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AULAS PRÁTICAS DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL II

2020/2021, TURMA A
Regência: Prof. Paula Costa e Silva
Assistente: João Marques Martins
04.03.2021
Bibliografia:
o As partes, o objeto e a prova – MTS
o A Ação Declarativa Comum – Lebre de Freitas
O Processo pode ser interpretado como uma relação jurídico-processo, a que, por vezes,
também se chama de instância.
Iremos focar-nos no objeto de processo (objeto da relação jurídico-processual): enquanto no
semestre passado foi adotada uma perspetiva estática, agora será impressa na disciplina uma
característica de desenrolar do processo (tramitação).
O objeto do processo é definido no momento inicial, através do encontro da petição inicial e
da contestação (e, nos casos em que é admitida, a réplica) – manifestações primordiais do
princípio do dispositivo e do contraditório.
Vamos começar por perceber melhor uma fase importante do processo – a fase dos
Articulados.
Percebendo se a instância é regular, o juiz vai olhar para os articulados, para verificar se os
mesmos cumprem os requisitos mínimos (mínimo de perfeição) – o juiz tem o dever de
convidar as partes a aperfeiçoar os articulados (590º, CPC). Daí falar-se da fase de
saneamento, pois o juiz está a sanar as irregularidades do processo.
Audiência Prévia: serve de dois propósitos – procurar aproximar as partes, resolvendo o
processo naquele momento, caso isso não seja possível, prepara-se a audiência final (termos
em que ocorrerá o julgamento).
Que questão jurídica é que as partes submetem à apreciação do tribunal?
Que factos são relevantes para decidir o objeto do litígio? Aqueles referidos pela facttispecie
da norma invocada pelo autor, para fundamentar o pedido. Assim, é necessário fixar os temas
da prova.
Quando entramos no julgamento, decorre o momento essencial do processo: a fase de
instrução (proposição e instrução da prova) – não é uma fase que se possa fixar no processo
sequencialmente.
A matéria da Prova é uma matéria fulcral, essencial – é complexa (607º, nº4, CPC). O juiz
apenas pode decidir/toma a decisão assente em juízes probatórios – há uma obrigação de
justificar a decisão. Se o juiz não pode decidir sem prova, o resultado final do processo
depende do momento da prova (logo, ter razão, em processo, depende da prova que temos).
Quais os efeitos que a sentença produz no ordenamento jurídico? Matéria do caso julgado.
Tutela Cautelar – a Justiça é lenta, por isso, por vezes os tempos da justiça não se coadunam
com a necessidade de resposta.
Por último, falaremos da matéria do Recurso.
Como se resolve um caso prático? Começar por identificar o problema jurídico em causa,
depois, por e contrapor os argumentos que podem dar resposta ao caso, por último, apresentar
a resolução final.
11.03.2021
OBJETO DO PROCESSO
Caso nº1 – Prejudicialidade e Prestações Vincendas
Responda justificadamente:
(a) X é proprietário de um imóvel que deu de arrendamento a Y em janeiro/2015. Por falta
de pagamento das rendas, X resolveu o contrato em setembro/2019. Como Y não devolveu o
imóvel, X propôs ação de despejo em dezembro 2019. Nesta ação, Y alega que a resolução
operada por X não foi lícita. Incomodado com tantos problemas, X vendeu o imóvel a Z em
janeiro de 2020. Quando teve conhecimento desta venda, Y propôs ação de preferência. O
que deve fazer o juiz da segunda ação quando toma conhecimento da pendência da primeira?
Desde já, importa referir que estamos perante duas ações: proposta em 2019, uma ação de
despejo; proposta em 2020, uma ação de preferência.
Quanto à primeira, importa referir que o objeto do processo é composto por um pedido único
e certo – a ação de despejo, prevista no artigo 14º do NRAU, consiste numa ação judicial
destinada a fazer cessar o contrato de arrendamento (10º, nº3, b)?) – tendo como causa de
pedir a celebração do contrato de arrendamento/resolução do contrato de arrendamento.
Quanto à ação de preferência, o objeto do processo é composto por um pedido único e certo
– declaração da existência de um direito de preferência, previsto no artigo 1091º, nº1, a), do
CC – e uma causa de pedir, que neste caso consistiria na celebração do contrato de
arrendamento.
Quanto à relação entre objetos processuais, identifica-se uma relação de prejudicialidade,
uma vez que o julgamento de um objeto processual depende da apreciação de um outro objeto.
Neste caso, a prejudicialidade é homogénea, pois ambos os objetos processuais em causa se
enquadram no âmbito do processo civil. Caso a ação de despejo seja procedente, o contrato
de arrendamento cessa, cessando o direito de preferência.
Esta situação encontra-se prevista no artigo 272º, nº1, que determina que o tribunal no qual
foi instaurada a ação dependente (neste caso, seria a ação de preferência), pode ordenar a
suspensão da instância, aguardando, assim, a decisão da ação relativa ao objeto prejudicial
(neste caso a ação de despejo).
A suspensão mantém-se até ao julgamento definitivo da causa prejudicial, nos termos do
artigo 276º, nº1, c).
Resolução: A prejudicialidade que está aqui em causa é uma noção própria de processo, que
não nos refere. Prejudicar neste contexto, determina influenciar. A prejudicialidade define
aqui uma relação. Está aqui em causa uma prejudicialidade homogénea, entre os objetos.
Objeto dependente e prejudicial (pois determina e influencia a decisão que irá ser tomada
quanto ao primeiro objeto).
Há cumulação de objetos, por exemplo, na coligação, sendo que estes objetos cumulados
podem estar numa relação de prejudicialidade.
272º e 269º, nº1, c) – é um poder do tribunal suspender a ação (para o professor, não parece
que haja aqui um dever). A relação de prejudicialidade que está em causa é de direito
substantivo – o direito para o qual o autor da segunda ação propõe ação, depende de um
contrato de arrendamento. O direito substantivo projeta-se no processo. O processo e o direito
substantivo são perspetivas e dimensões do mesmo problema (o de concretizar o direito).
Prejudicialidade pode ainda ser heterogénea.
Quanto ao caso: se analisássemos a questão na perspetiva de direito substantivo, a ação de
Y poderá proceder, caso improceda a ação de despejo (caso esta última proceda, não há direito
de preferência). Um dos elementos integrantes da causa de pedir na segunda ação é a
subsistência do contrato de arrendamento; um dos elementos do primeiro pedido é a extinção
desse mesmo contrato). Na segunda ação, a parte interessada na suspensão, apresentará o
pedido de suspensão de instância, apresentando a relação de prejudicialidade (normalmente,
são as partes que chamam esta relação ao processo).
Destaca-se, neste problema, o princípio de economia processual (teríamos dois tribunais a
decidir a mesma questão).
(b) Entre X, empreiteiro, e Y, dono de obra, foi celebrado e executado um contrato de
empreitada. Do contrato resultava que metade do preço (€5.000) seria paga na data da
conclusão da empreitada, devendo a outra metade ser paga 180 dias depois dessa data.
Passados cinco dias sobre o pagamento da primeira metade, um empregado de X ouviu Y
comentar no café que não estava contente com a obra, de modo que X não receberia sequer
mais um cêntimo. Consequentemente, X propõe ação, que conclui nos seguintes termos:
Atento o exposto, pede-se que o R. seja condenado a realizar o pagamento dos €5.000, no
dia 11.11.2020 (correspondente ao 180.º dia subsequente à conclusão da empreitada).
Considera o pedido admissível?
Na petição inicial, o autor formula o pedido (artigo 552º/1/e), CPC) e a causa de pedir (artigo
552º/1/d), CPC). No pedido, o autor formula 2 pretensões: uma material, na qual afirma o seu
interesse como juridicamente tutelado e uma processual, na qual solicita uma atuação judicial
determinada, requerendo ao tribunal providência processual adequada. Neste caso, o autor
apresenta como pedido a condenação do réu ao pagamento de 5000 euros (10º, nº3, b), CPC),
e como causa de pedir a celebração do contrato de empreitada.
O pedido é único, certo e, ainda, de prestações vincendas. Isto é, o empreiteiro formula o
pedido de condenação do dono de obra, quanto a uma prestação cujo cumprimento não é,
ainda, exigível. A prestação vence-se apenas após 180 dias subsequentes à conclusão da
empreitada, sendo que a ação é proposta antes.
Este tipo de pedidos é admitido nos termos do artigo 557º, nº2, do CPC. Se esta situação se
enquadrar na parte final do artigo referido, o pedido é admissível (não há título executivo e a
conversa do empregado é crível de que o dono da obra não irá pagar, sendo prejudicial ao
empreiteiro). Não se enquadrando o caso no tipo de situações previstas no artigo 557º/2, CPC,
o pedido não é admissível, há falta de interesse processual, estando por isso perante uma
exceção dilatória, que desencadeará a absolvição do réu da instância (576º/2 e 278º/1/e),
CPC).
Resolução: 557º está inserido, sistematicamente, na fase dos articulados. O artigo 610º
insere-se na fase da sentença.
557º - dá-nos a sensação de que o nosso legislador permite que coloquemos no pedido uma
prestação vincenda, bastando comprovar o grave prejuízo que pode ser causado ao credor.
“Título Executivo” corresponde a uma sentença. Apresenta uma perspetiva restritiva.
610º - o facto de não ser exigível no momento de dedução da ação, não é problema (quando
o réu contesta apenas a exigibilidade, e não a existência da prestação). Apresenta uma
perspetiva aberta.
Gera-se, então, uma aparente contradição normativa:
֍ Anselmo de Castro: quando o autor apresenta no pedido uma prestação que ele
declara vincenda, deduzindo assim o pedido, aplica-se a restrição do artigo 557º -
para que o pedido seja processualmente admissível, o autor tem que alegar o risco
sério de prejuízo grave caso não tenha título executivo à data do vencimento da
prestação.
O artigo 610º servia para quando o autor deduz um pedido que tem por objeto uma ação
vencida, mas durante o processo vem-se a descobrir-se a obrigação é meramente vincenda.
Críticas: sendo assim, se tudo depende dos termos em que o autor formula o pedido, o autor
poderá manipular a aplicação do artigo 557º.
֍ Tese mais recente (Lebre de Freitas): pressupõe aqui uma interpretação menos
próxima da letra da lei: o artigo 557º e as restrições que nele se preveem visam as
obrigações que ainda nem foram constituídas no momento da proposição da ação (ex.:
obrigação do fiador, apenas nasce com o incumprimento de devedor principal). Em
todos os outros casos, estando já a obrigação constituída, aplicar-se-á o regime do
artigo 610º.
Quanto ao caso: condenação in futurum, genericamente admitida pelo artigo 10º, nº3, b).
Aqui, dependeria qual a tese adotaríamos.

