Você está na página 1de 40

Teorias da

Aprendizagem
Teorias Clássicas da Aprendizagem

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Renan de Almeida Sargiani

Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Teorias Clássicas da Aprendizagem

• O Estudo Científico da Aprendizagem;


• Behaviorismo;
• Cognitivismo;
• Construtivismo;
• Humanismo.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Apresentar e discutir as principais teorias clássicas sobre a aprendizagem humana, com
ênfase nas abordagens comportamentalista, cognitivista, construtivista e humanista.
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

O Estudo Científico da Aprendizagem


Desde os gregos antigos, muitos pensadores e filósofos demonstraram interesse
em compreender como o ser humano adquire conhecimentos, isto é, como aprende
sobre o mundo ao seu redor. No século XIX, esse interesse passou a ser objeto de
estudos científicos da nova ciência denominada Psicologia. Desde então, várias teo-
rias foram elaboradas e estudadas e possibilitaram entender os aspectos biopsicos-
sociais da aprendizagem como um agente propulsor do desenvolvimento humano.
Nosso foco, nesta Unidade, será entender quatro conjuntos principais de teorias:
a abordagem comportamentalista, a abordagem construtivista, a abordagem
cognitivista e a abordagem humanista. Essas não são as únicas abordagens teóri-
cas da aprendizagem desenvolvidas no século XX, mas são as mais proeminentes e
que influenciam psicólogos e educadores até os dias atuais. Poderíamos discutir tam-
bém outras abordagens da aprendizagem como as abordagens psicanalíticas, feno-
menológicas ou da Gestalt, mas como o foco dessas abordagens não é a aprendiza-
gem, optamos por explorar aqui apenas as teorias que predominantemente estudam
as diferentes formas de aprender (LEFRANÇOIS, 2019).

Conheça mais sobre as abordagens discutidas aqui e outras lendo o livro de CARRARA, K. (org.).
Introdução à psicologia da educação: seis abordagens. São Paulo: Editora Avercamp, 2004.

É importante ressaltar que a ordem de apresentação das abordagens teóricas aqui


não será cronológica. Essa escolha é intencional, para mostrar que essas teorias são,
muitas vezes, contemporâneas e coexistem até os dias atuais. Algumas vezes, você
verá que teorias foram formuladas em oposição a outras predominantes, ou surgiram
a partir da evolução natural da própria abordagem em face de novas evidências pro-
venientes dos estudos realizados. Assim, mesmo dentro de uma abordagem teórica
também existem divergências e proposições distintas, assim, é importante entender
que existem fundamentos epistemológicos semelhantes que nos permitem considerar
essas teorias dentro de um mesmo enfoque ou abordagem. Alguns teóricos também
poderiam ser enquadrados em mais de uma abordagem, como veremos adiante.

Epistemologia é um ramo da filosofia que se ocupa do conhecimento científico. Podemos


dizer que trata do estudo metódico, reflexivo e crítico dos princípios, das hipóteses e dos re-
sultados das diversas ciências. A finalidade da Epistemologia é determinar os fundamentos
lógicos, o valor e a importância objetiva do método científico e de seus resultados.

Antes de discutirmos especificamente as teorias clássicas em psicologia da apren-


dizagem, vamos fazer apenas um breve resgate histórico, entendendo duas posi-
ções filosóficas bastante importantes que também dizem respeito à aprendizagem:
o racionalismo e o empirismo. Dentre todos os filósofos gregos, talvez os mais
conhecidos sejam Sócrates (469 a.C. – 399 a.C.), Platão (428 a.C. – 348 a.C.)
e Aristóteles (385 a.C. – 323 a.C.). Sócrates teria sido professor de Platão que,

8
por sua vez, foi o professor de Aristóteles. Não iremos discutir aqui em profundidade
suas ideias, proposições, convergências e divergências, mas apenas apresentar duas
formas distintas de pensar a aprendizagem que influenciaram e, podemos dizer que,
ainda influenciam a Filosofia e a própria Psicologia.

Figura 1 – Sócrates Figura 2 – Platão Figura 3 – Aristóteles


Fonte: Wikimedia Commons Fonte: Wikimedia Commons Fonte: Wikimedia Commons

Sócrates e Platão acreditavam que nós já nascemos com todo o conhecimento,


mas não temos acesso a ele de imediato. Para acessá-lo é preciso refletir intencional-
mente e buscar despertar esse conhecimento inato. Para isso, Sócrates desenvolveu
o método denominado de maiêutica, que consiste em realizar múltiplas perguntas,
induzindo o interlocutor na descoberta de suas próprias verdades e na conceituação
geral de um objeto do conhecimento.
Platão sistematizou as ideias de Sócrates e organizou um sistema educacional ba-
seado nessas duas doutrinas filosóficas: o inatismo e o racionalismo. O inatismo diz
respeito ao conhecimento que já nasce conosco e precisa ser revelado/recuperado, e
o racionalismo se refere à ideia de que podemos descobrir esse conhecimento inato
por meio da nossa reflexão deliberada. Nessa perspectiva, o professor não é aquele
que detém todo o saber, mas o que possibilita que os alunos questionem a si mesmos
e aprendam refletindo sobre seus próprios conhecimentos (DUMARD, 2015).
Aristóteles, por sua vez, pensava diferente de Platão e Sócrates. Ele acreditava
que nós não nascemos com conhecimento algum, tudo o que conhecemos é fruto
de nossas experiências, que nos chegam pelos órgãos de sentido. Essa doutrina de
Aristóteles ficou conhecida como empirismo, em que empiria significa que o conhe-
cimento é obtido exclusivamente com base na experiência direta, na observação do
mundo real. Aristóteles documentou e diferenciou dois métodos para se obter os
conhecimentos, isto é, aprender: o método dedutivo e o método indutivo.

• Método dedutivo ou raciocínio dedutivo: processo de análise e obtenção de conheci-


mento, que parte de uma premissa geral para uma específica, por meio da reflexão sobre o
que já se conhece. O que se sabe de novo já estava no conhecimento anterior.
• Método indutivo ou raciocínio indutivo: processo de obtenção de conhecimentos por
meio da observação empírica, da testagem e repetição de casos. O que se sabe de novo é
trazido pela observação da realidade.

9
9
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Aristóteles continuou a influenciar diversos pensadores ao longo da história. Não


é nosso objetivo explorar todos aqui, mas é recomendável que você procure co-
nhecer mais sobre as ideias de pensadores como Santo Agostinho, São Tomás de
Aquino; e na era Moderna, Francis Bacon, Galileu Galilei, René Descartes e John
Locke. Esses pensadores foram fundamentais para o desenvolvimento das Ciências a
partir da Revolução Científica iniciada no século XVI. Assim, as Ciências passaram a
valorizar cada vez mais o método indutivo e a necessidade da experimentação como
mediadora e classificadora da experiência vivida (DUMARD, 2015).

Um livro com linguagem acessível e que apresenta de modo simplificado essas bases filo-
sóficas, bem como as demais abordagens e teóricos estudados nesse curso é de SCHULTZ,
D. P.; SCHULTZ, S.E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2019.

Retomando nossa discussão sobre o racionalismo e o empirismo, podemos dizer


que os racionalistas defendiam que o conhecimento verdadeiro se dá pelo raciocínio
lógico, enquanto os empiristas defendiam que na realidade todo conhecimento se dá
pela experiência e observação direta da realidade. Na Idade Moderna, o filósofo fran-
cês René Descartes (1596-1650) foi o principal defensor do racionalismo, enquanto
o filósofo inglês John Locke (1632-1704) o principal defensor das ideias empiristas.
No século XIX, o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) sintetizou dialetica-
mente essas proposições antagônicas, criando uma nova visão que integra os principais
postulados do empirismo e do racionalismo. Assim, a maioria dos psicólogos atualmen-
te, concordam com Kant, e consideram que não se pode fazer uma teoria sem a refle-
xão lógica por um lado e a experimentação direta pelo outro (STERNBERG, 2010).

Figura 4 – René Descartes Figura 5 – John Locke Figura 6 – Immanuel Kant


Fonte: Wikimedia Commons Fonte: Wikimedia Commons Fonte: Wikimedia Commons

Essas discussões filosóficas foram fundamentais para que as ciências se desenvol-


vessem, em especial com base na experimentação. Foi assim que, no século XIX, a
Fisiologia, por exemplo, como a ciência que estuda as funções e o funcionamento
dos seres vivos, ganhou cada vez mais importância por seus estudos com base na ex-
perimentação e no método científico. A Psicologia, por sua vez, ainda era um ramo
da Filosofia, e só em 1879 se tornou uma disciplina científica, com a criação do

10
primeiro laboratório de psicologia experimental em Leipzig, na Alemanha. Wilhelm
Wundt (1832-1920), o fundador da Psicologia Científica, dominava os dois campos
do conhecimento, Filosofia e Fisiologia, e ao criar o laboratório, deu as bases para
que a Psicologia pudesse definir seu objeto de estudos e métodos de investigação.

