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Revisão: A Transição Vítrea em Produtos

Alimentícios

Review: Glass Transition in Food


Products

AUTORES
AUTHORS

) Fernanda Paula COLLARES RESUMO


Theo Guenter KIECKBUSCH
DTF/Faculdade de Engenharia Química - UNICAMP
Caixa Postal 6066 - Campinas-SP - CEP 13083-970 - Brasil A transição vítrea em alimentos tem importância fundamental, visto que tem sido
Fone: 00-55- 019-37887840 - Fax: 00-55-019-32394717
intimamente relacionada com a preservação de fatores de qualidade destes produtos. Muitos
e-mail: fercollares@hotmail.com - theo@feq.unicamp.br
exemplos no domínio da ciência e tecnologia de alimentos têm sido relatados, ilustrando que
a transição vítrea pode ser utilizada para interpretar, com maior ou menor sucesso,
José Roberto Delalibera FINZER transformações que ocorrem no processamento e na estocagem de produtos alimentícios e
Departamento de Engenharia Química - UFU
Av. João Naves de Ávila, 2160, Bl. K, Campus Santa de materiais biológicos de baixa umidade. Este conceito é de interesse, principalmente, para
Mônica - Uberlândia-MG, CEP 38400-089 - Brasil as indústrias alimentícias que utilizam processos de desidratação ou processos a baixas
Fone: 00-55-034-32394189 - Fax: 00-55-034-32394188 temperaturas. Este trabalho tem o intuito de apresentar uma revisão sobre o fenômeno de
e-mail: finzer@ufu.br
transição vítrea de forma simples e compreensível, onde serão abordados os conceitos de
metaestabilidade e de estado vítreo e também discutida a influência de diferentes parâmetros,
tais como, o material plasticizante, a massa molecular e a composição do produto alimentício,
sobre a temperatura de transição vítrea (T g). Serão também apresentados os principais
modelos matemáticos recomendados para definir os limites de atuação do fenômeno de
transição vítrea, assim como os diversos métodos que têm sido utilizados para a determinação
de Tg de produtos alimentícios. Finalizando, a aplicabilidade do conceito de transição vítrea
para explicar as mudanças físicas que ocorrem no processamento e na estocagem de alimentos
é discutida.

SUMMARY

Glass transition is particularly important in food products since it is closely related to


the preservation of quality factors in these products. Several examples in the domain of food
science and technology have been reported, illustrating that the glass transition concept
can be used to interpret, with greater or lesser success, changes accurring during the
processing and storage of low-moisture foods and biomaterials. This concept is of special
interest to food industries making use of drying or low temperature processes. The purpose
of this paper is to present a simple and comprehensible review on glass transition, explaining
the concepts of metastability and glass state. The influence of different parameters such as
the plasticizing material, molecular weight and food composition on the glass transition
temperature (Tg), is also discussed. The main mathematical models recommended for the
prediction of the glass transition phenomenon as well as various methods that have been
used for the determination of Tg in food products are presented. In conclusion, the applicability
of the glass transition concept to explain physical changes occurring during processing or
storage of food materials is shown.
PALAVRAS-CHAVE
KEY WORDS
Alimentos; Calorímetro Diferencial de Varredura;
Polímeros; Temperatura de transição vítrea; Transição
vítrea / Food; Differential Scanning Calorimetry;
Polymer; Glass transition temperature; Glass transition.

Braz. J. Food Technol., 5:117-130, 2002 117 Recebido / Received: 02/04/2001. Aprovado / Approved: 25/01/2002.
F. P. COLLARES Revisão: A Transição Vítrea em
et al. Produtos Alimentícios

Segundo CHAMPION et al. (2000), muitas evoluções


1. INTRODUÇÃO
físicas em produtos alimentícios a baixos conteúdos de água
ou no estado congelado podem ser preditas pelo conceito de
A aplicação e/ou adaptação de conhecimentos transição vítrea que esclarece o efeito do conteúdo de água e
desenvolvidos na área de Ciências dos Polímeros alterou temperatura na estabilidade. Entretanto, várias reações físicas
drasticamente conceitos clássicos da Ciência de Alimentos. A e químicas podem ainda ocorrer no estado vítreo, sugerindo
substituição ou complementação de fundamentos científicos que Tg não pode ser considerada um limiar absoluto de
baseados no equilíbrio termodinâmico (como o da atividade temperatura para a estabilidade. Relaxações sub-Tg e o
de água, por exemplo) por conceitos de metaestabilidade é, envelhecimento físico são fenômenos que mostram que a
reconhecidamente, a grande revolução dos anos 90 que mobilidade molecular abaixo de Tg não pode ser desprezada.
ampliou as bases científicas para uma moderna e mais coerente Publicações mais recentes têm levado a um
interpretação das relações propriedades-estruturas em entendimento mais profundo dos aspectos físicos básicos da
ingredientes, produtos e processos alimentícios. transição vítrea, a fim de determinar seu real impacto na
A primeira menção sobre a transição vítrea em tecnologia de alimentos. Apesar da natureza da transição
alimentos e sistemas biológicos apareceu na literatura nos vítrea estar ainda sob investigação, o conhecimento do
anos 60. Entretanto, a grande variedade de suas aplicações fenômeno de relaxação do estado vítreo está começando a
na ciência e tecnologia de alimentos foi elucidada nos anos contribuir para a explicação de algumas mudanças nos
80 por LEVINE, SLADE (1986). Como a estabilidade de produtos alimentícios abaixo de Tg.
alimentos é dependente do conteúdo de água e devido ao Este trabalho pretende apresentar de uma maneira
fato da temperatura de transição vítrea (Tg) também ser simples e ilustrativa o conceito de transição vítrea e como
altamente sensível a este parâmetro, o conceito de transição pode ser usado para entender o comportamento físico de
vítrea parece ser uma ferramenta importante para o produtos alimentícios durante o processamento e estocagem.
entendimento dos mecanismos das transformações nos Inicialmente, serão abordados os conceitos de
produtos alimentícios e para o controle da sua vida-de- metaestabilidade e de estado vítreo e discutidos os efeitos de
prateleira (shelf life). De fato, a temperatura de transição diferentes parâmetros, tais como, o material plasticizante, a
vítrea é considerada como uma temperatura de referência: massa molecular e a composição do produto alimentício, na
abaixo de Tg, é esperado que o alimento seja estável; acima temperatura de transição vítrea (Tg). Um levantamento dos
desta temperatura, a diferença (T-Tg) entre Tg e a temperatura modelos matemáticos desenvolvidos até o momento para
de estocagem T é responsabilizada por controlar a taxa das predizer o fenômeno de transição vítrea será apresentado,
mudanças físicas, químicas e biológicas. Foi também assim como as diversas técnicas que têm sido investigadas e
demonstrado que a transição vítrea permite a identificação utilizadas para a determinação de Tg de produtos alimentícios.
dos domínios de conteúdo de umidade e temperatura, onde Finalizando, serão discutidos exemplos de processos e
um produto pode exibir uma textura crocante e dura ou propriedades importantes em ciência de alimentos que têm
uma textura mole, gomosa e viscosa. Além disso, o sido afetados ou causados pelo fenômeno de transição vítrea.
conhecimento das variações de propriedades mecânicas e
de transporte na faixa de transição vítrea pode contribuir
para um melhor controle de algumas operações de
processamento de alimentos, tais como secagem, 2. CONCEITO DE METAESTABILIDADE
congelamento, liofilização, extrusão e floculação
(CHAMPION et al., 2000). Um estado de equilíbrio é estável, quando o sistema
O conhecimento atual sobre transição vítrea é está no seu nível mínimo de energia livre e cujas
essencialmente fenomenológico, muito pouco se sabe sobre transformações são espontâneas para ∆G < 0.
os aspectos teóricos, sendo que mais recentemente maior Existem estados de equilíbrio que não são estáveis,
esforço tem sido direcionado para o entendimento da natureza ou seja, podem ser permanentemente alterados como um
do estado vítreo (HAY, JENKINS, 1999, SILLESCU, 1999, WU, resultado de alguma pequena perturbação. Estes são
1999, GUTZOW et al., 2000). Estudos mostram que, em vários chamados de metaestáveis (MODELL, REID, 1983).
materiais alimentícios e biológicos, os sólidos estão em um
estado amorfo metaestável que é muito sensível a mudanças Um sistema termodinâmico, a uma temperatura
na temperatura e no conteúdo de umidade. Freqüentemente, específica, está em uma condição ou estado metaestável se
o estado amorfo é o resultado da remoção de água por toda mudança isotérmica pequena de qualquer de suas
desidratação ou congelamento (WHITE, CAKEBREAD, 1966). variáveis termodinâmicas resulta em um aumento na sua
A matriz amorfa pode existir como um material vítreo muito energia livre, enquanto alterações isotérmicas grandes nestas
viscoso ou como uma estrutura amorfa “gomosa” ou variáveis podem levar a um estado com menor energia livre.
“borrachuda”. Um líquido super-resfriado, por exemplo, que se mantém por
um longo período a temperaturas bem abaixo de seu ponto
A mudança do estado vítreo para o estado “gomoso“
de congelamento, sem cristalizar, acredita-se estar em um
ocorre na temperatura de transição vítrea (Tg) que é específica estado metaestável com relação à sua fase cristalina.
para cada material. Entretanto, plasticizantes como a água
diminuem a temperatura de transição vítrea (ROOS, KAREL, A idéia de metaestabilidade, por definição, requer que,
1991c). ao longo de todas as possíveis rotas entre os estados

