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PATOS DE MINAS
2021
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DAVID ROSSINI DE SOUSA ALVES
PATOS DE MINAS
2021
2
A REFORMA PROTESTANTE E A EDUCAÇÃO: a filosofia educacional dos
reformadores e suas contribuições para a pedagogia
RESUMO:
A Reforma Protestante do século XVI está muito além das categorias meramente
religiosas, ela envolveu, por consequência, toda a estrutura social da Europa medieval.
Esse envolvimento social trouxe mudanças e inovações que afetaram a área da
educação, área que os reformadores zelaram e deram importância central. As mudanças
propostas pela Reforma serviram de modo inovador e contribuíram para o
desenvolvimento da sociedade como um todo. Analisar essas contribuições e inovações
é indispensável para entender as fontes de muitas concepções modernas em pedagogia.
Esta pesquisa analisa como e por que os reformadores se envolveram com temas
pedagógicos e desenvolveram suas próprias teorias, e como essas teorias se espalharam
pela Europa e América. Para melhor compreensão, é necessário contextualizar a
Reforma, entender a atmosfera medieval e sua relação com a pedagogia, bem como
analisar aspectos socioculturais e o cotidiano medieval em termos educacionais. Os
resultados gerais do impacto da Reforma na educação foram de indispensável
contribuição ao desenvolvimento das sociedades modernas. Este estudo possibilita uma
nova compreensão acerca da Reforma Protestante e uma busca pelas raízes da
pedagogia popular que se inicia na Reforma.
1. INTRODUÇÃO
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tradicionalmente vista como a primeira das grandes revoluções que criaram o mundo
moderno” (LINDBERG, 2017, p. 35 apud OZMENT, 1992, p. 14).
Além de sua evidente relevância histórica, a presença da Reforma
Protestante nas obras de história da educação se deve, de antemão, ao fato de religião e
educação serem indissociáveis. De acordo com Giddens (2012, p. 489):
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sentido é apenas relativo, destrói seu sentido e, da mesma forma, resulta em uma
ausência total de sentido” (DOOYEWEERD, 2018, p. 134), o artigo não visa fazer da
Reforma Protestante um movimento educacional, pois isso é um erro.
Apontar a Reforma como um movimento que teve a educação como
prioridade principal é certamente um erro, e da mesma maneira, rejeitar que ela atingiu
várias esferas além da Teologia também é um equívoco. De acordo com Lindberg
(2017. p. 31) “se perdermos de vista a rede complexa de relacionamentos históricos das
reformas, corremos o risco de simplificar demais nossa concepção e avaliação da
própria Reforma”. Weber (2001, p. 32), ao analisar a influência da Reforma na
formação da ética capitalista, disse: “é bem verdade que os caminhos do destino
humano só podem amedrontar a quem dele observa apenas um segmento”. É a partir
desta premissa que esse artigo foi desenvolvido: atento para não cometer negligências e
para não absolutizar uma parte em detrimento do todo. Ao comentar sobre a Reforma
Protestante, Burckhardt (2009, p. 407) atenua algo parecido:
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a metodologia bibliográfica baseado em obras específicas, descrever os principais
pontos da filosofia educacional dos mais influentes reformadores e analisar suas
contribuições e inovações, bem como sua relação com a ideia de didática, com a
fundação de Harvard, com o prêmio Nobel, com Dom Pedro II, dentre outros.
Nos primeiros séculos da Idade Média até seu ocaso, a educação foi
extremamente limitada. Enquanto nobres e clérigos tinham os estudos e a formação
intelectual como obrigação, os servos, camponeses e os guerreiros não tinham a mínima
pretensão. Não meramente por negligência da Igreja em promover uma alfabetização
em massa, mas a própria educação era vista como perda de tempo e pouco atrativa. Na
vida comum do medievo não havia espaço para tal preocupação, na verdade “muitos
blasonavam a própria ignorância e caçoavam dos letrados” (NUNES, 1979, p. 150).
A primeira sombra de variação dessa mentalidade surgiu com o
Renascimento Carolíngio. De acordo com González (2011) e Le Goff (2016), Carlos
Magno se preocupou com a educação dos seus súditos e com o cultivo das letras,
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reformou escolas e ordenou a presença de eruditos como Alcuíno e Teodulfo para
comporem sua reforma educacional. Os clássicos estudos do Trivium e Quadrivium
ganharam maior prestígio e difusão e a partir dali se tornaram inextinguíveis para as
escolas e para futuras universidades na Idade Média. Foi ordenado que em cada
paróquia houvesse uma escola e que fosse proibido negar educação aos pobres ou que
exigissem pagamento pelo ensino. Todavia, essas escolas abertas nas paróquias não
eram públicas no sentido atual do termo, mas abertas a clérigos e a monges de qualquer
região. O comentário de Le Goff (2016, p. 133) denota os méritos do Renascimento
Carolíngio para a educação:
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estrangeiros” (NUNES, 1979, p. 219). As principais universidades eram a de Bolonha,
famosa pelo curso de Direito, Paris (Artes e Teologia) e Montpellier (Medicina).