Figura 7 – Wilhelm Wundt


Fonte: Wikimedia Commons

A aprendizagem não foi inicialmente objeto de estudos da Psicologia Científica.


Wundt considerava a experiência consciente imediata como objeto de estudos da Psi-
cologia, focando nas pesquisas sobre a sensação e a percepção, conteúdos mentais
básicos da experiência imediata. Ele acreditava que fenômenos complexos como a
aprendizagem, a linguagem, a religião e os costumes não poderiam ser estudados
em laboratório, mas sim por meio de observações naturalísticas mais amplas. Por
isso, Wundt diferenciou duas áreas distintas da Psicologia: a Psicologia Experimental
e a Psicologia Cultural.

• Psicologia Experimental: estudo dos processos mentais básicos como a sensação e per-
cepção em laboratório, usando para a isso a introspecção, que é a reflexão sistemática
sobre os próprios processos mentais.
• Psicologia Cultural: estudos sobre fenômenos complexos como a aprendizagem, a lingua-
gem e as relações sociais, que se dariam por meio de observações naturalísticas, isto é, em
situações reais, como observando crianças aprendendo na escola.

Um contemporâneo e conterrâneo de Wundt discordou de suas ideias e decidiu


investigar a aprendizagem em um laboratório improvisado criado em sua própria
casa. Desse modo, Hermann Ebbinghaus (1850-1909) talvez tenha sido o pri-
meiro a explorar cientificamente a aprendizagem e a memória. Ele foi o primeiro

11
11
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

pesquisador a estudar de modo sistemático os princípios do associacionismo, uma


corrente filosófica derivada do empirismo inglês que propunha a ideia de que a men-
te humana forma conexões e associações de ideias com origem nas experiências
trazidas pelos órgãos de sentido. Os associacionistas propunham estudar como as
ideias e eventos podem se associar na mente para propiciar a aprendizagem. Eles
descreveram alguns princípios de aprendizagem importantes como:
• Contiguidade: tendemos a associar as informações que ocorrem juntas ou quase
ao mesmo tempo;
• Similaridade: tendemos a associar assuntos com traços ou proprieda-
des semelhantes;
• Contraste: tendemos a associar assuntos que parecem apresentar polaridades
como quente/frio, claro/escuro, dia/noite.

Figura 8 – Hermann Ebbinghaus


Fonte: Wikimedia Commons

Ebbinghaus estudou experimentalmente seus próprios processos mentais envolvi-


dos na aprendizagem e memorização. Ele contou seus próprios erros e registrou suas
respostas diante da situação de aprender várias listas de palavras com características
diferentes. Assim descobriu, dentre outras coisas, o importante papel da repetição
consciente do material a ser aprendido. Ele concluiu que a repetição ajuda a fixar as
associações mentais de maneira mais consciente na memória, auxiliando a aprendi-
zagem (STERNBERG, 2010).

Os associacionistas foram os primeiros psicólogos a estudar cientificamente a


aprendizagem. Os trabalhos de Ebbinghaus e de outros associacionistas influencia-
ram e continuam influenciando diversos psicólogos, em especial, destacaremos a sua
sucessora direta, que é a abordagem comportamentalista da aprendizagem.

12
Behaviorismo
O Behaviorismo ou Comportamentalismo é uma perspectiva sobre a aprendiza-
gem que se concentra nas mudanças que ocorrem nos comportamentos observáveis
dos indivíduos, isto é, mudanças no que as pessoas dizem ou fazem. Os behavioristas
descrevem a aprendizagem em termos daquilo que se pode efetivamente observar, e
não no que se passa em nossas mentes, como pensamentos. Não significa que eles
ignorem completamente a existência dos processos mentais, mas sim que eles não
consideram que esses sejam fundamentais para explicar como as pessoas aprendem
ou se comportam (LEFRANÇOIS, 2019).

Alternativamente, os behavioristas procuram explicar a aprendizagem em


termos do comportamento observável, procurando entender as contingências en-
volvidas nesse processo, ou seja, como as condições sob as quais um comporta-
mento é emitido e como as consequências desse comportamento podem reforçá-lo
ou extingui-lo. Por exemplo, um aluno faz toda a lição de casa e, por isso, ganha
um elogio da professora. Essa consequência (elogio) do comportamento (fazer a
lição de casa) reforçará a probabilidade de que o aluno faça novamente a lição de
casa no futuro.

Behavior ou Behaviour significa comportamento em inglês, daí o neologismo behaviorismo


para se referir à abordagem comportamentalista que em inglês é conhecida como Behaviorism.

Durante pelo menos a primeira metade do século XX, essa foi a principal abor-
dagem da Psicologia nos EUA. No Brasil, essa também foi uma visão importante,
embora tenha perdido muito espaço na década de 1980, com o avanço de abor-
dagens construtivistas e cognitivistas, como veremos mais adiante. Embora exis-
tam muitos teóricos behavioristas, daremos destaque aqui para as contribuições
de John B. Watson, Ivan Pavlov, Edward L. Thorndike e B. F. Skinner. Pavlov e
Thorndike na verdade eram associacionistas, mas normalmente são apresentados
como behavioristas por sua contribuição ao surgimento dessa abordagem.

O psicólogo norte-americano John B. Watson (1878-1958) é considerado o pai


do behaviorismo. Ao denominar de Behaviorismo esse movimento, Watson estava
enfatizando que o único interesse da Psicologia deveria ser pelo comportamento
(behavior), e não pela experiência consciente, como vários psicólogos faziam, se-
guindo ou adaptando a proposta de Wundt. Watson defendia que a Psicologia de-
veria estudar o comportamento dos homens tão objetivamente quanto se estuda o
funcionamento das máquinas. Watson era um empirista e acreditava que nós não
nascemos com quaisquer capacidades, traços ou predisposições mentais, tudo o que
herdamos é nosso corpo e alguns reflexos, como o reflexo de sucção ou o reflexo
patelar; as diferenças quanto à capacidade e personalidade são simplesmente diferen-
ças no comportamento aprendido (HILL, 1981).

13
13
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Figura 9 – John B. Watson


Fonte: Wikimedia Commons

Watson pautou suas ideias sobre aprendizagem nas pesquisas do fisiologista russo
Ivan Pavlov (1849-1936). Pavlov foi responsável pela chamada “Teoria do Reflexo”,
que foi formulada com base em seus estudos sobre a fisiologia do sistema gastroin-
testinal de cães. Em uma série de experimentos, Pavlov demonstrou que cães na-
turalmente salivam diante de comida, mas se a visão da comida for emparelhada
com a apresentação de um estímulo sonoro repetidas vezes, apenas ouvir o som
já passará a eliciar a resposta de salivação nos cães. Assim, Pavlov teorizou que se
houver o emparelhamento/associação de um Estímulo Incondicionado (EI – ver a
comida) e de um Estímulo Neutro não Condicionado (ENC – ouvir o som), repetidas
vezes, o comportamento reflexo (salivar) será eliciado com a apresentação apenas
do estímulo neutro – que então passará a ser chamado de Estímulo Condicionado
(EC). O comportamento reflexo em questão passa a chamar-se resposta ou Reflexo
Condicionado (RC). A esse procedimento de aprendizagem se dá o nome de con-
dicionamento clássico, condicionamento respondente, ou ainda aprendizagem
por substituição de estímulo (LEFRANÇOIS, 2019).

Figura 10 – Ivan Pavlov


Fonte: Wikimedia Commons

14
A aprendizagem para Watson é baseada no modelo de Pavlov de condicionamento
clássico. Para ele, os homens nascem com um certo número de reflexos, como rea-
ções físicas e glandulares. Cada um desses reflexos é provocado por um estímulo,
por exemplo, ver comida e salivar, ou ser acariciado e ter sentimento de amor.
Assim, por meio do condicionamento clássico esses reflexos primários podem se tor-
nar complexos, como andar, falar, apaixonar-se, como o resultado de longas cadeias
de sequenciamento e articulação de reflexos básicos. Assim, toda aprendizagem tem
a ver com respostas que são selecionadas e encadeadas. Quanto mais complexa a
aprendizagem, maior o número de sequências de estímulo-resposta necessários.

Outro psicólogo muito importante para o behaviorismo foi Edward L. Thorndike


(1874-1949). Além de ser considerado o pai da Psicologia Educacional, Thorndike
também é considerado um dos pais do behaviorismo juntamente com Watson, por
seus trabalhos sobre a aprendizagem. Thorndike era, na realidade, um associacio-
nista como Ebbinghaus, assim suas proposições também são frequentemente deno-
minadas como associacionismo ou conexionismo, embora seja importante diferir
a sua ideia de conexionismo das propostas mais recentes em Psicologia Cognitiva e
dos Modelos de Redes Neurais, como veremos na próxima unidade.

