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Inês Antunes da Costa | Processo Civil II | TA

Caso 78

A sociedade A, com sede no Porto, dedica-se ao fabrico de leitores de DVD para veículos
automóveis.
No início de janeiro de 2017, celebrou um contrato de compra e venda com a sociedade B, com sede
em Roma, a qual se dedica ao fabrico de veículos automóveis, por via do qual a primeira vendeu à
segunda mil leitores de DVD pelo valor global de 100 mil euros.
Nesse contrato, ficou convencionado que os leitores de DVD seriam entregues até ao final do mês
de agosto, comprometendo-se B a proceder ao levantamento dos mesmos nas instalações de A, sendo
que o preço seria pago nos trinta dias após a entrega dos equipamentos.
Sucede quem, apesar de os leitores terem sido entregues na data acordada, A contactou um advogado,
no sentido de resolver judicialmente este litígio já que B, depois de interpelada por diversas vezes
para proceder ao pagamento da quantia em dívida recusa-se a fazê-lo.
a) Suponha que, no decurso da contestação, B tomou conhecimento de que A cedeu o crédito
reclamado nesta ação a C, com sede em Braga. Como poderá B proceder por forma a
acautelar a sua posição jurídica na ação, pressupondo que a mesma está disposta a confessar
o pedido e a proceder ao pagamento da quantia reclamada nos autos?
À luz do art. 260º, uma vez citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao
pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades consignadas na lei – princípio da estabilidade da
instância.
Contudo, os arts. 261º e 262º preveem a possibilidade de se verificarem modificações subjetivas da
instância, quer em consequência da substituição de alguma das partes na relação substantiva em litígio,
por sucessão ou por ato entre vivos, quer em virtude dos incidentes de intervenção de terceiros.
Ora, no caso em concreto, uma vez que a ré está disposta a satisfazer a prestação, mas tem
conhecimento de que o terceiro se arroga ou pode arrogar-se titular de um direito incompatível com
o da autora, pode requerer, dentro do prazo fixado para a contestação, que o terceiro seja citado para
vir ao processo deduzir, querendo, a sua pretensão, desde que a ré proceda simultaneamente à
consignação em depósito da quantia ou coisa devida.
Nesse caso pode verificar-se uma de três hipóteses:

 se o terceiro não deduzir a sua pretensão e se se verificar uma situação de revelia, é proferida
de imediato uma sentença a declarar extinto a obrigação em consequência do depósito (art.
340º/1);
 se o terceiro não deduzir a sua pretensão, mas não se verificar uma situação de revelia, a ação
prossegue nos seus termos, a fim de se decidir sobre a titularidade do direito (art. 340º/3);
 se o terceiro deduzir a sua pretensão, aplica-se o regime previsto no art. 992º/3, sendo o
devedor exonerado da sua obrigação e prosseguindo o processo unicamente entre os
credores.
b) Suponha que, na pendência da causa, A teve conhecimento de que a ré pretende vender os
leitores de DVD, objeto do contrato de compra e venda, a uma empresa italiana. O que
poderá fazer a autora no sentido de assegurar a proteção adequada do seu direito de crédito?
O conhecimento desta factualidade exige uma reação urgente por parte de A, razão pela qual esta
deve recorrer à tutela cautelar. Com efeito, nos termos do art. 362º/1, sempre que alguém mostre
fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito pode requerer
a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do
direito ameaçado.