Paralelamente ao surgimento das Universidades, nas escolas se desenvolvia
e tomava corpo uma nova forma filosófica e pedagógica: a escolástica. A introdução dos
textos de Aristóteles no Ocidente foi o fator culminante para seu desenvolvimento, que
chegou ao seu ápice com a Filosofia de Tomaz de Aquino. De acordo com Nunes (1979,
p. 244), do ponto de vista da educação:
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teologia, por outro, trazia no bojo ideias estranhas e contrárias à fé cristã” (NUNES,
1979, p. 262). Esse culto a Aristóteles rendeu uma crítica de Lutero que antes mesmo
das 95 teses mais famosas já havia elaborado outras 97 direcionadas contra a escolástica
de sua época, entre elas, algumas questionavam esse culto a Aristóteles, como a 43: “É
um erro dizer que nenhum homem pode se tornar um teólogo sem Aristóteles”. Todavia,
“Lutero não tinha nada contra Aristóteles em si. O que ele rejeitava era todo o esforço
da teologia escolástica de fazer da filosofia aristotélica a pressuposição da doutrina
cristã” (GEORGE, 1993, p. 59).
Essa escolástica tardia que recebia críticas contundentes foi fruto de uma
decadência intelectual no século XIV, causada principalmente pela Peste Negra. De
acordo com Nunes (1979), a praga disseminou-se principalmente nas cidades com os
seus aglomerados humanos e a falta de higiene, daí a mortandade nos conventos e nas
escolas. Em termos educacionais:
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Holanda, Johannes Reuchlin na Alemanha; Guillaume Budé na França; Thomas Linacre
na Inglaterra; entre muitos outros.
Todavia, deve-se atentar que o avanço de uma não implica o fim da outra.
Na verdade, o avanço da pedagogia humanista deve ser analisado a luz de que, no fim
da Idade Média, a educação e o acesso a informações pertinentes apenas deixaram de
ser algo exclusivo da Igreja Católica e da aristocracia (ALEXANDRE-BIDON, 2013).
De acordo com Huberman (1986, p. 75), “antes a Igreja tinha controle total da
educação; agora, surgiam escolas independentes fundadas por mercadores que haviam
prosperado”. Com a educação aos poucos se tornando desmonopolizada, a formação dos
príncipes, outrora tarefa dos teólogos, passa também a ser, naturalmente, assunto dos
humanistas (BURCKHARDT, 2009).
Se “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”, Lutero inicialmente recebeu
apoio dos humanistas na causa reformista, chegou a trocar cartas com Erasmo, mas, por
desavenças de opiniões, acabaram rompendo. Apesar dos embates, em linhas gerais o
humanismo foi o mais importante braço intelectual para o surgimento da Reforma. De
acordo com Biéler (2017, p. 42), “renascença e Reforma correspondem ambas ao
mesmo anseio. São dois movimentos complementares sobre os quais difícil é dizer qual
engendrou o outro”. George (1993, p. 50), complementa dizendo que:
Sendo antes de tudo uma forma, assim como a escolástica era, a forma humanística de
retorno às fontes gregas serviu utilmente a Reforma Protestante, mas no tocante a
educação, “em tese, a pedagogia humanista refere-se à formação do homem, do ser
humano abstrato, mas na prática é essencialmente aristocrática e só acessível aos ricos”
(NUNES, 1980, p. 28). Sendo a Reforma um movimento que atingiu e recebeu
fervoroso apoio das classes mais populares de camponeses e servos e da faminta
burguesia que buscava emancipação, os reformadores se viram diante de um dilema; a
educação aos poucos se tornava um fenômeno (ALEXANDRE-BIDON, 2013), porém
as classes não aristocráticas, majoritariamente analfabetas e sem acesso amplo
necessitavam urgentemente receber educação. O sola scriptura, o mais importante lema
reformista se sustentaria somente com um povo alfabetizado, mas o cenário era de um
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lado a ultrapassada educação escolástica católica, que não servia de modo algum a
cosmovisão protestante, e do outro a educação humanista, assim como a católica,
aristocrática e divergente em cosmovisão. Quando a Reforma eclode, os reformadores
sabiam então claramente da necessidade de uma reforma educacional, pois a Reforma
“também estava associado à reivindicação humanística pela reforma do fossilizado
sistema educacional escolástico” (SCHEIBLE, 2013, p. 34).
Essas teses fortaleceram a ideia da igualdade geral perante Deus, que aos
poucos acabou rompendo concepções medievais de que algumas profissões, ofícios ou
diferenças de nascimento tornavam os homens diferentes entre si. De acordo com
Cambi (1999, p. 247), “no plano social, é superada a distinção de origem medieval entre
clero e laicato, entre ação religiosa e ação civil”.
Com todos os seres humanos nivelados perante Deus e alcançando a
salvação pela fé através da leitura da Bíblia, nada seria mais importante do que fornecer
uma alfabetização básica e universal, visto que, segundo Cambi (1999), o povo durante
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a Idade Média, e por muito tempo da Idade Moderna, é majoritariamente analfabeto. Por
isso, “Lutero compreendeu que a Educação Básica seria a pilastra para sustentar esse
novo edifício” (JARDILINO, 2009, p. 27).
A Igreja Protestante que surgiu do cisma de Lutero não era uma Igreja
revolucionária que visava a não intervenção do Estado, uma autonomia plena e uma
liberdade total de ação. Era nada mais do que uma Igreja com uma nova doutrina moral
e teológica, que assim como a Igreja Católica, se apoiava nos príncipes que lhe davam
abertura e garantia sua proteção estatal, na ausência de tal proteção, certamente o
projeto reformista de Lutero não teria sido bem sucedido. Segundo Pirenne (1992, p.