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metaestável e estável de um sistema termodinâmico, haja


estados de maior energia livre que o estado metaestável. Estes
estados intermediários representam barreiras de energia livre,
impedindo a transformação espontânea do estado
metaestável para o estável.

3. ESTADO VÍTREO E TRANSIÇÃO VÍTREA

Estado vítreo é operacionalmente definido como o


estado amorfo comum ou estado metaestável não-cristalino
de um sólido (GOFF, 1992). De fato, o material vítreo é, na
realidade, um líquido super-resfriado de alta viscosidade (acima
de 1010 - 1014 Pa.s) que existe em um estado metaestável, sendo
capaz de suportar seu próprio peso em oposição à deformação,
devido à força da gravidade (LEVINE, SLADE, 1992).
O estado vítreo é uma forma da matéria que mantém
a estrutura, energia e volume de um líquido, mas, cujas
mudanças na energia e no volume com a temperatura são FIGURA 1. Faixa de temperatura de transição vítrea para
o
similares, em magnitude, àquelas de um sólido cristalino uma solução de 80% sacarose. Temperaturas inicial ( Tg ),
(KAUZMANN, 1948). média ( Tg ) e final ( Tg ) da região de transição vítrea. ∆Cp
m e

Um material vítreo é formado quando um líquido indica a mudança do calor específico na região da temperatura
típico, com uma estrutura molecular desordenada, é resfriado de transição vítrea (ROOS, 1995a).
abaixo de sua temperatura de fusão do equilíbrio cristalino
(T m ) ou temperatura de congelamento, a uma taxa
suficientemente alta, de modo a não permitir a cristalização
do líquido (FERRY, 1980). TABELA 1. Valores de temperatura de transição vítrea (Tg)
para diferentes compostos anidros e água.
A mais importante mudança, característica do estado
amorfo que envolve a transição de um sólido vítreo para um
estado borrachudo ou gomoso, ou ao contrário de um estado Compostos Tg (oC)
borrachudo para um vítreo, ocorre na chamada temperatura
de transição vítrea (Tg).
- Frutose 5a ; 7 b; 10c; 11 d;13 e
A temperatura de transição vítrea (Tg) não é um ponto - Glicose 21 f;29 g; 30h; 31a,d; 35d
nitidamente localizado (Figura 1), mas define o centro de uma - Lactose 101 a,d
região em torno de 20 oC ou superior, na qual a transformação - Maltose 43 ; 70 ; 87 k; 91l ; 92c; 95 b
d j

ocorre (WHITE, CAKEBREAD, 1966). 52d,f; 57e ; 67c,m; 70 b


- Sacarose
150 a 250n
Valores de Tg para sistemas alimentícios anidros e para - Amido de milho * 39,3o
a água são apresentados na Tabela 1. - Glúten 0,1 p; 4,5q
A temperatura de transição vítrea é específica para cada - Maçã liofilizada 188r
material e é afetada por três principais fatores: o material - Maltodextrina M 040 160r
plasticizante, a massa molecular e a composição. 121r
- Maltodextrina M 100
35,8r
- Maltodextrina M 250 83,1s
3.1 Plasticização da água - Morangos liofilizados -135t
- Soro de leite liofilizado
Baseado em conceitos da ciência dos polímeros - Água
sintéticos, um plasticizante é definido como um “material a
ROOS, 1995a; bORFORD et al. (1990) citado por SLADE et al., 1993; cROOS citado
incorporado em um polímero para aumentar sua viabilidade, por SLADE et al., 1993; dSLADE et al., 1993; eFRANKS (1990) citado por SLADE et al.,
flexibilidade e extensibilidade” (LEVINE, SLADE, 1992). 1993; fFRANKS (1989); gCHAN et al., 1986; hROOS, KAREL,1991d; iWHITE, CAKEBREAD,
1966; jGREEN, ANGELL (1989); kROOS, KAREL citado por SLADE et al., 1993; lORFORD
A plasticização, a um nível molecular, leva a um et al. (1989) citado por SLADE et al., 1993; mKAUZMANN, 1948; nSTRAHM, 1998;
aumento do espaço intermolecular ou volume livre, o
NICHOLLS et al., 1995; pSÁ et al., 1999; qWELTI-CHANES et al., 1999; r ROOS, 1987;
s
BURIN et al., 2000; t OHARI et al., 1987. * Valores preditos.
diminuindo a viscosidade local e, concomitantemente,
aumentando a mobilidade (FERRY, 1980). A plasticização
implica na íntima compatibilidade de mistura a nível molecular,
de modo que um plasticizante é homogeneamente misturado A água é um exemplo de um plasticizante que afeta a
em um polímero ou um polímero em um plasticizante (SLADE Tg de polímeros completamente amorfos e ambos, Tg e Tm, de
et al., 1993). polímeros parcialmente cristalinos (LEVINE, SLADE, 1992). A

