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A Didática e a sua Relação com a Educação:
Uma Análise Histórica e Filosófica
Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
A Didática e a sua Relação com a Educação:
Uma Análise Histórica e Filosófica
• Introdução;
• A Didática da Antiguidade à Idade Média;
• Do Período Medieval à Modernidade;
• Os Filósofos Pós-Iluministas na Contribuição da Orientação
Pedagógica para a Instrução de Crianças;
• Princípios da Didática.
OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Compreender o processo histórico e filosófico da didática e sua influência no processo
de ensino.
UNIDADE A Didática e a sua Relação com a Educação:
Uma Análise Histórica e Filosófica
Introdução
Iniciamos as nossas discussões nesta Unidade apresentando o objetivo de aprendiza-
gem que buscaremos com essas propostas, a didática. Estudar o conceito de didática,
bem como os seus campos de atuação se justifica pelo fato de que esta Disciplina é fun-
damental para a atuação docente, pois é uma das disciplinas principais do núcleo peda-
gógico, indispensável ao processo de formação e atuação dos profissionais da Educação.
Ao longo dos séculos, a didática deixou de ser considerada uma disciplina apenas ins-
trumental, constituída por métodos e técnicas de ensino. Após longos anos de estudos
e reflexões, hoje a compreendemos como uma área do conhecimento responsável pelo
estudo do processo de ensino-aprendizagem.
Assim, a didática pode ser entendida como “a arte de ensinar”, e por mais que nos
pareça algo atual, envolve um conteúdo científico filosófico, educacional e metodológi-
co, pensado e organizado no século XVII.
Figura 1 – Didática
Fonte: Getty Images
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Didática: é um campo em constante construção e/ou reconstrução, de uma práxis que não
tem como objetivo ficar pronta e acabada, mas articular as diferentes dimensões do processo
de ensino-aprendizagem.
Ainda que tenhamos essas referências sobre a forma de ensinar, foi com o início da
Era Moderna que se iniciaram os estudos a respeito da didática. Tais estudos surgiram
em um período marcado pela transição do feudalismo para o capitalismo, ocasionando a
necessidade de transmissão de saberes mínimos para os segmentos mais pobres da po-
pulação, com vistas à formação de mão de obra produtiva. O professor Libâneo (1994) é
enfático ao destacar que o desenvolvimento do sistema de produção capitalista, ainda por
se constituir enquanto tal, já influenciava na organização da vida social, política e cultural.
Sabemos que as formas de ensinar, assim como os objetivos que são direcionados à
educação, sempre estão relacionadas à forma de produção e reprodução social de dado
momento histórico. Assim, os métodos de ensino, o que ensinar e para quem ensinar
tinham, e ainda têm, por objetivo atender às necessidades da sociedade, e isso se aplica
também à didática (LIBÂNEO, 1994).
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Uma Análise Histórica e Filosófica
entanto, foi em 1629, com a publicação da obra Didática magna, escrita por João
Amós Comênio, que essa expressão se consagrou como tal; Baradel (2007, p. 11) en-
fatiza que “[...] inicialmente (século XVII), a didática tinha seus pressupostos calcados na
causa da Reforma Protestante, sendo um meio de luta contra o modelo de ensino da
igreja católica medieval, ou seja, deveria ser um instrumento de libertação”.
Em tal contexto ocorreram inúmeras mudanças nos campos cultural e científico, de modo
que sabemos do desenvolvimento das Ciências, da observação e experimentação científica.
Houve a perda de poder da Igreja Católica por conta da Reforma Protestante, do surgimento
de uma filosofia caracterizadora do período histórico e conhecida como iluminismo.
Segundo Gasparin (2010), nesse novo mundo que vinha surgindo, havia necessidade
de um novo homem, uma exigência social onde todos deveriam ser educados para essa
nova vida. O conhecimento social deveria ser incluído nas escolas, com o objetivo de pre-
parar os jovens para o novo tempo. Como se tratava de novos conhecimentos, estes não
poderiam ser ensinados da forma antiga, sendo necessário um novo método, uma nova
didática, da mesma grandeza dos conhecimentos que deveriam ser ensinados aos alunos.