422, tradução nossa), “com o luteranismo, ao que parece, com efeito, é mais do que a
religião do Estado: é a Igreja do Estado”. Com isso, as atribuições eclesiásticas agora
passam a ser necessariamente atribuições estatais, entre elas, a educação.
Lutero teve contato com assuntos pedagógicos durante praticamente toda
sua vida. Foi discente, docente, e, como teólogo de carreira, viveu no ambiente
universitário até a velhice. As próprias 95 teses foram estruturadas em forma de debate
acadêmico. Segundo Lindberg (2017), durante sua infância e juventude Lutero se
deparou com um sistema educacional pouco edificante, o conhecimento era imposto aos
alunos e eram usadas técnicas de coerção e escárnio. Alguns alunos eram forçados a
trajar uma imagem de jumento e apanhavam com vara se falassem alemão ao invés de
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latim. Às vésperas da Reforma estava fomentada a concepção de que a educação era
uma perda de tempo se você não quisesse seguir carreira eclesiástica. Lutero se opôs
firmemente a isso. Com a experiência negativa de sua própria educação e com a urgente
necessidade já afirmada, o reformador começou então a expor suas opiniões acerca da
educação.
A visão educacional de Lutero é encontrada em quatro ocasiões: num breve
trecho da célebre carta À nobreza cristã da nação alemã acerca da melhoria do
estamento cristão de 1520, que graças à prensa móvel de Gutenberg, outra grande aliada
de Lutero, que em três semanas já havia sido distribuído 4.000 exemplares e em dois
anos teve 13 edições, se tornando um texto clássico da Reforma (FEBVRE, MARTIN,
2000, p. 376); Aos conselhos de todas as cidades da Alemanha para que criem e
mantenham escolas cristãs de 1524, reeditado muitas vezes em Wittenberg, Erfurt,
Nuremberg, Estrasburgo e outras cidades da Alemanha; no Uma prédica par que se
mandem os filhos à escola de 1530, e em uma obra em conjunto com os reformadores
Filipe Melanchthon, João Bugenhagen e Jorge Espalatino, editada pela primeira vez em
1528 e reeditada em 1538 chamada Instrução dos visitadores aos párocos, também
conhecida como Artigos de Visitação, no qual contém um capítulo dedicado a educação,
chamado Das Escolas. Houve ainda uma terceira edição em 1545 e toda parte
envolvendo assuntos pedagógicos é atribuída a Melanchthon.
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canônico e ao direito secular. Ele próprio se propõe a reformar essas áreas. A saber,
Lutero antes de se tornar monge, formou-se em Direito a desejo de seu pai.
O principal aspecto nessa primeira intenção educacional de Lutero, é ter em
mente que se trata de uma educação puramente cristã e proposta pelo Estado. Não
existia laicidade estatal, tampouco educacional. Essa visão é demonstrada e
aperfeiçoada durante toda sua tratativa acerca da educação. Nesse primeiro texto, Lutero
não dá bases de como seria feito essa Reforma, é apenas um “start” para que os
territórios luteranos se preparassem para essa reforma tendo a educação cristã
protestante como base. Este trecho demonstra claramente essa concepção pedagógica:
Ao fim dessa breve tratativa, Lutero ainda tece críticas às escolas superiores
que buscavam apenas uma quantidade numerosa de alunos que buscavam cada qual ter
seu doutorado e que não tinham a Escritura Sagrada como princípio. Segundo Lutero, as
escolas superiores deveriam formar pessoas altamente entendidas na Escritura.
Podemos perceber a gênese de vários assuntos pelo quais Lutero iria
discorrer de maneira mais aprofundada futuramente. Seus principais textos e
fundamentações mais objetivas acerca do tema estavam por vir.
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54 em 1524; em Viena, de 661 em 1519 para 12 em 1532; em Erfurt, de 2.000 em 1501
para 20 em 1529; em Leipzig, de 175 para 93 entre 1526-30, e até mesmo em
Wittenberg dos 245 matriculados em 1521 restou apenas 173 em 1527. Nas escolas, a
situação também era delicada, “[...] recebendo um atendimento precário, em geral
permaneciam em reduzido número. A maioria das crianças da Europa nem chegava a
frequentar a escola” (FISCHER, 2006, p. 205).
Essa baixa adesão ao ensino se deve pelo fato de que guerras político-
religiosas e revoltas, como a dos camponeses de 1525, estavam ganhando cada vez mais
força, e a instabilidade sócio-política gera naturalmente uma baixa adesão à educação.
Lutero (2018, p. 303) sabia dessa drástica situação: “Em primeiro lugar, constatamos
hoje em todas as partes da Alemanha que as escolas estão em abandono. As
universidades são pouco frequentadas e os conventos estão em declínio.” Todavia, ele
seguia firme com suas críticas aos modelos vigentes e apontando sempre a
cristianização da educação como solução:
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cidade possuiu muitos homens bem instruídos, cidadãos ajuizados, honestos e bem
educados (LUTERO, 2018).