Caso nº2 - Coligação


Responda justificadamente:
(a) X propôs ação contra a Y, Lda. e contra Z, o respetivo gerente, tendo concluído pedindo
a suspensão imediata da Z do cargo e a realização de inquérito à sociedade. Após a análise
da petição inicial, o juiz entende que a cumulação dos pedidos em causa é ilegal. Tem razão?
Supondo que a cumulação de pedidos é, neste caso, ilegal, como deve o juiz proceder?
Desde já, importa referir que estamos perante uma única ação, que comporta dois pedidos: a
suspensão imediata de Z do cargo de gerente e a realização de inquérito à sociedade (1048º).
Assim, são apresentados vários objetos processuais que se reportam a distintos efeitos
jurídicos. Uma vez que existe uma pluralidade de réus – a Sociedade e Z – estamos perante
uma situação de coligação simples, prevista no artigo 36º, do CPC, pois os pedidos que são
cumulados são formulados individualmente contra cada réu, existindo uma diversidade de
relações materialmente controvertidas.
É necessário que se encontrem preenchidos 3 requisitos:
o A compatibilidade processual, prevista no artigo 37º, nº1, do CPC;
o A compatibilidade substantiva – uma vez que a coligação é simples, a
compatibilidade refere-se à coadunação ou não contradição entre os efeitos
decorrentes dos vários pedidos cumulados (555º, nº1 e 186º, nº2, c), do CPC);
o A conexão objetiva – refere-se à existência de uma relação entre os vários pedidos
cumulados.
Desde logo, verifica-se que o primeiro requisito não se encontra cumprido, uma vez que a
forma do processo não é idêntica para os pedidos cumulados: enquanto que a suspensão
imediata de Z do cargo de gerente corresponde a um processo comum, a realização do
inquérito da sociedade encontra-se previsto no artigo 1048º, do CPC, isto é, no Livro V, o
dos processos especiais.
Assim, quanto à incompatibilidade entre as formas do processo, através do despacho liminar
(226º, nº4, CPC), o juiz pode proceder ao indeferimento parcial da petição, quanto ao objeto
para o qual a forma processual indicada pelo autor (552º, nº1, c), CPC) não for adequada
(590º, nº1).
No momento do despacho saneador, a inadequação formal, que corresponde a uma exceção
dilatória inominada, determina a absolvição do réu da instância, quanto ao pedido para o qual
a forma usada não for adequada (576º, nº2 e 278º, nº1, e), CPC).
Resolução: estamos aqui perante um caso que envolve uma coligação, envolvendo assim
uma cumulação de pedidos, dirigidos a réus diferentes.
Tínhamos aqui uma cumulação simples (555º), sendo necessário que os efeitos jurídicos são
distintos. Há litisconsórcio quando todos os pedidos são deduzidos contra todos os réus.
A admissibilidade da coligação tem de ser discutida perante os requisitos previstos no artigo
36º e 37º.
Artigo 36º - pluralidade de objetos processuais, sendo estabelecida entre eles uma relação
(conexão objetiva). Essas relações estão tipificadas no artigo.
Artigo 37º - o tribunal tem de ser absolutamente competente para todos os pedidos.
Quanto à forma do processo: 1055º e 1048º - estão em causa diferentes processos especiais
(a tramitação de cada processo especial é única e adaptada àquele pedido).
O juiz pode absolver da instância o réu da forma de processo que é incompatível com aquela
que foi designada na PI (578º, e)). Um outro meio é o da adequação formal – talvez o juiz
consiga conciliar as duas tramitações específicas, de modo a que as mesmas fiquem
acomodadas, mas tramitem em simultâneo.
(b) X, credor de Y, considera que este vendeu a Z determinado imóvel com o objetivo de
subtraí-lo do seu património, impedindo assim X de cobrar o crédito através desse bem.
Consequentemente, X propôs ação pedindo: Nestes termos e nos melhores de Direito, deve a
presente ação ser julgada procedente, por provada, e em consequência:
a) Ser declarada a ineficácia em relação ao Autor do contrato de compra e venda identificado
no artigo 15.º da petição inicial, e reconhecer-se ao Autor o direito de praticar atos de
conservação de garantia patrimonial autorizada por lei e executar os ditos bens/direitos no
património do segundo réu, na medida do necessário para obter a satisfação integral do
crédito, com as demais consequências legais;
b) Ser declarado nulo o negócio titulado referido no artigo 15.º da petição inicial, com
fundamento em simulação absoluta.
Colocada(o) na posição da(o) juiz a quem foi concluído o processo depois da fase dos
articulados, em que termos procederia?
Desde já, importa referir que estamos perante uma única ação, que comporta vários pedidos:
a declaração de ineficácia do contrato de compra e venda em relação ao Autor;
reconhecimento ao autor da existência do direito praticar atos de conservação de garantia
patrimonial autorizada por lei e executar os ditos bens/direitos no património do segundo réu
(Z); e por último, a declaração de nulidade do negócio. Assim, são apresentados vários
objetos processuais que se reportam a distintos efeitos jurídicos. Uma vez que existe uma
pluralidade de réus – Y e Z– estamos perante uma situação de coligação simples, prevista no
artigo 36º, do CPC, pois os pedidos que são cumulados são formulados individualmente
contra cada réu, existindo uma diversidade de relações materialmente controvertidas.
É necessário que se encontrem preenchidos 3 requisitos:
o A compatibilidade processual, prevista no artigo 37º, nº1, do CPC;
o A compatibilidade substantiva – uma vez que a coligação é simples, a
compatibilidade refere-se à coadunação ou não contradição entre os efeitos
decorrentes dos vários pedidos cumulados (555º, nº1 e 186º, nº2, c), do CPC);
o A conexão objetiva – refere-se à existência de uma relação entre os vários pedidos
cumulados.
Estamos perante um problema de incompatibilidade substantiva, uma vez que os efeitos do
pedido de declaração de nulidade do negócio não se coadunam com o pedido de execução
dos ditos bens/direitos no património do segundo réu. Esta contradição conduz à ineptidão da
PI (186º, nº2, c)), determinando o indeferimento liminar (558º, nº1, a)) ou a absolvição do
réu (577º, nº1, a), 186º, nº1 e 2, CPC.
Resolução:
Em todas as coligações há uma cumulação – se se deduzem pedidos substancialmente
incompatíveis, a cumulação é inadmissível e por isso não é possível formar uma coligação –
vários pedidos são deduzidos contra diferentes réus.
Estamos aqui perante uma cumulação simples? Se sim, ela é inadmissível, pois estamos
perante um problema de incompatibilidade substantiva (um negócio não pode ineficaz
relativamente e nulo).
Não parece, também, que estamos perante cumulação alternativa. Pode, talvez, resultar uma
cumulação subsidiária, apesar de o autor não se ter expressado bem. Nestes casos, o juiz pode
convidar as partes a aperfeiçoar o articulado (590, nº2, b), CPC).
18.03.2021
Caso nº3 – Pedido Alternativo e Defesa por exceção/Impugnação
Responda justificadamente:
(a) Porque identificou vários defeitos na moradia em que habita, X propôs ação contra a Y,
Lda. (empresa que havia construído a referida moradia), tendo pedido que a ré fosse
condenada a:
- Proceder à integral eliminação dos defeitos enunciados na PI, realizando, para o efeito,
todas as obras de reparação necessárias, incluindo a substituição dos materiais deteriorados
e desadequados;
- Caso se recuse a fazê-lo, ou não proceda em conformidade com a condenação, a pagar os
custos das obras de reparação para integral eliminação dos defeitos, a realizar por terceiros,
no valor total de € 120.00,00.
Na pendência da ação, agravaram-se as infiltrações em virtude da chuva, tendo X realizado
algumas obras urgentes na sua moradia, as quais custaram €20.000.
Consequentemente, 3 meses antes da audiência final, X apresentou requerimento no processo
em que desistiu do primeiro pedido e pediu a condenação da Y, Lda. a pagar-lhe, além dos
€120.000 já referidos na P.I., os €20.000 despendidos, entretanto.
Desde já, importa referir que estamos perante uma única ação, que comporta vários pedidos:
o pedido de condenação à integral eliminação dos defeitos e o pedido de condenação ao
pagamento dos custos das obras de reparação para a integral eliminação dos defeitos.
Neste caso, existe uma relação de subsidiariedade entre os pedidos, sendo que X formula um
pedido principal, explicitando que, caso o réu se recuse a fazê-lo ou não proceda em
conformidade com a condenação, deverá ser apreciado um segundo pedido, subsidiário.
Assim, numa cumulação subsidiária, prevista no artigo 554º, do CPC a apreciação de um
pedido subsidiário é condicionada pela decisão de improcedência quanto ao pedido principal.
É necessário que se encontrem preenchidos 2 requisitos:
o A compatibilidade processual, prevista no artigo 37º, nº1, do CPC, devendo verificar-
se competência absoluta do tribunal para apreciar ambos os pedidos e uma
compatibilidade entre as formas do processo.
o A conexão objetiva – apesar de aparentemente não ser necessária qualquer conexão
entre pedidos, o professor MTS chama à atenção para o facto de o artigo 297º, nº3
estabelecer que o valor da ação corresponde ao valor do pedido principal, pelo que
não se justifica que, numa ação cujo valor seja determinado pelo pedido principal, se
possa apreciar um pedido subsidiário totalmente diferente e autónomo do primeiro.
Assim, aplica-se o artigo 36º, nº1, sendo que está em causa a mesma causa de pedir –
celebração de um contrato de empreitada.
Assim, a cumulação subsidiária respeita todos os requisitos exigidos.
Importa, ainda, ter em conta que X apresentou requerimento no processo em que desistiu do
primeiro pedido e pediu a condenação da Y, Lda. a pagar-lhe, além dos €120.000 já referidos
na P.I., os €20.000 despendidos, entretanto.
Estamos perante uma modificação do objeto processual, mais especificamente do uma
modificação do pedido (e não da causa de pedir). Esta modificação é quantitativa, uma vez
que ocorre uma ampliação do pedido inicialmente formulado (são acrescentados 20.000€ aos
120.000€ inicialmente pedidos).
Sendo essa modificação consensual, nos termos do artigo 264º, o pedido pode ser ampliado
em qualquer momento da tramitação da ação.
Uma vez que o enunciado nada esclarece, presume-se que estamos perante uma alteração
unilateral, prevista no artigo 265º. Tendo em conta que, na pendência da ação, se agravaram
as infiltrações em virtude da chuva, tendo X realizado algumas obras urgentes na sua moradia,
a modificação do objeto decorre da superveniência de novos factos (588º, nº1 e 2), logo,
segundo o professor MTS, esta modificação não é sujeita ao regime do artigo 265º, CPC.
Resolução:
A questão fundamental prende-se com o facto deste pedido estar formulado de forma pouco
clara. Logo, o juiz tem o dever de eventualmente fazer uma de duas coisas: considerar a PI
ineptida, por inteligibilidade (casos extremos); convidar ao aperfeiçoamento.
Aqui, parece que estamos perante uma relação de alternatividade – é colocada à disposição
do réu duas alternativas. Esta alternatividade teria de decorrer da lei – 553º, CC. Aqui, parece
duvidoso concluir que existe uma alternatividade. Segundo o regime da empreitada, 1221º,
CC - parece haver primeiro direito à reparação/eliminação dos defeitos.
Este pedido parece que apenas poderia ser imposto numa ação executiva. Se o réu vier a ser
condenado, em ação executiva - 868º e ss, CPC – permite ao autor substituir o réu executado
no cumprimento da prestação por um terceiro a quem o réu depois terá de pagar; 828º CC –
ação em execução.
A alternatividade dissolve-se, pois houve desistência do primeiro pedido – o problema passa
a ser da modificação do objeto.
Quanto à supressão do primeiro pedido – 283º, nº1, CPC.
Modificação – ampliação do pedido, quantitativamente. A instância é uma relação jurídico-
processual que integra o tribunal, autor e réu. Podem ocorrer modificações subjetivas da
instância.
260º, CPC – estabilidade da instância. Mas pode haver alterações subjetivas e objetivas.
264º e 265º - modificações objetivas. Só em termos muito apertados se aceita este tipo de
alterações.
Não parece que tenha havido acordo das partes: 265º, nº2 – a alteração tem de corresponder
a um desenvolvimento do pedido anteriormente configurado. Há uma ampliação do dano do
mesmo facto ilícito culposo – danos decorrentes do incumprimento (este último é causa
adequada aos danos).
Consequência do pedido primitivo: pedido de prestação vincenda – durante a pendência da
ação, a ação vence-se, podendo o autor ampliar o pedido, pedindo, por exemplo, juros de
mora.
588º - articulado superveniente – como se distingue a aplicação do 588º e do 265º? Nos
termos do primeiro, os factos são supervenientes, sendo que o 265º não estabelece este
requisito. O artigo 588º permite uma alteração do objeto processual, o mesmo é efetivamente
alterado com a sua caracterização no articulado superveniente (esta permissão não é permitida
no artigo 265º).
Superveniência – é subjetiva quando a parte que alega o facto não o conhecia sem culpa no
momento em que tinha de alegar o facto; é objetiva quando o facto apenas ocorreu depois do
momento processual em que deveria ter sido alegado.
(b) X propôs ação contra Y pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe os 4.000 que lhe
havia emprestado, bem como os juros remuneratórios acordados, ao abrigo de contrato de
mútuo celebrado entre as partes no dia 01.01.2017. Na contestação, Y alegou a nulidade do
contrato, em virtude da inobservância da forma prescrita por lei. X deduziu réplica pedindo
que a alegação de Y não procedesse, porquanto configurava o exercício abusivo de um
direito. Quid iuris?
Na petição inicial, o autor formula o pedido (artigo 552º/1/e), CPC) e a causa de pedir (artigo
552º/1/d), CPC). No pedido, o autor formula 2 pretensões: uma material, na qual afirma o seu
interesse como juridicamente tutelado e uma processual, na qual solicita uma atuação judicial
determinada, requerendo ao tribunal providência processual adequada. Neste caso, o autor,
X, apresenta como pedido a condenação do réu ao pagamento de 4000 euros, bem como juros
remuneratórios acordados (10º, nº3, b), CPC), e como causa de pedir a celebração do contrato
de mútuo.
Quanto à alegação feita pelo réu na contestação, importa referir que o mesmo não tem o ónus
de provar que a forma legal não foi observada, ocorrendo nulidade, cabendo, sim, ao autor,
provar que as partes observaram esse requisito de validade.
Assim, a negação pelo réu do facto constitutivo alegado pelo autor (a emissão das declarações
negociais, e a forma por elas revestida) constitui uma impugnação, prevista no artigo 571º,
nº1 e 2. Nos termos do artigo 584º, não lugar à réplica.
Absolvição do réu da instância caso proceda?
Resolução:
Toda a exceção alegada contém um pedido implicitamente (não estaria aqui em causa uma
reconvenção – o réu, ainda, deduz um pedido cuja procedência é autónoma à do pedido do
professor).
O réu defende-se por impugnação quando nega o facto alegado pelo autor, ou alega factos
que sejam incompatíveis com os factos alegados pelo autor. Vale, ainda, como impugnação,
a que incide entre a causa de pedir e do pedido (os factos verificaram-se, mas desses não se
funda o pedido – o efeito jurídico não é aceite – falta de relação causal entre a causa de pedir
e o pedido.
Exceção perentória – o réu invoca factos novos. Atendendo à sua natureza substantiva, está
em causa direito material, não estando descritos no CPC.
Exceções impeditivas (impedem a génese do direito) – aqueles que consubstanciam a
nulidade do negócio jurídico (normalmente). E os factos que produzem a anulabilidade?
Depende se se produzem antes ou depois da formação do contrato (normalmente, está em
causa um efeito extintivo).
Exceções extintivas – todos os modos de cumprimento da obrigação + decurso do tempo
(caducidade, extinção)
Exceções modificativos – não impedem, nem extinguem a génese do direito. Ex.: a moratória
(aumento do prazo); exceção de não cumprimento
As exceções devem ser alegadas na contestação e devem ser especificadas. O autor responde
às exceções na audiência prévia. No despacho saneador, o juiz pode decidir logo as exceções
perentórias - 595º, nº1, b).
No caso prático: a nulidade do contrato, que advém da inobservância da forma legal, no rigor
das coisas, deve ser alegada por impugnação e não por exceção. A causa de pedir tem como
base, precisamente, a celebração de um contrato válido. Assim, quando o réu diz que as partes
inobservaram a forma exigida, apenas pede ao juiz para olhar para o contrato – não há um
facto novo, apenas é contrariado o facto já alegado pelo autor, na PI.
584º - não haveria lugar à réplica. Assim, a réplica seria expurgada.
Caso nº4 - Coligação
Responda justificadamente:
(a) Em março/2015, em Lisboa, a X, S.A. celebrou com o banco W, S.A. um contrato
SWAP, constituído por condições gerais e condições particulares. Em agosto/2016,
em Leiria, a Y, Lda. celebrou também um contrato SWAP com o banco W, S.A., cujas
condições gerais eram idênticas às aceites pela X, S.A., diferindo muito embora as
condições particulares. Tendo-se sentido ambas lesadas pela conduta pré-contratual
do banco, a X, S.A. e a Y, Lda. propuseram em coligação ação indemnizatória contra
o banco W, S.A. Deve esta coligação ser admitida?
Desde já, importa referir que estamos perante uma única ação, que comporta dois pedidos:
ambos pedidos de condenação ao pagamento de indemnização, tendo por base condições
gerais idênticas, mas condições particulares distintas. Assim, são apresentados vários objetos
processuais que se reportam a distintos efeitos jurídicos. Uma vez que existe uma pluralidade
de autores – X e Y– estamos perante uma situação de coligação simples, prevista no artigo
36º, do CPC, pois os pedidos que são cumulados são formulados individualmente por cada
autor, existindo uma diversidade de relações materialmente controvertidas.
É necessário que se encontrem preenchidos 3 requisitos:
o A compatibilidade processual, prevista no artigo 37º, nº1, do CPC;
o A compatibilidade substantiva – uma vez que a coligação é simples, a
compatibilidade refere-se à coadunação ou não contradição entre os efeitos
decorrentes dos vários pedidos cumulados (555º, nº1 e 186º, nº2, c), do CPC);
o A conexão objetiva – refere-se à existência de uma relação entre os vários pedidos
cumulados. Parece verificar-se, também, uma vez que, nos termos do artigo 36º, nº2,
2ª parte, está em causa a aplicação das mesmas normas jurídicas na apreciação da
fundamentação dos pedidos cumulados.
Resolução:
Coligação – temos desde logo uma cumulação de pedidos: não há qualquer incompatibilidade
de pedidos (555º, nº1). É admitida por motivos de economia processual.
Assim, é necessária uma conexão material/objetiva - artigo 36º, nº2, 2ª parte, está em causa a
aplicação das mesmas normas jurídicas na apreciação da fundamentação dos pedidos
cumulados.
Aqui, em princípio, a coligação seria inadmissível.
(b) A X, S.A. propôs ação contra Y, seu ex-administrador, e contra W, ex-cônjuge de Y, tendo
pedido:
- Seja o réu Y condenado a pagar à autora uma indemnização de €100.000 por danos
decorrentes dos atos de gestão alegados nos artigos 15.º a 70.º da petição inicial;
- Sejam declarados nulos, por simulação, o divórcio e a subsequente partilha de bens
efetuados por Y e W, sendo novamente integrados na comunhão os bens partilhados.
Diga se é admissível esta coligação e, não o sendo, em que termos deve o juiz decidir.
Desde já, importa referir que estamos perante uma única ação, que comporta dois pedidos:
um pedido de condenação ao pagamento de uma indemnização de 100.000€ e um pedido de
declaração de nulidade do divórcio, entre Y e W. Assim, são apresentados vários objetos
processuais que se reportam a distintos efeitos jurídicos. Uma vez que existe uma pluralidade
de réus – Y e W– estamos perante uma situação de coligação simples, prevista no artigo 36º,
do CPC, pois os pedidos que são cumulados são formulados individualmente contra cada réu,
existindo uma diversidade de relações materialmente controvertidas.
É necessário que se encontrem preenchidos 3 requisitos:
o A compatibilidade processual, prevista no artigo 37º, nº1, do CPC;
o A compatibilidade substantiva – uma vez que a coligação é simples, a
compatibilidade refere-se à coadunação ou não contradição entre os efeitos
decorrentes dos vários pedidos cumulados (555º, nº1 e 186º, nº2, c), do CPC);
o A conexão objetiva – refere-se à existência de uma relação entre os vários pedidos
cumulados.
Quanto a este último requisito, parece não se verificar, uma vez que não existe qualquer
conexão entre os diferentes pedidos, que justifique serem cumulados na mesma ação, não se
verificando qualquer uma das situações previstas no artigo 36º, CPC.
A falta deste pressuposto é sanável, nos termos do 38º, nº1: o juiz convida o autor a escolher
qual o pedido que pretende que subsista. No entanto, a não sanação da falta deste pressuposto
consubstancia uma exceção dilatório nominada – 577º, nº1, f), dando lugar à absolvição do
réu da instância – 278º, nº1, e).
Correção:
O artigo 38º, nº1 apenas é aplicável quando concluímos que nenhum obstáculo processual se
opõe à coligação.
Há muitas dúvidas de que se verifique algum tipo de conexão objetiva entre ações; não parece
haver, também, relação de prejudicialidade (o primeiro pedido, se procedente, atribui
legitimidade substantiva ao autor, pois passa a ser interessado na declaração de nulidade do
divórcio).
Há problemas quanto à compatibilidade processual: o tribunal não é competente para
conhecer os dois pedidos, logo, não pode conferir-se ao autor a faculdade de escolher qual
deles quer ver atendido no processo, pois isso seria transferir para o autor o poder de
configurar a competência do autor.
Próxima aula: Reconvenção e Prova
25.03.2021
Caso nº5 - Reconvenção
Responda justificadamente:
(a) X propôs ação contra Y pedindo a condenação deste a entregar-lhe €10.000, a título
de restituição de quantia mutuada. Na contestação, por exceção, Y invoca a
compensação de €8.000 da obrigação alegada por X com uma dívida de X a Y desse
valor. Pode X deduzir réplica?
No entendimento do professor Lebre de Freitas, a compensação, enquanto o contracrédito
não excede o crédito do autor, situa-se no âmbito do pedido por este formulado, isto é, a
invocação da compensação não extravasa o objeto do processo.
Assim, apesar do artigo 266º, nº2, c), do CPC determinar que a reconvenção é admissível
quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter compensação, seja
para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor, o professor
reconsidera que está em causa uma mera admissibilidade de reconvenção.
Deste modo, Y, através da contestação, defende-se através de uma exceção perentória (576º,
nº3, CPC), neste caso, extintiva: a verificação da compensação vem destruir as consequências
jurídicas que decorrem do preenchimento da previsão legal.
Nos termos do artigo 91º, nº1, CPC, verifica-se uma extensão de competência, uma vez que
o tribunal que é competente para conhecer da ação proposta pelo autor, é também competente
para conhecer da exceção deduzida pelo réu.
A alegação de uma exceção perentória permite que o autor tenha direito de resposta, nos
termos do artigo 3º, nº4, CPC. No entanto, o exercício do contraditório quanto a esta questão
não é exercido através da réplica, segundo o artigo 584º, CPC.
Apesar disso, no entendimento do professor Lebre de Freitas, em nome da economia
processual, o autor, se quiser responder às exceções deduzidas pelo réu na contestação, terá
de o fazer na réplica – se não o fizer, o direito de resposta preclude.
A procedência da exceção perentória leva à absolvição do pedido, nos termos do artigo 571º,
nº2, CPC.
Correção:
A reconvenção é um ato processual através do qual o réu introduz no processo um novo objeto
processual, em que alega uma causa de pedir, que poderá ser distinta, e deduz um pedido
contra o autor.
O réu é o reconvinte, e o autor o reconvindo. A admissibilidade da reconvenção é limitada,
por motivos de estabilidade da instância – 266º - delimita o âmbito da admissibilidade da
reconvenção. Está em causa o direito de ação do réu – incrementa a economia processual, no
sentido de otimização dos recursos da justiça (não necessariamente a celeridade). No mesmo
processo, resolvemos um número maior de questões, mas simultaneamente provocamos um
enorme atraso na tramitação.
Há limites, designadamente de caráter processual: 266º, nº3 – competência hierárquica,
internacional e material.
Requisitos de conexão objetiva – elencados no nº2, do artigo 266º. Não basta que o tribunal
seja competente absolutamente, e que a forma dos processos coincida – é necessária uma
especial conexão.
O artigo em causa foi revisto, particularmente a alínea c). Para alguns, a compensação teria
de entrar no processo, através da reconvenção, pois o réu pedia o cumprimento do crédito,
por parte do autor, introduzindo um novo objeto ao processo; para outros, apenas era
necessário quando o crédito a favor do réu excedia o crédito alegado pelo autor.
Com a revisão de 2013, parece que o legislador resolveu esta questão a favor da primeira tese.
O réu “pode” + “é admissível” – alguns autores vêm defender que cabe ao réu escolher aquilo
que mais lhe convém, não está em causa uma situação de obrigatoriedade de recorrer à
reconvenção.
A compensação é uma causa de extinção das obrigações: torna-se efetiva por mera declaração
– se essa compensação já foi invocada extrajudicialmente: facto que já ocorreu, por isso
invocar-se-ia através de exceção (para alguns).
Problema: Se defendermos que apenas através da reconvenção se pode invocar a
compensação. Em todos os casos em que o réu seja credor do autor, e por razões de natureza
processual, não seja admissível a reconvenção (por exemplo, se há um problema de
competência do tribunal) – estamos a impedir o réu de se defender através da compensação.
A reconvenção aumenta o valor da causa, contrariamente à exceção.
Se deduzir a compensação, por via da reconvenção – mesmo que o crédito do autor seja
considerado improcedente, o tribunal tem de apreciar a minha pretensão, nos termos do artigo
266º, nº6.
Resposta à reconvenção – 584º, se o réu escolher a reconvenção, o autor pode apresentar um
segundo articulado – réplica. Caso escolha a exceção, a resposta apenas terá lugar, nos termos
do artigo 3º, nº4.
O que se tem feito, ao abrigo do princípio da adequação formal, é que o juiz pede ao autor
para se pronunciar por escrito.
(b) X contratou com o Dr. Y, cirurgião plástico, a realização de uma lipoaspiração, na
sua clínica em Lisboa. Não tendo os resultados sido os prometidos e esperados, X
propôs ação contra Y, pedindo a sua condenação ao pagamento de €5.000, por danos
decorrentes do cumprimento defeituoso do contrato. Na contestação, Y impugnou os
factos alegados por X. Adicionalmente, deduziu reconvenção, tendo pedido a
condenação de X a pagar-lhe uma indemnização de €4.000. Fundou o pedido no facto
de X ter publicado artigo num jornal local, em Setúbal, no qual declarava que o Dr.
Y era um magarefe, e não um cirurgião plástico. Este pedido reconvencional é
admissível?
O articulado contestação serve, não só o propósito de defesa, mas também para o réu deduzir
pedidos contra o autor, em exercício facultativo do direito de ação e em ampliação do objeto
do processo. Denomina-se reconvenção o pedido deduzido pelo réu, contra o autor, prevista
no artigo 266º, CPC.
Y, através de pedido reconvencional, pretende a condenação da contraparte no pagamento de
uma indemnização de 4.000€ - indica como fundamento, o facto de a contraparte ter
publicado um artigo num jornal local, tendo sido ofendidos alguns dos seus direitos de
personalidade, como a honra e o bom nome e a imagem do (artigos 72º e 79º, CC).
A reconvenção consiste na formulação pelo réu de um pedido que é distinto do pedido normal
de defesa e cuja procedência é requerida contra o autor (artigo 266º, CPC). Justifica-se por
razões de economia processual – não existe qualquer ónus de formulação do pedido
reconvencional no processo pendente, mas dada a sua conexão com o objeto apresentado pelo
autor ou a defesa deduzida pelo réu, convém apreciar-se tudo na mesma ação.
(Trata-se de uma reconvenção facultativa, uma vez que não se trata de nenhuma das exceções
de obrigatoriedade, previstas nos artigos 1792º/2, CC e artigo 860º/3, CPC)
Uma vez que houve, ainda impugnação dos factos alegados por X (negação pelo réu do facto
constitutivo alegado pelo autor - a emissão das declarações negociais, e a forma por elas
revestida - artigo 571º, nº1 e 2), a reconvenção será deduzida separadamente.
Para a reconvenção ser admissível, terá de se verificar algum dos fatores de conexão com o
pedido do autor, indicados no artigo 266º, nº2, CPC, não podendo verificar-se nenhum dos
requisitos negativos de compatibilidade processual, a que se refere o artigo 266º, nº3.
Desde logo, parece haver um problema de conexão objetiva, pois não se verifica nenhuma
das circunstâncias elencadas no nº2, do artigo 266º. A falta de conexão objetiva constitui uma
exceção dilatória inominada, levando assim à absolvição do réu da instância reconvencional
no despacho saneador (artigos 576º/2 e 278º/1/e), CPC).
Correção:
O réu impugnou o crédito do autor, por isso talvez a compensação não fizesse muito sentido
(o professor já não abre problemas).
Ignorando a impugnação – a alínea c) fala de “reconhecimento de um crédito”,
independentemente da fonte desse crédito.
853º, nº1, a) – exclui a possibilidade de compensação.
Neste caso, atendendo à alínea c) – parece estar em causa uma reconvenção admissível.
PROVA
Aula Teórica – 22.03.2021
Há regras sobre a prova que se encontram no CC. Esta distribuição da regulamentação da
prova por dois códigos foi ponderada
Qual a natureza das regras da prova? Natureza ou substantiva?
A prova tem uma dimensão que extravasa o direito – implica um estudo interdisciplinar.
341º, CC – as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos.
O sujeito da frase sugere uma certa utilização da palavra prova que pode ser discutida quanto
à sua adequação: estamos a referir-nos aos meios de prova (através dos quais se faz a prova).
3 sentidos da palavra prova:
֍ Meios de prova
֍ Prova-atividade: conjunto de atos processuais que se praticam no processo, tendo
em vista a demonstração de uma determinada realidade/alegações feitas através dos
articulados.
֍ Prova-resultado: formação da convicção do julgador a respeito da veracidade de
uma determinada alegação de facto.
Todos estes sentidos são perspetivas diferentes do fenómeno probatório. Assim, todos estes
sentidos têm um papel a desempenhar neste probatório. Destina-se a convencer, a persuadir
alguém de algo – o juiz.
Objeto da prova:
o Ficamos com a sensação de que seriam os factos. Segundo o professor, o objeto da
prova não podem ser os factos, pois os factos não estão no processo, nem fazem parte
dele – estão em causa sim as alegações/proposições de facto.
O objeto da prova são, sobretudo, as alegações de facto – estas permitem ao leitor extrair uma
representação de um evento fáctico.
“Realidade dos factos” – entra aqui o tema da verdade. O direito trabalha com factos
hipotéticos, futuros, negativos. Ex.: causa virtual.
Função da prova no processo:
➢ Prof. Castro Mendes – a prova é o pressuposto da decisão jurisdicional que consiste
da formação da convicção de que, no espírito do julgador, certa alegação singular de
facto é justificavelmente aceitável, como fundamento da decisão.
O juiz não pode decidir, no que diz respeito à matéria de facto, sem se basear/fundamentar a
sua decisão na prova. A lei impõe esta solução – 205º, nº1, CRP. A sentença é uma decisão
hétero-direcionada – quem são os destinatários? As partes, e, ainda, os juízes de tribunais
superiores, que poderão ter de avaliar a decisão, e aquilo em que se funda.
607º, nº4, CPC – na sentença, o juiz terá de dizer quais os factos provados e os não provados.
Cria um dever de fundamentação extenso/denso, que se torna muito mais garantístico para as
partes e muito mais funcional, num sistema que permite o recurso para instâncias superiores.
Meios de prova utilizados na atividade probatória:
➢ Proposição da Prova – respeita ao modo e ao tempo em que a prova aparece no
processo. Em princípio, deve ser requerida pelas partes. Sem prejuízo disso, 411º,
CPC – princípio do inquisitório – o juiz tem o dever de mobilizar os meios necessários
para que se produza prova relativa a determinados factos. Importante saber os
momentos em que é permitida a proposição de prova.
➢ Admissibilidade da Prova – cabe ao julgador decidir qual a prova admitida.
➢ Produção da Prova – exteriorização da representação fáctica que o meio de prova
contém.

