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PROCURADORIA-GERAL FEDERAL
PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA JUNTO AO INSTITUTO CHICO
MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
COORDENAÇÃO DE MATÉRIA FUNDIÁRIA
PARECER n. 00048/2021/COMAF/PFE-ICMBIO/PGF/AGU
NUP: 02659.000012/2013-58
RELATÓRIO
Relata a consulente que, por tais motivos, entendeu-se que o interessado tomou
conhecimento do processo instaurado.
Em seguida, após o devido acesso aos autos foi encaminhado pelo interessado
requerimento (SEI 8566464), apontando que Fazenda Esperança não está totalmente
sobreposta à Flona Itacaiúnas, que há sobreposição de apenas 426 hectares, e que a área
apontada como desmatada está quase totalmente reflorestada. Afirma que o interessado
não utiliza a área para nada, nem pastagem, nem casas, nem guarda maquinários,
portanto essa área. Requer, se possível ser um "preservador ambiental" e colaborar com
o que puder para a preservação da Floresta Nacional de Itacaiúnas, e criar uma Reserva
Particular do Patrimônio Natural e continuar residindo na fazenda onde vive há 28
anos. Sustenta que embora haja procuração nos autos do interessado para o advogado,
não foram apresentados documentos, e portanto o processo seria nulo. Aponta a decisão
judicial no processo nº 1585-05.2013.4.01.3901 e que essa decisão impediria o ICMBio
de retirar os pecuaristas da região. Requereu a extinção do processo por falta de citação,
intimação e procuração; a correção da sobreposição da área à unidade de conservação.
É o relatório.
análise jurídica
Outra questão de ordem no presente processo é que o ICMBio tem atribuições legais
suficientes para fiscalizar a área e coibir qualquer tipo de agressão ao regime jurídico
ambiental, inclusive com a apreensão de bens, embargo de atividades, demolição de
obras e outras medidas. A pendência do presente processo administrativo não traz, de
forma alguma, um salvo conduto para a livre atuação do ocupante no interior da unidade
de conservação. O objetivo do presente processo é solucionar conflitos com a máxima
civilidade, sem o uso do aparato estatal repressivo, e, com isso, dar a oportunidade ao
interessado de explicar porque, no ano de 2021, vinte e três anos depois da publicação
do Decreto nº 2.480/1998 que instituiu a Floresta Nacional de Itacaiúnas, 02/02/1998,
ainda se discute a sua presença na área.
Com efeito, é dever do interessado justificar sua presença ali, de pedir eventual
indenização por benfeitorias, de modo a cumprir a Constituição, e toda a legislação
brasileira, em especial, a Lei 9.985/2000, que rege o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação, que não se dirige apenas à Administração Pública, mas a todos, que
devem observar as suas determinações e que não podem alegar desconhecimento.
Diante de tudo isso, o interessado fica sujeito à responsabilização cível, administrativa e
criminal pela simples presença na área. Evidentemente que em áreas com registro
imobiliário, há uma presunção relativa de propriedade ao titular do registro, e que a
Administração não pode desconhecer. Porém, no caso de ocupantes que possuem
apenas documentos particulares, não há, em princípio, nenhuma informação pública que
leve à conclusão pela licitude da presença do ocupante ali. A não ser assim, não seria
possível distinguir alguém que pratica crimes, um infrator ambiental, um desmatador de
alguém que tenha boa-fé na ocupação e direito à indenização por benfeitorias.
No presente caso, ao contrário, a área em questão, seja a sobreposição no interior da
Flona, seja fora é, conforme relatado, comprovadamente pública.
"Pelas fotos, resta claro, a Fazenda Esperança, de propriedade do Senhor Manoel de Sousa
Barros, não está totalmente sobreposta sobre a FLORESTA NACIONAL ITACAIUNAS,
somente aquela área demarcada na foto acima, ou seja 484 hectares, sendo que o Senhor Manoel
de Sousa Barros não as utiliza para nada, nem pastagem, nem casas, nem guarda maquinários,
portanto essa área, que encontra-se dentro da Fazenda Esperança, não é utilizada para nada, não
se extrai nenhum recurso dela, e o Senhor Manoel de Sousa Barros, reside na Fazenda há 28
anos e se possível requer ser um preservador ambiental, colaborar com o que puder para a
preservação da Floresta Nacional de Itacaunas, preservando a fauna e flora, seja com recursos
financeiros seja com mão de obra própria, nos moldes que o Ministro do meio ambiente Ricardo
Sales vem divulgando, esse é seu desejo, ajudar na preservação e criar uma RESERVA
PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL (RPPN) E CONTINUAR RESIDINDO NA
FAZENDA QUE RESIDE HÁ 28 ANOS E FOI UM DOS PRIMEIROS A CHEGAR NA
REGIÃO."
Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública em face do ICMBIO, para que a autarquia
promova a regularização fundiária da UC Flona Itacaiúnas em etapas consistentes no a)
diagnóstico da situação fundiária; b) diagnóstico da situação socioeconômica; c) plano
de regularização fundiária; d) execução do plano; e) comprovação periódica do
cumprimento das etapas e medidas previstas; 2) promover a cessação de qualquer
atividade pecuária realizada no interior da Flona Itacaiúnas, com a consequente retirada
do gado ali existente; 3) restaurar a área degradada, mediante a execução de PRAD a ser
apresentado com vistas ao seu reflorestamento com espécies nativas do bioma
amazônico, na forma e estipuladas no item 95, "c" da inicial.