Outro interessante fator na visão educacional de Lutero, do qual ele já havia
indicado brevemente no À nobreza cristã da Alemanha era a questão da educação
feminina. Para Lutero, a mulher, assim como homem, estava em igualdade perante
Deus, ambos não necessitavam de intermediação para acessá-lo. Durante sua obra,
Lutero se mostrou preocupado com a posição da mulher na sociedade, advogou para o
fechamento de bordéis e escreveu tratados acerca do matrimônio. Segundo Jardilino
(2009, p. 55) “De certa maneira, a mulher é uma preocupação singular no pensamento
do reformador. Talvez por isso advogue a criação de escolas para mulheres em todas as
cidades”. No trecho em que Lutero expõe sua opinião ele diz que deve-se
Fica claro o fato de que não se trata de uma revolução social ou de uma luta
pela igualdade de gênero, mas sim de fazer valer sua coerência em relação à educação
universal. Segundo Jardilino (2009), não podemos afirmar que se tratava de uma
compreensão moderna de igualdade entre gêneros, mas a consistência teológica da
doutrina do sacerdócio universal que abrange também a mulher, por isso em relação aos
direitos educacionais, são iguais. De certa maneira, no sentido educacional, essa
concepção de Lutero foi inédita.
Ao longo do texto, outro fator interessante merece ser destacado: a ideia de
Lutero de educar de maneira dinâmica envolvendo uma de suas artes preferidas, a
música:
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âmbito evangelístico ele utilizava dela, segundo Oettinger (2001) citado por Lindberg
(2017), Lutero evangelizava por meio de canções, pois elas incluíam todas as pessoas,
mesmo aquelas que tinham pouca formação. A música não exigia qualquer investimento
monetário de sua audiência e uma vez aprendidas não poderiam ser perdidas ou
confiscadas. Por isso Lutero se posiciona a favor de uma dinâmica educacional e ainda
chega a citar que era assim que os gregos educavam suas crianças e que dessa educação
“resultaram pessoas excelentes, preparadas para toda sorte de atividades” (LUTERO,
2018, p. 319).
Após destacar a importância da educação e expor algumas de suas ideias,
Lutero encerra o texto focando agora nas autoridades, para que elas se atentem a
reforma educacional e não se poupem de investir nas escolas:
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“Quem pode dispensar seus filhos deste modo? Eles têm que cuidar do serviço em
casa”. Lutero (2018) respondeu a isso dizendo que os meninos devem ser enviados à
escola diariamente por uma ou duas horas e, não obstante, fazer o serviço de casa, para
que as duas coisas andem juntas, e uma menina pode dispender diariamente de uma
hora para ir à escola e, ao mesmo tempo, cumprir perfeitamente as tarefas domésticas.
Todavia, o povo parece não ter dado ouvidos a Lutero e muitas famílias
insistiam em não enxergar valor na educação. Começou a surgir então o pragmatismo,
do tipo: “Ora, desde que meu filho saiba escrever em alemão, ler e calcular, isso basta.
Ele será comerciante”. Por essas e outras, neste sermão, Lutero direciona seus
“canhões” aos pais, os responsáveis por “tamanha blasfêmia”. Sem perder sua finesse
literária, Lutero (2018, p. 331) diz que “entre as artimanhas do diabo uma das mais
importantes (se é que não é a mais importante) consiste em aturdir e enganar as pessoas
simples de tal maneira que não queiram mandar seus filhos à escola nem para o estudo”.
Pode-se observar que a resistência dos pais em mandarem os filhos para a
escola passava diretamente pela visão prática das pessoas comuns. Os filhos precisavam
trabalhar e ajudar em casa, e o tempo gasto na escola atrapalharia no trabalho e em casa.
Quanto a isso, Lutero (2018, p. 342) argumenta que: “O estudo não prejudica no
trabalho pelo sustento; pelo contrário, sabe administrar tanto melhor sua casa e, além do
mais, está preparado e apto para o ministério da pregação [...] caso se precisar dele”.
Por se tratar de um sermão, Lutero utiliza ainda várias passagens bíblicas
relacionadas à responsabilidade dos pais quanto aos filhos e sobre a confiança em Deus
para acreditar que se pode enviar o filho a escola e não morrer de fome. Sutilmente,
Lutero também responde a uma possível objeção intrínseca ao povo comum, que era em
relação à confiança na educação estatal, pois nem todas as famílias viam o Estado com
bons olhos. Advogando por motivos óbvios a favor do Estado, Lutero (2018, p. 346) diz
que “o regime secular é uma maravilhosa ordem divina e uma excelente dádiva de
Deus. Ele o instituiu e estabeleceu e quer vê-lo preservado, visto que dele não se pode
prescindir”. Isso não significa que as autoridades não tivessem deveres, na verdade,
desde o À nobreza cristã da Alemanha, Lutero atribui responsabilidades indispensáveis
ao Estado, e após exortar os pais, ele encerra a prédica exortando também as
autoridades:
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Se o pai for pobre, usem-se para isso os recursos da Igreja. Os ricos
deveriam destinar valores para essa finalidade em seus testamentos,
como fizeram alguns que instituíram bolsas de estudos (LUTERO,
2018, p. 362).
Com isso, é possível observar que a filosofia educacional de Lutero passa
diretamente pela universalização do ensino, pela gratuidade, obrigatoriedade, pelo dever
do Estado em garantir boas escolas e universidades, bons professores, uma boa
formação, e, sobretudo, uma educação puramente cristã protestante, pois apesar de
todos os esforços, Lutero não era um salvador da pedagogia alemã ou um revolucionário
educacional. No fundo, “não se pode negar que Lutero estava pensando no
desenvolvimento de sua reforma religiosa e, portanto, na preparação do clero
protestante” (JARDILINO, 2009, p. 49).
