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Amparado num
projeto gráfico O armistício
‘sem fim’
Por Rodrigo Fonseca
Especial para o Correio da Manhã
refinado, romance O que (ou no que) a errân-
cia de h. reflete das transfor-
da autoficção
-se das demais publicações por rância e do moralismo?
seu projeto gráfico refinado, em existenciais Hugo Cosarini: Com a er-
formato quadrangular, interca- rância de h, quis, em certa medi-
lando textos com arrebatadoras nas livrarias da, mostrar, na escolha das cenas,
brasileiras, numa
Divulgação
fotos em preto & branco, “Sem o afastamento das pessoas nesta
Fim” (Ed. Quelônio) é uma nossa idade cibernética já presen-
viagem existencial da literatura
brasileira pelas veredas do dese-
trama que une te no nosso recente passado. A
falsa aproximação das pessoas se
jo e da afirmação de identidades confissão e delata já com as mulheres na cida-
sexuais, num ambiente que tem dezinha natal e na cidade grande,
o HIV como um espectro as- imaginação onde ele vai buscar um ponto de
sombroso. Passeia pela progres- apoio naqueles que julgava pró-
são aritmética da matemática da ximos. Não acredito muito no
“autoficção” à luz de vivências recrudescimento da intolerância
(reinventadas) do autor mineiro e do moralismo. Soa-me mais
(radicado em São Paulo) Hugo como um punk de boutique, algo
Casarini. que a maioria das pessoas, para
Sua voz impressiona pela ha- não estar fora da ordem, ordem
bilidade de cerzir a dor de quem esta redigida pelos meios de co-
busca a libertação e a aceitação, municação que servem da nossa
equilibrando imaginação e re- bolha para formar opiniões, po-
lato confessional, em um regis- rém de poucas pessoas. Acredito
tro tragicômico. Seus parceiros (e vejo) que o grito de socorro de
na concepção desse “romance O pai é severo e o castiga com h ainda seja não ouvido nos rin-
objeto” foram a designer Síl- surras violentas. A mãe bate conti- cões do nosso país. Basta ver o
via Nastari e o fotógrafo André nência para a autoridade paterna. horror político e social que vive-
Penteado. Nesta quarta, às 19h, Mas ao deixar a “roça iluminada” mos sem que ninguém, ou muito
Casarini lança seu experimento de seu berço e seguir pra cidade de poucos, pronunciem-se. O Brasil,
na Livraria da Travessa do Sho- São Paulo, ele encontra um meio na sua imensidade e profunde-
pping Leblon, compartilhando que, finalmente, o acolhe. O re- za - e isso se aplica também às
suas invenções sintetizadas na sultado é uma trama de resfolego, periferias das grandes cidades -,
figura do jovem h. Guiado por mas de doçura, de prosa ágil. permanece o mesmo. As pessoas
seus ímpetos, h reconhece que Além das livrarias, o romance não se uniram mais, acho que até
sua homossexualidade e seu pode ser adquirido diretamen- se afastaram nos anonimatos das
comportamento intelectual, de te pelo site da editora (https:// redes. Basta ler os comentários
tom intimista, não ganham re- www.quelonio.com.br). No papo das notícias da internet.
conhecimento ou chancela no a seguir, Casarini explica o que O escritor mineiro radicado em SP Hugo Casarini aposta na autoficção
meio em que cresceu. buscou refletir com a saga de h. em ‘sem fim’, que lança nesta quarta na Livraria da Travessa Continua na página seguinte
2 CONTINUAÇÃO DA CAPA Quarta-feira, 13 de abril de 2022
CORREIO CULTURAL
Divulgação
O grupo, com sua formação original, registrou as faixas de um ensaio aqntes da fama num gravador de rolo
Walter
Pinheiro tem
especialização
musical
No compasso da diversidade
na Berklee O eclético músico Walter Pinheiro lança ‘2 por 3’, seu terceiro álbum
School, nos
EUA O flautista, saxofonista, arranja- ‘brass band’ WPBrass, que une jazz- nho Antunes (trompete); Allan Abba-
dor e compositor paulistano Walter -rock a frevo”, destaca. dia e Paulinho Malheiros (trombone);
Pinheiro está lançando seu terceiro Tudo quer revelar a riqueza sono- Eliezer Tristão (tuba); Muari Vieira
CD “2 por 3” (Tratore). São músicas ra talhada por Walter, em flertes com (guitarra); Zé Barbeiro (violão de 7);
de sua autoria, em linguagens e for- gêneros distintos que essa contem- Robertinho Carvalho (baixo); Ever-
mações distintas, que fazem uma sín- poraneidade nos possibilita, unindo ton Barba (bateria); e Beto Angero-
tese desses 25 anos de carreira. Wal- choro, samba-jazz, baião, jazz waltz, sa, Alfredo Castro e Marcos Magaldi
ter diz que o título do álbum quer funk, ijexá e frevo. Estilos que se en- (percussão).