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água age como um plasticizante de materiais alimentícios


amorfos, e o conteúdo de água define a localização de Tg. A
plasticização pela água é típica de carboidratos de baixa massa
molecular, oligossacarídeos, polissacarídeos e proteínas
(ROOS, 1995a).
O efeito plasticizante da água pode ser analisado
através de diagramas de estado. Em tais diagramas, a curva
contínua de transição vítrea de Tg em função da concentração
de sólidos, demonstra o efeito da água na Tg, especialmente a
baixos conteúdos de umidade. BONELLI et al . (1997),
estudando o efeito do conteúdo de umidade residual no
colapso estrutural de matrizes de açúcares liofilizados (lactose,
maltose, sacarose e trealose), observaram que esta umidade
residual promove notável mudança na Tg devido à extrema
sensibilidade ao efeito plasticizante da água na faixa de baixa
umidade.
O efeito da água na Tg de vários materiais alimentícios F I G U R A 2 . Temperaturas de transição vítrea de
tem sido modelado com a equação de Gordon-Taylor (ROOS, maltodextrinas (Maltrin M040, M100, M200 e M365, com
1995c): DE 1 igual a 5, 10, 20 e 36, respectivamente) em função da
atividade de água (aw) (ROOS, 1995a).
w1 Tg1 + k w2 Tg 2
Tg = (1)
3.2. Efeito da massa molecular na Tg
w1 + k w2
Na família dos polímeros alimentícios homólogos (isto
onde w 1 e w2 são as frações em peso dos compostos é, desde o monômero glicose, passando por maltose,
constituintes, Tg1 e Tg2 são as temperaturas absolutas de maltotrioses, maltodextrinas, até polímeros de alta massa
transição vítrea dos compostos constituintes, e k é uma molecular como a amilose e a amilopectina, que são os
constante. O subscrito ‘1’ refere-se ao material sólido e ‘2’ à constituintes do amido), Tg aumenta com o aumento da massa
água. molecular do composto (LEVINE, SLADE, 1992; MITSUIKI et
al., 1999).
Segundo COUCHMAN, KARAZ (1978), o valor de k pode
ser obtido através da expressão: FOX, FLORY (1950) observaram que a T g diminuía
linearmente com o aumento do valor do inverso da massa
∆C p 2 molecular, de acordo com a Equação (3), que pode ser usada
k = (2) para predizer o valor de Tg para compostos de alta massa
∆C p 1 molecular.

1
onde ∆Cpi é a variação nas capacidades caloríficas de cada Tg = Tg ( ∞) − Kg (3)
componente que constitui o material analisado. M

onde: M é a massa molecular ; Kg é uma constante; Tg(∞) é o


Como os valores exatos de ∆Cpi são difíceis de se Tg limite a alta massa molecular.
obter experimentalmente, ROOS, KAREL (1991a e b) têm
usado valores experimentais de Tg obtidos a vários Em 1996, BUSIN et al. encontraram uma relação linear,
conteúdos de água para calcular valores de k para a Equação (4), entre Tg (°C) e a dextrose equivalente (DE) para
carboidratos. maltodextrinas em uma ampla faixa de DE (2 a 100) com um
coeficiente de correlação satisfatório (r=0,98). Eles também
A equação de Gordon-Taylor tem sido aplicada na sugeriram que a medida de Tg poderia ser uma ferramenta
predição da plasticização da água de muitos componentes e útil para determinar o grau de hidrólise do amido.
materiais alimentícios, incluindo carboidratos e proteínas
(ROOS, KAREL, 1991a, c e f; KALICHEVSKY et al., 1993), assim Tg = − 1,4 (DE ) + 449,5 (4)
como de fármacos (HANCOCK, ZOGRAFI, 1994).
Embora a correlação geral entre a massa molecular de
Em aplicações práticas, o efeito da água na Tg pode uma série de carboidratos e T g tem-se tornado bem
também ser expresso em termos da atividade de água (aw). O estabelecida e amplamente aceita, T g pode variar
efeito da aw na Tg pode ser predito através do gráfico de Tg
contra aw e geralmente se usa uma aproximação por regressão 1
O valor de DE é um índice do grau de hidrólise do amido para a obtenção do composto,
linear embora a verdadeira relação seja sigmoidal, como mostra onde altos valores de DE correspondem a grandes extensões de hidrólise, isto é,
a Figura 2 (ROOS, 1995a). baixa massa média molecular.

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substancialmente, até mesmo com uma série de compostos


de mesma massa molecular e com diferenças sutis na estrutura
molecular (SLADE et al., 1993). Por exemplo, a glicose e a
frutose, que são dois monossacarídeos de mesma massa
molecular, apresentam valores de Tg bem distintos, o mesmo
ocorrendo com os dissacarídeos sacarose e maltose.

3.3 Efeito da composição na Tg

Existem duas relações fundamentais usadas para


correlacionar o efeito da composição na temperatura de
transição vítrea, uma origina-se da condição de continuidade
da entropia em Tg e a outra da condição de continuidade do
volume (COUCHMAN, KARAZ,1978).
A primeira relação, para um sistema de dois
componentes, corresponde à equação de Gordon-Taylor e já
foi apresentada anteriormente para a avaliação do efeito da
plasticização pela água na Tg, através das Equações (1) e (2). A FIGURA 3. Efeito da adição de maltodextrina na temperatura
Equação (1) pode ser expandida para descrever sistemas com de transição vítrea, Tg, da sacarose (ROOS, KAREL, 1991e).
maior número de componentes, como foi demonstrado por
ARVANITOYANNIS et al. (1993) para o sistema ternário glicose-
frutose-água e por KALICHEVSKY, BLANSHARD (1993) para o 3.4 Determinação da temperatura de transição
sistema água-frutose-amilopectina: vítrea