Lutero via na educação a base para o protestantismo. Atribuía ao Estado a
tarefa de executar suas demandas, e sabia que com uma educação de qualidade e
puramente cristã a capacidade intelectual do povo aumentaria e consequentemente a
qualidade do clero, dos governantes e da cidade como um todo. Mas deve-se ter em
mente que o público alvo e o ponto de partida dos reformadores para pensar a
universalização da educação, eram as grandes massas. À vista disso, outro fator
essencial veio à tona: a Bíblia e os grandes textos circulavam apenas em latim, língua
completamente desconhecida pelas massas iletradas (era comum apenas nos meios
intelectuais e universitários). Lutero em suas tratativas exigia o ensino do latim nas
escolas, mas pela urgência da demanda, o caminho mais rápido seria então traduzir a
Bíblia e os textos mais importantes para as línguas vernáculas, “por isso a ênfase nos
escritos em línguas vernáculas foi uma importante prática dos reformadores” (VIEIRA,
2008, p. 125).
Lutero iniciou sua tradução da Bíblia do latim para o alemão durante seu
exílio após a Dieta de Worms em 1521. Diferente das traduções anteriores à dele,
Lutero sempre se mostrou preocupado em chegar o mais perto possível do texto
original; “Lutero explicou que queria comunicar um alemão claro e vigoroso, não latim
ou grego. Assim, sua tradução foi guiada pelo uso linguístico das pessoas em casa, na
rua e no mercado [...]” (LINDBERG, 2017, p. 120).
Com a ajuda de uma aliada mais do que especial (a imprensa), os textos de
Lutero se espalhavam calorosamente pela Europa e ele fazia a fortuna de seus
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impressores. Sua tradução do Novo Testamento ficou pronta em menos de três meses e
foi publicada em setembro de 1522. Em Wittenberg, ficou conhecida como
Septembertestament e foi reimpressa outras 14 vezes somente ainda em Wittenberg
entre 1522 e 1524. O Septembertestament ainda contou com mais outras 66
reimpressões em Augsburg, Basiléia, Estrasburgo e Leipzig. Em pouco tempo já
atingira 87 edições em alto-alemão e 19 em baixo-alemão. (FEBVRE, MARTIN, 2000;
FISCHER, 2006).
O Antigo Testamento, por sua vez, foi publicado plenamente somente em
1534 e também contou com centenas de edições pela Alemanha. Segundo Lindberg
(2017, p. 120), “no decorrer de sua vida, Lutero trabalhou continuamente para tornar a
Bíblia mais acessível a leigos por meio de traduções, prefácio explicativos e até mesmo
planos para uma versão “letra grande”, destinada a pessoas com visão debilitada”. Isso
demonstra a preocupação de Lutero com a acessibilidade da Bíblia e com a língua
vernácula.
A Bíblia seguia sendo traduzida e até o fim do século XVI já existia versões
do Antigo e do Novo Testamento em inglês, holandês, francês, polonês, tcheco, dentre
outros. A Bíblia se tornara o livro da moda. Sobre a obra de Lutero, de acordo com
Febvre e Martin (2000, p. 379):
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Pode-se observar que Lutero sempre se mostrou um homem da prática. Sua
preocupação com a educação e com o projeto reformista como um todo, era uma
preocupação de ordem prática. De acordo com Vieira (2009, p. 135 apud ZULUAGA,
1972, p. 196), “Lutero deve ser lembrado como aquele que deu impulso prático e força
política à programação de um novo sistema escolar”. Todavia, quanto se trata de
pedagogia, as aplicações práticas de nada valem sem as fundamentações teóricas, e
quando se tratava de teoria, tornava-se assunto para o principal discípulo e herdeiro de
Lutero, seu ministro da educação: Filipe Melanchthon.
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excomunhão caso não se retratasse sobre as 95 teses e após a Dieta de Worms apenas
ele sabia que Lutero estava vivo e exilado. Melanchthon redigiu as principais confissões
de fé luteranas e foi ele quem discursou no funeral de Lutero em 1546. Mas a
importância de Melanchthon seria ainda estrondosamente maior para Lutero e para a
Reforma.
Sempre sendo o especialista nas reformas pedagógicas, suas ideias
ganhavam força e em 1523 foi eleito o reitor da Universidade de Wittenberg. De acordo
com Scheible (2013, p. 38), durante sua gestão ele aproveitou para implantar um
regulamento que passava diretamente por duas de suas preocupações fundamentais
acerca da pedagogia:
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Com a morte de Frederico, o Sábio, em 1525, seu irmão João, o Constante,
assumiu o governo e logo se atentou para a situação das universidades e escolas da
região. Com as pautas alinhadas, visto que os reformadores também estavam na missão
da reforma educacional, Melanchthon, Lutero e Bugenhagen saíram em visitas e
inspeções às escolas da Turíngia e da Saxônia nos anos de 1527 e 1528. Nessa altura,
sob a tutoria de Melanchthon, os reformadores juntamente com os prefeitos das
respectivas cidades já haviam fundado a Escola de Nuremberg em 23 de maio de 1526 e
a Universidade de Marburgo em 1º de julho de 1527. Os currículos e planos de estudo
tanto da escola como da universidade eram todos ditados por Melanchthon. Quando os
três voltaram das visitações na Turíngia e Saxônia, Melanchthon decidiu redigir um
manual de regras acerca do método pedagógico para os que se interessassem na reforma
educacional. Esse manual começou a figurar na obra de Lutero chamada Instrução dos
visitadores aos párocos, ou somente Artigos de visitação, que contava com várias
instruções relacionadas a teologia e a administração geral da igreja, e com um capítulo
chamado Das Escolas e suas três classes, é esse o capítulo que fez a influência de
Melanchthon se espalhar por toda a Alemanha.