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Ademais, nos termos do art. 362º/2, o interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente
ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor.
As providências cautelares, quanto à sua natureza, podem ser comuns ou especificadas, sendo certo
que o procedimento cautelar comum, tem caráter subsidiário, já que só é aplicável quando não se
encontre legalmente prevista qualquer providência tipificada que seja adequada a acautelar o risco de
lesão (art. 362º/3).
Para que as providências cautelares possam ser decretadas têm de estar preenchidos três requisitos
essenciais: periculum in mora, o fundado receio de que a demora normal da tutela do direito possa
causar um prejuízo grave e dificilmente reparável, o fumus boni iuris, a aparência da existência do
direito invocado, sendo certo que a celeridade e urgência da providência exigem tão-só uma
apreciação sumária do direito invocado, e o interesse processual, a inexistência de outro meio legal
menos gravoso que seja suscetível de tutelar o direito ameaçado.
No caso em concreto, tendo em conta que a autora se arroga credora da ré e, bem assim, que a ré se
prepara para vender os bens objeto de compra e venda a um terceiro, a credora pode requerer o
arresto dos leitores de DVD.
Na verdade, dispõe o art. 391º, que o credor que tenha justificado receio de perder a garantia
patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor, sendo que o arresto consiste
numa apreensão judicial de bens, à qual são aplicáveis as disposições relativas à penhora.
Contudo, neste caso o arresto reverte natureza especial. É que, nos termos do art. 396º/3, o credor
pode obter, sem necessidade de provar o justo receio de perde da garantia patrimonial, o arresto do
bem que foi transmitido mediante negócio jurídico quando estiver em dívida, no todo ou em parte,
o preço da respetiva aquisição.
c) Em hipótese distinta das anteriores, suponha que a ré veio alegar na sua contestação que os
leitores de DVD apresentam um defeito de fabrico, pelo que peticionou a substituição dos
leitores por outros, bem como o pagamento de uma indemnização no valor de 50 mil euros
pelos danos patrimoniais já sofridos. Classifique a defesa apresentada pela ré e identifique o
meio processual ao dispor da autora para reagir a essa defesa.
O art. 571º regula o tipo de defesa que pode ser apresentado pelo réu. Com efeito, o réu pode
defender-se por: impugnação da matéria de facto ou de direito, quando, respetivamente, contradiz os
factos alegados na petição inicial ou quando afirma que esses factos não podem produzir o efeito
jurídico pretendido pelo autor; por exceção dilatória, quando alega factos que impedem que o juiz
conheça do mérito da causa ou por exceção perentória, quando alega factos que, servindo de causa
impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor, determinam a improcedência
total ou parcial do pedido.
Para além disso, o réu pode, igualmente, formular pedidos autónomos contra o autor, através da
apresentação de uma defesa por reconvenção, nos termos dos arts. 266º e 583º.
Na situação em análise, ao invocar que os leitores de DVD lhe foram fornecidos apresentam um
defeito de fabrico, a ré está a defender-se por exceção perentória extintiva, na medida em que invoca
o cumprimento defeituoso da obrigação.
Por sua vez, no que concerne ao pedido de substituição e pagamento de uma indemnização, a ré
defende-se por reconvenção, já que não se limita a contestar os factos invocados pela autora,
deduzindo ao invés, um pedido autónomo contra ela. Neste caso, a reconvenção é admissível, na
medida em que o pedido reconvencional emerge do facto jurídico que serve de fundamento à defesa
(art. 266º/2 a)).

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d) Que meios de prova teria a autora à sua disposição face à configuração da relação material
controvertida?
A fase da instrução encontra-se regulada nos arts. 410º e ss. No que concerne ao seu objeto, dispõe
o art. 410º que a instrução tem por objeto os temas de prova enunciados ou, quando não tenha de
haver lugar a esta enunciação, aos factos enunciados de prova.
Por sua vez, à luz do art. 552º/2, o autor deve, no final da petição inicial, apresentar o rol de
testemunhas e requerer outros meios de prova.
No caso em apreço, tendo em conta a configuração da relação material controvertida, a autoria
poderia, designadamente, apresentar ou requerer os seguintes meios:

 Prova documental, mediante a junção aos autos do contrato de compra e venda e de outros
documentos relacionados com os termos da relação jurídica estabelecida com a ré (arts. 423º
e ss).
 Prova por depoimento de parte, na medida em que a autora poderia requerer ao tribunal o
depoimento da parte contrária, indicando desde logo os factos sobre os quais tal depoimento
devia incidir, sendo que este meio de prova visa obter a confissão, pela parte contrária de um
facto que lhe seja desfavorável (art. 452º e ss);
 Prova por declarações de parte, a qual pode ser requerida até ao inicío das alegações orais
em primeira instância e deve recair sobre factos em que a parte tenha intervindo
pessoalmente ou de que tenha conhecimento direto (art. 466º);
 Prova pericial aos leitores de DVD, no sentido de se averiguar se estes apresentam ou não
algum tipo de defeito;
 Prova testemunhal, no máximo de 10 testemunhas, quanto aos fundamentos da ação.