Frente a necessidade colocada pelo novo modo de produção e pelas mudanças cul-
turais e sociais, Comênio escreveu sua principal obra, Didática magna: o tratado de
ensinar tudo a todos, a qual deveria ser seguida por todos aqueles que ensinavam em
grupos ou de maneira individual. Ao elaborar o seu livro, esse autor não o propôs com o
objetivo de ser discutido, mas de ser seguido para responder aos novos desafios sociais;
com essa obra Comênio não anunciou apenas uma didática, mas uma grande didática
(GASPARIN, 2010).
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Comênio foi o primeiro pensador a estabelecer o entendimento de que o conheci-
mento deveria ser de acesso para todos, criando, assim, regras e princípios sobre a for-
ma de ensinar, ou seja, sobre a didática. Esse educador fundamentava as suas ideias nos
princípios da ética religiosa; mesmo assim, os seus pensamentos eram inovadores para
a época e se contrapunham aos ideais conservadores da nobreza, a qual exercia grande
influência naquele período. Nesse contexto, o latim era a língua oficial e amplamente
utilizada para ensinar artes, Ciências e demais idiomas.
Dessa maneira, Comênio propôs que se fosse utilizada a língua pátria (no caso, o la-
tim) para o ensino, pois naquele período os Estados Nacionais estavam se constituindo,
“[...] a língua vernácula passou a ter uma importância fundamental como identidade de
um povo, como nova forma de manifestação da cultura, e como novo instrumento de
comunicação no processo de ensino [...]” (GASPARIN, 2010, p. 23). No que diz respeito
aos aspectos pedagógicos, a natureza e o estudo por meio da experimentação eram os
princípios fundamentais que deveriam permear o processo educacional.
Assim, era necessário estabelecer uma ordem e os conteúdos deveriam ser bem
aprendidos para ser possível ensinar outros conteúdos; afinal, somente a partir de uma
educação completamente organizada e ministrada com clareza é que outros conteúdos
poderiam ser ensinados às crianças e aos Adolescentes.
O “Pai da Didática” acreditava que a indução e experiência são princípios que mar-
cariam a educação naquele momento, tanto como método geral de ensino, tal como
método específico para ensino das Ciências, moral e piedade.
Note que o surgimento da didática teve origem fora do ambiente escolar, e foi pro-
posta como forma de compreender as questões filosóficas, científicas, educacionais e
metodológicas do período, tornando-se, na escola, uma resposta aos anseios e às neces-
sidades para a transmissão e assimilação dos novos conhecimentos (GASPARIN, 2010).
A partir desse método, Comênio propôs cinco passos para que fosse executado:
preparação do aluno, apresentação do conteúdo, assimilação do conteúdo, gene-
ralização e aplicação. Não podemos esquecer que esse método seguia os pressupostos
tradicionalistas da época em que foi criado.
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Uma Análise Histórica e Filosófica
Comênio (apud WALKER, 2001, p. 30) foi buscar nos pressupostos religiosos as
ações pertinentes para implementar a Didática magna, ressaltando repetidamente
em sua obra que “[...] nunca será em vão o trabalho começado em nome do Senhor”.
O “Pai da Didática” salientou a sua utilidade e que estaria baseada em retos princípios,
tais como:
• A ajuda de Deus para obter o resultado esperado;
• Os estudantes aprenderão como se estivessem jogando;
• Os professores não precisarão mais mudar de método para que o aluno aprenda.
Para Libâneo (1994) por mais inovadores que sejam as ideias, sabemos que demora-
ram tempo considerável para serem efetivadas na prática, no século em que Comênio
viveu, bem como em alguns séculos seguintes havia ainda a predominância de práticas
escolares da Idade Média, tais como ensino intelectualista, verbalista e dogmático, me-
morização e repetição mecânica dos ensinamentos do professor; além de que nas esco-
las, assim como na Idade Média não havia lugar para as ideias dos alunos, muito menos
para as experiências vividas por esses. A Igreja continuava a exercer grande poder tanto
na religião, quanto na vida social.
Você Sabia?
Que a Reforma Protestante marcou o caráter revolucionário de luta contra o tipo de
ensino que era transmitido pela Igreja Católica medieval?
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Os Filósofos Pós-Iluministas
na Contribuição da Orientação
Pedagógica para a Instrução de Crianças
Sabemos que a história é dialética e está sempre em movimento, em processo de
construção e transformação. Assim, com o passar do tempo o poder da nobreza e do
clero que no século XVIII ainda era predominante, foi perdendo força e a burguesia se
fortalecendo enquanto classe social, e lutando pela conquista do poder no campo polí-
tico, econômico e cultural.