Ora, as escolas dos meninos têm muitas falhas. Para que a juventude
seja instruída corretamente, estabelecemos a seguinte ordem: Em
primeiro lugar, os professores devem empenhar-se a ensinar somente
o latim aos alunos, não o alemão, o grego ou o hebraico, como alguns
vinham fazendo até agora, sobrecarregando as pobres crianças com
tanta variedade [de línguas]. Isso não só é infrutífero, mas inclusive
prejudicial [...]. Em segundo lugar, não devem sobrecarregar os alunos
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com muitos livros, mas evitar, de todas as formas, a multiplicidade.
Em terceiro lugar, é necessário dividir os alunos em classes.
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Além de elencar de maneira muito detalhada as matérias de estudo e
até mesmo as suas horas de ensino, o plano fornece indicações úteis
sobre o método de aprendizagem que dá muito espaço à leitura e à
conversação, mais que à gramática e à sintaxe, cuja utilidade não é,
todavia, posta em dúvida para um melhor aprendizado e uso da língua.
No mesmo plano, Melanchton atribui às autoridades civis a tarefa de
instituir e financiar as escolas e de nomear professores dotados de boa
cultura clássica.
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Magister Filipe aos meus, também prefiro que eles estejam sendo usados, em latim e em
alemão, mais do que os meus” (SCHEIBLE, 2013, p. 171). Com as ações de Lutero,
Melanchthon, Bugenhagen e outros reformadores alemães, “[...] a Alemanha liderou a
alfabetização europeia no século XVI” (FISCHER, 2006, p. 206). Porém, essa liderança
não foi incontestável, seus vizinhos suíços também estavam na disputa após aderiram a
Reforma.
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Isso não significa que Calvino discordava da tradição pedagógica proposta
por Lutero e Melanchthon, exceto a discordância sobre o meio que fornece a educação.
As outras concepções eram totalmente aceitas: a ideia de que a ignorância é inimiga da
fé; a tese da educação como instrumento para o aumento da piedade cristã; a junção do
humanismo com a ortodoxia protestante; a universalização e gratuidade da educação;
colégios femininos, e educação simples e bem dividida. Todas essas concepções
fizeram-se presentes da visão educacional de Calvino.
Convém pautar que, diferente de Lutero e Melanchthon, Calvino não
escreveu textos diretamente relacionados à educação, seja em forma de metodologias ou
focado em teorias pedagógicas. A questão da educação em Calvino está internalizada
em sua concepção antropológica do que é o homem. Calvino aceitava vigorosamente a
tese reformada da depravação total. Para ele, o pecado obscurecia a alma humana, por
isso, educar o ser humano, segundo ele, é dá-lo a chance de encontrar-se com Deus, e o
objetivo último da educação é mostrar ao ser humano, por meio dos textos sagrados, sua
essência divina e sua relação com Deus (VIEIRA, 2008). Portanto, para Calvino, “a
educação não é um fim em si mesmo, mas uma ferramenta imprescindível e útil a sua
teologia. A educação é, pois, a base para o conhecimento da verdade que liberta”
(VIEIRA, 2008, p. 149).
Calvino escreveu em 1536, na época com apenas 27 anos, a primeira edição
daquele que viria a ser o livro mais importante de toda a Reforma Protestante, a
Instituição da Religião Cristã (Christianae Religionis Institutio), também conhecido
como Institutas. De acordo com George, (1993, p. 178, grifo nosso):
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Apesar dessas primeiras edições das Institutas carregarem essa preocupação
com uma educação clara e convincente, a primeira afirmação nítida da importância da
educação nos textos de Calvino, aparece somente em suas Ordenanças Eclesiásticas de
1541, direcionadas a Igreja de Genebra, onde ele afirma que:
[...] tendo em vista que somente é possível tirar proveito das aulas se
houver, em primeiro lugar, o ensino de línguas e humanidades, e
também porque é necessário educar as próximas gerações para que
não se deixe a igreja deserta para nossos filhos, um colégio deve ser
instituído para instruir as crianças. Preparando-as para o ministério e
para o governo civil (GREGGERSEN, 2003 apud LEITH, 1996).
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Na schola privata, o conteúdo era dividido em sete classes, começando pela
classe 7, que seria a inicial. Nessa classe as crianças começariam a conhecer as letras e a
composição das palavras no latim e no francês. Na classe 6 desenvolveriam as
conjugações de verbos e começariam a adentrar nos catecismos. Na classe 5 teriam o
primeiro contato com a escrita lógica e com a construção de sentenças. Na classe 4 as
crianças concluiriam a gramática latina, com textos de Cícero e Ovídio. Na classe 3
adentrariam ao mundo da gramática grega, com Virgílio e outros. Na classe 2
estudariam história com os clássicos Tito Lívio, Xenofonte, Heródoto e Homero, e
claro, a história dos evangelhos. Na classe 1 começava os estudos avançados de lógica e
retórica (VIEIRA, 2008).