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Caso 79

B, solteira de 17 anos, filha de A, viúvo ficou a saber, poucos dias após o falecimento do seu pai,
ocorrido em Braga, que este havia testado as seus irmãos, F, casado com C, e T, casado com S, o
primeiro na comunhão de adquiridos e o segundo no regime da comunhão geral, um apartamento
no aldeamento turístico de Pedras del’Rei, em Tavira, e uma quinta no Gerês, respetivamente. Estes
dois imóveis estão avaliados em 300 mil euros.
Sabendo que à data da celebração do testamento, já havia sido diagnosticada ao seu pai a doença de
Alzheimer, B pretende impugnar aquele ato por entender que o seu pai, quando o celebrou, não
estava capaz de compreender o significado do mesmo.
a) Suponha que T, na sua contestação, alega que:
a. O seu pai estava de perfeita saúde mental quando outorgou o testamento em causa,
não sofrendo de qualquer doença do foro mental, muito menos de Alzheimer;
b. A sua irmã B é menor de idade e, por isso, não pode propor esta ação, por não poder
estar por si em juízo, razão pela qual o réu deve ser absolvido da instância;
c. O réu é parte ilegítima porque a ação tinha de ser proposta quer contra T e F, quer
contra as mulheres de ambos.
Caracterize cada uma das defesas apresentadas por T.
Nos termos dos arts. 571º e 583º, o réu pode, em sede de contestação, defender-se por exceção
dilatória ou perentória, por impugnação ou por reconvenção.
No caso, ao alegar que A estava de perfeita saúde, o réu defende-se por impugnação direta da matéria
de facto, já que se limita a contradizer a factualidade vertida na PI (art. 571º).
Por sua vez, ao sustentar a incapacidade judiciária da autora, o réu defende-se por exceção dilatória
(arts. 18º, 278º. 571º, 576º, 577º c)).
Por último, ao invocar a ilegitimidade processual passiva, por violação de litisconsórcio necessário
legal e natural (arts. 33º e 34º) o réu defende-se por exceção dilatória (arts. 571º, 576º e 577º e)).
b) Como deveria atuar processualmente B depois de tomar conhecimento da contestação?
O CPC de 2013 veio restringir a possibilidade de o autor responder à contestação do réu através da
apresentação de um articulado de réplica. Com efeito, nos termos do art. 584º, o autor só pode
replicar para deduzir toda a defesa quanto à matéria da reconvenção ou, estando em causa uma ação
de simples apreciação negativa, para impugnar os factos constitutivos que o réu tenha alegado ou
para alegar os factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu.
Deste modo, no caso em concreto, a autora não poderia apresentar articulado de réplica para
responder às exceções invocadas pelo réu na sua contestação.
Contudo, ao abrigo do princípio do contraditório, art. 3º/4, preceitua que a parte contrária pode
responder, na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final, às exceções
deduzidas no último articulado admissível. Isto, sem prejuízo de o juiz, nos termos do art. 3º/3,
decidir antecipar o contraditório relativamente à exceção invocada pela ré, proferindo um despacho
de convite à autora para que esta, querendo, se pronuncie quanto às exceções deduzidas pelo réu na
sua contestação.
c) Suponha que A, em vez de ter outorgado um único testamento, celebrou no mesmo dia e
cartório, dois testamentos, um a favor de T e outro a favor de F, testando ao primeiro o
apartamento e ao segundo a quinta, e que B quer propor uma ação de impugnação contra os

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dois, considerando o mesmo fundamento, i.e., a incapacidade de o seu pai perceber o sentido
das declarações testamentárias proferidas. Quid iuris?
No caso em concreto, uma vez que existem dois testamentos distintos, tal situação implica que
existem duas relações materiais controvertidas diferentes. Todavia, uma vez que a apreciação do
mérito da causa depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos, e dado que o pedido da
autora será o mesmo, com base na mesma causa de pedir – anulação do testamento com base em
incapacidade do testador – é lícito à autora demandar todos os réus em situação de coligação (art.
36º).
Todavia, para que a coligação seja admissível, não se pode verificar nenhum dos obstáculos previstos
no art. 37º. Com efeito, a coligação não é admissível quando aos pedidos correspondam forma de
processo diferentes ou a cumulação possa ofender regras de competência internacional ou em razão
da matéria ou da hierarquia. De todo o modo, quando aos pedidos correspondam formas de processo
que, embora diversas, não sigam a uma tramitação manifestamente incompatível, o juiz pode
autorizar a cumulação, sempre que nela haja interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das
pretensões seja indispensável para a justa composição do litígio. Trata-se de uma manifestação do
princípio da economia processual.
Assim, estando preenchidos os requisitos para a coligação (conexão objetiva, compatibilidade
material, compatibilidade substantiva) é lícito à autora demandar todos os réus na mesma ação, em
regime de coligação processual passiva.