CONFISSÃO
352º - reconhecimento (declaração de ciência) que a parte faz quanto a um facto que lhe é
desfavorável e que favorece a parte contrária – o réu afirma um facto que é constitutivo do
direito do autor ou nega um facto que é modificativo, extintivo ou impeditivo; o autor nega
um facto que é constitutivo do seu direito ou confirma um facto que é modificativo, extintivo
ou impeditivo.
o Judicial – 355º, nº1 e 3 – é feita em juízo, durante o processo, em que há de ser
valorado.
o Extrajudicial – 355º, nº4 – pode estar contida num documento ou advir de um outro
processo.
Figuras afins:
• Admissão – 574º, nº2 – se o réu não impugna os factos alegados pelo autor,
consideram-se fixados por acordo (“quem cala, consente”).
• Declarações de parte – 456º - recolha de declarações da própria parte, perante o
julgador (o conteúdo/objeto das mesmas é livre).
A confissão judicial tem de ser requerida – normalmente a outra parte é que requer o
depoimento de parte, com o objetivo de lhe extrair a confissão. Requere-se o depoimento de
parte, identificando-se, desde logo, os temas sobre os quais recairá. Pode ainda ser requerido
pelo juiz.
456º, nº1 – normalmente, tem lugar na audiência final, sendo a primeira prova a ser produzida
(604º, nº3, a), CPC). A parte presta juramento – 459º. A parte é inquirida pelo juiz - 460º.
A confissão tem força probatória plena – 347º - naquele processo, o juiz terá de considerar
como provados os factos que foram objetos de confissão e só não o fará se demonstrar no
processo a falsidade desses factos (caso seja produzida prova em contrário).
PROVA TESTEMUNHAL
Relato de factos com interesse para a causa, que é realizado por uma pessoa que não pode
depor como parte.
552º, nº6. 572º, d) – as partes têm de requerer logo a prova testemunhal, podendo vir a alterar
o rol de testemunhas. 598º, nº2.
526º - o tribunal pode ordenar a inquirição de testemunhas.
Testemunha-perito: ocorre muitas vezes, por exemplo, em processos de negligência médica.
PROVA PERICIAL
Encontrar características/relações causais impõem conhecimentos especiais.
Caso nº6
Responda justificadamente:
(a) Numa ação de responsabilidade civil contratual, X, autor, alegou o incumprimento,
muito embora não tenha mobilizado qualquer meio de prova para demonstrar a
referida alegação. Na perspetiva de X, cabe ao réu provar que cumpriu. Tem razão?
Estamos perante um problema de distribuição do ónus da prova.
Nos termos do artigo 342º, nº1, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos
constitutivos do direito alegado, sendo que o seu nº 2 estabelece que a prova dos factos
impeditivos, modificativos ou extintivos incumbe à parte contra a qual é invocada uma
situação jurídica. Ou seja, não é a parte que nega os factos invocados pela contraparte que
está onerada com a prova de que esses factos não são verdadeiros, mas é sim a parte que os
alega que tem o ónus de provar que eles são verdadeiros.
Assim, cabe ao autor que alegou o incumprimento realizar a prova dos factos constitutivos
da situação jurídica (exceto quanto à culpa, uma vez que o artigo 799º, nº1 estabelece uma
presunção – quem beneficia de uma presunção legal, não tem de a provar – 350º, nº1 –
invertendo-se o ónus da prova).
Está em causa a prova de um facto negativo – o não-cumprimento – sendo que a prova do
mesmo pode ser muito difícil de realizar, dado que, se nalguns casos o que não sucedeu pode
deixar consequências visíveis, em muitas outras situações a omissão não desencadeia
quaisquer modificações percetíveis.
Ainda que haja esta dificuldade, não implica necessariamente uma exceção à distribuição do
ónus da prova imposta pelo artigo 342º, nº1, CC.
Correção:
Ónus de prova – a dúvida sobre a realidade de um facto resolve contra a parte a quem o facto
aproveita. O facto aproveita a quem está onerado com a prova - CC – 346º. Quem está
onerado? 342º.
413º - o juiz aproveita a prova, de onde quer que venha.
Não é propriamente um ónus – há vontade.
O incumprimento é um facto constitutivo ou um facto extintivo? Caso seja constitutivo, cabe
ao autor fazer a prova; se o cumprimento é um facto extintivo, então cabe ao réu fazer a prova.
O incumprimento é a ilicitude.
Logo, a presunção do artigo 799º apenas abrange a culpa, não se aplicando aqui. Cabe ao
autor provar o incumprimento.
E o que sucede quando a ação é de cumprimento – condenação a cumprir? O facto constitutivo
é o complexo fáctico que gera a obrigação: o incumprimento nunca integra a causa de pedir,
pois consubstancia-se, precisamente, num pedido.
(b) Em ação de impugnação pauliana, nas alegações finais, o advogado do réu (devedor)
observa que a ação terá de improceder, porquanto o autor não demonstrou que as vendas
realizadas pelo réu tivessem tornado praticamente incobrável o crédito alegado pelo
autor, sendo certo que este é um facto constitutivo do direito que pretende realizar na
ação. Tem razão?
O artigo 610º, do CC, que consagra a impugnação pauliana estabelece que os atos que
envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal
podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:
a) Ser o crédito anterior ao ato ou, sendo posterior, ter sido o ato realizado dolosamente com
o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do ato a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu
crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.
Estamos, assim, perante uma questão de distribuição do ónus da prova. Nos termos do artigo
342º, nº1, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito
alegado, sendo que o seu nº 2 estabelece que a prova dos factos impeditivos, modificativos
ou extintivos incumbe à parte contra a qual é invocada uma situação jurídica. (Ou seja, não é
a parte que nega os factos invocados pela contraparte que está onerada com a prova de que
esses factos não são verdadeiros, mas é sim a parte que os alega que tem o ónus de provar
que eles são verdadeiros).
Assim, cabe ao autor a alegação dos factos constitutivos previstos no artigo 610º, a).
Quanto à alínea b) – A impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu
crédito, ou agravamento dessa impossibilidade coincide com a observação pelo advogado do
réu, relativa ao facto de as vendas realizadas pelo réu terem tornado praticamente incobrável
o crédito alegado pelo autor. A prova deste facto consiste numa prova de facto negativo,
sendo que, apesar de poder ser muito difícil a sua realização, não implica necessariamente
uma exceção à distribuição do ónus da prova imposta pelo artigo 342º, nº1, CC.
Implica, no entanto, essa exceção a regra especial (344º), prevista no artigo 611º. Assim, a
observação do advogado é improcedente, pois não cabe ao autor fazer a prova deste facto
negativo, cabendo sim ao réu ou ao terceiro interessado na manutenção do ato fazer a prova
de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor (facto impeditivo – obstam
ao preenchimento de uma previsão legal e que, por isso, impedem uma certa consequência
jurídica).