Figura 11 – Edward L. Thorndike


Fonte: Wikimedia Commons

Thorndike acreditava que a “satisfação” era a chave para a formação de associações.


Em 1905, ele denominou de “Lei do Efeito” o fato de que um estímulo tenderá a produ-
zir uma determina resposta ao longo do tempo se o organismo for recompensando por
essa resposta e se isso gerar satisfação. Em outras palavras, o que ele propôs foi que se
o comportamento é seguido por uma recompensa, o organismo aprende a responder
(o efeito) dessa determinada maneira. A satisfação é, portanto, um reforçador daquele
comportamento esperado. Na Unidade anterior, falamos sobre um exemplo hipotético
de um pesquisador que queria usar chocolates para melhorar a aprendizagem. Aqui es-
tamos vendo como uma teoria poderia influenciar na criação dessa hipótese.

Thorndike foi o primeiro a estudar a aprendizagem por ensaio e erro. Em suas


pesquisas, ele criou uma espécie de “caixa problema” na qual colocava gatos que
tinham que executar alguns passos para escapar da caixa. Ele observou que os

15
15
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

gatos faziam várias alternativas e modificavam suas novas respostas em virtude dos
erros. Isso foi crucial para o avanço no entendimento sobre a aprendizagem, que
até então era vista como se a resolução de problemas fosse resultado unicamente
por um insight que fazia com que o problema fosse resolvido de uma única vez, ao
invés de uma solução gradual, como na aprendizagem por tentativa e erro. Thorn-
dike identificou que a aprendizagem por tentativa e erro é um método básico de
aprendizagem usado por, essencialmente, todos os organismos para aprender novos
comportamentos ou resolver problemas (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).

Insight: é um termo em inglês usado inicialmente pela Psicologia da Gestalt para se referir ao
momento em que uma pessoa compreende algo de forma súbita, ou que consegue encontrar
a solução de um problema ou situação complicada. Seria um equivalente do termo epifania.

A teoria de aprendizagem de Thorndike introduz a estrutura da psicologia compor-


tamental: a aprendizagem é o resultado da associação entre estímulos (S) e respostas
(R), portanto S-R. Essas associações entre estímulos e respostas são fortalecidas ou
enfraquecidas pela natureza e frequência dos pares S-R. Os estudos de Thorndike,
contudo, eram sobre respostas voluntárias (ainda que não conscientes) dos animais, en-
quanto Watson focava mais na aprendizagem involuntária, como no caso dos estudos
com cães de Pavlov, estudando, por exemplo, a aprendizagem das respostas de medo.

As maiores contribuições ao behaviorismo, contudo, foram dadas por Burrhus


Frederic Skinner (1904-1990), mais conhecido como B.F. Skinner. Skinner reco-
nhecia o condicionamento respondente como uma forma de aprendizagem, e identi-
ficou outro tipo de condicionamento que era mais frequente entre humanos, o con-
dicionamento operante. O termo “operante” se refere ao fato de que o indivíduo
aprende com as consequências de “operar” sobre o ambiente.

Figura 12 – Burrhus Frederic Skinner


Fonte: Wikimedia Commons

16
Skinner trabalhou principalmente com ratos e pombos, usando um procedimento
semelhante a caixa de gatos de Thorndike, que alterada por ele, ficou conhecida
como “Caixa de Skinner”. Nesses experimentos, ratos ou pombos eram primei-
ramente privados de água ou comida e colocados em uma caixa especial na qual
conseguiam o alimento ou água se realizassem pequenas tarefas, como pressionar
botões ou alavancas. Skinner considerava que os princípios obtidos com essas pes-
quisas com animais também se aplicavam a seres humanos, o que foi demonstrado
posteriormente por inúmeras outras pesquisas (SKINNER, 2003).
Dentre esses princípios, ele descobriu que um organismo terá a tendência de
repetir uma resposta que foi reforçada e irá suprimir uma resposta que foi punida.
Dessa forma, Skinner avança os modelos behavioristas anteriores propondo um mo-
delo de tríplice contingência, ou seja, como S-R-C (estímulo-resposta-consequên-
cia). Um determinado estímulo é seguido por uma resposta do organismo e a conse-
quência dessa resposta pode influenciar para que a resposta volte a acontecer, ou seja
eliminada nas próximas vezes. Em outras palavras, todo comportamento  aumenta
ou diminui de frequência em virtude das consequências que a seguem (MOREIRA;
MEDEIROS, 2007), uma ampliação da Lei do Efeito de Thorndike.
Para Skinner, as consequências dos comportamentos podem ser classificadas como
reforço ou punição. Quando as consequências aumentam a probabilidade de que o
comportamento se repita, são chamados de reforços. Quando a consequência diminui
a probabilidade de que o comportamento se repita, então chamamos de punição. É
importante que entendamos que o que é reforço ou punição dependerá muitas vezes
da pessoa, pois o que é reforçador para um pode ser punição para o outro (SKINNER,
2003). Uma pessoa pode adorar chocolates, que será um reforçador para ela, enquan-
to outra pode detestar, e assim o chocolate funcionará como punição.
Para Skinner, novos comportamentos normalmente são aprendidos por um pro-
cedimento denominado de modelagem ou aprendizagem por aproximações su-
cessivas. Nesse procedimento, a pessoa que está ensinando deve reforçar as respos-
tas parecidas com a resposta final gradualmente, até que se chegue cada vez mais
próximo da resposta final esperada. Uma professora, por exemplo, pode elogiar as
primeiras tentativas de escrita de uma criança, e, aos poucos, ir apresentando como
se deve escrever convencionalmente, até que a criança chegue no comportamento
final de escrever de forma autônoma e convencional.
Alguns efeitos importantes da aprendizagem são descritos por Skinner (2003), como
a generalização, onde um comportamento aprendido para uma situação é transferido
para outras situações. Por exemplo, a criança pode aprender a chamar um animal de
quatro patas que late de cachorro, e daí generalizar isso para todos os animais de quatro
patas, incluindo gatos. Até que ela aprenda a discriminação, ou seja, determinar quando
é apropriado ou não um determinado comportamento, por exemplo, diferenciar gatos
de cachorros. Por fim, há também a extinção, quando um comportamento deixa de ser
reforçado e por conseguinte passa a não ser mais emitido, sendo esquecido.

Skinner também propôs mudanças no processo de ensino, uma vez que para ele o
professor sozinho não teria condições para dar reforços a todos os alunos ao mesmo

17
17
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

tempo. A solução encontrada por ele foi criar o que denominou de “máquinas de
ensinar”, que eram instrumentos mecânicos capazes de cumprir essa função de re-
forços graduais, para auxiliar ao professor. Nessas máquinas, os alunos respondem
a uma questão ou problema, e se a resposta for correta recebem reforço imediato e
passam para a próxima questão. Do contrário, não recebem reforço e podem tentar
novamente. O reforço poderia ser algo como um som ou pontuação. (SKINNER,
1972). Podemos considerar que as máquinas de ensinar foram as primeiras tentativas
do uso de computadores na Educação. Além disso, as ideias de Skinner ainda hoje
são utilizadas na construção de muitos softwares e jogos educacionais.

Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Skinner e a Análise do Comporta-


mento” para entender melhor sobre a teoria e suas principais contribuições.
Disponível em: https://youtu.be/0Hn9dN1_W4U

No limiar com a abordagem cognitivista, mas derivando principalmente dos tra-


balhos behavioristas, temos também a teoria da aprendizagem social, de Albert
Bandura (nascido em 1925). A teoria de Bandura é uma proposta mais recente do
que os trabalhos de Watson e Skinner, desenvolvida desde os anos 1960, portanto, já
assimilando conhecimentos da abordagem cognitivista. A premissa de Bandura é que
os condicionamentos clássicos e operantes não são suficientes para explicar toda a
aprendizagem. Ele enfatiza que boa parte daquilo que aprendemos se dá, na realidade,
pelo que se denomina de aprendizagem vicariante, aprendizagem por imitação, ou
aprendizagem observacional. Essa proposta enfatiza a importância do aspecto social
da aprendizagem e da observação do outro. Ao ver alguém fazendo algo, nós podemos
aprender com essa observação, sem que tenhamos a necessidade de passarmos, nós
mesmos, pelas mesmas etapas (SALDAÑA; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2002).