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Caso 80

No dia 25 de outubro de 2016, pelas 15h, em Barcelos ocorreu um acidente de viação, sob forma de
colisão de veículos.
Foram intervenientes o motociclo com a matrícula 00-00-KA, pertencente a F e conduzido por ele,
vem como o veículo automóvel de matrícula 00-00-KB, propriedade de B, conduzido por A.
Esse acidente ficou a dever-se à culpa de A, o qual, desrespeitando um sinal de STOP e ignorando as
regras da prioridade, atravessou-se à frente do motociclo, provocando-se um aparatoso embate, do
qual resultou a destruição total do motociclo e o internamento hospital urgente de F, o qual ficou
com traumatismos graves no maxilar e nos membros superiores e inferiores.
B havia transferido a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo para a companhia de
seguros V.
Acresce a isto que, por força da colisão do veículo automóvel conduzido por A com o motociclo
tripulado por F, esse motociclo acabou por ser projetado para o passeio do lado esquerdo e atingiu
um veículo automóvel (00-00-KC), propriedade de M, que ali se encontrava estacionado, causando-
lhe danos na parte lateral esquerda do mesmo, os quais ascendem ao valor de mil e quinhentos euros.
F tem 28 anos, trabalha como marceneiro e aufere mil euros mensais. Além disso, é casado e tem 2
filhos menores, tendo a sua mulher sido recentemente despedida de uma fábrica têxtil. Desde o dia
do acidente, o mesmo está incapacitado de trabalhar, pois sofreu várias fraturas nos membros
inferiores e superiores e continua internado, a aguardar uma série de intervenções cirúrgicas, uma
delas inclusive ao maxilar.
a) Procurado pela mulher de F, que está desesperada, pois não tem recursos mínimos para
sobreviver com os seus filhos, o que lhe aconselharia, para, de imediato e judicialmente,
obviar à situação de necessidade vivida pelo agregado familiar de F?
No caso, verifica-se uma situação de urgência na tutela de um direito, uma vez que, em sequência do
sinistro, a família de F, deixou de ter recursos económicos necessários para conseguir sobreviver,
considerando o facto de o sustento da família depender em exclusivo da retribuição mensal auferida
por F.
Com efeito, enquanto o processo judicial não chega ao seu termo torna-se necessário obviar a esta
situação de grave carência, mediante antecipação da satisfação do direito. Deste modo, deve ser
requerido o decretamento de uma providência cautelar. Na verdade, dispõe o art. 362º/1, que, sempre
que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu
direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a
assegurar a efetividade do direito ameaçado.
Para que as providências cautelares possam ser decretadas, têm de estar preenchidos três requisitos
cumulativos: periculum in mora, ou seja, que exista um fundado receio de que a demora normal da
tutela do direito possa causar um prejuízo grave e irreparável ou de difícil reparação; fumus boni iuris,
i.e., o tribunal deve concluir pela existência aparente do direito invocado, sendo que a celeridade e a
urgência da tutela cautelar exigem tão-só uma apreciação sumária do direito invocado; e o interesse
processual, que o requerente não possa dispor de um outro meio processual menos gravoso que
permita tutelar o direito ameaçado.
Por outro lado, o tribunal só pode decretar uma providência cautelar comum ou não especificada se
o risco de lesão não puder ser acautelado por nenhuma das providências cautelares tipificadas nos
arts. 377º a 409º.

