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DIREITO

INTERNACIONAL PRIVADO

PROCESSO INTERNACIONAL

Competência. Aplicação do direito estrangeiro. Prova

1. Leitura obrigatória

Para o estudo do direito processual civil internacional, temos como leitura obrigatória:
O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), em seus arts. 21 a 27, 83 e 376, a Lei
de Introdução às Normas do Direito Brasileiras (LINDB), em seus arts. 13 e 14 e, por
fim, o art. 2º da Convenção Interamericana de direito internacional privado (DIPRI).

2. Competência

A primeira coisa que se estuda em direito processual civil internacional é a


competência das autoridades judiciárias brasileiras para julgarem questões com
conexão internacional.

Embora o CPC/2015 traga a denominação “competência internacional”, esta não é


muito adequada, visto que o presente estudo é o das situações em que os magistrados
brasileiros poderão julgar questões com conexão internacional, logo, melhor seria
denominar “competência internacional concorrente”.

A primeira distinção a ser feita é a aquela das questões em que os juízes brasileiros
poderão julgar, assim como os juízes de outros países, e as questões que somente os
juízes brasileiros poderão apreciar. No primeiro caso, fala-se da chamada competência
concorrente, ao passo que no segundo, da competência exclusiva.

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Em primeiro lugar, falando sobre competência concorrente, tem-se o art. 21 do
CPC/2015:

Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:

I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;

II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;

III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.

Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a


pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.

O referido disposto traz três hipóteses em que a autoridade judiciária brasileira poderá
julgar o feito: 1) réu domiciliado no Brasil; 2) a obrigação tiver de ser cumprida no
Brasil; e 3) ato ou fato praticado no Brasil.

O parágrafo único, por sua vez, esclarece o domicílio da pessoa jurídica como sendo
aquele onde possuir agência, filial ou sucursal.

O art. 22 do CPC/2015, que também trata de competência concorrente, é inovação em


relação ao CPC/1973. Tal dispositivo esclarece a competência das autoridades
judiciárias brasileiras em relação a algumas matérias específicas:

Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações:

I – de alimentos, quando:

a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil;

b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens,


recebimento de renda ou obtenção de benefícios econômicos;

II – decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou


residência no Brasil;

III – em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

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O inciso I estabelece uma inversão em relação ao art. 21, inciso I, do CPC/2015 em que
o domicílio não será o do réu, mas do alimentando. Quanto ao inciso II, considera-se
uma incrível ampliação, pois, anteriormente, quando o brasileiro realizava compras no
exterior, regressando ao país, não poderia propor demanda no Brasil. O inciso III, por
fim, traz a chamada cláusula de eleição de foro, tornando o juízo brasileiro competente
ainda que não haja qualquer conexão do fato com o Brasil.

Com relação à competência exclusiva das autoridades judiciárias brasileiras para


apreciar questões com conexão internacional, dispõe o art. 23 do CPC/2015:

Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:

I – conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;

II – em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento


particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da
herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território
nacional;

III – em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha


de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou
tenha domicílio fora do território nacional.

No tocante ao dispositivo acima, ressalta-se a questão da sucessão hereditária, em que


se inclui todos os atos sucessórios, testamento, partilha, entre outros. Além disso,
observa-se que não há exceção quanto a bens móveis ou imóveis, referindo-se ao
dispositivo a qualquer bem.

Como consequência desse dispositivo, qualquer processo que tenha tramitado no


exterior, acerca dessas matérias, não pode ser homologado, nem receberão exequatur
as cartas rogatórias expedidas nesse contexto.

O CPC/2015 dá destaque à cláusula de eleição de foro ao dispor, em seu art. 25, o


seguinte:

Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento


da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato
internacional, arguida pelo réu na contestação.

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§ 1º Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional
exclusiva previstas neste Capítulo.

§ 2º Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1º a 4º.

Assim, a competência das autoridades brasileiras ficaria excluída se houver previsão de


cláusula de eleição de foro. Contudo, tal previsão deve ser arguida pela parte em
contestação, não podendo o magistrado suscitá-la de ofício. Observa-se, assim, a
importância dada pelo CPC à referida cláusula. Ademais, deve-se ressaltar que tal
disposição não se aplica às competências exclusivas dispostas pela norma processual.

Ainda no tocante à matéria, cita-se precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ),


em que foi decidido o seguinte:

Ainda que o princípio da soberania impeça qualquer ingerência do Poder Judiciário


Brasileiro na efetivação de direitos relativos a bens localizados no exterior, nada
impede que, em processo de dissolução de casamento em curso no País, se disponha
sobre direitos patrimoniais decorrentes do regime de bens da sociedade conjugal aqui
estabelecida, ainda que a decisão tenha reflexos sobre bens situados no exterior para
efeitos da referida partilha (REsp. nº 1.552.913/RJ, rel. Min. Maria Isabel Gallotti,
Quarta Turma, julgado em 08.11.2016, DJe 02.02.2017).

