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06/05/2022 15:51 ConJur - Opinião: A venda de participação societária e o lucro presumido

OPINIÃO

A venda de participação societária por sociedades


optantes pelo lucro presumido
22 de fevereiro de 2022, 17h08

Por Thiago Braichi e Sávio Hubaide

Os mercados financeiro e de capitais têm atraído cada vez mais investidores, e são muitas
as empresas que se dedicam à atividade de compra e venda de participações societárias.
Independentemente das diversas modalidades de investimentos desenvolvidas, a exemplo
de venture capital e private equity, empresas dedicadas à alienação de participações se
diferenciam daquelas voltadas à gestão pela ausência de caráter duradouro em suas
aquisições.

A compra e venda de participações societárias não


se inclui entre as atividades para as quais a lei
imputa a obrigatoriedade de adoção do lucro real
(artigo 14 da Lei nº 9.718/98). Por esse motivo,
desde que respeitados os demais limites, empresas
que se dedicam a essa atividade estão autorizadas
a optar pelo lucro presumido, modalidade
reconhecidamente menos complexa que, muitas
vezes, mostra-se financeiramente vantajosa.

Na sistemática do lucro presumido, o montante tributável é determinado pela soma do valor


resultante da aplicação dos percentuais de presunção sobre a receita bruta, e dos ganhos de
capital, rendimentos e ganhos líquidos auferidos em aplicações financeiras, demais receitas
e resultados positivos (artigo 25 da Lei nº 9.430/96).

Nesse sentido, há duas dúvidas iniciais sobre a tributação da renda resultante da alienação
de participações societárias para empresas optantes pelo lucro presumido: 1) se os valores
auferidos incluem-se no conceito de receita bruta ou sujeitam-se ao regime do ganho de
capital; e 2) caso sejam considerados receita, qual é o percentual de presunção aplicável.

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Em relação ao primeiro questionamento, vale notar que a Lei nº 12.973/14 ampliou o


conceito de receita bruta previsto no artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, que compreende
o produto das vendas, da prestação de serviços em geral, o resultado das operações de conta
alheia e as demais receitas relacionadas ao objeto principal da empresa. Dessa forma, para
as empresas que se dedicam à atividade de compra e venda de participações societárias,
fica evidente que os ganhos auferidos estão abarcados pelo conceito legal de receita bruta,
sujeitando-se ao regime do lucro presumido, quando for essa a opção.

Quanto ao percentual de presunção, a controvérsia reside em verificar se devem ser


aplicados os 32% sobre a cessão de bens imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza,
ou os 8% (IRPJ) e 12% (CSLL) previstos para a venda de mercadorias ou produtos, e
demais operações residuais para as quais não há previsão expressa.

Sobre o tema, a Receita Federal publicou a Solução de Consulta Cosit nº 347/17, formulada
por empresa que possui como objeto social a participação em outras sociedades, como
acionista ou cotista, e a compra e venda dessas participações societárias. As participações
são adquiridas pela empresa com o intuito específico de comercialização.

Na oportunidade, a RFB manifestou o entendimento de que a receita obtida pela alienação


de participações societárias de caráter não permanente deve ser computada na receita bruta
sujeita ao regime do lucro presumido, sem a exclusão do custo de aquisição, enquanto a
alienação das participações de caráter permanente sujeita-se ao regime do ganho de capital.
Entretanto, em que pese o reconhecimento de que as participações não permanentes se
enquadram no conceito de receita bruta, defendeu que se submetem ao percentual de 32%,
pois corresponderiam à atividade de "administração e cessão de direitos de qualquer
natureza".

Ocorre que a legislação tributária não definiu o alcance da expressão "cessão de direitos".
Em um primeiro momento, pode dar a entender que o termo abarcaria toda e qualquer
cessão. No entanto, tida a cessão como uma possibilidade de transmissão de quaisquer
direitos sobre determinado bem, sua adoção ampla conflitaria com outros negócios
jurídicos que envolvem transmissão de direitos, para os quais a legislação prevê outros
percentuais de presunção.

A compra e venda de mercadorias tangíveis, por exemplo, é operação que


indiscutivelmente se submete aos percentuais de 8% e 12%, e que, em uma acepção
genérica, envolve a cessão do direito de propriedade sobre o bem objeto da transação. Não
há dúvidas de que a propriedade é um direito cedido na operação de compra e venda de
mercadorias.

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Dessa forma, não há previsão legal ou justificativa razoável que sustente tratamento diverso
à compra e venda de bens intangíveis como as participações societárias, em que também
ocorre a cessão do direito de propriedade. A interpretação conjunta dos percentuais de
presunção não leva a outra conclusão senão a de que a cessão de direitos abarcada pelo
percentual de 32% consiste, em verdade, na cessão temporária de direitos. Tanto é que o
mesmo inciso engloba a locação, ou seja, espécie do gênero cessão de direitos que envolve
a transferência temporária do direito de posse.

Embora o tema seja de considerável relevância, haja vista o crescimento do número de


empresas dedicadas a essas operações, e o impacto tributário decorrente da diferença entre
os percentuais presuntivos, não há muitos precedentes sobre o assunto.

No Acórdão nº 1102-000.227, o Carf entendeu que somente as receitas decorrentes da


cessão de direitos de qualquer natureza estariam sujeitas ao percentual de 32%, "o que não
alcança, portanto, as receitas provenientes da alienação destes mesmos bens e direitos". É
verdade que a decisão proferida em 2010 determinou que a venda de participações
societárias, permanentes ou não, estaria sujeita ao regime do ganho de capital, o que veio a
ser superado tanto pelo conceito de receita bruta da Lei nº 12.973/14 quanto pela SC nº
347/17. De toda forma, o precedente é mais um indicativo de que o percentual de 32% se
aplica apenas às cessões temporárias, mas não às alienações.

Na mesma linha, no Acórdão nº 9101-001.329, a CSRF, além de defender que a receita


bruta engloba os resultados das atividades que constituem o objeto social da empresa,
afirmou que "a melhor exegese o art. 15 leva-nos a concluir que a cessão de direito de que
trata a alínea c do inciso III é tão somente a cessão provisória, em que não há
transferência da propriedade, mas apenas de um dos poderes da propriedade, como, por
exemplo, a cessão de direito de uso".

Percebe-se, portanto, que embora a RFB tenha manifestado o entendimento de que o


resultado da alienação de participações societárias estaria sujeito ao percentual de 32%,
essa não é a melhor interpretação dos percentuais de presunção previstos na Lei nº
9.249/95. Por ser a solução de consulta relativamente recente, especialmente para fins
contenciosos, espera-se que, quando provocados, o Carf e o Judiciário venham a se
posicionar no sentido de que o percentual de 32% engloba apenas as cessões provisórias,
enquanto as alienações estão sujeitas à regra geral de 8% e 12%.

Thiago Braichi é sócio na área tributária do Freitas Ferraz Advogados.

Sávio Hubaide é associado na área tributária do Freitas Ferraz Advogados.

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Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2022, 17h08

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