Muitas propriedades físicas de um material alimentício


w1 ∆C p1 Tg1 + w2 ∆Cp 2 Tg 2 + w3 ∆Cp 3 Tg 3
Tg = (5) mudam repentinamente, quando a temperatura aumenta
w1 ∆C p1 + w2 ∆Cp 2 + w3 ∆Cp 3 acima de Tg, entre elas, as mais importantes são um aumento
no volume molecular livre, um aumento na capacidade
calorífica (Cp), um aumento no coeficiente de expansão térmico
onde os subscritos 1, 2 e 3 referem-se aos três componentes (α) e coeficiente dielétrico (ε) e mudanças nas propriedades
do sistema ternário. viscoelásticas. Mudanças aceleradas em uma das propriedades
acima são a base para detecção da temperatura de transição
A expressão para a dependência de Tg em relação à vítrea (BHANDARI, HOWES, 1999).
condição de continuidade do volume é equivalente à Equação
(1) (COUCHMAN, KARASZ, 1978): Existem muitas técnicas experimentais que podem ser
usadas para medir a Tg em sistemas alimentícios, e algumas
delas estão listadas na Tabela 2.
φ1o ∆α1 Tg 1 + φ2o ∆α 2 Tg 2
Tg = (6) Os valores de T g de compostos amorfos e
φ1o ∆α1 + φ2o ∆α 2 materiais alimentícios, como por exemplo, abacaxi
(TELIS, SOBRAL, 2001) e caqui liofilizados (SOBRAL et al .,
2001), são geralmente determinados por calorimetria
As frações volumétricas φ1o e φ2o são definidas em diferencial de varredura (DSC). O DSC utiliza um pequeno
termos dos volumes molares V1o e V2o avaliados nas calorímetro dinâmico, que é usualmente processado com
um programa de temperatura-tempo linear (BÜHLER,
respectivas T g1 e T g2. Os incrementos do coeficiente de
LIEDY, 1989). É definido como uma técnica na qual a
expansão volumétrica na transição isobárica, ∆α1 e ∆α 2 , são
diferença na absorção de energia pela amostra e por um
derivados da definição α i = 1 Vi o (∂ Vi ∂ T ) p . material de referência é medida como uma função da
A Figura 3 mostra o efeito da adição de temperatura, enquanto a substância e o material de
maltodextrinas, com valores de dextrose-equivalente iguais referência são sujeitos a um controle programado de
a 4, 10 e 20, na temperatura de transição vítrea, Tg, da temperatura (MA et al ., 1990).
sacarose. O Tg da mistura aumenta com o aumento da O DSC é usado, portanto, para medir a quantidade
massa molecular do aditivo e conseqüentemente com a de energia necessária para elevar a temperatura de uma
diminuição da dextrose-equivalente (DE ). amostra. Em essência, o DSC mede a mudança da entalpia
O abaixamento da Tg com o aumento da concentração com relação à temperatura (calor específico). Na
da sacarose foi observado por TORREGGIANI et al. (1999) em temperatura de transição vítrea, uma apreciável mudança
suco de morangos no qual foram adicionados 20% de no calor específico é observada quando o material é
carboidratos como maltose, sorbitol e mistura de glucose- transformado de um estado vítreo imóvel para um estado
frutose-sacarose (2:2:0,5). gomoso de maior mobilidade (STRAHM, 1998).

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TABELA 2. Métodos para a medida da transição vítrea A análise termomecânica (TMA) é definida como uma
(SCHENZ, 1995). técnica na qual a deformação de uma substância sob carga
não-oscilatória (compressão, tensão, flexão ou torção) é
Análises térmicas Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) medida como uma função da temperatura, enquanto sujeita
Calorimetria Diferencial de Varredura a um programa de temperatura controlada. Já a análise
Modulada (MDSC) mecânica dinâmica (DMA) é uma técnica para a medida de
Propriedades mecânicas Análise Termomecânica (TMA) propriedades mecânicas (módulo, características de
Análise Mecânica Dinâmica (DMA) amortecimento) de materiais quando eles são deformados
Análise Termomecânica Dinâmica (DMTA) por força periódica. Como a faixa de módulo do DMA é
Espectrofotômetro Reométrico Mecânico muito alta para vários materiais alimentícios, sua aplicação
(RMS) está limitada a alguns alimentos congelados (MA et al.,
Propriedades dielétricas Análise Dielétrica Diferencial (DDA) 1990).
Espectrofotometria Ressonância Magnética Nuclear (NMR) Uma série de produtos, incluindo queijo, caseína,
glúten, isolados de soja, amidos e chocolates, foi testada para
a medida de Tg usando a análise termomecânica dinâmica
A variação da capacidade calorífica pode ser (DMTA). Em 1989, WETTON, MARSH citado por NIKOLAIDIS,
determinada pelos valores de mudança no fluxo de calor, ∆Y , LABUZA (1996) demonstraram o grande potencial da aplicação
da taxa de aumento da temperatura (scanning rate) e peso da desta técnica em materiais poliméricos não-sintéticos, tais
amostra, de acordo com a seguinte equação: como queijo e chocolate. O DMTA também mostrou ser uma
técnica apropriada para a medida de Tg de produtos
∆Y alimentícios compostos, como para o biscoito cracker
∆Cp = (7)
mm × rsc comercial (NIKOLAIDIS, LABUZA,1996).
Em 1991, COCERO, KOKINI estudaram as mudanças
onde : ∆C p é a capacidade calorífica (J/ g oC ); ∆Y é a variação nas propriedades reológicas devido à transição vítrea da
do fluxo de calor (mW ); mm é a massa de material (g); rsc é a glutenina hidratada (amostras com 4 a 14,4 % de umidade),
taxa de variação da temperatura (oC /s ) através do espectrômetro reométrico mecânico (RMS). As
temperaturas de transição vítrea obtidas pelo RMS foram
superiores àquelas obtidas por DSC, porque o DSC detecta a
O DSC é insensível a Tg quando a mudança no calor
contribuição do volume livre para a capacidade calorífica,
específico é pequena. Além disso, complicações existem com
resultando na mobilidade molecular da amostra depois de
sistemas multicomponentes quando os vários constituintes
sua transição, enquanto o RMS detecta o amolecimento real.
sofrem muitas transições térmicas pequenas dentro da mesma
Com a exceção das amostras com umidades extremas, a
faixa de temperatura. A interpretação dos dados do DSC para
correlação entre as temperaturas obtidas pelas duas técnicas
estes sistemas é difícil (BILIADERIS, GALLOWAY, 1989).
se apresentou muito boa.
Em 1993, READING et al . descreveram a teoria
A ressonância magnética nuclear (NMR) foi utilizada
operacional do calorímetro diferencial de varredura modulada
por RUAN et al. (1998) e RUAN et al. (1999) na determinação
(MDSCTM) e demonstraram que mudanças térmicas reversíveis
da temperatura de transição vítrea (T g) de polímeros
e irreversíveis podiam ser separadas usando esta técnica. A
alimentícios, como maltodextrina, pão, bolo e biscoito. A NMR
transição vítrea, sendo reversível, poderia ser diferenciada das
é uma técnica espectroscópica baseada nas propriedades
mudanças irreversíveis, tais como a relaxação endotérmica de
magnéticas do núcleo atômico e é freqüentemente usada
materiais amorfos, a gelatinização, a recristalização e a
para monitorar as propriedades de movimento das moléculas
desnaturação protéica.
pela detecção das características de relaxação do núcleo ativo
Segundo BELL, TOUMA (1996), o MDSC diferenciou com do NMR, tal como 1H, 2H, 3H, 13 C, 17 O, 23Na e 31 P. Estes
sucesso a transição vítrea de outras mudanças térmicas pesquisadores encontraram que os tempos de relaxação do
irreversíveis em componentes alimentícios simples. Entretanto, NMR experimentaram mudanças dramáticas acima e abaixo
esta técnica não pode determinar a transição vítrea para de certas temperaturas, que são característica do tipo de
sistemas alimentícios mais complexos a baixos conteúdos de material e conteúdo de água. Os resultados para as amostras
água. Para estes últimos, o MDSC não foi mais sensível do que de maltodextrina (DE 15), que foram usadas como modelo,
o DSC padrão, enquanto para soluções, o MDSC foi mais indicam que as temperaturas características determinadas
adequado. Os valores obtidos de Tg através de MDSC foram pelo NMR concordaram com os valores de Tg determinados
reprodutíveis e consistentes tanto em relação aos obtidos pelo usando DSC.
DSC padrão, como aos dados publicados na literatura. A Tg de muitos polímeros alimentícios anidros de
Como a medida de eventos térmicos é muito menos alta massa molecular, tais como amido e proteínas, não
sensível à transição vítrea que a medida de propriedades podem ser determinados experimentalmente, pois eles
mecânicas do sistema, mudanças volumétricas e mudanças começam a se decompor antes de alcançar a Tg. Neste caso,
reológicas podem também ser analisadas na determinação de a Tg pode ser predita (BUSIN et al., 1996; ROOS, 1995a)
Tg, utilizando-se métodos como TMA, DMA, respectivamente pelo coeficiente angular ( Tg∞) em um gráfico de Tg em função
(SCHENZ, 1995, VODOVOTZ, CHINACHOTI, 1996). de 1/M (inverso da massa molecular). Alternativamente,