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No caso em concreto, atentando às providências especificadas, conclui.se que deve ser requerida a
providência especificada de arbitramento de reparação provisória (arts. 388º a 390º).
Com efeito, à luz do art. 388º/1, como dependência da ação de indemnização fundada em lesão
corporal de F, os lesados, bem como os titulares do direito a que se refere o art. 495º/3 CC, podem
requerer o arbitramento de quantia certa, sob forma de renda mensal, com reparação provisória do
dano.
O juiz deve decretar esta providência caso se verifiquem os requisitos cumulativos do art. 388º/2: a
dependência de uma ação de indemnização, já proposta ou a propor; fundar-se o direito
indemnizatório em morte ou em lesão corporal; a existência de uma situação de necessidade em
consequência dos danos sofridos; encontrar-se indicada a obrigação de indemnizar a cargo do
requerido.
Sendo deferida a providência cautelar de arbitramento de reparação provisória, o tribunal fixa uma
quantia mensal, em função das necessidades de sustento, vestuário e habitação do requerente, até que
seja arbitrada uma indemnização em definitivo, na ação principal, já proposta ou a propor.
Se esta providência for decretada e, entretanto, caducar (art. 373º), o requerente deve restituir todas
as prestações recebidas, nos termos previstos para o enriquecimento sem causa (art. 390º/1).
b) Em hipótese distinta, poderiam F e M associar-se entre si numa única ação intentada contra
V?
No caso, M também sofreu danos no seu veículo, em consequência do mesmo acidente de viação.
Ora, no caso em concreto, existem duas relações materiais controvertidas. Assim, existindo
pluralidade de partes e pluralidade de relações jurídicos controvertidas, F e M poderiam coligar-se
entre si, intentando uma ação contra V. Trata-se de uma manifestação do princípio da economia
processual. Para efeito, torna-se necessário o preenchimento dos requisitos positivos previstos no art.
36º (compatibilidade substantiva e conexão objetiva) não podendo simultaneamente verificar-se
nenhum dos obstáculos à coligação que se encontram previstos no art. 37º (compatibilidade
processual).
No caso, muito embora os pedidos de F e M sejam diferentes, a verdade é que a procedência dos
pedidos de ambos depende da apreciação dos mesmos factos, nomeadamente no que diz respeito à
dinâmica do acidente de viação (conexão objetiva).
No que diz respeito à compatibilidade processual, que a coligação não é admissível quando os pedidos
correspondem formas de processo diferentes ou a cumulação possa ofender regras de competência
internacional ou em razão da matéria ou da hierarquia.
No caso em análise, os pedidos de F e M não correspondem a formas de processo diferentes, nem a
cumulação é suscetível de ofender regras de competência internacional ou em razão da matéria ou da
hierarquia.
c) Suponha que a ré, na sua contestação, veio alegar que o acidente não sucedeu como o autor
refere na PI, já que,
a. no local não há qualquer sinal de STOP e o veículo seguro apresentou-se pela
esquerda e não pela direita.
b. Ademais, invocou ainda que F só sofreu danos tão graves porque não usava capacete
naquele dia e hora e ainda o mesmo conduzia uma taca de alcoolémia de 2 gramas
por litro de sangue, para além da circunstância de seguir com manifesto excesso de
velocidade para que circula numa localidade.
Como poderia F reagir?

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Em primeiro lugar, importa analisar o tipo de defesa apresentado pela ré.