Rousseau ficou conhecido como o primeiro filósofo do romantismo, por meio da pu-
blicação de seu livro intitulado Contrato social. Nessa obra, Rousseau defende a ideia
de que o homem (ser humano) é inatamente bom e tem o seu comportamento corrompi-
do pela sociedade. Além desse livro, o pensador é autor de inúmeras obras sobre poesia,
música e uma das mais notáveis autobiografias da literatura europeia. Outra publicação
conhecida de Rousseau e de fundamental importância para a educação é intitulada Emí-
lio, na qual o autor explicita o caráter corruptor da sociedade.
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Uma Análise Histórica e Filosófica
Apesar de ter formulado tais pensamentos e os reproduzido por meio de suas obras,
Rousseau não os colocou em prática; tal tarefa couber a outro pedagogo chamado Pes-
talozzi. Educador de origem suíça, viveu entre os anos de 1746 e 1827, trabalhando do
início ao fim de sua vida no campo educacional. Na perspectiva de Libâneo (1994, p. 60),
o filósofo Pestalozzi “[...] deu grande importância ao ensino como meio de educação e de-
senvolvimento das capacidades humanas, como cultivo do sentido, da mente e do caráter”.
A partir das ideias elaboradas por Comênio, desenvolvidas por Rousseau e colocadas
em prática por Pestalozzi, muitos outros educadores foram influenciados. Entre os mais
importantes conheceremos Johann Friedrich Herbat, pedagogo de origem alemã, que
viveu entre os anos de 1766 e 1841. Herbat foi um dos principais autores que influen-
ciaram a pedagogia conservadora (tradicional).
Libâneo (1994) esclarece que juntamente com a formulação dos objetivos da educa-
ção e pedagogia como Ciência, Herbat realizou uma análise sobre o desenvolvimento do
processo psicológico-didático de aquisição de conhecimentos, sob a direção do profes-
sor. Para esse autor, a finalidade é moral, a qual pode ser atingida por meio da educação.
Educar o homem para Herbat consistia em instruí-lo “[...] para querer o bem, de
modo que aprenda a comandar a si próprio [...]”. O professor assume papel primordial,
sendo considerado um “arquiteto de mentes”. Cabe ao professor:
[...] trazer à atenção dos alunos aquelas ideias que deseja que dominem
suas mentes. Controlando os interesses dos alunos, o professor vai cons-
truindo uma massa de ideias na mente, que por sua vez vão favorecer a
acumulação de ideias na mente das crianças. (LIBÂNEO, 1994, p. 60)
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• Sistematização: Os conhecimentos deveriam ser sistematizados para se obter a
generalização;
• Método: Referente ao uso de conhecimentos adquiridos por meio de exercícios.
Posteriormente, esses passos foram mais desenvolvidos por educadores discípulos
de Herbat, estando presentes ainda hoje nas práticas de ensino em sala de aula
(LIBÂNEO, 1994).
Princípios da Didática
Iniciaremos a nossa discussão conversando sobre a didática; como já vimos no item
anterior, em cada momento da história essa temática ganhou significados e objetivos
diferentes, a fim de atender às demandas de determinado período. Muitos são os autores
que conceituam a didática, cada um conforme a sua corrente teórica. Aqui utilizaremos
três autores fundamentais para conceituar a didática: Libâneo (1994), trabalhado an-
teriormente, Gasparin (2010) e uma teórica conhecida nessa área de estudos, que é a
Candau (2011). Estes são autores contemporâneos, os quais têm contribuído de forma
significativa para o campo da educação.
Segundo Libâneo (1994, p. 85), a Ciência que estuda a práxis educativa, ou seja, a
teoria e a prática da educação
[...] nos seus vínculos com a prática social global. Assim, sendo a Didática
uma disciplina que estuda os objetivos, os conteúdos, os meios e as con-
dições do processo de ensino tendo em vista as finalidades educacionais,
que são sempre sociais, ela se fundamenta na Educação (enquanto disci-
plina pedagógica).