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et al. Produtos Alimentícios

uma análise em sistema multicomponente poderia ser quantitativa do fenômeno de transição vítrea e seu impacto
usada, pela adição de diferentes quantidades de agente nas propriedades físicas do material (PELEG, 1992).
plasticizante, como a água, e novamente determinar a A exata relação das curvas de viscosidade com a
intersecção da reta, quando o conteúdo de água tender a temperatura, a qualquer composição, é importante na
zero (BHANDARI, HOWES, 1999). avaliação da estabilidade devido à importância da região
borrachuda ou gomosa para os eventos cinéticos controlados
por difusão.
4. A CINÉTICA DA TRANSIÇÃO VÍTREA Existem muitas equações desenvolvidas para
relacionar a viscosidade, η, e a temperatura. Uma delas é a
equação de Arrhenius (SCHENZ, 1995):
A transição vítrea em sistemas amorfos é um fenômeno
cinético de mudança no estado físico que depende da
−B T
temperatura, do tempo (ou freqüência) e da composição do η = Ae (11)
material específico (FERRY, 1980; WUNDERLICH citado por
LEVINE & SLADE, 1992; GOFF, 1992).
onde o fator pré-exponencial A e o fator exponencial B são
Em termos termodinâmicos, a transição vítrea é constantes para um dado sistema e T é a temperatura absoluta.
definida como uma transição de segunda ordem (em contraste
com a fusão de um cristal, que é de primeira ordem), ou seja, A equação de Arrhenius se aplica para valores de
as duas fases envolvidas diferem nas segundas derivadas da temperatura T > Tm ou T < Tg, como pode ser visto pela
energia livre, G, com respeito à temperatura e pressão, mas Figura 4.
não nas suas energias livres por si mesmas ou nas suas
derivadas primeiras. Portanto, a transição vítrea é caracterizada
por (KAUZMANN, 1948; LEVINE & SLADE, 1992):

(i) Descontinuidade no coeficiente de expansão


térmica:

O volume, V = (∂G/∂P)T, não se altera na transição, mas


o coeficiente de expansão, α, definido por:

1  ∂V  1  ∂ 2G 
α =   =   (8)
V  ∂T  P V  ∂p ∂T 

passa por uma mudança muito rápida.

(ii) Descontinuidade na capacidade calorífica : FIGURA 4. Viscosidade como uma função da temperatura
reduzida (Tm/T) para vidro e polímeros parcialmente cristalinos
Similarmente ao item anterior, a entalpia, H, que é (LEVINE, SLADE, 1992).
dada por:
Quando a temperatura (T) é reduzida abaixo daquela
 ∂G  do estado líquido de baixa viscosidade (Tg < T < Tm), uma
H = G − T  (9)
 ∂T  P cinética não-linear completamente diferente da cinética de
Arrhenius, torna-se operante e é caracterizada por uma
não se altera, mas a capacidade calorífica, Cp , que é definida dependência da temperatura extraordinariamente grande
por: (Figura 4) (LEVINE, SLADE, 1992). Esta última é chamada de
cinética de WLF ou teoria de Williams-Landel-Ferry.
 ∂H   ∂ 2G  A equação semi-empírica de WLF (Equação 12),
Cp =   = − T  2 (10)
 ∂T  P  ∂T  P derivada da teoria de volume livre, descreve a natureza cinética
da transição vítrea e define a dependência exponencial da
sofre uma mudança brusca durante a transição. temperatura com propriedades viscoelásticas de polímeros
amorfos e líquidos formadores de vidro para a faixa de
A transição vítrea pode também ser definida temperatura do estado gomoso ou borrachudo de Tg a
operacionalmente, baseada nas propriedades mecânicas, em Tg+100oC (LEVINE, SLADE, 1986, LEVINE, SLADE, 1992).
termos de um processo de relaxação mecânica, tal como a
WILLIAMS et al. (1955) observaram que a diminuição
viscosidade (FERRY, 1980).
da viscosidade acima de Tg de várias substâncias formadoras
Os modelos que relacionam a viscosidade à de vidro era aproximadamente igual e podia ser expressa pela
temperatura são uma ferramenta essencial em qualquer análise seguinte equação:

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η − C1 ( T − TS ) Outras equações aplicáveis para a descrição da


log = (12) dependência da viscosidade em relação à temperatura na
ηS C2 + ( T − TS )
transição vítrea são a equação de Vogel-Tamman-Fulcher (VTF)
(Equação 14) e a expressão da regra da potência (Equação
onde TS é a temperatura de referência; C1 e C2 são constantes 15) (NOEL et al., 1990; ROOS, 1995a):
características do sistema e dependem da TS selecionada; η é
a viscosidade na temperatura T e ηS é a viscosidade na  B 
temperatura de referência TS . η = A exp   (14)
 T − T0 
Os valores de C1 e C2 descrevem a dependência da
temperatura dos processos de relaxação a temperaturas acima
da temperatura de referência. Para um polímero não-diluído, (
η = A' T − Tg ) r
(15)
quando Tg é usada como a temperatura de referência, C1 é
proporcional ao inverso do volume livre do sistema a Tg , onde: η é a viscosidade; A, A’’, B e r são constantes; T é a
enquanto C2 é a razão entre o volume livre a Tg e o coeficiente temperatura (oC); T0 é a temperatura de referência (oC) e Tg é a
de expansão do volume livre. Este último, por sua vez, é a temperatura de transição vítrea (oC).
constante que descreve a dependência linear, em ∆T acima de
Tg, do aumento no volume livre devido à expansão térmica
acima de Tg (isto é, a diferença entre os volumes dos estados
líquido gomoso e sólido vítreo) (LEVINE, SLADE, 1992). 5. DIAGRAMAS DE ESTADO
Segundo PELEG (1992), o modelo de WLF tem-se
mostrado válido, principalmente, quando a temperatura de Um entendimento básico das transições vítreas em
referência, TS, que pode ser selecionada arbitrariamente, é pelo sistemas alimentícios começa pela consideração dos
menos 50oC acima da temperatura de transição vítrea. O uso diagramas de estado, que são assim chamados porque
de Tg como a temperatura de referência, com os valores das representam não somente um diagrama de fases de equilíbrio,
constantes C1 e C2 igual a 17,44 (adimensional) e 51,6 (K), mas uma combinação de estado de equilíbrio e eventos
respectivamente (que são os valores das ‘constantes metaestáveis ou cinéticos (SCHENZ, 1995).
universais’, extraídos de dados experimentais de muitos Um diagrama de estado representa estados nos
polímeros amorfos sintéticos), pode, muitas vezes, ser quais um sistema pode existir como uma função da
inapropriado. temperatura, concentração, tempo e pressão (LEVINE,
Entretanto, a equação de WLF pode ser linearizada SLADE, 1986). Diagramas de estados simplificados mostram
para determinar as constantes C 1 e C2 através de dados o estado físico de materiais alimentícios como uma função
experimentais, como mostrado a seguir (ROOS, 1995b): da concentração e da temperatura, como na Figura 5 (ROOS,
KAREL, 1991b).
( T − TS ) C2 1
=− − ( T − TS ) (13) Na Figura 5, Tm representa a curva de equilíbrio de
logη − logηS C1 C1
fusão de um sistema alimentício (que pode ser desde um
simples soluto, tal como a sacarose, até um sistema
O modelo de WLF não é limitado somente à complexo, como o leite) e Tg representa a curva de transição
viscosidade, mas pode também acomodar outras relaxações vítrea do sistema alimentício. Quando uma solução de
mecânicas ou classes de parâmetros como a resistência à soluto diluído é resfriada abaixo da temperatura ambiente,
tração (PELEG, 1992). gelo cristalizará à Tm e a solução líquida residual se
A aplicação da equação de WLF para os sistemas concentrará. Como o sistema continua a ser resfriado, mais
alimentícios tem conduzido a um entendimento do e mais gelo será formado até que, na temperatura Tm’, a
comportamento dos alimentos a partir de uma perspectiva da solução concentrada torna-se tão viscosa que afetará a
ciência de polímeros. Os princípios-chave desta aproximação mobilidade da água e nenhum gelo adicional cristalizará.
são: Com um resfriamento adicional, o sistema cruzará a curva
de transição em Tg’, que é a temperatura de transição vítrea
(i) os sistemas alimentícios podem ser tratados como de sistemas alimentícios que atingiram a máxima
sistemas poliméricos clássicos; concentração, (Cg’), e pode ser alcançada por congelamento.
(ii) Tg é importante no entendimento e predição do Considerando-se intervalos curtos de tempo, o
comportamento dos sistemas alimentícios; resfriamento posterior deste sistema não mais provocará a
cristalização de gelo; ele se tornou um sólido mecânico
(iii) a água é um plasticizante onipresente de polímeros
com viscosidade extraordinariamente alta, isto é, um
alimentícios;
sistema vítreo (SCHENZ, 1995).
(iv) a cinética de sistemas poliméricos de alimentos na Estudos com matrizes maximamente concentradas por
região gomosa ou borrachuda não segue a expressão de congelamento têm mostrado que valores de Tg’ geralmente
Arrhenius, sendo melhor descrita pela equação de WLF; aumentam com o aumento da massa molecular (LEVINE &
(v) a cinética é controlada pela difusão e depende do SLADE, 1986), mas o Cg’ é igual à aproximadamente 80%
tempo. para a maioria dos carboidratos (ROOS, KAREL, 1991b).

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1986). Estas mudanças físicas em materiais desidratados estão