Quanto ao primeiro argumento, esta defende-se por impugnação da matéria de facto (art. 571º), já
que contradiz os factos invocados pelo autor na PI.
Quanto ao segundo argumento, a ré quer defender-se por impugnação da matéria factual e por
exceção perentória extintiva (art. 571º e 576º/2).
Tendo em consideração o tipo de defesa apresentado pela ré, importa referir que o autor não pode
responder a essa contestação através da apresentação de um articulado de réplica. Nos termos do art.
584º, o autor só pode replicar para deduzir toda a defesa quanto à matéria da reconvenção ou, estando
em causa uma ação de simples apreciação negativa, para impugnar os factos constitutivos que o réu
tenha alegado ou para alegar os factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu. Ora,
não tendo a ré deduzido qualquer defesa por reconvenção, nem estando em causa uma ação de
simples apreciação negativa, o autor não pode replicar, ficando-lhe, no entanto, reservada a
possibilidade de responder à matéria das exceções na audiência prévia, ou, não havendo lugar a ela,
no início da audiência final (art. 3º/4).
d) Imagine que G, de 87 anos de idade, presenciou o acidente de viação e comunicou a F que
está disponível para depor em tribunal na qualidade de testemunha. Contudo, advertiu-o de
que irá ser submetida a uma intervenção cirúrgica de risco dentro de 3 semanas. O que pode
F fazer, por forma a assegurar o depoimento testemunhal de G possa a ser atendido nos
autos?
A prova testemunhal encontra-se regulada nos arts. 495º e ss.
No caso em apreço, o problema que se coloca é o de garantir a produção urgente do depoimento
testemunhal de G. Na verdade, tratando-se de uma pessoa de bastante idade e que vai ser submetida
nas próximas 3 semanas a uma intervenção de risco, verifica-se uma situação de urgência quanto à
produção antecipada de prova. De facto, o art. 419º admite a produção antecipada de prova, desde
que se verifique um justo receio de vir a tornar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas
pessoas.
Para o efeito, o requerente da prova antecipada deve justificar sumariamente a necessidade de
antecipação, mencionando com precisão os factos sobre os quais irá incidir o depoimento da
testemunha e identificar as pessoas que devem ser ouvidas (art. 420º/1).
e) Considere que nos requerimentos probatórios apresentados no final dos articulados, a ré
indicou como testemunha o seu legal representante e o mandatário do autor pediu o
depoimento de parte do seu cliente. Quid iuris?
Quanto à circunstância de a ré ter indicado como testemunha o seu legal representante, importa
salientar o art. 495º/1 que preceitua que têm capacidade para depor como testemunhas todos aqueles
que, não estando interditos por anomalia psíquica, tenham aptidão física e mental para depor sobre
os factos que constituem objeto de prova.
Todavia, no caso, foi arrolado como testemunha o legal representante da parte. Nos termos do art.
496º estão impedidos de depor como testemunhas as pessoas que, na causa, possam depor como
partes. Assim, como legal representante da ré pode depor como parte, logo, não pode depor como
testemunha.
Deste modo, o autor deve deduzir um incidente de impugnação da testemunha (art. 514º), devido à
impossibilidade legal de o representante da ré poder depor como testemunha.
Relativamente ao facto de o mandatário do autor ter pedido depoimento de parte do seu cliente,
cumpre salientar que este meio de prova não é igualmente admissível.

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Com efeito, o depoimento de parte é um meio de prova, através do qual se visa conseguir que o
depoimento reconheça a realidade de um facto que lhe é desfavorável (arts. 452º a 465º). Nesse
sentido, o juiz pode, em qualquer estado do processo, determinar a comparência pessoal das partes
para prestação de depoimento, informações ou esclarecimentos sobre factos que interessem à decisão
da causa (art. 452º/1). Por outro lado, cada uma das partes pode requerer não só o depoimento da
parte contrária, mas também das suas contrapartes (art. 453º/3), desde que indique de imediato os
factos sobre os quais o depoimento há de recair.
Ora, neste caso o juiz não deve admitir o depoimento de parte apresentado pelo próprio mandatário
do autor em relação ao seu próprio cliente.
Diferentemente, se o mandatário do autor pretendia que o cliente prestasse declarações na audiência
final, devia ter requerido a prova por declarações de parte (art. 466º).

