Você está na página 1de 24

CONCURSO DE CRIMES:

CONCURSO MATERIAL, FORMAL


E CONTINUIDADE DELITIVA
Professor Diego Pureza
Concurso formal:
O concurso formal ou ideal está previsto no artigo 70 do Código
Penal:
“Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-
se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente
uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto
até metade. As penas aplicam-se, entretanto,
cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes
concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o
disposto no artigo anterior”.
Age em concurso formal o sujeito que, mediante uma só ação ou
omissão, prática dois ou mais crimes, idênticos ou não.

São, portanto, requisitos do concurso formal de delitos:


(A) a unicidade da conduta e;
(B) a pluralidade de crimes.
Exemplo: JOÃO, conduzindo seu automóvel, com manifesta
imprudência, perde o controle de direção do veículo e atropela
ANTONIO e MARIA, causando a morte dos pedestres. JOÃO, praticou
dois homicídios culposos na direção de veículo automotor (art. 302
do CTB), em concurso formal.
Embora se exija conduta única para a configuração dessa espécie de
concurso, nada impede que esta mesma conduta seja fracionada
em diversos atos, no que se domina ação única desdobrada.

Exemplo: JOÃO ingressa em ônibus coletivo e subtrai, mediante


grave ameaça, os pertences pessoais dos passageiros. O crime
permanece único, praticado mediante diversos atos, caracterizando
o concurso formal de delitos.
A doutrina classifica essa forma de concurso em:
os crimes decorrentes da conduta única são da mesma
Homogêneo espécie.
Heterogêneo os crimes são de espécie distintas.
Próprio, o agente, apesar de provocar dois ou mais resultados,
perfeito ou não age com desígnios autônomos, isto é, não tem
normal intenção independente em relação a cada crime.
Impróprio,
imperfeito ou o sujeito age com desígnios autônomos. Esta espécie
anormal só tem cabimento nos crimes dolosos.
Nota-se que estas classificações não são excludentes.
É perfeitamente possível que verifique-se um concurso formal
próprio ou impróprio e homogêneo ou heterogêneo.

As regras de aplicação da pena vão depender do tipo de concurso


formal (se perfeito ou imperfeito):
(A) Aplicação da pena no concurso formal perfeito (ou próprio)

No concurso formal perfeito incide o sistema da exasperação: o juiz


aplica uma só pena se idênticas, ou a maior, se diferentes,
aumentada de um sexto até metade. Quanto maior o número de
infrações, maior deve ser o aumento.

Exemplo: motorista reincidente que, negligentemente, atropela e


mata casal.
Análise da fixação da pena:
Art. 68 do CP (cálculo da pena seguindo três fases)
1ª FASE: pena-base em 2 anos (não havendo
circunstancias judiciais, nem favoráveis, nem
Homicídio
desfavoráveis)
culposo
2ª FASE: pena intermediaria em 2 anos e 4 meses
art. 302 do CTB,
(majorada em 1/6, considerando a agravante da
pena de 2 a 4
reincidência)
anos.
3ª FASE: pena definitiva em 2 anos e 10 meses
(exasperada em 1/5 em razão do concurso formal
de delitos)
Não se descarta a hipótese de o sistema da exasperação se revelar
prejudicial ao réu.
Neste caso, lembrando que o concurso formal foi criado para
beneficiar o agente, deve o magistrado preferir o cúmulo das penas.
Trata-se de denominado concurso material benéfico, estabelecido
no artigo 70, parágrafo único, do Código Penal:

“Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do


art. 69 deste Código”.
Exemplo: JOSÉ, com intenção de matar, atira em ANTÔNIO. Todavia, JOÃO,
que passava pelo local, também foi atingido. ANTÔNIO morreu e JOÃO ficou
levemente ferido. Estamos diante de um típico caso de concurso formal
heterogêneo perfeito. Se aplicada a regra da exasperação, a pena do crime
mais grave (homicídio, reclusão de 6 a 20 anos) será aumentada de 1/6 até
a metade. Imagine-se que, diante do caso concreto, o magistrado
sentenciante conclua pela fixação da pena mínima (6 anos) majorada
também do mínimo (1/6), totalizando 7 anos de prisão. Nessa hipótese,
deverá ser reconhecido o concurso material benéfico, pois fica evidente que
a soma das penas mínimas das duas infrações (homicídio e lesão corporal
leve) resulta em pena menor (6 anos e 3 meses de prisão).
(B) Aplicação da pena no concurso formal imperfeito (impróprio)

No concurso formal imperfeito, o agente pratica uma única


conduta, todavia seu objetivo é provocar dois ou mais crimes. Por
existir desígnios autônomos, as penas deverão ser somadas,
aplicando-se a mesma regra do concurso material de crimes.
Crime continuado:
Verifica-se a continuidade delitiva (ou crime continuado),
estampada no art. 71 do CP, quando o sujeito, mediante pluralidade
de condutas, realiza uma série de crimes da mesma espécie,
aguardando entre si um elo de continuidade (em especial, as
mesma condições de tempo, lugar e maneira de execução). Eis o art.
71 do CP:
“Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas
condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como
continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes,
se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer
caso, de um sexto a dois terços”.
Nota-se, portanto, que o instituto está baseado em razões de
política criminal. O juiz, ao invés de aplicar as penas
correspondentes aos vários delitos praticados em continuidade, por
ficção jurídica, para fins da pena, considera como se um só crime foi
praticado pelo agente, devendo ter sua reprimenda majorada.

A continuidade delitiva divide-se em duas espécies: crime


continuado genérico e especifico. Vejamos cada qual,
separadamente.
Crime continuado genérico ou comum
Previsto no artigo 71, caput, do Código Penal, dá-se o crime
continuado genérico (ou comum) quando o agente, mediante mais
de uma ação ou omissão, prática dois ou mais crimes da mesma
espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e
outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como
continuação do primeiro.
Apresenta os seguintes requisitos:
(A) Pluralidade de condutas;
(B) Pluralidade de crimes da mesma espécie;
Em resumo:

crimes da mesma espécie = mesmo tipo penal + igual bem jurídico.


(C) Elo de continuidade: é também requisito do crime continuado o
elo de continuidade entre as condutas. Esse elo se revela através:

(C.1) Das mesmas condições de tempo: a lei não anuncia qual o


hiato temporal máximo que deve existir entre o primeiro e o último
delito de cadeia, alertando a jurisprudência que não pode suplantar
30 (trinta) dias.
(C.2) Das mesmas condições de lugar: Para a jurisprudência, haverá
as mesmas condições de lugar quando os crimes são praticados na
mesma comarca (ou em comarcaras vizinhas).

(C.3) Da mesma maneira de execução (modus operandi): bem


como alerta BITENCOURT: a lei exige semelhança e não identidade.
A semelhança na maneira de execução se traduz no modus operandi
de realizar a conduta delitiva. Maneira de execução é o modo, a
forma, o estilo de praticar o crime, que, na verdade, é apenas mais
um dos requisito objetivos da continuação criminosa.
(C.4) Outras circunstâncias semelhantes: abrangendo quaisquer
outras circunstâncias das quais se possa concluir pela continuidade.
Crime continuado específico
O crime continuado especifico está previsto no artigo 71, parágrafo
único, do Código Penal:
“Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com
violência ou grave ameaça a pessoa, poderá o juiz,
considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social, e a personalidade do agente, bem como os motivos e as
circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas
as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste
Código”.
Manda a lei que se observe a regra do concurso material benéfico e
o limite máximo de pena a cumprir no Brasil (30 anos).
Qual lei deve ser aplica se, no decorrer da prática de um crime
continuado, sobrevém lei mais grave?
Ilustrando:

A sumula nº711 do STF: “A lei penal mais grave aplica-se ao


crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é
anterior à cessação da continuidade ou da permanência.”

Você também pode gostar