diretamente relacionadas à temperatura de transição vítrea,
Tg (ROOS, KAREL, 1991d).
Tanto a pegajosidade, como a compactação e a
cristalização estão relacionadas ao fenômeno do colapso. O
colapso ocorre quando uma matriz não pode suportar, por
longo tempo, seu próprio peso, levando a mudanças
estruturais como a diminuição no volume e a aglomeração de
pós secos, contendo carboidratos amorfos. A compactação é
observada quando ocorre um endurecimento e uma redução
no escoamento das partículas, que pode levar a uma pobre
reidratação e dispersibilidade. Durante o colapso, a umidade
é liberada das regiões cristalizadas para as amorfas, o que
leva à redução da viscosidade local, desse modo aumentando
a taxa de cristalização dos carboidratados amorfos presentes.
Portanto, todos os três resultados são fenômenos físicos
relacionados ao escoamento de pós secos (TSOUROUFLIS et
al., 1976).
FIGURA 5. Diagrama de estado simplificado mostrando as O fenômeno da pegajosidade (stickiness) é
mudanças acima da temperatura de transição vítrea (Tg). A freqüentemente encontrado durante a produção ou na
temperatura do começo da fusão do gelo, a temperatura de estocagem de pós desidratados. Em secadores por
transição e a concentração das soluções na máxima atomização, este fenômeno pode ser um enorme problema,
concentração por congelamento são indicadas por Tm’, Tg’ e quando as partículas, que foram insuficientemente secas,
Cg’, respectivamente. A linha Tm mostra o ponto de equilíbrio colidem com outras (coesão) ou com a parede do equipamento
de fusão do gelo acima de Tm’ (ROOS, 1995a). de secagem (adesão), aderindo a esta. Isso pode levar a baixos
rendimentos de produto, problemas operacionais e
Os diagramas de estado podem ser usados para dificuldade de manipulação do pó. Para produtos sensíveis
mostrar a formação do estado amorfo no processamento de ao calor, este fenômeno pode também levar ao
superaquecimento, resultando em características sensoriais
alimentos e para descrever os vários fenômenos, dependentes
da temperatura, umidade e tempo, típicos deste estado (ROOS, indesejáveis e/ou degradação do alimento (LAZAR et al., 1956,
1995a). BRENNAN et al., 1971, DOWNTON et al., 1982, PAPADAKIS,
BAHU, 1992, CHUY, LABUZA, 1994).
Os problemas com a pegajosidade de pós durante o
processamento foram observados durante a secagem por
6. TRANSFORMAÇÕES FÍSICAS EM ALIMEN- atomização de polpa de tomate (LAZAR et al., 1956) e de suco
TOS RELACIONADAS À TRANSIÇÃO concentrado de laranja (BRENNAN et al., 1971). Estes estudos
VÍTREA mostraram que o fenômeno de pegajosidade é conseqüência
do aumento nas condições de temperatura e umidade relativa.
Os carboidratos e as proteínas, nutrientes WHITE, CAKEBREAD (1966) foram os primeiros a
macromoleculares encontrados nos produtos alimentícios em reconhecer que um alimento desidratado é um vidro amorfo,
quantidades variáveis, podem formar estruturas de não- isto é, um líquido metaestável super-resfriado, abaixo de sua
equilíbrio, amorfas, supersaturadas ou parcialmente amorfas, temperatura de transição vítrea (Tg.), com viscosidade da ordem
quando sujeitos a processos nos quais a temperatura é de 1012 Pa.s. A temperaturas acima de Tg e umidade alta, o
rapidamente reduzida abaixo do ponto de fusão desses produto desidratado poderá passar do estado vítreo para o
componentes ou, então, a água é removida por evaporação estado gomoso ou borrachudo (com uma viscosidade menor),
ou por formação de gelo (KAUZMANN, 1948, WHITE, provocando o fenômeno da pegajosidade (DOWNTON et al.,
CAKEBREAD, 1966, ROOS, 1995a). 1982) .
Para as indústrias alimentícias, particularmente aquelas A temperatura na qual ocorre a pegajosidade (ponto
que utilizam processos de conservação por desidratação de stickiness) é governada pela temperatura de transição vítrea
(secagem e liofilização) ou por processos a baixas temperaturas (Tg). A viscosidade crítica para esse fenômeno é em torno de
(congelamento), o conhecimento da temperatura de transição 10 7 Pa.s que corresponde à viscosidade do ponto final da
vítrea e do mecanismo da transformação vítrea são de interesse transição vítrea, como pode ser visto na Figura 6 (ROOS, KAREL,
primordial (GENIN, RENÉ, 1995). 1991b).
Os produtos alimentícios em pó, que contém CHUY, LABUZA (1994) mostraram que para fórmulas
carboidratos amorfos, podem passar por mudanças físicas, lácteas infantis em pó e para a maltodextrina DE 10, a
tais como: cristalização, pegajosidade e compactação durante temperatura de transição vítrea é inferior às temperaturas do
o processamento, manipulação e estocagem (LEVINE, SLADE, ponto de pegajosidade e de colapso (Figura 7). Ambas medem

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o mesmo fenômeno físico relacionado à transição vítrea, mas As temperaturas do ponto de pegajosidade e de
são observações de um grau diferente de colapso. A colapso diminuem com o aumento do conteúdo de água
temperatura de colapso é uma medida do endurecimento concorrentemente com Tg (devido ao efeito plasticizante da
inicial, enquanto a temperatura de pegajosidade mede um água na matriz), e a viscosidade crítica se correlaciona com a
estágio avançado do colapso. viscosidade de materiais amorfos a temperaturas 10-20o C
acima de Tg (ROOS, KAREL, 1991c).
LEVINE, SLADE (1986) consideraram o colapso de
materiais desidratados ser governado pelo fenômeno de
transição vítrea. ROOS, KAREL (1991e) observaram que os
valores de T g de maltodextrinas determinados por DSC
(Calorimetria Diferencial de Varredura) foram menores que os
correspondentes valores de T co apresentados por
TSOUROUFLIS et al. (1976), mas mostraram similar decréscimo
com o aumento no conteúdo de água.
A Figura 8 mostra que a relação entre Tg e Tco é linear
para as maltodextrinas com valores de dextrose-equivalentes
de 10, 15, 20 e 25, e que Tco ocorre ao redor de 40 a 70oC
acima de Tg.
A alta correlação entre os valores experimentais de Tg
e Tco sugere que a determinação de Tco é um método aplicável
para a determinação de Tg de alimentos amorfos (ROOS,
1995b). A diferença de temperatura entre Tg e Tco é uma medida
da diferença entre a escala de tempo experimental da
observação de Tg com DSC e os métodos de determinação de
FIGURA 6. Temperatura de transição vítrea (Tg) e ponto de Tco, incluindo a determinação da temperatura de pegajosidade,
pegajosidade de uma mistura amorfa de sacarose e frutose como foi também exposto por CHUY, LABUZA (1994).
(7:1) mostrando a relação entre Tg e a pegajosidade (ROOS,
Assim como Tg e Tco, o ponto de pegajosidade de pós
1995a). alimentícios também diminui com o decréscimo da massa
molecular e os produtos com baixos Tg têm também baixas
temperaturas de pegajosidade (ROOS, 1995c).

FIGURA 8. Correlação entre a temperatura de colapso, Tco, e


FIGURA 7. Temperaturas de transição vítrea (Tg), do ponto a temperatura de transição vítrea, Tg, para as maltodextrinas
de pegajosidade (Tp) e de colapso (Tco) como uma função do com valores de dextrose equivalente de 10 (M100), 15
conteúdo de umidade para a maltodextrina DE 10 (taxa de (M150), 20 (M200) e 25 (M250). A Tg foi predita com a equação
aquecimento de 10 oC/min) (CHUY, LABUZA, 1994). de Gordon e Taylor com os dados de ROOS, KAREL (1991e) e
ROOS (1993b). (ROOS, 1995b).
Informações sobre as temperaturas de pegajosidade e
colapso são valiosas no projeto de processos de aglomeração, A pegajosidade de produtos alimentícios que contém
que usam a coesão controlada para aumentar o tamanho das alta quantidade de monossacarídeos, como sucos de frutas,
partículas dos alimentos em pó e, conseqüentemente, melhorar pode ser reduzida e a estabilidade dos produtos aumentada
sua dispersibilidade (ROOS, KAREL, 1991b, ROOS, 1995a). pela adição de compostos com altos valores de T g .