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UNIDADE A Didática e a sua Relação com a Educação:
Uma Análise Histórica e Filosófica
Por muito tempo, a didática foi concebida por uma perspectiva instrumental, abran-
gendo apenas um conjunto de conhecimentos técnicos, sobre o “como fazer”. Tratada
de forma universal, a didática se desvinculava dos problemas referentes aos objetivos da
educação. Atualmente, temos a visão da necessidade de superação dessa perspectiva
técnica sobre a didática, estando em um momento em que ultrapassar essa visão é fun-
damental, e para tal necessitamos “[...] pensar a prática pedagógica concreta, articulada
com a perspectiva de transformação social, que emergirá uma nova configuração para
a didática” (CANDAU, 2011, p. 14).
A ação social dos profissionais da educação não é uma prática isolada que se reduz
somente ao que fazem; pelo contrário, é sempre uma prática geral do grupo social ao
qual o professor está inserido. Isso ocorre porque a totalidade social é sempre histórica
e contraditória, composta por elementos subjetivos e objetivos.
Cabe, então, à educação tal tarefa, sendo esta considerada a práxis educativa, ou
seja, como a teoria e prática do processo educativo. A educação tornou-se, assim, “[...]
um campo de conhecimentos que investiga a natureza das finalidades da educação numa
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determinada sociedade, bem como os meios apropriados para a formação dos indivídu-
os, tendo em vista prepará-los para as tarefas da vida social” (LIBÂNEO, 1994, p. 24).
A didática é uma disciplina de extrema importância para nós, professores, pois com-
preender o “como ensinar” pressupõe entender que a escola, na busca por cumprir as
suas funções social e pedagógica, organiza, desenvolve e avalia os elementos (aluno-
-professor-conteúdo-recursos) envolvidos no processo educativo. Esses elementos, na
perspectiva de Damis (2006, p. 30) “[...] expressam e sistematizam as condições e ne-
cessidades predominantes na realidade, direciona o aluno, ao ser levado a estabelecer
relações entre um conhecimento específico e a realidade natural e social mais ampla
[...]”. Por meio do saber transmitido, o aluno acaba por adquirir a compreensão de mun-
do, habilidades e valores necessários à vida social.
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Uma Análise Histórica e Filosófica
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Didática: Velhos e Novos Temas
LIBÂNEO, J. C. Didática: velhos e novos temas. 2002.
Didática: velhos e novos temas, de José Carlos Libâneo (2002): organizado pelo
renomado teórico Libâneo, este livro reúne uma coletânea de textos que se torna-
ram relevantes sobre as discussões que envolvem a didática, fazendo-nos pensar
sobre o processo de construção e materialização da didática;
Repensando a Didática
VEIGA, I. P. A. Repensando a didática. Papirus Editora, 2014.
Livro Repensando a didática, organizado por Ilma Passos Alencastro Veiga: visa
pensar e repensar o papel da didática e a sua importância na formação inicial e
continuada de professores; a intenção da autora é estimular a busca por uma didá-
tica que, de fato, concretize a prática pedagógica.
Filmes
Nenhum a Menos (2000)
Acontece em uma aldeia no vilarejo de Shuiquan; a história baseia-se na vida de um
professor da escola primária que precisa afastar-se da docência por um tempo, e
a única pessoa que poderá substituí-lo é uma jovem de 13 anos de idade. Sem ne-
nhuma experiência, essa jovem enfrentará inúmeros desafios para cumprir com o
propósito de lecionar para os seus alunos, até que o pequeno Zhang deixa a aldeia
e caminha rumo à cidade para buscar trabalho, enquanto a pequena professora,
determinada em sua função, vai atrás de seu aluno a fim de trazê-lo para os braços
da escola.
https://youtu.be/yHTbr0QA6Ko
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UNIDADE A Didática e a sua Relação com a Educação:
Uma Análise Histórica e Filosófica
Referências
BARADEL, C. de B. Didática: contribuições teóricas e concepções de professores.
Bauru, SP: [s.n.], 2007. Disponível em: <http://www.fc.unesp.br/upload/pedagogia/
TCC%20Carina%20Baradel%20-%20Final.pdf>. Acesso em: 02/02/2019.
PERRENOUD, P. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre, RS: Artes
Médicas, 2000.
WALKER, D. Comenius: o criador da didática moderna. Juazeiro do Norte, CE: HB, 2001.
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