Figura 13 – Albert Bandura


Fonte: Wikimedia Commons

18
Segundo Bandura, a aprendizagem por imitação ocorre quando as pessoas olham
e prestam atenção no que uma pessoa (modelo) faz, para então se lembrar do que o
modelo fez e por fim transformar essa aprendizagem em ação, podendo reproduzir
o mesmo comportamento. Pensando na escola, podemos notar vários exemplos de
aprendizagem vicária, como o fato de adolescentes começarem a se comportar de
modo semelhante, ou mesmo as crianças que imitam o jeito de seus pares ou adultos
próximos ao andar e falar.
A teoria da aprendizagem social é muito influente na psicologia clínica e no desen-
volvimento de métodos de ensino de habilidades sociais, e, transposta para a educação,
faz com que nós reconheçamos a importância das aprendizagens indiretas ou implícitas
que ocorrem o tempo todo na escola e fora dela. As crianças aprendem muito mais do
que o conteúdo formal ao qual são ensinadas, elas aprendem a postura e o interesse do
professor que ensina, aprendem com seus colegas e aprendem coisas que nem sempre
são explicitadas ou passíveis de serem avaliadas, como emoções, valores e crenças. Além
disso, Bandura mostrou que nem sempre a pessoa necessita ser reforçada ou punida
para aprender, aprende-se mesmo “sem querer”, e aprende-se por automotivação, por
exemplo, quando se quer muito fazer algo e se observa atentamente para aprender.

A teoria da aprendizagem social ajuda a entender não apenas sobre como as


pessoas aprendem destrezas e habilidades, mas também como transmitem, na socie-
dade, as atitudes, valores e ideias. Uma última característica importante da teoria de
Bandura é a distinção entre expectativa de resultado e auto-eficácia. A expectativa
de resultado diz respeito ao julgamento sobre as consequências para determinado
desempenho, o que pode facilitar a seleção de comportamentos do repertório, ou
a decisão entre emitir ou não certos comportamentos em relação a demandas do
ambiente (ex.: João imagina as consequências de faltar a uma festa e por isso deci-
de se vai ou não). Já a auto-eficácia se refere ao julgamento que a pessoa faz sobre
a sua própria capacidade de emitir um certo padrão de comportamento. Crianças
com baixa auto-eficácia acreditam que não conseguem realizar certas coisas e,
portanto, não tentam, o que reforça sua auto-crença e, por conseguinte, a sua difi-
culdade (SALDAÑA; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2002).

Cognitivismo
O Cognitivismo se caracteriza principalmente por ser a abordagem do processa-
mento da informação, partindo da premissa de que a mente humana funciona como
um computador que processa e transforma os estímulos ambientais que nos chegam
por meio dos órgãos de sentido. Os psicólogos cognitivos estão preocupados com
os processos mentais superiores, e não apenas com o comportamento observável,
como os behavioristas. Eles discutem a importância da aprendizagem como proces-
so de aquisição de conhecimentos e a necessidade de aprender a aprender, isto é,
de ter controle intencional sobre os próprios processos de aprendizagem. Os profes-
sores, nessa perspectiva, podem dar aos alunos a oportunidade de fazer perguntas,
refletir, falhar e pensar em voz alta. Essas estratégias podem ajudar os alunos a

19
19
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

entenderem como seu processo de pensamento funciona e usarem esse conheci-


mento para construirem melhores oportunidades de aprendizagem.
Existem muitas teorias diferentes que se propõem a investigar como a cognição
influencia nosso comportamento. Desde os gregos antigos, muitos pensadores se
ocuparam de estudar o desenvolvimento da cognição, ou seja, da nossa forma de
pensar e obter conhecimentos, e como nossa atividade mental influencia os compor-
tamentos. Embora todos esses pensadores estivessem adotando um referencial cog-
nitivista, nós estamos focando aqui na perspectiva cognitiva que deriva da Psicologia
Cognitiva, criada nos EUA, nos anos 1950.
Como já discutimos anteriormente, a perspectiva behaviorista dominou a Psico-
logia norte-americana até meados dos anos 1950, fazendo com que houvesse uma
profunda rejeição aos termos mentalistas (ex.: pensar, imaginar, mente, cognição), que
eram na realidade a base de toda a Psicologia em sua origem. Embora o behaviorismo
fosse predominante, muitos psicólogos eram contrários as suas restrições, principal-
mente pela identificação de limites nas explicações sobre como as pessoas aprendem
sem estudar o que acontece em nossas mentes.
Além disso, esses psicólogos estavam influenciados pelos estudos de Piaget
sobre o desenvolvimento cognitivo que aconteciam na Europa, bem como a Psico-
logia da Gestalt e a Psicobiologia do Cérebro, que mostravam a importância dos
processos mentais, da consciência e do cérebro como organizador ativo de todo
nosso comportamento. Esses fatores foram se intensificando em um movimento
que se consolidou em 1956, em um evento realizado no Instituto de Tecnologia
de Massachusetts (MIT), nos EUA. Depois desse evento, vários psicólogos norte-
-americanos passaram a reintroduzir nas pesquisas as discussões sobre a cogni-
ção, entendida aqui como os produtos e processos envolvidos na aquisição de
conhecimentos (STERNBERG, 2000).
É importante ressaltar que a abordagem cognitiva é atualmente muito utilizada in-
ternacionalmente, principalmente por sua estreita relação com as Neurociências e por
integrar a Ciência Cognitiva. Contudo, podemos notar diferenças importantes entre os
modelos adotados entre os anos 1950 e 1980, focados na mente como processador de
informações, e os modelos que foram desenvolvidos a partir dos anos 1980, focados
no processamento paralelo e distribuído, como veremos na próxima unidade.
Para os cognitivistas, a mente é como um computador, ou seja, um processador
de informações. Por esta razão, essa abordagem é também denominada de abor-
dagem do processamento de informações, modelo simbólico, ou do processa-
mento serial (LEFRANÇOIS, 2019). Nessa primeira fase da Psicologia Cognitiva
(1950-1980), entendia-se o processamento cognitivo de forma mais serial como os
computadores, ou seja, tudo que é aprendido segue um processamento como em
uma linha de produção; desde que a informação chega por meio dos nossos órgãos
sensoriais, ela passa a ser dividida e analisada por múltiplos processadores em nossa
mente até que seja compreendida e armazenada em nossa memória.
Atualmente, existem outras perspectivas dentro da Psicologia Cognitiva, como o
conexionismo (diferente da proposta de Thorndike), que incorpora as evidências de

20
neurociências e adota o termo conexionismo, em alusão às conexões entre os neurô-
nios (sinapses) que são responsáveis pelo processamento de todas as informações no
cérebro. Dessa forma, o processamento cognitivo ocorre sempre de forma paralela
e distribuída, não linear e sequencial como se pensava antes. Ou seja, as informa-
ções que chegam aos nossos órgãos sensoriais não são tratadas em uma linha de
produção como se pensava, mas sim de forma dividida (compartilhada) entre vários
neurônios que trabalham todos ao mesmo tempo.

Dentre as principais contribuições dos cognitivistas para o estudo da aprendiza-


gem e do ensino estão o entendimento sobre os mecanismos cerebrais e processos
cognitivos envolvidos nesses processos. Muitos psicólogos cognitivos têm demons-
trado como a aprendizagem é um processo cognitivo que permite orquestrar, isto
é, organizar os demais processos como memória, atenção, linguagem, percepção,
raciocínio para processar as informações, resolver problemas e adquirir conhecimen-
tos. Esses conhecimentos têm sido cruciais para a melhoria das práticas de ensino
(STERNBERG, 2010).

Uma das teorias cognitivas mais importantes sobre a aprendizagem é a do psicó-


logo David Ausubel (1918-2008). Ausubel tinha muito interesse em construir uma
teoria de ensino que pudesse auxiliar os professores a melhorar o seu desempenho e a
aprendizagem dos alunos em sala de aula (RONCA, 1994). Um dos recursos pedagógi-
cos mais conhecidos da proposta de Ausubel são os mapas conceituais, que são dia-
gramas hierarquizados que procuram refletir a organização de uma disciplina ou parte
dela (RONCA, 1994). Mapas conceituais permitem identificar os conceitos básicos de
uma disciplina e as relações e influências desses conceitos em um quadro mais amplo.

Figura 14 – David Ausubel


Fonte: novaescola.org.br

A teoria de Ausubel parte do conjunto de conhecimentos que o aluno já traz


consigo, a que ele denomina de estrutura cognitiva, e que seria o ponto central

21
21
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

e mais importante que os professores deveriam levar em consideração nas suas


práticas educativas. O conteúdo que é assimilado pela estrutura cognitiva tem
uma forma hierárquica, onde conceitos mais amplos se superpõem a conceitos
com menor poder de extensão. Assim, quando os professores ensinam, eles pos-
sibilitam que conceitos mais complexos sejam incorporados à estrutura cognitiva
das crianças (RONCA, 1994).