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Caso 81

B e A, casados, adquiriam em dezembro de 2014, à sociedade V uma fração autónoma, tipo T2, em
Guimarães.
O prédio onde se integra a fração foi construído pela sociedade C, com sede em Guimarães.
Sucede que, pouco tempo depois de terem começado a habitar essa fração, B e A aperceberam-se do
surgimento de numerosos defeitos de construção, nomeadamente humidade nas paredes, soalho
manchado e descolado por ação da humidade e caixilharia com sinais de humidade.
Descontentes com a situação, no final de janeiro de 2015, denunciaram os defeitos à empresa
vendedora.
Porque a empresa vendedora, apesar das sucessivas promessas de que iria verificar as anomalias
denunciadas, nada fez, em meados de dezembro de 2017, B e A contactaram um advogado, referindo-
lhe que era sua intenção agir judicialmente, por forma a exigir a reparação dos defeitos atrás
enunciados ou a indemnização pelos danos que tais defeitos causaram e ainda causa, orçando os
primeiros em 6 mil euros, de acordo com um orçamento apresentado por um técnico.
a) Atendendo à circunstância de o advogado ter sido consultado apenas em meados de
dezembro de 2017, refira o expediente processual que convirá usar, por forma a neutralizar
a invocação de uma exceção perentória por parte da Ré.
No caso, B e A, atuando como consumidores, adquiriram uma fração autónoma à sociedade C. Tendo
B e A detetado a existência de deficiências nesse imóvel, o art. 4º DL 67/2003, preceitua que, em
caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja
reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, redução do preço ou resolução do
contrato, sendo certo que, tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem ser
realizadas dentro de um prazo razoável.
Por sua vez, o art. 5º-A do diploma disciplina o prazo para o exercício desses direitos. Tratando-se
de um bem imóvel, o consumidor deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade no prazo de
um ano a contar da data em que a tenha detetado e, uma vez realizada essa denúncia, os direitos
atribuídos ao consumidor caducam no prazo de 3 anos a contar da data da denúncia.
Deste modo, uma vez que B e A denunciaram os defeitos construtivos à sociedade vendedora no
final de janeiro de 2015, a caducidade dos seus direitos ocorrerá no final de janeiro de 2018. Por
conseguinte, tratando-se de um prazo de caducidade, os autores devem intentar a ação antes do termo
desse prazo, já que, nos termos do art. 331º CC, só impede a caducidade a prática, dentro do prazo
legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
b) Considerando as intenções manifestas por B e A, que pedidos deduziria na demanda a
interpor? Qual a relação existente entre os mesmos?
No caso em concreto, verifica-se o cumprimento defeituoso de um contrato de empreitada.
Ora, uma vez que os autores pretendem obter a reparação dos defeitos ou o pagamento de uma
indemnização pelos danos causados por esses defeitos, verifica-se a existência de pedidos alternativos.
Com efeito, nos termos do art. 553º, é permitido deduzir pedidos alternativos, com relação a direitos
que, por sua natureza ou origem, sejam alternativos, ou possam resolver-se em alternativa.
Por sua vez, quanto ao pedido de indemnização pelos danos sofridos verifica-se um pedido genérico,
uma vez que ainda não é possível determinar o valor total dos danos (art. 556º/1 b)). Este pedido

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genérico será concretizado em momento posterior, através de um incidente de liquidação, nos termos
dos arts. 358º a 361º.
c) Suponha que na contestação a ré alega que:
a. não existem na fração autónoma nenhum dos direitos invocados pelos autores;
b. os autores nunca denunciaram aqueles defeitos à ré;
c. a ré é parte ilegítima, já que não foi ela quem construiu o prédio de que a fração
autónoma faz parte.
Caracterize a defesa da ré.
O art. 571º regula o tipo de defesa apresentada pelo réu. Esta pode ser: por impugnação de matéria
de facto ou de direito, quando contradiz os factos alegados na PI ou quando afirma que esses factos
não podem produzir o efeito jurídico pretendido pelo autor; por exceção dilatória, quando alega
factos que impedem que o juiz conheça o mérito da causa ou por exceção perentória, quando alega
factos que, servindo de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor
determinam a improcedência
No caso, no primeiro argumento ao alegar que não existem na obra nenhum dos defeitos invocados
pelos autores, a ré defende-se por impugnação direta da matéria de facto, já que contradiz os factos
alegados pelo autor na PI (art. 571º/1)
No segundo argumento, ao invocar que os autores nunca denunciaram aqueles defeitos à ré,
conforme alegam, a ré defende-se quer por impugnação direta da matéria de facto, porquanto
contradiz os factos alegados na PI (art. 571º/2), que por exceção perentória extintiva, já que invoca
no processo um facto que terá por efeito a extinção do efeito jurídico pretendido pela ação, por
caducidade de tal direito (art. 571º/2, 2ª parte, 576º/3).
No terceiro argumento, a ré defende-se por exceção dilatória, já que invoca a sua ilegitimidade
processual passiva. Sendo julgada procedente, essa exceção terá como consequência a absolvição do
réu da instância, salvo quando a exceção dilatória possa ser sanada.
d) Imagine que no decurso da ação, mas depois de todos os articulados admissíveis terem sido
deduzidos e antes ainda de os autores terem sido concluídos ao juiz para proferir saneador,
os autores repararam que os defeitos invocados pioraram consideravelmente e que foram
aparecendo outros defeitos ainda não notados até então. O advogado, face à situação
descrita, pretende aproveitar aqueles factos para a demanda em curso. Como e até quando
poderá fazê-lo?
No caso, verificou.se um agravamento dos defeitos, bem como o surgimento de novos.
Ora, nos termos do art. 611º, sem prejuízo das restrições estabelecidas noutras disposições legais,
nomeadamente quanto às condições em que pode ser alternada a causa de pedir, deve a sentença
tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se
produzam posteriormente à proposição da ação, de modo que a decisão corresponda à situação
existente no momento do encerramento da discussão.
Com efeito, findos os articulados legalmente admissíveis, pode suceder que surja, entretanto, um
facto novo com relevância para a decisão quanto ao mérito da causa, ou pode suceder que, não
obstante esse facto já se verificar antes da propositura da ação ou durante o decurso da fase dos
articulados a parte com interesse na sua alegação só tenha tido conhecimento desse facto em
momento posterior.
Por conseguinte, tendo como pano de fundo a descoberta da verdade material (e não apenas da
verdade processual), terminada a fase dos articulados é ainda possível a apresentação de articulados
supervenientes, nos termos dos arts. 588º e 589º.