Percebe-se que a maior preocupação na schola privata é com a leitura, com
a escrita e com o desenvolvimento da fala. De acordo com Campos (2000), “em cada
ano, ao final de abril, o aluno tinha de apresentar um ensaio em francês e, se aprovado,
traduzi-lo para o latim”. Essa ênfase na gramática, na leitura e na fala, aproxima a
schola privata do Trivium mais do que do Quadrivium, pois matérias como a
matemática e a música estavam ausentes na schola privata, sendo estudadas a partir da
schola publica.
Após concluírem a schola privata, o aluno se ingressaria na schola publica,
correspondente a universidade. Nessa fase, o aluno se adentraria ao mundo do hebraico,
do grego e das artes, e, sobretudo, ao mundo da teologia. Apesar do foco na teologia, o
método humanístico sempre se fizera presente, pois os alunos liam também a Platão,
Aristóteles, Plutarco e Cícero. Na schola publica os alunos também mantinham maior
contato com a física e com a matemática, e eles deviam “defender publicamente suas
teses, enquanto outro aluno era preparado para questioná-las” (VIEIRA, 2008, p. 166).
Apesar do teor universitário da schola publica, ela se diferenciava das
universidades tradicionais, pois não cobrava taxas, não concedia graus, e nem possuía
associações de estudantes. Por Genebra ter se tornado um refúgio para os protestantes
de toda Europa, a Academia crescia e até a morte de Calvino em 1564 já contava com
1600 alunos. Calvino insistiu que a Academia ficasse sob o controle da Igreja e que
todas as indicações partissem dela. Ele exigia também a responsabilidade dos alunos
que deveriam ter frequência às reuniões públicas de instrução, nas quais havia o ensino
do catecismo; ter diligência no seu estudo, pessoal das escrituras; ter responsabilidade
de exercer vigilância sobre a sua própria vida. Dessa forma, eles aprendiam a ser
responsáveis em matéria de obediência (CAMPOS, 2000).
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A Academia, juntamente com o brilhantismo dos escritos de Calvino, fez
com que Genebra se tornasse o centro da Reforma Protestante, de acordo com Campos
(2000):
Não somente Genebra, mas outras regiões da Europa foram
diretamente afetadas pela criação da Academia [...]. Os lideres das
igrejas reformadas do continente e da Grã-Bretanha foram fortemente
influenciados pelas aulas de Genebra [...]. É perfeitamente justo dizer
que não somente a Academia, mas todo o contexto da cidade de
Genebra, ou seja, o contexto académico, politico, litúrgico e teológico
afetaram positivamente toda a Europa e, posteriormente, o continente
americano. O sucesso da Academia foi extraordinário. Ela foi o berço
de grande parte do ministério protestante da Europa naquela época.
Ali surgiram os pregadores e mestres mais importantes do
protestantismo europeu. Todas as igrejas enviavam os seus jovens
para serem preparados em Genebra [...].
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As contribuições da filosofia educacional protestante podem ser destacadas
não somente em níveis pedagógicos, mas também em níveis sócio-políticos, pois, a
ampliação do ensino afeta consequentemente a sociedade como um todo. A base por
trás da democratização da educação idealizada pelos reformadores é a ideia do
sacerdócio universal de cada crente, pelo qual, sem mediação alguma, tem a liberdade
de alcançar Deus e de ler as escrituras sagradas, sendo cada indivíduo responsável por si
e pelos seus atos. Essa “individualização” alavancada pela Reforma fez surgir novos
ideais políticos e científicos, que de maneira irredutível, passam pela valorização da
educação universal e da ampliação das instituições de ensino.
Após o período da Reforma continuaram a surgir novas universidades de
cunho protestante. Na Alemanha, é fundada a Universidade de Altdorf em 1622,
Estrasburgo em 1621, Kiel em 1665, Giessen em 1607, Rinteln em 1621 e Duisburg em
1655. Na região dos países baixos, recém-independente da Espanha e de grande
influência calvinista, foi fundada a Universidade de Leiden em 1575, de onde saíram
nomes como o de Descartes, Spinoza e Rembrandt, além de Groningen em 1614,
Amsterdam em 1632 e Utrecht em 1636. Na Inglaterra, as guerras religiosas sempre
atrasaram o processo de implantação da filosofia educacional protestante, todavia,
observa-se que figuras protestantes como John Dury e o poeta John Milton escreveram
tratados acerca da educação e eram favoráveis a uma educação pública oferecida pelo
Estado. Nos EUA, terra de muitos puritanos refugiados, é fundada a Universidade de
Harvard em 1636, o nome se deve ao pastor puritano John Harvard, que doou 780 libras
e 400 livros para o que viria a ser uma das maiores universidade dos EUA e do mundo;
Yale, fundada em 1701, Princeton em 1746, Columbia em 1754 e várias outras, todas
por iniciativas religiosas de cunho protestante (VIEIRA, 2008; NUNES, 1981).
Lutero, Melanchthon e Calvino não encaixam no quadro de filósofos da
educação como conhecemos hoje, talvez Melanchthon seja o que mais se aproxima,
mas, certamente, uma das principais contribuições da filosofia educacional reformada é
exposta na obra de João Amós Comenius, esse sim é filósofo da educação e pode ser
considerado o principal sistematizador da pedagogia protestante.