Dessa forma, chegamos à ideia central da teoria de Ausubel, que é a diferen-


ciação entre aprendizagem significativa e aprendizagem mecânica. Para ele,
a aprendizagem significativa ocorre quando uma nova informação é relacionada
a outras informações relevantes (semelhantes) que já estão presentes na estrutura
cognitiva dos alunos. O conhecimento anterior resultará assim num “ponto de
ancoragem” onde as novas informações irão encontrar um modo de se integrar
a aquilo que o indivíduo já conhece. Por outro lado, a aprendizagem mecânica
ocorre quando uma informação nova não se relaciona a conceitos já existentes na
estrutura cognitiva, sendo arbitrariamente armazenada e, portanto, ocorre pouca
ou nenhuma interação entre a nova informação e as informações já presentes na
estrutura cognitiva (NOVAK, 1981).

Dentre as principais implicações da teoria da aprendizagem significativa está a


ênfase na importância de relacionar novos conteúdos a informações já conheci-
das pelos aprendizes, isto é, a ancoragem. O papel do professor nesse caso é
criar condições para que as aprendizagens sejam significativas, permitindo que o
aluno possa relacionar as novas informações com conceitos já pré-existentes em
sua estrutura cognitiva. Para Ausubel, uma teoria de ensino deve ser fundamen-
tada em um tripé que considere: a realidade local, a estrutura cognitiva de cada
aluno e a identificação dos conceitos amplos e fundamentais das diversas áreas
do conhecimento (RONCA, 1994).

Os cognitivistas também discutem muito a


importância das funções cognitivas como a me-
mória e a atenção na aprendizagem. A atenção
é necessária para que se possa focar no que
deverá ser aprendido, enquanto a memória é o
que permite processar, armazenar e recuperar
o conhecimento aprendido. George A. Miller
(1920-2012), considerado um dos pais da
Psicologia Cognitiva, apresentou um conceito
muito importante sobre a memória, denomina-
do de capacidade de canal. Nossa memória
não tem capacidade infinita de processamento,
nós podemos processar cerca de 5 a 9 coisas
ao mesmo tempo, sendo que a média é de 7
itens. Assim, para que não ocorra uma sobre-
carga cognitiva é importante dividir e agrupar
o conteúdo a ser ensinado para que se possa Figura 15 – George A. Miller
facilitar a aprendizagem (STERNBERG, 2010). Fonte: Wikimedia Commons

22
Outra contribuição importante da Psicologia Cognitiva são os estudos sobre a
metacognição. John Flavell (nascido em 1928), definiu a metacognição, ainda
nos anos 1970, como o conhecimento que as pessoas têm sobre seus próprios
processos cognitivos e a habilidade de controlar esses processos, monitorando,
organizando e modificando-os para realizar objetivos concretos. Em outras palavras,
a metacognição se refere à habilidade de refletir sobre uma determinada tarefa (por
exemplo, ler, calcular, pensar, tomar uma decisão) e sozinho selecionar e usar o me-
lhor método para resolver essa tarefa.

Figura 16 – John Flavell


Fonte: amacad.org

Assim, um bom professor deveria incentivar seus alunos a planejarem seus pró-
prios modos de estudo e avaliarem a si mesmos, se estão com dificuldades e como
buscar alternativas para superá-las. Em outras palavras, os professores deveriam en-
sinar as crianças para desenvolverem essa habilidade de refletir sobre o melhor modo
para aprender, ou seja, desenvolverem a metacognição. Nesse sentido, a abordagem
cognitiva enfatiza que os alunos devem aprender a aprender, ou seja, desenvolver a
metacognição, e assim controlar intencionalmente seus processos de aprendizagem,
podendo aprender de maneira mais eficiente e significativa.

O psicólogo cognitivo Howard Gardner (nascido em 1943) também ofereceu


importantes contribuições para a Educação. Até os anos 1970, o conceito de inte-
ligência era muito valorizado em Psicologia e Educação e avaliado por meio dos fa-
mosos testes de inteligência ou testes de Q.I. (Quociente de Inteligência). A definição
de inteligência variava muito, de modo que existem até hoje mais de 70 definições
distintas do que significa inteligência (STERNBERG, 2000). Contudo, essas defini-
ções acabavam em síntese definindo inteligência como uma capacidade geral para
resolver problemas, muito relacionada ao conteúdo escolar e à cultura.

23
23
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Figura 17 – Howard Gardner


Fonte: Wikimedia Commons

Gardner, nos anos 1980, com base em suas pesquisas, formulou a “Teoria das
Inteligências Múltiplas”, que considera que não existe um só tipo de inteligência.
Gardner considera que para abarcar adequadamente o campo da cognição humana,
é necessário incluir um conjunto muito mais amplo e mais universal de competên-
cias do que se considerava até então (GARDNER, 1994). Nesta direção, ele passa a
definir inteligência como a capacidade de resolver problemas ou de criar produtos
que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais (GARDNER, 1994).

Para Gardner (1994), todos somos capazes de conhecer o mundo, criar coisas e
resolver problemas por meio de “inteligências” como a linguagem, a análise lógico-
-matemática, a representação espacial, o pensamento musical e o uso do corpo.
Contudo, é comum que um tipo de inteligência predomine em cada pessoa. Inicial-
mente, as pessoas nascem com um vasto potencial de talentos que são moldados
pela cultura, o que em grande parte é fruto da educação. Assim, cientistas podem
ter mais habilidade lógico-matemática, enquanto atores podem ter mais  habilidade
corporal-cinestésica. Inicialmente, Gardner descreveu sete tipos de inteligência:
lógico-matemática, linguística, musical, espacial, corporal-cinestésica, intrapessoal,
interpessoal; mais recentemente, ele introduziu duas novas: naturalista e existencial.

Existem muitas críticas às proposições de Gardner, justamente pelas dificulda-


des em se determinar o que é inteligência. Ainda assim, a sua proposta tem impli-
cações educacionais importantes, uma vez que enfatiza que uma criança que tem
mais habilidades matemáticas do que linguísticas não é mais inteligente do que a que

24
possui superioridade nas habilidades linguísticas; elas só possuem inteligências dife-
rentes e precisam receber ensino que propicie o desenvolvimento de todas as suas
potencialidades. Além disso, nossos sistemas de educação costumam valorizar mais
algumas habilidades, como a linguística, em detrimento de outras, como a lógico-
-quantitativa, o que implica muitas vezes em sufocar talentos para determinados
tipos de inteligência. Para Gardner, é necessário que a educação forneça um maior
equilíbrio, não privilegiando apenas um tipo de conhecimento, mas sim dando con-
dições para que todos se desenvolvam em todas as suas potencialidades.

Construtivismo
O Construtivismo considera que a aprendizagem é um processo de “construção”
pessoal do aprendiz. Os construtivistas acreditam que o ambiente social e o am-
biente físico propiciam oportunidades de interação entre os sujeitos e os objetos de
conhecimento, gerando conflitos, e consequentemente, uma reestruturação, pelo
aprendiz, de suas construções mentais anteriores. Na escola, para os construtivistas,
o aprendiz constrói ativamente o conhecimento ao seu modo e o professor é um
mediador da relação ensino-aprendizagem, possibilitando as situações e experiências
que ajudarão os aprendizes a construírem suas aprendizagens.

A abordagem construtivista tem sido predominante na educação brasileira desde


os anos 1980. Ela foi desenvolvida, principalmente, entre as décadas de 1970 e 1980,
ainda que possamos identificar suas principais ideias desde a década de 1920. A abor-
dagem construtivista é muito semelhante à abordagem cognitivista porque ambas dis-
cutem os processos mentais envolvidos na aprendizagem. Assim, é comum encontrar
um mesmo autor classificado como construtivista ou cognitivista. A diferença principal
que fazemos nesse curso entre essas duas propostas é que na abordagem cognitivista
os teóricos entendem aprendizagem como a “aquisição de conhecimento”, no senti-
do de processamento das informações; e os construtivistas entendem aprendizagem
como a “construção de conhecimento”, no sentindo de pensar sobre e atribuir sentido
próprio às informações.

A principal ideia do construtivismo é que uma pessoa aprende organizando e


reorganizando mentalmente novas informações ou experiências. A organização
acontece, em parte, relacionando novas experiências a conhecimentos anteriores
que já são significativos e bem compreendidos. No começo do século XX, ideias
semelhantes eram defendidas pelo educador, psicólogo e filósofo norte-americano
John Dewey (1859-1952). Dentre as principais contribuições de Dewey estava o
incentivo à criação de laboratórios experimentais dentro das escolas de formação de
professores, com o objetivo de usar o método científico para melhorar o ensino e a
aprendizagem. Ele também defendia que os currículos deveriam ser ajustados para a
forma como os alunos aprendem e a seus interesses individuais.