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Maltodextrinas com relativamente baixa dextrose equivalente ser usada para explicar o amolecimento de produtos
(DE ) são freqüentemente usadas como materiais que extrusados (STRAHM, 1998), a cristalização da sacarose em
diminuem o stickiness e melhoram a estabilidade de pós sólidos amorfos, a mudança nas propriedades de textura do
alimentícios (ROOS, KAREL, 1991d). pão, a perda de textura de produtos liofilizados (BONELLI et
al., 1997) e a gelatinização (VODOVOTZ, CHINACHOTI, 1996)
O resfriamento das paredes do secador a temperaturas
e retrogradação do amido (BAIK et al., 1997). Algumas reações
inferiores a Tg tem sido empregado para evitar a pegajosidade
em secadores por atomização (LAZAR et al., 1956). Vários químicas, controladas por difusão, podem também ser
influenciadas pela transição vítrea, como a influência nas taxas
aditivos, geralmente de alta massa molecular, têm sido
de escurecimento não-enzimático (reação de Maillard)
também usados para elevar a temperatura de transição vítrea
do material a ser desidratado, combatendo a pegajosidade (LIEVONEN et al., 1998, WHITE, BELL, 1999) e na estabilidade
térmica da enzima lisozima (BUERA, KAREL, 1995, BEL,TOUMA,
do produto nas paredes do secador e também a compactação
1996).
durante a estocagem (BRENNAN et al., 1971).
No entanto, como observado por SHEBOR et al. (1996)
A influência do fenômeno de transição vítrea no
e CARDONA et al. (1997), a inativação enzimática de sistemas
processo de secagem de pastas alimentícias sobre a superfície
de materiais sólidos foi avaliada por COLLARES (2001). amorfos desidratados em uma matriz polimérica (ou
carboidrato), não pode ser predita com base na teoria da
Segundo este estudo, comprovou-se que o desprendimento
transição vítrea. Isso é particularmente verdade para a
de filmes de maltodextrina, melaço de cana-de-açúcar e goma
arábica durante a secagem sobre a superfície de materiais inativação térmica (T > 90oC) da invertase em matriz amorfa
de trealose, para a qual eles verificaram que existe um
sólidos (placas de vidro comum, aço inoxidável, Nylon e
mecanismo adicional de proteção. A trealose mesmo tendo
Teflon ) é governado pela transição vítrea do material
alimentício. De acordo com COLLARES (2001), para haver temperatura de transição vítrea, Tg = 100 oC (ROOS, 1993a),
inferior à matriz de maltodextrina DE 10, Tg = 160oC (ROOS,
desprendimento natural da película seca de pasta alimentícia,
KAREL, 1991e) exerceu maior grau de proteção à enzima
sem auxílio externo, é necessário que a umidade do filme
atinja valores correspondentes aos de transição vítrea, na invertase em relação à matriz amorfa de maltodextrina.
temperatura de operação. Portanto, a operação de secagem Em 1996, SCHMIDT e LAMMERT estudaram o
deve propiciar condições de transição vítrea ao produto, no fenômeno de envelhecimento físico de maltose vítrea, que
final do processo, ou pela diminuição da temperatura do ar, consiste na alteração das propriedades físicas do material
ou pela formulação da alimentação, utilizando-se aditivos de vítreo em função do tempo, a temperaturas abaixo de sua Tg.
alta massa molecular. Este termo foi usado por STRUIK (1978) para distinguir o
envelhecimento devido às transformações físicas do
Em produtos lácteos desidratados, o conteúdo de água
envelhecimento devido a reações químicas, degradação ou
aumenta com o aumento da umidade relativa até que ocorre
a cristalização da lactose, resultando em perda de umidade. A alterações na cristalinidade. O envelhecimento físico afeta
muitas propriedades físicas, como densidade, deslizamento,
cristalização de açúcares em alimentos desidratados em pó
relaxação da resistência, constante dielétrica e perda dielétrica.
ocorre depois dos fenômenos de pegajosidade e colapso,
acima de Tg (ROOS, 1995a). O conhecimento deste processo de envelhecimento para
materiais poliméricos é importante por causa das mudanças
A influência do fenômeno de transição vítrea também nas suas propriedades físicas com o tempo que afetam
tem sido observada na estabilidade de produtos alimentícios grandemente o uso final e a estabilidade destes materiais; o
armazenados por longos períodos em temperaturas típicas mesmo podendo se dizer para os alimentos e ingredientes
de congelamento (-18oC). Segundo LEVINE, SLADE (1989), alimentares. SCHMIDT, LAMMERT (1996) observaram que há
esta estabilidade está relacionada com a diferença de mudança na entalpia das amostras vítreas de maltose a 13oC
temperatura entre a temperatura de estocagem e a temperatura abaixo do ponto médio da Tg, demonstrando que a mobilidade
de transição vítrea da matriz maximamente concentrada (Tg’ ). molecular pode existir abaixo da temperatura de transição
Este conceito de crioestabilização assume a estabilidade do vítrea.
alimento abaixo de Tg’ e rápida diminuição da mesma acima
A transição vítrea, portanto, não pode ser usada
de Tg’ de acordo com a cinética de WLF. A temperaturas acima
de Tg’, ocorre um aumento na mobilidade dos constituintes sozinha para caracterizar um material em relação às condições
de umidade e temperatura prevalecentes durante a estocagem,
do alimento congelado. No estado vítreo (temperaturas abaixo
e também T g não pode ser considerada como um limiar
de Tg’), a amostra é estável em relação à recristalização e reações
deteriorativas devido à alta viscosidade. A crioestabilização absoluto de estabilidade.
de produtos congelados pode ser atingida pela elevação da
Tg’ (fazendo-se a reformulação adequada dos ingredientes)
ou pela estocagem a temperaturas inferiores a Tg’. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A temperatura de transição vítrea é, portanto, um
importante parâmetro físico na ciência de alimentos, pois ajuda Os diagramas de estado, onde as relações entre a
a explicar o comportamento químico e físico dos sistemas composição e o estado físico do material alimentício são
alimentícios. Além do problema de aglomeração e estabelecidas, fornecem meios para a formulação de produtos
compactação de pós alimentícios durante o processo de para satisfazer requerimentos de processamento e estabilidade
desidratação e estocagem, a transição vítrea pode também na estocagem quando a reformulação é possível. Estes

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et al. Produtos Alimentícios

diagramas de estados e, conseqüentemente, a temperatura CHAMPION, D., LE MESTE, M., SIMATOS, D. Towards an improved
de transição vítrea (T g) podem também ser usados para o understanding of glass transition and relaxations in foods: molecular
desenvolvimento de processos, equipamentos, embalagens mobility in the glass transition range. Trends in Food Science &
adequadas e condições de estocagem para a máxima Technology, 11:41-55, 2000.
estabilidade do produto alimentício (ROOS, 1995a). CHAN, R.K., PATHMANATHAN, K., JOHARI, G.P. Dielectric relaxations
A manipulação adequada da transição vítrea, portanto, in the liquid and glassy states of glucose and its water mixtures. J.
auxiliará no desenvolvimento de novos produtos alimentícios Phys.Chem., 90:6358-6362, 1986.
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