Assim como os juízes estrangeiros não podem dispor sobre bens situados no Brasil, os
magistrados brasileiros também não podem dispor sobre bens situados no exterior, em
decorrência do princípio da soberania e da efetividade. No caso, o STJ excepcionou
essa disposição afirmando: quando for o caso de dissolução de casamento, haverá
produção de efeitos no exterior, sem violar a ordem jurídica brasileira, de decisão cujos
reflexos existam quanto a bens lá situados.

3. Aplicação do direito estrangeiro – prova

Um aspecto interessante com relação à matéria é a aplicação do direito estrangeiro,


pois, muitas vezes, a norma indireta obrigará o juiz a aplicar o direito estrangeiro, a
exemplo de um contrato internacional em que o proponente reside no Japão, devendo
aplicar-se o direito japonês ao caso concreto.

Antes de efetivamente debater tal aplicação, deve-se citar três artigos relacionados,

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momento em que serão feitas as observações doutrinárias:

LINDB, art. 14. Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a
invoca prova do texto e da vigência.

CPC/2015, art. 376. A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou
consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar.

Convenção Interamericana, art. 2º Os juízes e as autoridades dos Estados Partes ficarão


obrigados a aplicar o direito estrangeiro tal como o fariam os juízes do Estado cujo
direito seja aplicável, sem prejuízo de que as partes possam alegar e provar a
existência e o conteúdo da lei estrangeira invocada.

Com base nos citados dispositivos, além das disposições doutrinárias, pode-se dizer que
a aplicação do direito estrangeiro, quando previsto na norma indireta, é obrigatória,
devendo o juiz aplicá-lo de ofício. Além disso, mesmo não invocado pelas partes, pode o
magistrado determinar, como ônus da parte, provar seu teor e sua vigência, devendo o
juiz aplicar esse direito (estrangeiro).

Deste modo, pode o juiz fazer o controle de constitucionalidade, segundo a doutrina,


desse direito, se houver previsão desse instituto no direito estrangeiro, utilizando-se da
constituição estrangeira como parâmetro, mas não devendo aplicá-lo, como já dito, se
violar a ordem pública brasileira. Vale dizer, deverá agir como se fosse o juiz
estrangeiro, mas sempre tendo como limitação a ordem pública brasileira.

Observa-se também que, para fins de recurso extraordinário, a lei estrangeira é


equiparada à lei federal, segundo precedente do Supremo Tribunal Federal – STF (RE
nº 93.131, rel. Min. Moreira Alves, Segunda Turma, julgado em 17.12.1981).

4. Caução

A caução (cautio judicatum solvi) é uma garantia exigida para que um estrangeiro ou
brasileiro domiciliado no exterior litigue na justiça brasileira. Há de se observar que,
caso o autor resida no estrangeiro, deverá se exigir a caução para que se dê impulso ao
processo.

O art. 83 do CPC/2015 prevê que:

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Art. 83. O autor, brasileiro ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou deixar de residir
no país ao longo da tramitação de processo prestará caução suficiente ao pagamento
das custas e dos honorários de advogado da parte contrária nas ações que propuser, se
não tiver no Brasil bens imóveis que lhes assegurem o pagamento.

Observa-se que a caução não será necessária se houver bens imóveis que lhes
assegurem o pagamento. No CPC/1973, a caução estava prevista nos dispositivos do
processo cautelar, o que não fazia muito sentido, mas no CPC/2015 está junto aos
dispositivos sobre despesas processuais, mais adequado à matéria.

Também não será exigida caução, nos termos do art. 83, § 1º, do CPC/2015 quando:

§ 1º Não se exigirá a caução de que trata o caput:

I – quando houver dispensa prevista em acordo ou tratado internacional de que o Brasil


faz parte;

II – na execução fundada em título extrajudicial e no cumprimento de sentença;

III – na reconvenção.

§ 2º Verificando-se no trâmite do processo que se desfalcou a garantia, poderá o


interessado exigir reforço da caução, justificando seu pedido com a indicação da
depreciação do bem dado em garantia e a importância do reforço que pretende obter.

Durante o estudo serão observados diversos tratados e convenções que dispensam a


caução, a exemplo da Convenção da Haia, sobre sequestro internacional de crianças, a
Convenção de Nova York, sobre a prestação de alimentos no estrangeiro, o Protocolo de
Las Leñas, entre outros.

5. Litispendência

Por fim, faz-se necessário o estudo da litispendência internacional. Vejamos o art. 24 do


CPC/2015:

Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não
obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe

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são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e
acordos bilaterais em vigor no Brasil.

Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a


homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no
Brasil.

A regra é que não existe litispendência internacional, podendo ser ajuizada demanda
que já esteja tramitando no exterior, salvo previsão em tratado e acordos bilaterais em
sentido contrário. Não há impedimento nem mesmo para a homologação de sentença
estrangeira.

Tal disposição, antes da previsão no CPC/2015, já era posição dos tribunais brasileiros.

Portanto, o que ocorrerá, no caso da homologação de sentença estrangeira, é que a


demanda em curso no Brasil será extinta, pois haverá a coisa julgada.

Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência


dos temas em provas de concursos públicos.
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