Na Didática Magna, a influência da pedagogia protestante pode ser
observada em várias passagens: “as crianças devem aprender desde o princípio da vida a
ocupar-se principalmente com as coisas que conduzem diretamente a Deus, como o
estudo das Sagradas Escrituras, os exercícios de culto divino e as boas ações”
(COMENIUS, 1997, p. 277 apud LOPES, 2003, p. 180). A máxima “ensinar tudo a
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todos”, sem dúvida, é baseada nos pressupostos teológicos de Comenius, que, de acordo
com Lopes (2003, p. 187, grifo o autor):
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a Igreja Presbiteriana anexou a Escola Americana ao Protestant College at São Paulo,
em 1897 mudaram o nome para Mackenzie College at São Paulo, que se tornaria a
Universidade Presbiteriana Mackenzie, atuante até os dias atuais.
O Colégio Internacional, por sua vez, havia contraído muitas dívidas e seu
fundador George Nash Morton encerrou suas atividades no colégio em 1879. O Colégio
passou por novas administrações e após um surto de febre amarela em Campinas
mudou-se para a cidade de Lavras em 1893, assumindo o nome de Instituto Evangélico.
Sob a direção do missionário Samuel Rhea Gammon, o Instituto até 1908 já contava
com 195 alunos e com uma variedade de cursos e setores; Ginásio e curso Normal,
Escola Técnica de Comércio, Colégio Evangélico, Escola de Agricultura e cursos de
música (HACK, 2000).
Foi ao cursar o Ginásio em Lavras que o patense Antônio Dias Maciel,
sobrinho do Dr. Olegário Dias Maciel e filho do Cel. Farnese Dias Maciel se converteu
ao protestantismo e levou as ideias protestantes para Patos de Minas. O protestantismo
já marcava presença em Patos desde 1889 com o casal John Thomas Smith e Eliza Jane
Smith. Eliza já mostrava as inclinações protestantes à educação e foi a primeira
orientadora de uma escola feminina na cidade (FONSECA, 1974). Antônio Dias Maciel
impulsionou e deu maior visibilidade ao ainda embrionário protestantismo em Patos.
Entre 1929 e 1931, ele fundou o Colégio Sul-Americano, de orientação presbiteriana.
Esse colégio veio a se tornar a Escola Normal de Patos em 1933, sendo o Dr. Antônio
Dias Maciel o primeiro Diretor da escola. Em 1968 a Escola receberia o nome de Escola
Estadual Professor Antônio Dias Maciel, em homenagem ao seu fundador. A Escola é
atuante em Patos de Minas até os dias atuais.
Em termos gerais, acerca da filosofia educacional protestante no Brasil, de
acordo com Mendonça (2008, p. 145):
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Percebe-se que os países de maior influência protestante lideraram o
desenvolvimento dos sistemas educacionais e de índices de alfabetização pelo mundo.
De acordo com Giddens (2012, p. 611):
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fábricas, para nelas ocuparem, cargos superiores de mão-de-obra
especializada e posições administrativas. A explicação desses casos é,
sem dúvidas que as peculiaridades mentais e espirituais adquiridas do
meio ambiente, especialmente do tipo de educação favorecido pela
atmosfera religiosa da família e do lar, determinaram a escolha da
ocupação e, por isso, da carreira (WEBER, 2001, p. 37).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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É pretensioso afirmar que a Reforma foi a causa primeira de toda a
pedagogia moderna. Porém, a grande maioria dos historiadores, até mesmo os católicos,
concorda que a Reforma, em termos de popularização da educação, foi um dos
principais, se não o principal fator.
Todas essas contribuições devem ser analisadas a luz de que, a Reforma
produziu, graças à ideia do sacerdócio universal, um senso de individualidade e de
responsabilidade individual de cada crente, e, de acordo com Dooyeweerd (2018, p.
150), “toda contribuição individual à abertura do aspecto cultural da sociedade humana
torna-se, no curso do tempo, uma contribuição ao desenvolvimento cultural da
humanidade, a qual tem uma perspectiva global”. Por isso, as contribuições da Reforma
Protestante para a pedagogia se tornaram contribuições globais e indispensáveis. O fato
de a reforma ter lugar garantido nas obras de história da educação, história da leitura ou
história do livro, prova isso.
6. REFERÊNCIAS
BIÉLER, A. A força oculta dos protestantes. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2017.
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FONSECA, G. Domínio de pecuários e enxadachins: história de Patos de Minas. Belo
Horizonte: Ingrabrás, 1974.
GONZÁLEZ, J. L. História ilustrada do cristianismo: a era dos mártires até a era dos
sonhos frustrados. 2. ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2011.
HUBERMAN, L. História da riqueza do homem. 21. ed. rev. Rio de Janeiro: LTC,
1986.
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MENDONÇA, A. G. A inserção do protestantismo no Brasil. 3. ed. São Paulo:
EDUSP, 2008.
PIRENNE, H. História de Europa: desda las invasiones hasta el siglo XVI. México:
Fondo de Cultura Económica, 1992.
ZUCKERMAN, H. Scientific elite: nobel laureates in the United States. New York:
The Free Press, 1977.
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7. ANEXOS
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