15.04.2021
Caso nº7
Responda justificadamente:
(a) A X, Lda. propôs ação contra Y, imputando a este o incumprimento de um contrato
de empreitada. Na contestação, Y requereu o depoimento de parte de W, à data,
gerente da X, Lda. Na audiência final, que decorreu em fevereiro de 2020, W
apresentou-se para realizar o depoimento requerido. Disse, inter alia, que a X, Lda.
havia, como alegado na contestação, concedido uma moratória a Y para conclusão
dos trabalhos, mas sob condição de este prestar uma garantia bancária. Esta
garantia – prosseguiu W – nunca chegou, porém, a ser prestada. Posto isto:
(i) Supondo que a gerência da X, Lda. era plural e que a sociedade se vinculava
com a assinatura de dois gerentes, em que termos deve ser apreciado o
depoimento de W?
Numa primeira abordagem, nos termos do artigo 352º, do CC, o depoimento de W parece
consistir numa confissão, ocorrendo o reconhecimento da realidade de um facto (neste caso,
a concessão de uma moratória ao réu) desfavorável para si e favorável à parte contrária.
Uma vez que a confissão foi produzida em processo, em depoimento de parte, a requerimento
da parte contrária, estamos perante uma confissão judicial provocada – 355º, nº2 e 356º, nº2,
CC + 452º, nº2, CPC. Tal como ocorreu, o depoimento, em regra, deverá ser prestado na
audiência final, nos termos do artigo 456º, nº1, CPC.
A confissão não é admissível quando:
o Tiver por objeto um facto fisicamente impossível ou notoriamente inexistente – 354º,
c), CC.
o Havendo impossibilidade legal de o facto ser dado como provado – 354º, a), CC.
o Se recair sobre factos relativos a direito indisponíveis – 354º, b), CC.
Quanto a estes três parâmetros não parece haver qualquer inadmissibilidade.
Importa ainda ressalvar que, no caso, a declaração confessória é complexa, pois contém a
afirmação de factos desfavoráveis ao declarante (a concessão de uma moratória ao réu), mas
também factos que lhe são favoráveis (a concessão da mesma encontrava-se sob condição de
ser prestada uma garantia bancária, que nunca chegou a acontecer).
Assim, segundo o princípio da indivisibilidade, previsto no artigo 360º, CC, Y poderá optar
por 3 vias:
o Prescindir da confissão, passando esta a ter eficácia de meio de prova sujeito à livre
apreciação do julgador;
o Aceitar, caso em que a confissão ganha eficácia de prova plena, e por sua vez, a
declaração de aceitação funciona como uma segunda confissão em sentido inverso,
dos factos que lhe são desfavoráveis;
o Declarar que se quer aproveitar da confissão, mas se reserva o direito de provar a
inexatidão dos factos ou circunstâncias que lhe são desfavoráveis (a realidade destes
factos só ficará definitivamente estabelecida se não for feita a prova em contrário).
De modo que a confissão tenha força probatória plena, é ainda necessário que se verifiquem
os requisitos previstos no artigo 353º.
Segundo o artigo 260º, nº4, CSC, respeitante às sociedades por quotas, os gerentes vinculam
a sociedade, em atos escritos, apondo a sua assinatura com indicação dessa qualidade, sendo
que o artigo 261º, nº1 vem acrescentar que quando haja vários gerentes e salvo cláusula do
contrato de sociedade que disponha de modo diverso, os respetivos poderes são exercidos
conjuntamente.
Assim, nos termos do artigo 33º, nº1, do CPC, estamos perante uma situação de litisconsórcio
necessário. Deste modo, não se encontra verificado o requisito previsto no artigo 353º, nº2,
CC – a confissão feita não é eficaz.
Quando não é feita com os requisitos exigidos para que tenha eficácia probatória plena, como
é o caso, a declaração de reconhecimento de factos desfavoráveis pode constituir meio de
prova sujeito à livre apreciação do julgador, nos termos do artigo 361º, CC.
Assim, a sua eficácia probatória exige que o juiz o confronte com todos os outros elementos
de prova produzidos sobre o facto confessado, para que tire a conclusão sobre se este se
verificou ou não.
Resolução: o depoimento é prestado pelo seu representante e apenas tem valor de confissão
desde for feita por pessoa que possa vincular a sociedade.
413º, CPC - o tribunal deve tomar em consideração todas as provas atendíveis. Dentro do
processo, não se desperdiçam provas.
461º - o tribunal pode apreciar livremente esse depoimento (não está obrigado a atribuir
força probatória plena deste depoimento).
(ii) Admita que, em dezembro de 2019, W havia renunciado ao cargo de gerente
da X, Lda. Deve o depoimento de W ser admitido?
Nos termos do artigo 392º, CC, a prova testemunhal é admissível em todos os casos, exceto
quando é direta ou indiretamente afastada. Dispõe o artigo 496º do CPC que “estão impedidos
de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes”. Ora, o depoimento
de parte é um meio de prova que se destina a provocar uma confissão judicial, que, nos termos
do artigo 352º, CC, consiste no reconhecimento da realidade de um facto para si e favorável
à parte contrária.
Quando uma das partes é uma pessoa coletiva, como é o caso da Sociedade X, Lda., há que
apurar, face à lei substantiva quem são os seus representantes legais, uma vez que quando a
Sociedade é parte numa causa, estes não podem intervir como testemunhas, mas, tão-só, como
partes, pois só eles têm o poder de reconhecer factos cujas consequências jurídicas são
prejudiciais à sociedade.
Assim, porque à data do depoimento, W já não era gerente da Sociedade, não sofria de
qualquer impedimento legal para poder depor como testemunha, isto é, como um terceiro em
face da relação jurídica processual, ainda que não o seja perante a relação jurídica material
ou os interesses que no processo se discutem (estão assim excluídas as partes). À partida,
também não se verifica qualquer dos impedimentos previstos no artigo 495º, CPC.
Logo, o seu depoimento deve produzir todos os efeitos que lhe são próprios, ficando sujeito
ao princípio da livre apreciação de prova, nos termos do artigo 396º, CC.
Quantos às ligações pessoais da referida testemunha aos atuais sócios/gerentes da autora: não
é causa de impedimento da sua audição como testemunha, são antes circunstâncias a serem
devidamente tidas em consideração ao nível da apreciação da razão de ciência da testemunha.
Não podem as suas declarações valer como depoimento de parte. O advogado da parte que
pediu o depoimento, deve sugerir ao juiz (que tem poderes inquisitórios) que chame o ex-
gerente a ser ouvido enquanto testemunha.
Quem identifica quem vai prestar o depoimento? O destinatário do requerimento do
depoimento é a sociedade, cabendo-lhe a ela selecionar quem a irá representar.
(b) X propôs ação contra Y. Após a distribuição, mas antes de expedida a citação, o
advogado de X apercebeu-se de que, por lapso, não havia integrado na Petição
Inicial o rol de testemunhas que X lhe apresentara e cujo depoimento se afigura
fundamental para a procedência da ação. O que pode o advogado de X fazer para
remediar este lapso?
A iniciativa da prova testemunhal é correntemente tida como devendo ser das partes,
constituindo uma zona remanescente do princípio do dispositivo, no âmbito da instrução do
processo.
Assim, a proposição da prova testemunhal cabe às partes, sendo que, nos termos do artigo
552º, nº6, CPC, no final da petição inicial, o autor deve apresentar o rol de testemunhas, ainda
que possa vir a aditá-lo ou alterá-lo (598º, nº2, CPC), tendo possibilidade de desistência da
inquirição da testemunha (498º, nº2, CPC) e possibilidade de substituição das mesmas (508º,
nº3). Deste modo, o rol de testemunhas não poderá ser apresentado em momento posterior.
Para remediar este lapso, o advogado de X pode, no decurso da ação procurar demonstrar e
convencer o juiz que essas pessoas, que pretendia integrar no rol de testemunhas, têm
conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa. Perante esta situação, o juiz
deverá ordenar que tais pessoas, não oferecidas como testemunhas, sejam notificadas para
depor, nos termos do artigo 526º, CPC.
Resolução: Nos termos do artigo 598º, nº3 – as testemunhas são notificadas para comparecer
pelo tribunal – é o tribunal que vai enviar uma carta registada para que as testemunhas
compareçam (para as situações de testemunha hostis). Portanto, é importante ter presente
que esta faculdade de alterar o rol tem esta desvantagem (funciona sobretudo para
testemunhas que a parte tem controlo).
A redação do Código é muito inconclusiva, mexendo com a essência do direito à prova.
Antes de 2013: na PI, as partes juntavam apenas os documentos (423º, nº1). As partes apenas
requeriam as restantes provas no momento da audiência preliminar/prévia.
Depois de 2013 - 552º, nº6: por vezes, o autor ou réu, por lapso, ou por interpretarem
diferentemente a lei, não adicionam o rol de testemunhas.
572º, d) – caso haja réplica
Se o requerimento probatório pode ser alterado, será que podem as partes adicionar o rol?
Esta não é claramente a intenção do legislador. Só podem alterar as provas que tenham sido
requeridas nos articulados iniciais.
Princípio da boa-fé processual: a força da nossa posição processual é pelo menos
determinada pelas provas de que dispomos. A solução justa é que pelo menos ao autor seja
concedida a faculdade de alterar como bem entender do requerimento probatório, pois é
nessa ocasião que o autor tem conhecimento da estratégia processual do réu. Logo, na PI, o
autor requere prova às escuras. (dar essa possibilidade ao réu já parece ser mais duvidoso).
Caso nº8
Responda justificadamente:
(a) Em março/2017, X e Y outorgaram escritura pública de contrato de compra e venda
de um imóvel. Antes da escritura, Y havia solicitado a X que lhe permitisse pagar
parte do preço (€25.000) apenas no final de maio/2017. Como eram bons amigos, X
acedeu. Na escritura, X declarou que já havia recebido a totalidade do preço. Fê-lo,
em bom rigor, para não complicar o ato notarial e porque confiava bastante em Y.
Este, todavia, não chegou a pagar o remanescente do preço. Agora, X pretende
propor ação contra Y, para pedir ao tribunal que o condene a pagar €25.000 e
respetivos juros moratórios. Para fazer prova, pretende valer-se do depoimento de
W, que assistiu à conversa em que Y pediu a X para pagar o remanescente do preço
apenas em maio/2017, bem como do depoimento de Z, a quem Y terá relatado esta
conversa. Deverá o juiz, e em que termos, valorar a prova testemunhal de que X se
pretende servir?
A testemunha consiste num terceiro em face da relação jurídica processual, ainda que não
perante a relação jurídica material ou interesses que no processo se discutem. À partida não
está em causa qualquer problema de capacidade, logo, tanto W, como Z podem depor como
testemunhas. No entanto, importa ter em conta que há factos sobre os quais não é admissível
depoimento testemunhal.
Quanto à existência de uma escritura pública, importa referir que a mesma consiste num
documento escrito autêntico, pois provém de oficial público provido de fé pública, nos termos
dos artigos 362º e 363º, nº1 e 2, CC. A força probatória plena do documento autêntico,
prevista no artigo 371º, CC, pode ser ilidida mediante a arguição e a prova de falsidade (372º,
CC). Aqui, estaríamos perante uma falsidade ideológica, e não material, uma vez que está
em causa o conteúdo da declaração do documentador, traduzindo uma falsa atestação,
contemporânea da formação do documento – foi estabelecida uma convenção segundo a qual
Y apenas pagaria parte do preço no final de maio, contrariando o que veio a ser declarado na
escritura, segundo a qual X já havia recebido a totalidade do preço.
Neste caso, a escritura pública é exigida por lei, uma vez que estava em causa a compra e
venda de um bem imóvel, devendo cumprir-se o requisito de forma previsto no artigo 875º,
CC.
Assim, nos termos do artigo 394º, nº1, CC, não é admissível a prova por testemunhas de
convenções que sejam contrárias ao conteúdo deste documento, que seria o caso. No entanto,
segundo o professor Lebre de Freitas, nada impede o recurso à prova testemunhal para a ilisão
da genuinidade do documento. Logo, segundo o artigo 396º, CC, a força probatória dos
depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal.
(Depoimento de Z: possível confissão extrajudicial, trazida ao processo mediante inquirição
de testemunhas, chamadas a provar a declaração do confitente, que, por sua vez, prova o facto
confessado.)
Resolução: Admissibilidade da prova testemunhal.
364º, nº1 – o documento autêntico faz prova plena.
393º e 394º
Quando X declara que recebeu o preço, está a referir um facto e não uma vontade: faz uma
declaração de ciência.
358º, nº2 – estamos perante uma confissão extrajudicial.
É admissível a prova testemunhal? Neste caso parece não estar em causa uma convenção,
não havendo a restrição do 394º, nº1.
Para o professor, a declaração deve valer como confissão – deve-se fazer uma interpretação
restritiva (não estou a tentar provar um facto que se encontra plenamente provado, mas antes
a demonstrar os vícios da vontade que inquinam a confissão).
(b) Numa ação de responsabilidade civil por ato médico, X, autor, requereu ao tribunal
que solicitasse à Y, S.A., proprietária de uma clínica de imagiologia, o relatório dos
exames aí realizados por X.
A Y, S.A. recusou juntar esses documentos aos autos.
A requerimento do autor, X, o tribunal ordenou à Y, S.A. para juntar ao processo documentos
com interesse para a decisão da causa que estavam em seu poder – neste caso, o relatório dos
exames realizados por X.
(i) Supondo que a Y, S.A. não era parte na ação, é esta recusa lícita e, não o
sendo, quais são as suas consequências?
Ainda que a Y, S.A. seja apenas terceiro, a recusa dá lugar a multa, nos termos dos artigos
417º, nº2, 430º e 437º, CPC, havendo, ainda, possibilidade de usar de meios coercitivos e da
apreensão do documento (433º, CPC).
(ii) A circunstância de a Y, S.A. ser ré na ação alteraria, em que termos, a
resposta precedente?
Sendo parte na ação, a recusa da Y, S.A., para além de todas as consequências anteriormente
referidas, dá lugar à cominação da livre apreciação da recusa ou omissão injustificada para
efeitos probatórios e, ainda, da inversão do ónus da prova, nos termos dos artigos 417º, nº2,
CPC e 344º, nº2, CC.
Resolução:
Não há recusa legítima, pois não está em causa dever de sigilo/segredo (médico). Os dados
clínicos são dados sociais, mega sensíveis. Aqui, quem pede a informação é o titular dos
dados. Assim, a recusa na cooperação é injustificada.
Artigo 7º, CPC – cooperação das partes
432º - o requerimento é dirigido ao tribunal.
417º, nº1 – o dever de cooperar com a realização da justiça cabe a todos.
2 formas de o juiz tirar efeitos probatórios desta recusa: pode apreciá-la livremente (extrair
da mesma a conclusão de que o documento pode provar o facto que o requerer queria
provar); inverter o ónus da prova.