25
25
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Figura 18 – John Dewey


Fonte: Wikimedia Commons

No Brasil, as ideias de Dewey influenciaram Anísio Teixeira (1900-1971), que


foi seu aluno e liderou um movimento de reformas educacionais chamado de Escola
Nova ou Escolanovismo, buscando mudar a forma como a educação ocorria no
Brasil. Teixeira era crítico do modelo tradicional de educação, que via a memori-
zação como o principal mecanismo de aprendizagem. As ideias construtivistas e
progressistas trazidas por Dewey enfatizavam o reconhecimento daquilo que o aluno
já sabe antes de aprender algo novo, e que não aprendemos apenas ideias ou fatos,
mas também atitudes, valores e senso crítico. A aprendizagem para esses autores só
ocorre quando sabemos agir de acordo com o que foi aprendido.

Figura 19 – Anísio Teixeira


Fonte: consed.org.br

O maior expoente do construtivismo é, sem dúvidas, o biólogo suíço Jean Piaget


(1896-1980). Piaget elaborou e atualizou a sua teoria do desenvolvimento cognitivo
por muitos anos e denominou um campo de estudos chamado de Epistemologia
Genética, isto é, o estudo da gênese do conhecimento. Para Piaget, o desenvol-

26
vimento cognitivo se inicia com a capacidade inata dos seres humanos que, assim
como outros seres vivos, têm de se adaptar ao ambiente. A mais elevada forma de
adaptação humana é a cognição (ou conhecimento) e por isso ele estuda o desenvol-
vimento cognitivo (LEFRANÇOIS, 2019).

Figura 20 – Jean Piaget


Fonte: Wikimedia Commons

Segundo Piaget, desde o nascimento, os bebês tentam se adaptar ao seu ambiente,


o que impõe diferentes desafios que devem ser resolvidos. Assim, ele descreveu qua-
tro estágios que são caracterizados por diferentes formas de pensar e agir: estágio
sensório-motor, estágio pré-operatório, estágio operatório concreto e estágio
operatório formal. A idade não é o fator crucial de mudança para Piaget, mas sim
as diferentes formas com as quais a criança lida com os problemas ao seu redor, pas-
sando por desde operações mentais baseadas na simples atividade sensório-motora
(ex.: aprender a andar) até o mais refinado pensamento lógico-abstrato (ex.: aprender
sobre equação de segundo grau). As mudanças de um estágio para o outro são gra-
duais e ocorrem por meio de três princípios interrelacionados: organização, adap-
tação e equilibração.

A organização se refere à tendência inata que temos de criar estruturas cogni-


tivas cada vez mais complexas, que abarquem os conhecimentos adquiridos, isto,
os esquemas. Os esquemas são comportamentos que têm estruturas neurológicas
relacionadas a eles, por exemplo, olhar, falar. Quanto mais experiências, mais com-
plexos os esquemas se tornam. Todo conhecimento aprendido é sempre incorpora-
do, portanto, à estrutura cognitiva anterior. Essa é uma premissa básica de modelos
cognitivistas e construtivistas.

27
27
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Adaptação é o termo utilizado por Piaget para descrever como uma criança lida
com novas informações que parecem conflitar com o que ela já sabe. Por exemplo,
um recém-nascido tem apenas esquemas simples como os reflexos de sugar, alcançar
e agarrar, mas precisa adaptá-los para que se tornem mais complexos, coordenados
e propositais, como andar, falar, escrever etc. A adaptação envolve dois processos:
assimilação e acomodação. A assimilação ocorre quando se responde a situações
usando atividades ou conhecimentos já aprendidos. Novos objetos ou situações são
assimilados ao esquema quando se pode responder a eles usando o conhecimento
prévio. Uma criança pode somar 2+2 porque aprendeu regras de adição previamen-
te. Frequentemente, os esquemas prévios não servem para todas as situações novas
e é preciso modificá-los, o que ocorre por meio da acomodação, que significa mudar
nossas estruturas cognitivas para incluir um conhecimento novo.

Para exemplificar o que seriam esses processos, podemos pensar em uma criança
fazendo duas coisas distintas: brincar e imitar. Quando a criança brinca, ela usa pre-
dominantemente a assimilação, quando ela imita, ela usa a acomodação. Piaget diz
que ao brincar, a criança usa os esquemas já disponíveis e ignora tudo aquilo que
não se encaixa na brincadeira, por exemplo, brinca que uma cadeira é um cavalinho,
assimilando o andar a cavalo e ignorando que se trata de uma cadeira. Quando a
criança imita, ela modifica seu comportamento em função das demandas que lhe são
impostas por algo ou alguém, assim aprendendo algo novo (LEFRANÇOIS, 2019).

A equilibração é um esforço constante do organismo para manter um balanço ou


equilíbrio estável que determina a mudança da assimilação para a acomodação. Quan-
do as crianças não conseguem lidar com novas experiências dentro de suas estruturas
cognitivas existentes, elas tendem a organizar novos padrões mentais que integram a
nova experiência, assim restaurando o equilíbrio. Um bebê que está acostumado a ma-
mar no seio ou na mamadeira e que começa a sugar o bico do canudo de uma caneca
para bebês está demonstrando assimilação – utilizando um esquema já existente para li-
dar com um novo objeto ou com uma nova situação. Quando o bebê descobre que para
beber de canudo são necessários movimentos da língua e da boca um pouco diferentes
daqueles utilizados para sugar o seio ou a mamadeira, ele se ajusta para modificar o
esquema anterior. Ele “acomoda” seu esquema de sugação para lidar com uma nova
experiência: a caneca. Assim, assimilação e acomodação operam juntas para produzir
equilíbrio e crescimento cognitivo (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2010, p. 76).

Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Jean Piaget” para entender melhor sobre
a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/rRLukE2HGzA

Os estudos de Piaget focavam principalmente o desenvolvimento cognitivo indi-


vidual, o que acontece na mente de quem aprende. Outros construtivistas buscaram
expandir essa ideia ao integrar também a reflexão sobre as relações e interações
sociais e com os objetos culturais a serem aprendidos. Essa abordagem que enfatiza
os aspectos sociais é por vezes chamada de socio construtivismo, construtivismo
social ou teoria sociocultural.

28
O principal representante desse enfoque é o psicólogo bielo-russo Lev Semenovich
Vygotsky (1896-1934), que elaborou uma teoria do desenvolvimento cognitivo sus-
tentando que todo conhecimento é construído socialmente, no âmbito das relações
humanas. A abordagem proposta por Vygotsky buscava integrar, em uma mesma
perspectiva, o ser humano enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e cul-
tural, enquanto membro de uma espécie animal e participante de um processo his-
tórico. Entendia que o funcionamento psicológico tipicamente humano é cultural e,
consequentemente, histórico. E que havia elementos mediadores na relação entre o
homem e o mundo, que seriam os instrumentos, os signos e todos os elementos do
ambiente, carregados de significado cultural e construídos nas relações humanas.

Figura 21 – Lev Semenovich Vygotsky


Fonte: Wikimedia Commons

Na teoria de Vygotsky (1998), a linguagem tem um grande destaque. A linguagem


é duplamente importante para Vygotsky, pois além de ser o principal instrumento de
intermediação do conhecimento entre os seres humanos, tem relação direta com o
próprio desenvolvimento psicológico. Nenhum conhecimento é construído pela pes-
soa sozinha, mas sim em parceria com as outras, que são os mediadores. Assim, a
linguagem é a principal ferramenta com a qual mediamos as relações. Inicialmente,
linguagem e pensamento estão desconectados, mas no curso do desenvolvimento
passam a ser indissociáveis.

Importante!
É mais comum utilizar o termo “aprendizado” do que aprendizagem para se referir à psi-
cologia de Vygotsky, pois em russo o termo usado por ele equivale a algo como o proces-
so de ensino-aprendizagem, isso é, ele inclui sempre aquele que aprende, aquele que en-
sina e a relação entre essas pessoas. Para Vygotsky, aprendizado é o “processo pelo qual o
indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores etc., a partir de seu contato
com a realidade, com o meio ambiente e com as outras pessoas” (OLIVEIRA, 2010, p. 59).