Marcelo Petrella/Divulgação
dar uma idéia do conteúdo: “O 2 faz trelaçam na habilidade do músico em Walter é formado em flauta
alusão à contraposição de linguagens estruturar texturas, sempre buscando pela Universidade Estadual Paulista
e sonoridades que uso. Por exemplo, coerência. As músicas têm nomes (UNESP/1997) e tem especialização
música de rua versus a de salão; for- como “Samba Jaizzsch” e “Arruda e a na Berklee School of Music (Boston/
mações pequenas versus as grandes Gafieira”. EUA/2002). Lançou o duplo primei-
formações. O 3 é uma referência à Juntos, no álbum, alguns dos me- ro/segundo CD, Som na Brasa - Re-
multiplicidade de projetos que venho lhores músicos da cena paulistana gional Brasileiro, em 2010. Naquele
articulando nesses anos, como a mi- como Anderson Quevedo (saxofone); trabalho já desenvolvia essa musicali-
nha banda Gafieira do Pinheiro ou a Natan Oliveira e Marco Stoppa, Rubi- dade que bebe de fontes diversas.
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pela capital portuguesa em bus- val Cinéma du Réel em 2001. ra. Filmo como uma equipe tado visual, Vitalina leva às telas
ca de seus mortos, após a morte Este era um dos filmes fa- muito reduzida, com quatro suas experiências com o luto e
de seu marido, atrás de sentido. voritos de Eduardo Coutinho pessoas por trás das câmeras, a ressaca diante do sexismo. No
“Estudando aquelas pesso- (1933-2014), aclamado docu- para que meu elenco de não ato- fim do ano passado, Costa lan-
as de Cabo Verde, que tanto me mentarista responsável por cults res tenhas as melhores condições çou o livro “Vitalina Varela - Ca-
deram e tanto me dão, há tantos como “Edifício Master” (2002) e de criar. Não se deve ser urgente, dernos de Rodagem”, no qual faz
anos, tive a percepção de que exis- “Santo Forte” (1999). Em sua ex- no cinema, nem no documentá- um balanço de seu método de
tem mulheres sentinelas, à olhar periência de trabalho com Costa rio, formato que aspira a ter um trabalho, reunindo fotografias
para o mar, à espera, sem resposta”, nos sets, Dona Vitalina dizia: “Se contato mais terra a terra com tiradas nos subúrbios de Lisboa
disse Costa ao Correio da Manhã. houver amor, as coisas vão dar a realidade”, disse o diretor ao e na ilha de Santiago, Cabo Ver-
Considerado um dos mais certo!”. Ela cedeu muito de suas Correio da Manhã em sua passa- de, entre 2017 e 2019.
requintados estetas do nosso vivências à caracterização de sua gem pelo Rio, há três anos. “Existem pessoas com um vi-
tempo no audiovisual, Costa personagem a caminho das Fon- Desde Locarno, o longa de ver muito rico que vieram d’Áfri-
ganhou notoriedade por lon- tainhas, bairro onde o cineasta Costa já soma 23 prêmios e ga- ca para se reinventarem em solo
gas-metragens como “Cavalo ambienta suas aclamadas tramas, nhou uma sessão nobre no Mu- português. E é delas que eu falo,
Dinheiro” (Melhor Direção em oferecendo ao espectador uma seu de Arte Moderna (MoMA) em planos que distendem uma
Locarno em 2014), “Juventude missa estética de reflexão sobre a de Nova Iorque, no âmbito de percepção mais comercial do Penn durante as filmagens de seu
em Marcha” (indicado à Palma resiliência dos imigrantes d’África um ciclo dedicado ao melhor tempo”, disse o cineasta. documentário em Kiev, na Ucrânia
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