PROVIDÊNCIAS CAUTELARES
Caso nº9
22.04.2021
Responda justificadamente:
(a) Comente, no que respeita ao problema da medida da prova, a seguinte decisão: RG
19.09.2019 (Proc. n.º 3018/18.3T8BRG.G1 | Margarida Sousa).
Num processo se pretende apenas alcançar “verdades relativas, contextuais, aproximadas”:
apesar de ser necessário que a decisão se funde na melhor aproximação possível à realidade
empírica dos factos, é inevitável que se trate em todo o caso de uma aproximação “relativa”,
sendo que o standard de prova (regra de decisão que indica o nível mínimo de corroboração
de uma hipótese para que esta possa considerar-se provada, ou seja, possa ser aceite como
verdadeira) no processo civil é o da probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”.
Entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela
que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais; Deve preferir-se
aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais
provável que seja verdadeira do que seja falsa.
Não pode, porém, descurar-se a hipótese de acontecer que “todas as versões dos factos tenham
um nível baixo de apoio probatório e, nesse contexto, escolher a relativamente mais provável
pode não ser suficiente para considerar essa versão como “verdadeira”.
E, sendo certo que “estas situações de incerteza não permitem que se determine a verdade ou
a falsidade do enunciado de facto x”, não se pode deixar de concluir que perante um tal estado
de incerteza “a decisão só pode ser adotada mediante a aplicação da regra do ónus da prova
objetivo”.
“Assim, se após a valoração da prova, o juiz entender que há factos que permanecem
duvidosos e incertos (ocorre uma deficiência probatória), terá de recorrer ao ónus da prova,
valorando a prova contra a parte a quem incumbia o respetivo ónus da prova, respondendo
não provado ao artigo factual correspondente. Por isso é que as regras do ónus da prova são
subsidiárias no sentido de que apenas operam, se necessário, posteriormente à valoração da
prova.
Sumário:
I – O standard de prova (regra de decisão que indica o nível mínimo de corroboração de uma
hipótese para que esta possa considerar-se provada, ou seja, possa ser aceite como verdadeira)
no processo civil é o da probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”;
II – Quando todas as versões dos factos tenham um nível baixo de apoio probatório, escolher
a relativamente mais provável pode não ser suficiente para considerar essa versão como
“verdadeira”;
III – Quando assim sucede, não pode deixar de se concluir que perante o estado de incerteza
daí decorrente a decisão só pode ser adotada mediante a aplicação da regra do ónus da prova
objetivo;
IV – Quando o demandante invoca como causa de pedir da sua pretensão um mútuo ou
empréstimo, sobre ele recai não só o ónus da prova da entrega da quantia reclamada como
ainda o da assunção pelo demandado da obrigação de restituição;
V – Nesse caso, apresentando-se, quer a versão do demandante, quer a do demandado, com
um nível baixo de apoio probatório, aplicando o referido ónus da prova, impõe-se considerar
não provado que a entrega do dinheiro tenha ocorrido no âmbito do alegado empréstimo.
Resolução:
O que é a medida da prova? É uma figura crucial.
A medida da prova é a convicção que o julgador tem de obter sobre a verificação/veracidade
de uma alegação de facto para considerá-la provada, e utilizá-la como fundamento da
decisão judicativa.
As regras do ónus de prova intervêm como fundamento da decisão quando não se atingiu a
medida de convicção necessária para dar um facto como provado ou não provado.
Medida de prova = medida de convicção
Esta bitola definida logo no primeiro parágrafo do sumário é aceitável no nosso
ordenamento jurídico?
Nos sistemas de common law, costuma dizer-se que há, três graus de convicção do julgador:
1. O que se aplica no processo civil (50%): standard de prova “more probably than
not” (probabilidade prevalecente).
2. Clear and convincing evidence (75%) – grau mais exigente, reporta a relações cíveis,
mas que respeitam a direitos parentais ou de personalidade.
3. Proof beyond reasonable doubt – próximo de uma certeza absoluta.
É uma tese em franca crise nos países de onde é originária.
Em Portugal:
o Prova total (stricto sensu) – o juiz apenas pode considerar um facto provado quando
a sua convicção for incompatível com a possibilidade de a realidade ser diferente
daquela que é considerada);
o Mera Justificação – é admitido nos casos em que a lei permite.
Esta tese do standard de prova é muito criticável no nosso sistema, pois a lei indica
precisamente em sentido contrário. Artigo 368º, nº1 – fala de probabilidade séria (é
seguramente algo mais do que 50%), é já uma convicção seriamente formada - contradição
valorativa clara.
346º, CC – “destinada a tornar os factos duvidosos” – se o conseguir, a questão é decidida
contra a parte onerada com prova.
Assim, a tese do standard de prova não tem cabimento.
(b) X, Y, Z, W e S, únicos sócios da sociedade T, Lda. reuniram, no dia 20.03.2019, em
AG não convocada. Durante a AG, X propôs que se deliberasse sobre a venda de um
imóvel da sociedade; W e S opuseram-se. Com os votos favoráveis de X, Y e Z, a AG
deliberou vender o imóvel. No dia 01.04.2019, W e S requereram providência
cautelar não especificada, em que pediam que fosse preventivamente anulada a
deliberação de venda do imóvel. Arrolaram como testemunhas os gerentes da
sociedade (U e V), que haviam estado presentes na AG. Na sentença, o juiz declarou
a suspensão da execução da deliberação, tendo escrito: "Decorre dos depoimentos
de U e de V a probabilidade séria de que a deliberação foi tomada nos termos
alegados por W e S, sendo, pois, desnecessário apreciar qualquer outro meio de
prova sobre este aspeto.". Quid iuris?
O artigo 362º, nº1, CPC, referente às providências cautelares não especificadas, que, à partida
seria o caso, determina que sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause
lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória
ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.
De modo a estarmos perante uma providência cautelar, é necessário o preenchimento de 3
requisitos:
- Perigo na mora: a necessidade de composição provisória decorre do prejuízo que a demora
na decisão da causa e na composição definitiva provocaria na parte cuja situação jurídica
merece ser acautelada ou tutelada (362º, nº1) – a espera necessária para que haja composição
definitiva do litígio pode levar a que essa composição seja ineficaz/inconsequente.
- Aparência do direito: as providências cautelares exigem apenas prova sumária do direito
ameaçado, ou seja, a demonstração da probabilidade séria da existência do direito alegado
(365º, nº1, 368º, nº1, 388º, nº2, 392º, nº2 e 405º, nº1, CPC), bem como do receio da lesão
(362º, nº2, 365º, nº1, 368º, nº1, 391º, nº1, 392º, nº1, 403º, nº1 e 405º, nº1).
As providências apenas requerem, quanto ao grau de prova, uma mera justificação, isto é,
exige-se apenas a prova de que a situação jurídica alegada é provável ou verosímil – 368º,
nº1, CPC.
Logo, na sentença, o juiz ao declarar que decorre dos depoimentos de U e de V a
probabilidade séria de que a deliberação foi tomada nos termos alegados por W e S, sendo,
pois, desnecessário apreciar qualquer outro meio de prova sobre este aspeto, significa
precisamente que tais depoimentos se demonstraram suficientes para ser provada a
probabilidade da situação alegada.
- Proporcionalidade: os benefícios para o requerente não podem ser excessivamente maiores
do que os prejuízos para o réu – 368º, nº2, CPC.
Ainda que W e S tenham requerido providência cautelar não especificada, importa ter em
conta o artigo 362º, nº3, segundo o qual não são aplicáveis as providências referidas no nº1
quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das
providências tipificadas no capítulo seguinte.
O artigo 380º, nº1, CPC prevê, precisamente, a suspensão de deliberações sociais, que seria
o caso. Nos termos deste, se alguma sociedade tomar, em assembleia geral, deliberações
contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10
dias (cumpriu-se?), que a execução dessas deliberações seja suspensa, desde que, além de
provar a sua qualidade de sócio, mostre que essa execução pode causar dano apreciável.
Esta providência cautelar permite antecipar determinados efeitos jurídicos resultantes da
sentença declarativa de nulidade ou de anulação da deliberação social ao impedir a execução
da deliberação inválida e a consequente produção de efeitos negativos na esfera jurídica do
requerente da providência cautelar ou da própria associação ou sociedade em causa.
Uma vez que a Assembleia não foi convocada, aplica-se o artigo?
+ Possível prova ilícita:
A prova testemunhal é admissível em todos os casos em que não seja direta ou indiretamente
afastada - artigo 392.º. Neste caso existe uma proibição legal: os representantes legais de uma
PC não podem intervir como testemunhas. Vejamos: os gerentes U e V apenas poderiam ser
admitidos a depor como testemunhas se já não o fossem à data do depoimento uma vez que
nos termos do artigo 496.º estão impedidas de depor como testemunhas os que na causa
possam depor como partes. Sendo U e V administradores da sociedade eles poderiam vir a
ser chamados a depor como parte em representação da sociedade - artigo 453.º/2 e 452.º
Correção:
54º, nº1, CSC – qual a função da convocatória nas assembleias gerais? São 2 – dar a
conhecer ao sócio de que se vai realizar uma AG + informar o sócio sobre os assuntos que
serão tratados nessa AG.
56º, nº1, a) – o vício que afeta as deliberações é a nulidade.
58º, nº1, a) – anulabilidade, quando há falta de concordância quanto à discussão.
Se alego que a deliberação é anulável, já estou na providência; se alego que é inexistente.
246º, c), CSC.