"[...]
O pedido do MPF, nesse ponto, merece acolhida para que o ICMBIO seja condenado a:
1) elaborar e apresentar diagnóstico da situação fundiária da Flona Itacaiúnas,
sujeito à homologação judicial, ouvido o MPF;
2) após, a partir da homologação do diagnóstico do item 1, elaborar e apresentar o
diagnóstico da situação socioeconômica, também sujeito à oitiva do Ministério
Público e homologação;
3) em seguida, após a homologação do segundo diagnóstico (item 2), elaborar e
apresentar o plano de regularização fundiária da Flona Itacaiaúnas, com o
correspondente cronograma executivo, indicando o prazo de conclusão, ouvindo-se o
MPF e sendo igualmente objeto de homologação do Juizo;
4) depois disso, em um ano a contar da homologação do plano de regularização
fundiária e seu cronograma, iniciar efetivamente a execução do plano de
regularização, observados formas e prazos nele previstos;
4.1) comprovar, semestralmente, em Juizo o cumprimento das etapas e medidas
contidas no plano de regularização fundiária da Flona Itacaiúnas.
Entendo que eventual retirada do gado deve se dar concomitantemente a execução
do plano de regularização fundiária, já que indissociável a ocupação humana a
própria atividade pecuária predatória. Logo, o pedido do MPF, nos termos como
posto (promover em 06 meses a cessação de qualquer atividade de pecuária realizada no
interior da FLONITA, com a consequente retirada de todo o gado ali existente), não há
de ser acolhido
[...]
O plano de trabalho se encontra desatualizado, razão porque determino ao ICMBIO, em
especial, quanto a não autuação de processos administrativos de ocupantes indicados no
item 02, o seu cumprimento em 30 dias, considerando a data da manifestação do
presidente do ICMBIO em 07/02/2017 (fls. 720/721) e a presente data, em que já
ultrapassamos meados de 2018, sob pena de aplicação de multa diária de R$10.000,00
pelo descumprimento. [...] já que cumprida a determinação do item 02, deve o
ICMBio cumprir a etapa 03 em três meses, a etapa 04 em três meses, a etapa 05 em
três meses, as etapas 06 e 07 em dez meses. A conclusão total do prazo, considerando
nesta, eventual prazo final para a efetivação real do plano com a real desocupação
depende de circunstâncias e variáveis alheias ao ICMBIO, já que apontado ajuizamento
de ações judiciais.
Por tais fundamentos, acolho em parte os pedidos, ratificando a tutela antecipada
nos termos da fundamentação, julgando procedente em parte a pretensão formulada
na inicial (art. 487, I do CPC), resolvendo o mérito da demanda para condenar o
ICMBIO a:
1) elaboração e apresentação de diagnóstico da situação fundiária da Flona Itacaiúnas,
sujeito à homologação judicial, ouvido o MPF;
2) após, a partir da homologação do diagnóstico do item 1, elaborar e apresentar o
diagnóstico da situação socioeconômica, também sujeito à oitiva do Ministério Público
e homologação;
3) em seguida, após a homologação do segundo diagnóstico (item 2), elaborar e
apresentar o plano de regularização fundiária da Flona Itacaiúnas, com o correspondente
cronograma executivo, indicando o prazo de conclusão, ouvindo-se o MPF e sendo
igualmente objeto de homologação do juízo;
4) depois disso, em um ano a contar da homologação do plano de regularização
fundiária e seu cronograma, iniciar efetivamente a execução do plano de regularização,
observados formas e prazos nele previstos, inclusive com a retirada do gado
eventualmente existente nesse momento;
4.1) comprovar, semestralmente, em Juízo o cumprimento das etapas e medidas
contidas no plano de regularização fundiária da Flona Itacaiúnas (grifos no original).
[...]
Em decisão liminar de fl. 434/484, o juízo antecipou a tutela para determinar que o
ICMBio promovesse a regularização fundiária nos seguintes termos sucessivos:
elaborar e apresentar diagnostico de situação fundiária e promover a cessação da
atividade pecuária dentro de seis meses;
elaborar e apresentar o diagnóstico da situação socioeconômica, dentro de seis meses;
elaborar e apresentar plano de regularização fundiária da Flona Itacaiúnas, com
correspondente cronograma executivo, dento de seis meses
após tudo isso, no prazo de um ano a contar da homologação do plano de regularização,
iniciar efetivamente a execução do plano de regularização e comprovar, perante o juízo,
semestralmente, o cumprimento da respectivas medidas.
Foi dada, em seguida, uma ordem para que o ICMBio coibisse a abertura de novas
pastagens, ou seja, o Poder Judiciário, ao constatar a ilegalidade na omissão do ICMBio
em fiscalizar, determinou que se realizasse a fiscalização, restringindo a
discricionariedade do ICMBio nesse sentido. De forma alguma a decisão está a impedir
que o regime jurídico ambiental seja aplicado em sua plenitude.
CONCLUSÃO
Procurador Federal
SEPFE-ICMBio