29
29
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Para Vygotsky (1998), a vivência em sociedade é essencial para a transformação


do homem, de ser biológico em ser humano. É pelo aprendizado nas relações com
os outros que construímos os conhecimentos que permitem nosso desenvolvimento
mental. Vygotsky caracterizou essa evolução intelectual em duas funções, a primeira,
que já nascemos com ela, é a Função Psicológica Elementar, que são os reflexos e
a atenção involuntária, presentes em todas as crianças e nos animais mais desenvolvi-
dos. A partir do aprendizado cultural, parte dessas funções básicas transforma-se em
Função Psicológica Superior, como a consciência, o planejamento e a deliberação.
Com o intuito de explicar o processo de aprendizagem, construção de conheci-
mento ou desenvolvimento cognitivo, Vygotsky desenvolveu o conceito de Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZDP), que definiu como a distância entre o nível de
desenvolvimento real (Zona de Desenvolvimento Real), aquilo que se pode fazer
de forma independente, e o nível de desenvolvimento potencial, o que se pode fazer
com a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes
(VYGOTSKY, 1998). O desenvolvimento proximal tem por determinante aquilo que
a criança ainda não domina, mas é capaz de realizar com auxílio de alguém mais
experiente, como exemplo, quando uma criança já sabe somar e é desafiada a fazer
uma multiplicação simples. Assim, a ZDP é a distância entre o desenvolvimento real
e o potencial, isto é, que está próximo, mas ainda não foi atingido.
Para Vygotsky, em síntese, o aprendizado é contínuo e o desenvolvimento inte-
lectual se concretiza por saltos qualitativos, de um nível de conhecimento para outro,
onde o ensinar e o aprender formam uma unidade. Essa unidade delimita o campo
de constituição do indivíduo na dimensão sociocultural. São processos indissociáveis
que implicam na ideia de que o professor participa ativamente do processo de apren-
dizagem e de desenvolvimento do aluno. O professor é visto como um impulsionador
do desenvolvimento cognitivo da criança. Assim, ao professor cabe apresentar às
crianças novas formas de pensamento e conceitos, mas, não sem antes, detectar
que condições elas têm de apreendê-lo. A aprendizagem dos alunos se construirá
mediante o processo de relação do indivíduo com seu ambiente sociocultural e com
o suporte de outros indivíduos mais experientes.

Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Lev Vygotsky” para entender melhor
sobre a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/T1sDZNSTuyE

Outra contribuição derivada do ponto de vista de Vygotsky veio de Jerome


Bruner (1915-2016), um dos psicólogos norte-americanos mais longevos. Ele teve
uma longa produção científica, discutindo muitos tópicos como percepção, lingua-
gem, desenvolvimento, aprendizagem e ensino. A sua principal teoria é conhecida
como “Teoria de instrumentalismo evolucionista”, pois, para ele, o homem de-
pende das técnicas (instrumentos, cultura) a sua volta para o seu desenvolvimento e
processo de humanização.
Bruner discutiu a aprendizagem por descoberta. Para ele, as crianças devem
explorar as situações para que estejam mais ativas e envolvidas em sua própria

30
aprendizagem do que em metodologias expositivas nas quais permaneçam muito
passivas. Essa proposta é coerente com outra contribuição muito significativa de
Bruner para a Educação, que foi a proposição do currículo em espiral. A ideia
central da proposta é que os alunos recebam uma informação básica sobre determi-
nado assunto de forma que possam construir uma base para aprender mais sobre o
assunto em situações futuras (por exemplo, mais aulas, semestres, anos escolares).
Os assuntos devem ser apresentados cada vez com mais detalhes e complexidades
permitindo que o aluno possa pensar e repensar sobre o assunto até que atinja o
domínio ou maestria (BRUNER, 1973).

Figura 22 – Jerome Bruner


Fonte: rededucom.org

Em outras palavras, isso que dizer que qualquer coisa pode ser ensinada, pelo
menos nas suas formas mais simples, a alunos de todas as idades, uma vez que os
mesmos tópicos serão, posteriormente, retomados e aprofundados. Nesse sentido,
ele expande a ideia de Vygotsky de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), para
alavancar a aprendizagem por meio de Scaffolding (andaime), ou seja, para ele, o
professor deve criar condições de ensino que funcionem como andaimes para auxiliar
a criança a superar a sua ZDP e atingir novos patamares de aprendizagem.

Outra contribuição importante dos construtivistas vem do psicólogo francês Henri


Wallon (1879-1962). Ele argumentava que a relação ensino-aprendizagem apenas
pode ser analisada como uma unidade, pois, são lados de uma mesma moeda onde
a relação professor-aluno é um fator determinante. Ambos (professor e aluno) são
sujeitos concretos e historicamente determinados e trazem uma bagagem cultural e
experiências que o meio lhes propiciou. Aluno e Professor estão em desenvolvimento
durante a relação de ensino-aprendizagem, que é sempre aberta e inacabada. Ao ensi-
nar, o professor está promovendo o desenvolvimento do aluno e o seu próprio.

31
31
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Figura 23 – Henri Wallon


Fonte: novaescola.org.br

Além disso, Wallon traz uma contribuição importante ao campo da aprendizagem ao


resgatar a importância da afetividade e do movimento, uma vez que predominantemente
discutimos apenas a cognição. Para Wallon, não há uma dicotomia entre a afetividade
e a cognição, ou a afetividade e o ato motor. Esses são fatores que estão presentes no
desenvolvimento humano, em uma relação dialética e indissociável entre eles. Essas
dimensões atuam em conjunto e se estabelecem nas interações humano-sociais. Wallon
propõe que a afetividade, o ato motor (motricidade) e o conhecimento da pessoa
(cognição) são os domínios ou campos funcionais que a criança desvendará no decorrer
de seu desenvolvimento e que devem ser entendidos conjuntamente. Desta maneira,
estabelece-se o eixo principal da teoria de Wallon, que é a visão integradora do desenvol-
vimento humano, que passa pelas dimensões cognitiva-afetiva-motora da criança.

Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Henri Wallon” para entender melhor
sobre a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/ebt2iaiV9U8

Humanismo
O Humanismo foca no estudo das particularidades de cada ser humano, na com-
plexidade e singularidade de cada pessoa e nos seus motivos e interesses em apren-
der. A premissa da abordagem humanista é considerar a aprendizagem em uma
perspectiva mais ampla de desenvolvimento integral da pessoa. Essa abordagem
surgiu como uma forte crítica às ideias behavioristas e psicanalíticas predominantes
nos EUA até a década de 1950. Assim, partilha também de alguns princípios das
abordagens cognitiva e construtivista, entendendo a aprendizagem como um pro-
cesso individual de representação e reestruturação cognitiva, mas considerando que
o aprendiz deve ser o principal ator do seu processo de aprendizagem, refletindo,
questionando e fazendo escolhas.

32
Carl Rogers (1902-1987) é o principal expoente do Humanismo e seus traba-
lhos são mais conhecidos pela prática clínica do que a educacional. Contudo, ainda
nos anos 1920, Rogers propôs uma nova forma de ensino que tomava o aluno como
o centro do processo educativo, mediante um estilo de aula tão diferente quanto atra-
tivo e estimulante, e que consistia em suprimir as aulas expositivas, e em aprender
sozinho, ou em grupos de trabalho sem a autoridade do mestre, cada qual se ocu-
pando dos seu próprios interesses (PUENTE, 1978). Essa proposta, conhecida como
o “ensino centrado no aluno”, era pautada em grande parte pelas ideias de John
Dewey, por isso a semelhança com a proposta construtivista também. Rogers enten-
dia que a aprendizagem é sempre individual, singular e peculiar para cada aprendiz,
mas valorizava também as relações interpessoais, principalmente na construção da
personalidade do indivíduo e no autoconceito para aprender.

Figura 24 – Carl Rogers


Fonte: Wikimedia Commons

Segundo Puente (1978), para os humanistas, a responsabilidade pela educação/


aprendizagem está no próprio estudante, possuidor de forças de crescimento, auto-
-avaliação e auto-correção, digno de confiança, e em quem deve estar centrado o
processo de ensino. Assim, a única tarefa do professor e da instituição de ensino
consiste em facilitar a aprendizagem do aluno, criando condições favoráveis que
liberem a sua capacidade de aprender. A educação humanista deve ser centrada no
estudante, em lugar de no professor ou no ensino.

Para Rogers, a educação ocorre pelo contato, assim, o professor deve ser um
educador-facilitador que não adota apenas um único modelo para facilitar a apren-
dizagem, mas que coloca o interesse dos aprendizes em primeiro lugar. Ele aponta
três condições que facilitam a aprendizagem do aluno: a autenticidade do professor,
a sua aceitação ou o apreço pelo aluno e a compreensão da realidade singular do
aluno. Entre essas três condições existe uma interdependência dinâmica, mas a mais
básica delas é a autenticidade do professor. Rogers enumera ainda uma quarta con-
dição, que seria a percepção do aluno das condições do professor, essa condição

33
33
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

portanto, seria a que envolve todas as demais, já que é a partir da percepção do


aluno que se pode aferir as demais condições (PUENTE, 1978).