Caso nº10
Responda justificadamente:
(a) X requereu providência cautelar contra a Y, S.A., proprietária de diversas revistas,
em que pediu ao Tribunal que: (i) ordenasse a esta sociedade que se abstivesse de
publicar determinado artigo sobre o divórcio de X; (ii) a Y, S.A. não fosse ouvida
antes de decretada a providência cautelar; (iii) o contencioso fosse invertido. O
Tribunal acedeu a todos os pedidos. Suponha-se na posição de advogado da Y, S.A.
e explique de que modo pode reagir.
Quanto à providência:
Frequentemente vemos os direitos de personalidade ameaçados ou mesmo postos em causa.
Para fazer face a estas situações o artigo 70º/2, CC prevê a possibilidade de o indivíduo
requerer as providências que se mostrem adequadas às circunstâncias do caso e que tenham
por objetivo evitar a consumação ou, nos casos em que a ofensa já se mostre concretizada,
atenuar os efeitos da mesma. O processo especial de tutela da personalidade revela-se o meio
idóneo para requerer as providências adequadas a evitar a consumação de ameaça ou atenuar
os efeitos de ofensa já cometida aos direitos de personalidade (artigo 878º e ss).
Neste caso estariam em causa dados da vida privada.
Providência inominada.
Quanto a Y, S.A. não ser ouvida:
De acordo com o artigo 366º/1 o tribunal deve ouvir o requerido, exceto quando a audiência
puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência. A regra é, portanto, a de que o tribunal
deve ouvir o requerido, pelo que só após o exercício do contraditório é que a providência será
decretada ou recusada.
O contraditório prévio permite sempre decidir com maior segurança, mas em determinadas
providências cautelares, a audiência prévia representa a condenação da providência ao
insucesso. Assim, sem prejuízo das situações em que é a própria lei que impõe o decretamento
da providência sem o contraditório do requerido, se o tribunal entender que a audiência prévia
pode colocar em causa o efeito útil da providência ou a finalidade que com ela se pretende
alcançar, a providência pode ser decretada sem o contraditório do requerido (artigo 366º/1,
2ªparte e artigo 3º/2). Trata-se de uma exceção ao princípio do contraditório.
Quando a audiência prévia do requerido ponha em risco o efeito prático que, concretamente,
se pretende atingir, ou seja, quando o conhecimento antecipado da providência cautelar
permita ao requerido agir de forma a inutilizar o interesse ou a eficácia da providência
cautelar. Neste caso, a exigência de perigo tem que ser séria, assim como o aumento do perigo
de lesão deve ser objetivo e substancial (artigo 366º/1, 2ª parte). A decisão de o juiz ouvir ou
não o requerido não é proferida discricionariamente. Os conceitos indeterminados de “risco
sério” e “fim ou eficácia da providência” (artigo 366º/1) hão de ser por ele preenchidos
segundo critérios de razoabilidade. A decisão que proferir, fundamentada nos termos gerais
é passível de recurso imediato de apelação, quando o juiz indefira o requerimento de não
audição do requerido, por ser absolutamente inútil a sua impugnação com o recurso da decisão
final, pela mesma razão tenho a apelação efeito suspensivo.
O recorrido que não tenha sido previamente ouvido pode, em alternativa, após a sua
notificação da decisão que haja decretado a providência (artigo 366º/6 → artigo 372º/1):
Recorrer, nos termos gerais da decisão; deduzir oposição, que inicialmente não lhe foi
facultada.
Não é necessária a iniciativa da parte. 3º, nº1, CPC – o juiz não pode tomar uma decisão
sem que isso lhe seja pedido, não tendo sido dada oportunidade à contraparte de se
pronunciar.
2 casos em que é permitido:
- Quando o simples conhecimento da providência cautelar pelo requerido permitir-lhe-á
impedir a eficácia dessa providência.
- O tempo necessário para exercer o contraditório invalidaria a eficácia da providência
cautelar.
Quanto à inversão do contencioso:
Em nome da economia processual, o artigo 369º instituiu na tutela cautelar o regime da
inversão do contencioso, permitindo-se, em determinados casos, que a providência cautelar
proceda à composição definitiva do litígio. O requerente fica, assim, dispensado de intentar a
ação principal de que a providência cautelar depende, transferindo-se para o requerido o ónus
de demonstrar, “em ação por ele proposta a impulsionada, que a decisão cautelar não devia
ter, afinal, essa vocação de definitividade. Não havendo qualquer reação do requerido em
relação à composição do litígio, tal composição consolida-se, ou seja, o litígio fica resolvido
de forma definitiva, em virtude da inação do próprio requerido.
Dispõe o artigo 369º/1 que “mediante requerimento, o juiz, na decisão que decrete
providência, pode dispensar o requerente do ónus de propositura da ação principal se a
matéria adquirida no procedimento lhe permitir formar convicção segura acerca da existência
do direito acautelado e se a natureza da providência decretada for adequada a realizar a
composição definitiva do litigio”.
Uma vez transitada em julgado a decisão que tenha decretado a providência cautelar e
invertido o contencioso, o requerido é notificado, com a advertência de que, querendo, deve
intentar a ação destinada a impugnar a existência do direito acautelado nos 30 dias
subsequentes à notificação, sob pena de a providência se consolidar como composição
definitiva do litígio (artigo 371º/1). Esta ação assumirá, tendencialmente, a veste de uma ação
de simples apreciação negativa, já que o requerido solicita a declaração da inexistência do
direito acautelado com base na inexistência dos factos que levaram o juiz do procedimento
cautelar a inverter o contencioso.
Tem de ser obrigatoriamente requerida.
Figura introduzida em 2013 – a razão dessa introdução é economia processual.
2 requisitos para a inversão do contencioso:
o Tenha sido requerido;
o Que o pedido que conste da providência cautelar seja coincidente com o pedido da
ação principal;
o Que o julgador se convença com prova stricto sensu;
Cabe agora ao requerido propor a ação.
Quando o requerido propõe a ação principal, cabe-lhe a ele provar que o requerente (agora
réu), não é titular do direito/situação jurídica que alega).
(b) X propôs ação contra a Y, Lda., na qual pediu a condenação desta a pagar-lhe
€350.000. De seguida, requereu providência cautelar de arresto das contas
bancárias da Y, Lda., tendo fundado a sua pretensão no seguinte argumento: "A Y,
Lda. não é proprietária de qualquer bem imóvel, sabendo o Requerente que é apenas
proprietária de dois automóveis cujo valor não excede os €30.000. Tratando-se de
uma sociedade comercial, a Y, Lda. tem ao seu dispor vários mecanismos,
inclusivamente legais, para exaurir o saldo das respetivas contas bancárias. Assim
sendo, mesmo que o Requerente obtenha vencimento na ação que corre termos no
Juízo Central Cível de Lisboa, Processo n.º 298/9T8 LSB, dificilmente conseguirá
cobrar o seu crédito". Na sentença, o juiz indeferiu a providência requerida com o
fundamento de que o Requerente não havia demonstrado suficientemente o
justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito. Quid iuris?
O arresto consiste numa providência cautelar conservatória especificada, a qual consiste na
apreensão judicial de bens do devedor, tendo em vista a garantia de um direito de crédito
(artigo 619º/1, CC). Com efeito, estabelece o artigo 391º/1 que o credor que tenha justificado
receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto dos bens do
devedor ou dos bens adquiridos por terceiro ao devedor, consistindo essa providência numa
apreensão judicial de bens cujo valor será suficiente para assegurar a situação patrimonial do
crédito invocado, à qual são aplicadas as disposições relativas à penhora (artigo 391º/2).
Deste modo, a providência cautelar de arresto visa assegurar o efeito útil da respetiva ação já
pendente contra o alegado devedor, porquanto, em caso de procedência dessa ação, fica
garantida a execução do seu património.
Para que o arresto possa ser decretado é necessário o preenchimento de dois requisitos:

• A probabilidade séria de existência do direito de crédito de que o requerente se arroga titular


(fumus boni iuris) – artigo 392º/1, 1ª parte;

• Existir um receio, devidamente justificado e fundado, de o credor poder vir a perder a


garantia patrimonial do seu crédito (periculum in mora);
Na sentença, foi posto em causa este segundo requisito.
O periculum in mora consubstancia-se no perigo de serem praticados atos de ocultação,
disposição, alienação ou oneração do património do devedor, não sendo necessário provar
que essa conduta é dolosa ou fraudulenta.
Torna-se necessário que o credor arrestante alegue factos concretos e objetivos dos quais
resulte o receio ou a forte probabilidade de perder a garantia patrimonial do seu crédito e/ou
que, pelas regras da experiência comum ou pelo critério do bom pai de família, imponham o
deferimento imediato da providência, sob pena de total ineficácia da ação judicial correlativa.
Não basta, portanto, para dar este requisito como verificado, uma mera verosimilhança a um
eventual perigo de dissipação de património pelo devedor. Inclusive, deve o julgador concluir
pelo não preenchimento deste requisito nos casos em que esse receio seja alicerçado em meras
conjeturas, suspeições ou juízos de valor sem concretização factual.
Assim, tal como decidiu o juiz, o arresto será injustificado, se, como é o caso o devedor nunca
pretendeu alienar, dissipar ou ocultar bens, nem está em risco de insolvência e se o credor se
limita a alegar que o devedor atravessa dificuldades económicas.
Como se demonstra o justo receio de perda de garantia?
- Não podem estar em causa meras especulações.
Nomeadamente em casos de sociedades comerciais, há sempre imensas dificuldades em ter
informação de conteúdo da esfera patrimonial.
Não basta a alegação de considerações genéricas e abstratas.
29.04.2021
SENTENÇA
Caso nº11
Responda justificadamente:
(a) X propôs ação contra Y pedindo ao tribunal que fosse declarada a nulidade do
contrato de arrendamento celebrado entre ambos e que o Y fosse condenado a pagar-
lhe uma indemnização de €10.000 por danos que imputa àquele a título de culpa in
contrahendo. Na sentença, o juiz discorreu sobre o processo negocial, tendo
considerado que, quando muito, o X estaria em erro sobre a base do negócio.
Terminou concluindo que não se verificava qualquer facto que determinasse a
nulidade do negócio jurídico e declarou a ação totalmente improcedente. Depois de
ler a decisão, o advogado de X entendeu que: (i) a sentença não especificou os
fundamentos de direito, pois o julgador não apreciou criticamente a doutrina e a
jurisprudência citadas na petição inicial; (ii) a fundamentação está em contradição
com a decisão, pois se o juiz considerou que o X poderia ter incorrido em erro sobre
a base do negócio, deveria ter anulado do contrato; (iii) o juiz deixou ilegalmente de
se pronunciar sobre o pedido indemnizatório.
Concorda com o advogado de X?

Quanto à falta de indicação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a


