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1 ª EDIÇÃO
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eu não
preciso de
você
Eu não preciso de você. Eu preciso perder a barriga,
preciso de um ferro de passar roupas e preciso mandar
lavar o carro. Mas de você eu não preciso. Talvez até eu
precise me vestir melhor, usar um corte de cabelo mais
moderno e comprar papel higiênico — está acabando.
Mas, definitivamente, eu não preciso de você. Mas eu
quero você. Um diabético não deseja a insulina. Eu não
adoro meu remédio da tireoide que eu tenho que tomar
todos os dias. Mas eu preciso dele. E um diabético
precisa da insulina. Ambos por não termos opção.
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bil
parar de se preocupar com as coisas. Mas ela fechou a
porta na sua cara.
Algumas horas depois, após uma mensagem de texto
malcriada de Lufe, reclamando da “portada” na cara,
ela respondeu, pediu desculpas e saíram para lanchar.
Lancharam e, à noite, ela saiu com amigas, ele também.
No dia seguinte ela ainda estava mal-humorada, mas
depois do almoço foi até a casa dele. Enquanto ele
assistia ao jogo do seu time, ela dormia no sofá. E o
padrão se repetiu: ela acordou e eles fizeram aquele
mesmo sexo sublime por horas e horas e voltaram a
dormir.
Lufe acordou a tempo de observar Anna dormindo
por mais alguns minutos, até que ela acordou.
— Dorme aqui. — Pediu ele.
— Não. — Ela respondeu, blasé como só ela sabia ser.
— Por quê? Estamos juntos há muito tempo?
— Lufe, nos últimos dois dias a gente passou mais de
quarenta horas juntos.
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o primeiro
fim
Essa semana que passamos longe foi um pouco
confusa pra mim. Me fez perceber que eu sinto a sua
falta mais do que como só uma amiga, mas isso ainda
é confuso. Me fez sentir falta da sua companhia, do
seu sorriso falando de teatro, dos seus pés no meu
colo enquanto reclama da vida. Me fez sentir falta do
nosso sexo, do nosso pós-sexo onde nós dois estamos
acabados e em êxtase. Me fez sentir falta do que o
nosso sexo causa, tanto em mim quanto em você. Me
fez sentir falta de te ouvir falar: “ninguém nunca me
comeu desse jeito”, enquanto eu sorrio feito criança
elogiada pela professora na reunião de pais e alunos, na
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deixa
Títulos não me importam. Não me importa ser o
“Meninas, esse é o Lufe, meu namorado”, tampouco eu
almejo ser o “ah, o Lufe, o cara que eu fico”. Os títulos
e as convenções pouco importam desde que, entre nós,
o que temos seja claro e honesto. Eu não te quero como
troféu, tampouco quero sê-lo para você (a não ser que
exista alguém no mundo que goste de troféus magrelos,
barrigudos e com o nariz torto). Eu só quero que você
me deixe ser, para você, o que realmente importa, não
o que parece importar. Me deixa ser seu porto seguro,
o abraço para onde você corre quando tudo tá uma
bagunça. Me deixa ser a segurança que você sempre
achou que nunca fosse querer.
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Tomara
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eu preciso
de você, sim.
Anna,
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o pior casal
do mundo
A gente tem tudo pra dar errado. Absolutamente tudo.
Em uma lista de compatibilidade com todas as pessoas
que você já ficou, eu ficaria atrás de bêbados que você
ficou só uma vez e ex-presidiários que você pode ter
ficado em uma noitada sem saber do passado deles. E
a recíproca é verdadeira. A gente tem tudo e mais um
pouco pra dar errado. Somos dois grossos, irritadiços,
queremos estar sempre certos, perdemos a cabeça com
facilidade, somos impulsivos, somos ciumentos (eu
sempre fui, você ficou agora), nos ofendemos com
facilidade, e isso tudo foi só o que eu lembrei de cabeça
agora à uma da manhã.
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Eu não te esqueci.
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eu não te
esqueci
Nem por um segundo eu te esqueci. Nem durante
outro beijo, durante outra noite, durante outro abraço,
nem durante outros cafunés, durante outras palavras de
amor, outras brigas, muito menos durante outros planos.
Até porque, depois de você não houve outros planos.
Aliás, geralmente essas coisas funcionam para mim.
Beijos, abraços, sexos, noites, cafunés, planos, essas
coisas geralmente me fazem esquecer alguém bem
rápido. Bom, dessa vez não só não funcionou como
piorou. Nenhum beijo é o seu, nenhum abraço é o seu,
nenhum cafuné é o seu e nenhum futuro é o nosso.
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eu não quero
mais esse amor
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por que eu
sempre volto
para você?
Por que eu sempre volto para você? Por que diabos eu
sempre volto para você, Anna? A cada decepção amorosa
depois de você, e acredite, foram muitas, eu volto para
você. Volto pensando que, apesar de quase termos nos
matado, entendíamos um ao outro por sermos igualmente
fodidos e quebrados. E só por isso eu tendo a relevar
nossos erros e voltar para você, porque essa coisa toda
dói demais, viu? Sabe aquela frase do 1984, do Orwell,
onde ele falava que o Winston, em uma tradução livre
minha, não queria tanto ser amado quanto queria ser
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você nunca
existiu
Não se sinta tão importante com o que eu escrevo
sobre você, ou com o que eu já escrevi. Não vou ser
leviano e dizer que é tudo mentira. Mas nada é verdade.
Você nem existe, tá reclamando de que? Você não passa
de uma criação ególatra da minha cabeça de escritor que
acredita em finais felizes. Só. E, assim, você é e foi o
que eu quero e quis que você fosse. Não o que você foi
de verdade. Você não tem nada que reclamar quando
eu te retrato de um jeito que você não gosta e muito
menos ficar lisonjeada se eu te trato como uma pessoa
maravilhosa, porque é tudo invenção. Porque você não é
nada disso. A versão de você que eu descrevo nada mais
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fim
Oi, Anna,
Hoje é dia vinte e dois de fevereiro de dois mil e
vinte. Quase dois anos depois que eu decidi juntar tudo
isso em um livro. Pois bem, juntei. O livro tem nome,
tem capa, mas falta um último texto. Estou há oito dias
travado neste último texto. E você sabe bem que eu
nunca travo. Mas travei. Como seria o último texto?
Fofo? Esperançoso? Libertário? Falando que ainda te
amo e pedindo para você voltar? Um texto sobre como
eu amadureci com essa história toda? Um texto fofo
levantando uma trégua? Ou um texto engraçado? Eu
não sei.
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