Para os humanistas, os seres humanos têm uma potencialidade natural para


aprender. O desafio das instituições de ensino é proporcionar uma atmosfera favo-
rável onde estudantes e professores se sintam livres para novas descobertas, com
autoaceitação, sem pressões ou censuras. Para Rogers, a aprendizagem autoinicia-
da envolve a pessoa do aprendiz de forma holística, unindo sentimento e intelecto,
sendo, dessa forma, mais duradoura e abrangente. Por outro lado, a aprendizagem
socialmente útil deve fazer parte da vida do aluno, o qual deve incorporar dentro
de si um processo de mudança, aprendendo a aprender, estando aberto a novas ex-
periências e em busca de conhecimento, mas sem descartar o que já foi aprendido
(LIMA; BARBOSA; PEIXOTO, 2018).

Uma das principais críticas dos humanistas à educação escolar é a variável mo-
tivação, que para eles é muito esquecida na escola, e sem a qual não pode existir
aprendizagem significativa. Rogers alerta aos educadores contra a ênfase apenas
na motivação extrínseca, para ele, a motivação intrínseca do aluno é que deve ser
estimulada. Desse modo, motivados intrinsecamente, os alunos podem ter a apren-
dizagem autoiniciada, buscando descobrir quais são os seus problemas reais e vitais
e chegarem à aprendizagem significativa.

Nesse sentindo, o psicólogo humanista Abraham Maslow (1908-1970) apre-


sentou uma teoria para explicar as razões da motivação, segundo a qual as necessi-
dades humanas estão organizadas e dispostas em níveis de uma pirâmide, em uma
hierarquia de importância que vai de necessidades básicas no primeiro nível, para
necessidades psicológicas e, por fim, necessidades de auto-realização. Como você
pode observar na ilustração da pirâmide, na base dela estão as necessidades mais
básicas e primitivas, que são as necessidades fisiológicas, somente depois de tê-las
satisfeito é que nós passamos a necessidades mais “refinadas”, como as necessidades
psicológicas e de auto-realização.

Realização
Necessidades
Pessoal
Auto-Realização
Moralidade,
criatividade, solução de
problemas, ausência de
preconceitos, aceitação dos fatos.

Estima
Auto-estima, confiança, conquista
respeito dos outros, respeito aos outros. Necessidades
Psicológicas
Amor/Relacionamento
Amizade, família, intimidade sexual

Segurança
Segurança do corpo, do emprego, de recursos
da moralidade, da família, da saúde, da propriedade. Necessidades
Básicas
Fisiológicas
Alimento, roupa, repouso, moradia.

Figura 26

34
A contribuição de Maslow é importante para que não nos esqueçamos que ao
avaliar uma situação de aprendizagem é importante considerar esses diferentes
fatores. Uma criança com fome e medo dificilmente terá motivação intrínseca e
conseguirá aprender da mesma forma que uma criança que não tenha essas ca-
rências. Além disso, assim como Rogers alerta, é preciso que a motivação para
aprender seja cada vez mais uma necessidade interna de auto-realização do que
uma exigência externa, que force o aprendiz a algo que ele não vê como sendo
uma necessidade.

Figura 25 – Abraham Maslow Carl Rogers


Fonte: Wikimedia Commons

Outro teórico humanista é Joseph Novak (nascido em 1932), que também tra-
balhou com o cognitivista David Ausubel, que formulou a teoria do mapa conceitual
ou mapa mental, e que, assim como ele, discute sobre a aprendizagem significativa,
ampliando essa noção ao adotar uma perspectiva humanista. Para Novak, a aprendi-
zagem significativa subjaz à integração construtiva, positiva, entre pensamentos, sen-
timentos e ações, conduzindo ao desenvolvimento integral da pessoa. A perspectiva
de Novak é que quando a aprendizagem é significativa, o aprendiz cresce, tem uma
sensação boa e se predispõe a novas aprendizagens na área. Por outro lado, quando
a aprendizagem é mecânica, o aprendiz acaba por desenvolver atitudes negativas em
relação ao conteúdo a ser aprendido e não atinge a aprendizagem significativa. A teoria
de Novak é importante porque enfatiza a predisposição para aprender como uma
das condições para a aprendizagem significativa, enfatizando a integração entre pen-
samento, sentimentos e ações.

35
35
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Figura 27 – Joseph Novak


Fonte: Divulgação | ihmc.us

Em Síntese
Nesta unidade, discutimos as principais teorias desenvolvidas ao longo do século XX,
mostrando como cada abordagem teórica foca diferentes aspectos sobre a aprendiza-
gem. Os associacionistas focam na associação entre as ideias. Os behavioristas enfa-
tizam o comportamento observável e o papel das contingências para a aprendizagem.
Os cognitivistas abordam os processos mentais envolvidos na aquisição, no processa-
mento e no armazenamento do conhecimento. Os construtivistas ressaltam o papel
ativo dos aprendizes na construção do conhecimento. Os humanistas, por sua vez, en-
fatizam a importância de se considerar a pessoa integral e a individualidade na apren-
dizagem. Todas essas abordagens contribuem para entender melhor a complexidade
e importância dos processos de aprendizagem e as implicações educacionais. Na pró-
xima unidade, iremos mais além dessas abordagens, discutindo seus desdobramentos
em abordagens mais contemporâneas e que trazem particularidades da aprendizagem
no século XXI.

36
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
O processo da educação
BRUNER, J. S. O processo da educação. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1973.
Introdução a psicologia da educação: seis abordagens
CARRARA, K. (org). Introdução a psicologia da educação: seis abordagens.
1. ed. São Paulo: Avercamp, 2004.

Vídeos
Beyond Wit and Grit: Rethinking the Keys to Success
https://youtu.be/IfzrN2yMBaQ

Leitura
Aprendizagem por observação: perspectivas teóricas
e contribuições para o planejamento instrucional – uma revisão
BORGES-ANDRADE, J. E. Aprendizagem por observação: perspectivas teóricas e
contribuições para o planejamento instrucional – uma revisão. Psicol. cienc. prof.,
Brasília, v. 1, n. 2, p. 2-68, jul. 1981.
https://bit.ly/2RavJ2n
Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel
RONCA, A. C. C. Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel. Temas
psicol, Ribeirão Preto, v. 2, n. 3, p. 91-95, dez. 1994.
https://bit.ly/32dwnmf

37
37
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem

Referências
BRUNER, J. S. O processo da educação. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1973.
CUNHA, M. V. John Dewey, a outra face da escola nova no Brasil. In: GHIRALDELLI,
P. (Org.). O que é filosofia da Educação? 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A editora,
2002. p. 248-263.
DUMARD, K. Aprendizagem e sua dimensão cognitiva, afetiva e social. São
Paulo: Cengage Learning, 2015.
FLAVELL, J. H. Metacognitive aspects of problem solving. In: RESNICK, L. B.
(Ed.), The nature of intelligence. Hillsdale, NJ: Erlbaum, 1976, p.231-236.
GARDNER, H. Estruturas da mente: a Teoria das Múltiplas Inteligências. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1994.
HILL, W. F. Aprendizagem: uma resenha das interpretações psicológicas. Rio de
Janeiro: Ed. Guanabara dois, 1981.
LEFRANÇOIS, G. R. Teorias da Aprendizagem: o que o professor disse. São Paulo:
Cengage Learning, 2019.
LIMA, L. T.; BARBOSA, Z. C. L.; PEIXOTO, S. P. L. Teoria humanista: Carl Rogers
e a Educação. Ciências Humanas e Sociais. Alagoas, v.4, n.3., 2018.
MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do compor-
tamento. Porto Alegre: Artmed, 2007.
NOVAK, J. D. Uma teoria de educação. Trad. de A. Moreira. São Paulo: Pioneira, 1981.
OLIVEIRA, M. K. de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-
histórico. 3. ed. São Paulo: Scipione, 1995.
PAPALIA, D.; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano. 8 ed.
Porto Alegre: Artmed, 2006.
PUENTE, M. De la. O ensino centrado no estudante: renovação e crítica das teorias
educacionais de Carl R. Rogers. São Paulo: Cortez & Moraes, 1978.
RONCA, A. C. C. Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel. Temas psicol.,
Ribeirão Preto, v. 2, n. 3, p. 91-95, dez. 1994.
SALDAÑA, M. R. R.; DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, Z. A. P. A importância da
teoria da aprendizagem social na constituição da área do treinamento de habilidades
sociais. In: GUILHARDI, H. J.; MADI, M. B. B.; QUEIROZ, P. P.; SCOZ, M. C.
(Orgs.). Sobre comportamento e cognição: Contribuições para a construção da
teoria do comportamento. Santo André: ESETec., 2002, p. 269-283.
SKINNER, B. F. Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
________. Tecnologia do Ensino. S. Paulo: Editora Pedagógica. 1972.
STERNBERG, R.J. Psicologia Cognitiva. 5. Ed. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

38

Você também pode gostar