decisão (arigo. 615º/1 b)):
Esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um
pedido, mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes
para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação
das decisões judiciais (artigos 208º/1 CRP e 154º/1 CPC).
O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido
ou sobre uma dúvida suscitada no processo (artigo 154º/1 CPC) e apenas a ausência de
qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão; a fundamentação insuficiente ou
deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação
mediante recurso, se este for admissível.
Quanto à fundamentação em contradição:
A decisão é nula quando os seus fundamentos estiverem em oposição com a parte decisória
(artigo 615º/1 c)), isto é, quando os fundamentos invocados pelo tribunal conduzirem
logicamente a uma conclusão oposta ou, pelo menos, diferente daquela que consta da decisão.
Quanto à omissão de pronúncia:
O tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação,
excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (art. 608º/2).
Este corolário do princípio da disponibilidade objetiva (arts. 5º/1 e 664º 2.ª parte) significa
que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os
pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem
juridicamente irrelevantes ou cuja execução penas das matérias ou pedidos que forem
juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico
escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.
Por isso é nula a decisão em que o tribunal deixa de se pronunciar sobre questões que devesse
apreciar (artigo 615º/1 d) 1.ª parte), ou seja, quando se verifique uma omissão de pronúncia.
Correção:
A matéria da sentença é fundamental – a mesma é o culminar do processo. Tal como qualquer
ato processual, a sentença está subordinada a regras – 607º e ss.
Nulidades da Sentença – 615º:
o Dever de fundamentação;
o Dispositivo, quer na vertente da omissão, quer na vertente de excesso;
No ponto (i), o fundamento do recurso não deve proceder – 602º - aqui, temos de perceber o
que são “questões que devesse apreciar”: o juiz não está obrigado apreciar as razões de
direito que na perspetiva do autor servem de fundamento. Essas razões de direito não são
questões, são fundamentos/argumentos que a parte utiliza para persuadir o julgador a
decidir as questões num determinado sentido. Assim, o juiz não tem de ser pronunciar sobre
estes aspetos.
Só falhas graves de fundamentação é que gera nulidade da sentença, não bastando uma
fundamentação incompleta (caso bastasse, todas as decisões eram nulas; é sempre possível
dizer mais alguma coisa). Nos demais casos, em que a fundamentação é insuficiente, recorre-
se da decisão.
No ponto (ii), há um debate doutrinário, pois tem-se entendido que o juiz deve anular o
negócio, mesmo que o pedido seja uma declaração de nulidade. O princípio do dispositivo
tutela também os interesses do réu – assim, para se poder anular o negócio, o réu tem de ter
tido a oportunidade de se pronunciar sobre os factos alegados. À partida, aqui, não haveria
nulidade da sentença. O juiz tem a faculdade de tomar a decisão de anular o negócio ou a
obrigação de anular o negócio? Para o professor, à partida seria uma faculdade.
No ponto (iii), não parece haver falta de pronúncia – se o contrato for efetivamente nulo, o
juiz não tem de se pronunciar acerca da indemnização, pois a questão dada à nulidade, vem
“prejudicar” esta segunda questão.
(b) Comente, quanto à fundamentação da sentença, o seguinte acórdão STJ 26.02.2019
(1316/14.4 TBVNG-A.P1.S2 |Fonseca Ramos).
Comentário do professor MTS:
Sumário:
I. A fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação
dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da
convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objetividade e
discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas da decisão,
saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a
fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida
pelo Tribunal.
II. A exigência de fundamentação das respostas negativas aos quesitos constituiu
inovação na revisão do Código de Processo Civil de 1995/96: não era requisito
no Código de Processo Civil de 1939 e só passou a sê-lo, quanto aos factos
provados no Código de Processo Civil de 1961, mantendo-se até ao DL. 329-
A/95, de 12.12, o dever, quanto aos factos julgados provados, de especificar os
fundamentos decisivos para a formação da convicção do Tribunal.
III. A formulação constante da sentença recorrida, que o Acórdão recorrido
“validou”, reportada ao dever de fundamentação constante do art. 704º, nº4, do
Código de Processo Civil: “Foram considerados como factos não provados: todos
os demais alegados que contrariam ou excedem os acima expostos [os 28
indicados como provados], nomeadamente os alegados em 6° a 11°, 58° a 77° da
petição de embargos”, é complexa, obscura, não permitindo a imediata e exigível
compreensão e apreensão dos factos que a sentença considerou não provados,
pois implica uma indagação analítica e especiosa sobre quais são os factos não
provados, com referência à formulação “todos os demais alegados que contrariem
ou acima expostos, nomeadamente os alegados nos arts. 6º a 11º, 58º a 77º da
petição dos embargos”.
IV. Tal indicação implica que os destinatários imediatos da sentença indaguem,
através da apreciação da petição dos embargos, que, no caso, comporta 102
artigos, que factos (o conceito, consabidamente, não é unívoco), quais os factos
que “contrariam ou excedam os expostos”.
V. A necessidade imposta pela decisão, no que respeita ao apuramento cristalino do
completo elenco dos factos não provados, para lá de ser totalmente omissa a
fundamentação quanto a eles, consubstancia nulidade, nos termos dos arts. 607º,
nº4, e 615º, nº1, als. c) e d) do Código de Processo Civil.
VI. Na ponderação da natureza instrumental do processo civil e dos princípios da
cooperação e adequação formal, as decisões que, no contexto adjetivo, relevam
decisivamente para a decisão justa da questão de mérito, devem ser
fundamentadas de modo claro e indubitável, pois só assim ficam salvaguardados
os direitos das partes, mormente, em sede de recurso da matéria de facto, quando
admissível, habilitando ao cumprimento dos ónus impostos ao recorrente
impugnante da matéria de facto, mormente, quanto à concreta indicação dos
pontos de facto considerados incorretamente julgados e os concretos meios de
prova, nos termos das als. a) e b) do nº1 do art. 640º do Código de Processo Civil.
VII. Uma deficiente ou obscura alusão aos factos provados ou não provados pode
comprometer o direito ao recurso da matéria de facto e, nessa perspetiva,
contender com o acesso à Justiça e à tutela efetiva, consagrada como direito
fundamental no art. 20º da Constituição da República.
Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
"Está em causa a aplicação/interpretação do art. 607º, do Código de Processo Civil, que versa
sobre a elaboração da sentença. Não existe, no vigente Código, peça autónoma onde o Juiz,
antes da sentença, declara quais os factos provados e não provados após o julgamento, com
as respostas aos quesitos, despacho que continha a fundamentação, podendo até ser
reclamado.
As Reformas do Código de Processo Civil, visando a simplificação e a celeridade, acabaram
com velhas peças processuais, ou fórmulas como a “especificação e o questionário”
impuseram, inovadoramente, que na sentença se identifiquem as partes e o objeto do litígio,
enunciando-se, de seguida, as questões que cumpre solucionar. Seguem-se os fundamentos,
devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as
normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final. (nºs 3 e 4).
O nº4 do art.607º do Código de Processo Civil, que está em causa, impõe ao julgador que na
fundamentação da sentença declare:
“Quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando
criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando
os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em
consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por
confissão consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos
ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e
extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
O dever de fundamentação das decisões, na sua vertente endoprocessual e extra-processual,
decorre do art. 208º, nº1, da Constituição da República, sendo da maior relevância não só
para que possa ser exercido controlo no julgamento da matéria de facto, como na decisão de
direito.
A exigência de fundamentação da matéria de facto provada e não provada com a indicação
dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do
julgador, devem ser feitas com clareza, objetividade e discriminadamente, de modo a que as
partes, destinatárias imediatas, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e
a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo
Tribunal.
A exigência de fundamentação das respostas negativas aos quesitos constituiu inovação na
revisão do Código de Processo Civil de 1995/96: não era requisito no Código de Processo
Civil de 1939 e só passou a sê-lo, quanto aos factos provados no Código de Processo Civil de
1961, mantendo-se até ao DL. 329-A/95, de 12.12, o dever, quanto aos factos julgados
provados, de especificar os fundamentos decisivos para a formação da sua convicção. [...]
Na audiência prévia foi elaborado o despacho saneador e, a fls. 130, foi indicado como
“Objecto do litígio: “o montante da quantia exequenda; a natureza e extensão da
responsabilidade dos embargantes; e a validade das cláusulas contratuais”. E como temas de
prova – “1. A disponibilização à mutuária dos valores invocados no requerimento executivo
para além das quantias indicadas como disponibilizadas nos títulos executivos; 2. A
comunicação e explicação das cláusulas contratuais aos embargantes”.
A amplitude e complexidade dos temas de prova e do objeto do litígio, sempre tornaria
complexa a tarefa do julgador de indicar com precisão que factos foram submetidos a
julgamento e quais as razões (fundamentação) pelas quais se consideraram não provados os
quantos que a convicção probatória adquiriu.
Dir-se-ia que a tarefa estaria mais facilitada na velha lógica “cada facto um quesito”, nos
remotos tempos da tão criticada e longamente vigente peça “questionário”, depois “base
instrutória” que, em articulação com a “especificação” espelhava, em regra, todos e cada um
dos factos sujeitos a julgamento, uma valia não despicienda.
Comentário:
No “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, de Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís
Filipe Pires de Sousa, pág. 717, em comentário ao art.607º lê-se, além do mais:
“A matéria de facto provada deve ser descrita pelo juiz de forma fluente e harmoniosa, técnica
bem diversa de uma que continue a apostar na mera transcrição de respostas afirmativas,
positivas, restritivas ou explicativas a factos sincopados, como os que usualmente preenchiam
os diversos pontos da base instrutória (e do anterior questionário). Se, por opção, por
conveniência ou por necessidade, se inscreveram nos temas de prova factos simples, a decisão
será o reflexo da convicção formada sobre tais factos, a qual deve ser convertida num relato
natural da realidade apurada… […]. O importante é que, na enunciação dos factos provados
e não provados, o juiz use uma metodologia que permita perceber facilmente a realidade que
considerou demonstrada, de forma linear, lógica e cronológica, a qual, uma vez submetida às
normas jurídicas aplicáveis, determinará o resultado da ação.”
A formulação constante da sentença recorrida reportada ao dever de fundamentação constante
do art. 704º, nº4, do Código de Processo Civil: “Foram considerados como factos não
provados: todos os demais alegados que contrariam ou excedem os acima expostos [os 28
indicados como provados], nomeadamente os alegados em 6° a 11°, 58° a 77° da petição de
embargos” é complexa, obscura, não permitindo a imediata exigível compreensão e
apreensão dos factos que a sentença considerou não provados, pois implica uma indagação
analítica e especiosa sobre quais são os factos não provados, com referência à formulação
complexa “todos os demais alegados que contrariem ou acima expostos, nomeadamente os
alegados nos arts. 6º a 11º, 58º a 77º da petição dos embargos”.
Tal indicação implica que os destinatários da sentença indaguem através de apreciação da
petição dos embargos, que comporta 102 artigos, que factos (o conceito, consabidamente, não
é unívoco) “contrariam ou excedam os expostos, sendo que importaria ao intérprete saber
quais os que contrariavam ou excediam “os acima expostos”.
A necessidade imposta pela decisão, no que respeita ao apuramento cristalino do completo
elenco dos factos não provados, para lá de ser totalmente omissa a fundamentação quanto a
eles, consubstancia nulidade nos termos dos arts. 607º, nº4, e 615º, nº1, als. c) e d) do Código
de Processo Civil.
Na ponderação da natureza instrumental do processo civil e dos princípios da cooperação e
adequação formal, as decisões que, no contexto adjetivo, relevam decisivamente para a
decisão justa da questão de mérito, devem ser fundamentadas de modo claro e indubitável
pois só assim ficam salvaguardados os direitos das partes, mormente, em sede de recurso da
matéria de facto, quando admissível, habilitando ao cumprimento dos ónus impostos ao
recorrente impugnante da matéria de facto, mormente, quanto à concreta indicação dos pontos
de facto considerados incorretamente julgados e os concretos meios de prova, nos termos das
als. a) e b) do nº1 do art. 640º do Código de Processo Civil.
Com o devido respeito, não pode este Tribunal reconhecer ao Acórdão recorrido tais
requisitos de clareza e precisão na indicação da matéria de facto não provada, para lá da
omissão de fundamentação dessa decisão, pelo que enferma de nulidade, nos termos do art.
615º, nº1, b) e c), 684º, nº2, do Código de Processo Civil e, como tal, não pode manter-se
sendo anulado."
A sentença é um ato de comunicação, tendo como destinatários as partes, tendo, várias vezes,
ordens.
Fundamentação desempenha dois papéis fundamentais: o juiz tem de integrar nos seus
deveres a persuasão/convencimento de que aquela é a melhor decisão - serve para o
convencimento das partes; quanto ao sistema de recursos, o juiz de 1ª instância tem de
explicar por que motivos ficou convencido (607º, nº4).
607º, nº4 – faz uma menção específica aos factos não provados.
CASO JULGADO
Caso nº12
Responda justificadamente:
(a) X propôs ação de responsabilidade civil decorrente de acidente de viação contra Y.
O tribunal considerou que o Y não era parte legítima, pelo que o absolveu da
instância. Um mês após o trânsito em julgado desta decisão, X propôs nova ação
contra Y, na qual deduziu o mesmo pedido indemnizatório. Na contestação, Y arguiu
a exceção de caso julgado. Deve esta exceção proceder?
O caso julgado é a insusceptibilidade de impugnação de uma decisão (despacho, sentença ou
acórdão) decorrente do seu trânsito em julgado (art. 628º CPC). O caso julgado traduz-se na
inadmissibilidade da substituição ou modificação da decisão por qualquer tribunal (incluindo
aquele que a proferiu) em consequência da insusceptibilidade da sua impugnação por
reclamação ou recurso ordinário.
O caso julgado vem regulado em 2 lugares no CPC: Efeitos da sentença + Contestação (pois
o caso julgado é também uma exceção – 580º)
581º
Se é imposta nova ação, sobre a mesma matéria – posso usar o caso julgado como exceção.
Evitar decisões contraditória e gerir os recursos da justiça – 580º, nº2, CPC.
Caso julgado formal (sobre questões formais) vs. Material (sobre questões substantivas).
Aqui, a legitimidade poder-se-ia considerar uma questão material, sendo o caso julgado
material (pode ser invocado noutros processos).
06.05.2021
(b) X propôs ação contra Y, pedindo a condenação deste ao pagamento de €10.000. Em
reconvenção, Y alegou um crédito de €9.500 sobre X, que fundou na obrigação de X
lhe restituir o capital emprestado (€9000) e de pagar os juros remuneratórios (€500),
nos termos de um contrato de mútuo celebrado por escrito particular, que juntou aos
autos. A sentença condenou o Y a pagar €500 ao X. Passados dois meses, X propôs a
ação contra Y em que pedia que o contrato de mútuo invocado por Y na primeira ação
fosse anulado (pois X era menor à data da respetiva celebração) e que, em
consequência, o Y fosse condenado a restituir-lhe os €500 respeitantes aos juros
remuneratórios. Na contestação, o Y invocou a exceção de caso julgado. Deve
proceder?
O caso julgado é a insusceptibilidade de impugnação de uma decisão (despacho, sentença ou
acórdão) decorrente do seu trânsito em julgado (artigo 628º CPC).
Estamos perante um caso julgado material uma vez que incide sobre razões de mérito e por
isso pode ter eficácia para além do processo em que é proferido, isto é, além de uma eficácia
intraprocessual, é suscetível de valer num processo distinto daquele em que foi proferida a
decisão – 619º, nº1, CPC.
Deste modo, o instituto do caso julgado exerce 2 funções: uma positiva, ao fazer valer a sua
força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; e uma negativa, ao impedir
que a mesma causa seja novamente apreciada.
No caso, Y invoca a exceção de caso julgado, prevista no artigo 580º, que procura proibir a
repetição, na mesma causa, com as mesmas partes e o mesmo objeto, de outra decisão e,
ainda, a contradição, sendo que, havendo duas decisões contraditórias sobre o mesmo objeto,
segundo o artigo 625º, nº1, vale aquela que primeiramente transitar em julgado.
Quanto às mesmas partes, é manifesta a existência de identidades entre os sujeitos das duas
ações (X e Y), sendo indiferente a posição que assumam em ambos os processos, podendo
ser autores numa ação e réus noutra (no caso, X é autor de ambas e Y é réu em ambas).
Quanto ao mesmo objeto:
- A causa de pedir parece não coincidir: na primeira ação, nomeadamente na reconvenção, é
alegado um crédito cujo fundamento consiste na celebração de um mútuo; na segunda ação,
a causa de pedir alicerça-se na menoridade do autor à data de celebração do mútuo.
- O pedido: importa referir que se tem entendido que, quando na segunda ação o pedido
consiste no inverso do pedido na primeira ação, a declaração de um certo efeito jurídico
(anular o contrato) pressupõe o reconhecimento desse mesmo efeito jurídico. Logo, pode
considerar-se que existe identidade de pedidos.
580º, nº2 – Esta declaração do legislador é extremamente abrangente por um lado e por
outro carece de preceitos seguintes que a concretizem.
581º - vem definir um conceito extremamente complexo, que é o de identidade de causa.
Nesta hipótese, a relação de identidade tem de ser analisada entre o pedido reconvencional
e a proposta pedida em segundo lugar.
O tribunal podia ser colocado na posição de se contradizer?
O pedido de reconvenção implica pressupor que o contrato em causa é válido – se a decisão
do pedido reconvencional for a de reconhecer o direito a ser indemnizado, então pressupõe
que o negócio em causa seja válido.
Está, sem dúvida, em causa uma contradição, se a segunda decisão vier considerar o
contrato inválido.
Haverá identidade de pedidos quando:
o O que se pede na segunda ação é o inverso do que se pede na segunda.
o O segundo efeito jurídico já se encontra consumido pelo efeito jurídico decidido na
primeira ação.
o A declaração de certo efeito jurídico, na primeira ação, pressupõe a
declaração/reconhecimento de um direito/situação jurídica que vem a ser posta em
causa na segunda ação.
Efeito positivo do caso julgado: impõe o sentido de uma decisão genérica
Caso nº13
A X, Ltd., sociedade australiana, celebrou com a Y, Lda., sociedade portuguesa, um contrato
de fornecimento de vinho produzido pela X, Ltd. Entregue a primeira encomenda, a Y, Lda.
apercebe-se de que o vinho cuja produção foi contratada não é o mesmo que, nas provas
ocorridas na negociação, foi apresentado à Y, Lda. Em suma, na perspetiva da Y, Lda., a X,
Ltd. enganou-a. Na sequência desta descoberta, houve troca de e-mails em que a Y, Lda.
ameaçou pôr em causa a subsistência do contrato. Prevendo o pior, a X, Ltd. propôs ação num
tribunal de Camberra, pedindo que o contrato fosse declarado válido. Tendo conhecimento
desta conduta, a Y, Lda. propôs ação no Tribunal da Comarca de Braga, pedindo que o
contrato seja declarado nulo.
(a) Na ação que corre em Portugal, a X, Ltd. alega a exceção de litispendência. Supondo
que é juiz desta ação, como procederia?
Existe litispendência quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao
pedido e à causa de pedir. Como a exceção da litispendência se reporta àquela tríplice
identidade, basta não haver uma delas para que a mesma não se verifique.
As sentenças produzidas em tribunais estrangeiros, não relevam no nosso ordenamento
jurídico (29º, Regulamento nº 1215 – em caso de litispendência de um país da UE, aquele
tribunal em que a ação foi proposta em segundo lugar vai suster a tramitação do processo,
e esperar que o tribunal em que a ação foi proposta em primeiro lugar se declare competente
ou incompetente.
Nos demais casos, nº3, 580º - a litispendência noutros países é irrelevante.
As causas de pedir são diferentes – mas o núcleo essencial é a celebração do contrato. 582º,
nº2 – aquela em que o réu foi citado em primeiro lugar.
(b) Na ação que corre em Portugal, a X Ltd. alega a exceção de caso julgado, com
fundamento na decisão do tribunal de Camberra, que declarou o negócio válido.
Supondo que é juiz desta ação, como procederia?
Ação de revisão-confirmação

