação; 2) Técnica utilizada; 3) Objetivo da técnica e sua justificativa para o uso; 4) Descrição da aplicação; 5) Levantamento dos dados interpretativos síntese interpretativa; 6) Anexo(s); 7) Referências bibliográficas. Não existe uma forma única de ensinar a elaboração de relatos de sessão, mas entendemos da capacidade do supervisor de interagir e se relacionar com os estagiários de modo que resulte em um encontro produtivo, contribuindo assim para a formação profissional dos estagiários e que ao mesmo tempo atinja o objetivo de oferecer um serviço psicológico atendendo a demanda do usuário da instituição.
REFERÊNCIA
ANCONA-LOPEZ, S. Psicodiagnóstico Interventivo: evolução de uma prática. São