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Inês Antunes da Costa | Processo Civil II | TA

A superveniência pode ser objetiva ou subjetiva, à luz do art. 588º/2, sendo que a primeira verifica-
se quando aos factos ocorrem após o fim dos articulados e a segunda nos casos em que os factos,
apesar de se terem verificado antes ou no decurso da fase dos articulados, só são conhecidos pela
parte a quem esses factos aproveitam após os termo da fase dos articulados.
O art. 588º/3 estabelece o prazo processual para a apresentação de articulados supervenientes, sendo
que varia em função do momento da ocorrência ou do conhecimento da superveniência.
O articulado pode ser apresentado: na audiência prévia, nos 10 dias posteriores à notificação da data
designada para a realização da audiência final e na audiência final
Uma vez apresentado o articulado superveniente, o juiz deve proferir um despacho liminar de
admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora
de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão (art. 588º/5). Deste
modo, no que concerne aos novos defeitos que, entretanto, apareceram e não eram do conhecimento
dos autores, estes podem apresentar um articulado superveniente.
Por sua vez, relativamente aos defeitos inicialmente invocados e que, entretanto. se agravaram, os
autores podem ampliar o pedido até ao encerramento da discussão da primeira instância, uma vez
que essa ampliação constitui um desenvolvimento do pedido primitivo.
e) Suponha que os autores, face ao agravamento da situação e porque a fração está a tornar-se
praticamente inabitável, pretendem efetuar as obras de reparação necessárias à eliminação
dos defeitos detetados e anunciaram essa intenção ao advogado. Que cuidados deverá ter o
advogado em atenção em matéria probatória?
Uma vez que os autores pretendem realizar as obras de reparação necessárias, atenta a situação de
manifesta necessidade em que se encontram, o mandatário deve diligenciar no sentido de se provar
o estado em que o imóvel se apresentava antes da realização dessa intervenção.
Com efeito, estando em causa uma situação de urgência quanto à reparação do imóvel, a prova pode
ficar prejudicada, uma vez que, com essa intervenção, os defeitos vão ser eliminados.
Assim, o mandatário dos autores deve requerer a produção antecipada da prova antes da realização
da audiência de julgamento, sob pena de a prova dos defeitos ficar irremediavelmente comprometida.
Na verdade, à luz do art. 419º, havendo justo receio de vir a tornar-se impossível ou muito difícil o
depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por arbitramento ou inspeção, pode
o depoimento, o arbitramento ou a inspeção realizar-se antecipadamente e até antes de ser proposta
a ação.
No que concerne aos meios de prova legalmente admissíveis nessa sede, o mandatário pode requerer
a realização de uma perícia ao imóvel (art. 388º CC e 467º e ss) ou a realização de uma inspeção (art.
490º a 494º), a fim de se verificar o estado em que o imóvel se encontra.

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