RECURSO
Caso nº14
Responda justificando:
(a) Em ação de responsabilidade civil, a X, S.A. foi condenada a pagar uma
indemnização de €100.000. Y, acionista titular de uma participação de cerca de 10%
no capital da sociedade, pretende recorrer da decisão, alegando que a sentença
prejudica o seu direito aos dividendos do exercício em curso. Pode Y recorrer?
Critérios a verificar:
Alçada (valor da causa) – artigo 44º, LOSJ, se o valor não excede os 5.000€, não há lugar a
recurso – no caso estão em causa 100.000€, logo pode recorrer.
Sucumbência – medida em que a decisão foi desfavorável ao recorrente – é preciso que
exceda metade do valor da alçada, o que ocorre, podendo recorrer.
Falta analisar legitimidade.
“Partes vencidas”
O sócio não foi diretamente prejudicado. Mas o prejuízo não é sequer efetivo: apenas o será
se na AG se decidir a divisão de dividendos: assim, não pode o sócio recorrer.

(b) No dia 01.04.2019, finda a audiência de julgamento, a juiz dita a sentença para a
ata, tendo a ata sido disponibilizada no CITIUS no dia 03.04.2019.

(i) Não sendo interposto recurso, em que data transita esta decisão em julgado?
Nos termos do artigo 628º, a decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja
suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.
Importa, assim, perceber se a decisão é suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.
Segundo o professor Castro Mendes, o recurso consiste no pedido de reponderação sobre
certa decisão judicial, apresentada ao órgão hierarquicamente superior. Assim, quando a
causa admite recurso, a decisão judicial pode ser impugnada por essa via – 627º, nº1.
Nos termos do artigo 638º, nº1, CPC, o prazo para a interposição do recurso é de 30 dias,
sendo que, nos termos do nº3, tratando-se de sentenças orais, reproduzidas no processo (como
parece ser o caso), o prazo corre do dia em que foram proferidos, isto é, dia 01.04.2019, se a
parte estiver presente ou foi notificada para assistir ao ato.
Deste modo, não tendo sido interposto recurso, a decisão transitará em julgado no dia
30.04.2019.
Importa saber qual o prazo e quando começa a contar?638º: ou 15 dias (ex.: providência
cautelar) ou 30.
Quando começa a contar – o primeiro dia do prazo é o dia seguinte
Se o recurso pedir a reapreciação da prova gravada, acrescem 10 dias.
(ii) A resposta seria diferente caso a sentença tivesse sido proferida no âmbito
de um procedimento cautelar?
Nas providências cautelares, não se forma caso julgado, uma vez que, conforme estabelece o
nº4, do artigo 364º, CPC, nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final proferida
no procedimento têm qualquer influência no julgamento da ação principal, da qual o
procedimento cautelar depende.
Apenas sendo a ação principal procedente, é que a decisão poderia transitar em julgado.
371º, nº1 – 30 dias para propor a ação principal.
17.05.2021
Caso nº15
Responda justificadamente:
(a) Em resultado de acidente de viação, X e Y coligaram-se e demandaram Z, tendo X
alegado um dano de €4.000 e Y um dano de €14.000. Z foi absolvido de todos os
pedidos. X e Y pretendem interpor recurso para o Tribunal da Relação. Podem fazê-
lo?
X e Y coligaram-se nos termos do artigo 36.º e demandaram Z: X alegando um dano de 4 mil
euros e Y um dano de 14 mil euros, tendo Z sido absolvido de ambos os pedidos.
X e Y pretendem interpor recurso para o tribunal da Relação.
Nos termos do artigo 627.º as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos,
podendo estes ser ordinários ou extraordinários - art. 627.º/2.
No nosso caso, ao que tudo indica, e admitindo que a sentença ainda não tenha transitado em
julgado - art. 628.º estaríamos diante de um possível recurso ordinário, devendo ser
respeitados os prazos do art. 638.º
Nos termos do 631.º as partes têm legitimidade para recorrer.
Cabe entender se desta decisão se admite recurso: ora, nos termos do art. 629.º o recurso
ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se
recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da
alçada desse tribunal, atendendo-se ao valor da causa.
Nos termos do art. 42.º da LOSJ, os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados para
efeito de recurso das suas decisões e, em regra, nos termos do n.º2 os tribunais da relação
conhecem das causas cujo valor exceda a alçada dos tribunais judiciais de 1ª instância.
O art. 44.º/1 vem estabelecer que a alçada dos tribunais de primeira instância é de 5000 euros
e dos tribunais da Relação é de 30000 euros.
Assim, levante-se aqui um problema quanto ao valor da causa no nosso caso.
A coligação é uma figura de pluralidade de partes em que há sempre uma cumulação de ações,
tornada possível por razões de ordem prática e de simplificação, pelo que cada um dos
pedidos mantém autonomia relativamente aos outros. Assim, no acórdão do STJ 1/9/2016
(2653/13.0TTLSB.L1. S1 no caso de coligação, o valor da ação deve ser considerado
autonomamente para cada um dos pedidos cumulados, ou seja, para que o recurso seja
admissível em relação a todos, é necessário que o valor de cada um deles seja superior ao
valor da alçada do tribunal de que se recorre. O professor MTS refere que o valor de um
pedido de valor superior à alçada não pode justificar a interposição de um recurso quanto a
outro pedido cujo valor seja inferior ao dessa alçada. O valor de um pedido não se transfere
para efeitos da admissibilidade de um recurso quanto a outro pedido.
Assim, no nosso caso: X não poderá recorrer para o tribunal da Relação (porque o valor da
causa é de 4000), mas Y poderá, pois, o valor da causa é superior ao da alçada do tribunal de
1ª instância e a decisão impugnada é desfavorável ao recorrente em valor superior a metade
da alçada desse tribunal - artigo 629.º.
DÚVIDA: como é que este entendimento quanto ao valor da causa das ações coligadas se
articula com o disposto no artigo 297º, nº2 que determina que “cumulando-se na mesma ação
vários pedidos, o valor é a quantia corresponde à soma dos valores de todos eles”.
Resolução:
O pedido de X não excede a alçada da primeira instância, contrariamente ao de Y. Logo, Y
poderia recorrer e o X não – 629º, CPC – fala-se do valor da causa (e não o valor do pedido).
Sendo a cumulação admissível. Sempre que a coligação é admitida, não implica que cada
um dos pedidos não pudesse ser deduzido em ação autónoma (até pressupõe esta possível
autonomização).
Se X não pode recorrer, mas Y não: temos uma decisão contraditória? Pois o dano sofrido
pelo Y é indemnizado, não sendo o Z condenado a indemnizar o X. (Não parece ser esse o
caso).
(b) Em ação de responsabilidade civil decorrente da queda de criança num buraco que se
encontrava em propriedade alheia, a primeira instância e a Relação consideraram que
o proprietário do terreno havia adotado os cuidados que lhe eram exigíveis. O lesado
recorreu para o STJ, impugnando este entendimento. O STJ recusou conhecer a
questão com o fundamento de que se tratava de matéria de facto. Quid iuris?
Recurso de Revista (porque é da Relação para o STJ). Há dupla conforme - artigo 671.º/3
Nos termos do artigo 640.º quando seja impugnada a decisão sobre matéria de facto, o
recorrente deve especificar os elementos constantes das alíneas a), b) e c) do nº1 do artigo
640.º, sob pena de rejeição.
No sumário do acórdão do STJ de 14-07-202 - Revista n.º 812/17.6T8PNF.S1 - 1.ª Secção -
António Magalhães (Relator) - Jorge Dias - Maria Clara Sottomayor é referido que a rejeição
injustificada da impugnação da matéria de facto, com fundamento na inobservância do ónus
do art. 640.º do CPC, é uma violação da lei processual. Refere que o critério relevante para
apreciar a observância ou inobservância dos ónus enunciados no art- 640.º do CPC há de ser
conforme aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
No entanto, nos termos do artigo 671.º/3, não é admitida revista do acórdão da Relação que
confirme, sem voto vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão
proferida em 1ª instância.
Resolução: STJ conhece matéria de direito e não matéria de facto. Porquê? Ideia De
Uniformização de Direito (688º e ss, CPC) – o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência
não tem força de lei.
A função do STJ é, sobretudo, conhecer os recursos do Tribunal da Relação – função de
uniformização. Ideia de coerência do Direito.
Há aqui, também uma ideia de crivo
Culpa consiste numa questão de direito ou de facto?
O que é a dupla conforme? 672º abre a porta para recurso de revista excecional.
2 posições que se contrapõem:
- No nosso sistema judicial, o STJ aparece como um tribunal que de algum modo não pode
ser qualificado como instância, pois não pode apreciar a totalidade da questão – a sua
função exclusiva é a de apreciar a decisão na perspetiva da violação da lei substantiva e
processual, e eventualmente de nulidades (só conhece a matéria de direito). É, no entanto,
uma solução problemática - Não é possível, com rigor, separar o direito dos factos.
Quando da relação pretendemos interpor recurso para o STJ – não podemos pôr em causa
os factos provados (a relação fixa definitivamente as questões de facto).
Caso nº16
Responda justificadamente:
(a) Ao entrar num supermercado, X foi abalroada pela porta automática de acesso à loja,
tendo sofrido várias lesões. X propõe ação contra a Y, S.A., proprietária do
estabelecimento comercial, pedindo indemnização.

(i) Imagine que Y arrola 12 testemunhas, entre elas M, N e O, que tinham


assistido ao acidente. Porém, no dia da audiência final, M e N faltaram. Quid
iuris?
A iniciativa da prova testemunhal é correntemente tida como devendo ser das partes,
constituindo uma zona remanescente do princípio do dispositivo, no âmbito da instrução do
processo, largamente dominada pelo inverso princípio do inquisitório – 411º.
Desde logo, o rol de testemunhas não pode exceder, por cada parte, o total de 10 testemunhas,
quanto à matéria da ação, devendo considerar-se não escritos os nomes das testemunhas que
no rol ultrapassem o número legal, nos termos do artigo 511º, nº1 e 3.
O seu nº4 determina que, atendendo à natureza e extensão dos temas da prova, o juiz pode,
por decisão irrecorrível, admitir a inquirição de testemunhas para além do limite previsto de
10.
Quanto ao não comparecimento de M e N, o artigo 508º, nº2 determina que a falta de
testemunha não constitui motivo de adiamento dos outros atos de produção de prova, sendo
ouvidas as testemunhas presentes. No entanto, o nº3 do mesmo artigo regula 3 situações
distintas:
- Caso a impossibilidade seja definitiva, Y tem a faculdade de substituir as testemunhas;
- Se for meramente temporária ou a testemunha tiver mudado de residência, a parte pode
substituí-la ou requerer o adiamento da inquirição;
- Caso a falta seja sem motivo justificado, pode ser substituída.
(ii) Suponha que P e Q, testemunhas arroladas por Y, S.A., descrevem o acidente
nos exatos termos em que foi descrito na petição inicial. Pode a Y, S.A.
requerer ao juiz para não valorar os depoimentos prestados por P e Q?
Estamos perante a figura da contradita (?).
(b) X e Y eram cotitulares de uma conta bancária, onde se encontravam depositados
€70.000. Em março/2017, Y transferiu para uma conta de que ele era único titular a
totalidade do dinheiro. Em maio/2018, X propôs ação em que pediu ao tribunal para
condenar Y à restituição dos €35.000 que lhe pertencem, além de indemnização pelos
prejuízos sofridos. Na contestação, Y alegou que os referidos €35.000 lhe haviam
sido mutuados por X, estando apenas obrigado a restituí-los em dezembro/2020. No
início da audiência final, Y requereu a junção aos autos de um documento particular,
que era um contrato de mútuo celebrado entre X e Y, em fevereiro/2017, nos termos
do qual aquele declarava emprestar a este €35.000, ficando Y obrigado a restituir-
lhos em dezembro/2020. Y alegou que apenas havia juntado o documento naquele
momento porque, durante a mudança de casa em dezembro/2017, havia perdido
alguns documentos, tendo reencontrado o referido contrato apenas há 15 dias. Posto
isto:
(i) Deve a juiz admitir a junção do documento?
Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da defesa devem ser apresentados
com o articulado em que aleguem os factos correspondentes, neste caso, na contestação –
423º. Existe, assim, extemporaneidade da apresentação. O nº3 do artigo referido estabelece
uma exceção, que parece enquadrar-se no caso, uma vez que estamos perante documentos
cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
OU – nº2.
Resolução:
O direito de apresentar documentos não preclude – 423º. O critério do juiz deve ser o
seguinte – se o documento é verdadeiramente essencial para a descoberta da verdade,
implica o adiamento da audiência (a contraparte tem de se pronunciar), o juiz pode aceitar,
mas deve ser condenado ao pagamento de multa.
Superveniência Objetiva – o documento gerou-se depois.
Superveniência Subjetiva – a parte devia ter conseguido juntar o documento mais cedo?
O documento pode servir para provar a celebração de um contrato nulo – esta prova é
importante pois pode fundar a decisão de condenar o Y no pedido, não com fundamento no
contrato de mútuo, mas na obrigação de restituir a prestação recebida.

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