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Este ebook ou qualquer parte dele não pode ser reproduzido ou usado de qualquer
forma sem a autorização expressa e por escrito da autora, exceto pelo uso de citações
breves em resenhas e avaliações.
Esta é uma obra de ficcção e qualquer semelhança com nomes, acontecimentos, fatos
ou aspectos da vida real retratados aqui terão sido mera coincidência.
Dedicatória
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Beijinho, Dani s2
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Sumário
Nota da Autora
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Epílogo
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Agradecimentos
1
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Dou risada, tiro uma foto da mesa e mando para eles com a
legenda: “cheguem logo”. Deixei na longa mesa da sala de jantar
uma pilha de copos descartáveis, duas garrafas de vodca, pacotes
de doritos e uma grande tigela de guacamole que a Rose, que
trabalha aqui na casa, preparou antes de ir embora. Parte das
cervejas estão num cooler no chão e outra parte, na geladeira.
Aos poucos, as pessoas vão chegando. O apartamento fica
praticamente cheio. Morgana, Bic e Pedro chegam juntos e me
cumprimentam com abraços.
Um tempo depois, Yuri chega com a Carol e é como se a festa de
fato começasse. Ele toma conta da playlist, trocando a música
eletrônica por alguma batida pop mais animada. Motive, da Ariana
Grande, começa a tocar no autofalante. Não reclamo,
particularmente, eu escuto de tudo.
Passo pela sala, a mesa de centro já está cheia de garrafas vazias
de cerveja. A varanda está lotada e percebo uma densa onda de
fumaça pairando no ar. Avisto Pedro e Bic conversando no sofá e me
junto a eles.
—E aí? —Digo, me sentando.
—Ah, ele só pode estar brincando! —Pedro diz de repente, mas
não é comigo que está falando.
—O que? —Eu franzo as sobrancelhas.
—A música! —Ele responde.
Bic dá uma risada. Acho que essa é Borderline, da Ariana também.
Eu ainda devo estar com cara de ponto de interrogação, porque
Pedro revira os olhos e se adianta em explicar:
—Sweetener! O Yuri colocou o álbum Sweetener pra tocar na
festa! Eu vou ter que ir até lá.
Ele começa a se levantar e Bic ri mais alto. Chego mais perto
dela.
—Tá se divertindo, Biczinha? —Pergunto.
—É, até que sim —dá de ombros.
—Humm, não me convenceu.
Ela suspira, seu sorriso vai sumindo.
—Bic, você veio aqui pra se divertir. Se anima, bebe um pouco, vai
dançar!
—Tô sem ânimo, Ian. O que você quer que eu faça?
—Aqui —puxo uma longneck do cooler próximo ao sofá.
Bic suspira, mas me deixa abrir a tampa e dá um bom gole.
Depois, faz uma careta.
—Eca! Odeio Heineken.
—Acho que tem umas latinhas de Skol no freezer —sugiro.
—Não, vou preparar uma caipivodca ou algo assim. Se vou induzir
meu bom humor com álcool, é bom que seja com alguma coisa doce,
pelo menos.
—É assim que se fala! —Eu sorrio enquanto me levanto e vou com
ela até a cozinha.
Não me considero forte para bebida, mas duas garrafas de cerveja
depois, estou muito bem. Ariana Grande liberou espaço para Doja
Cat tomar conta do recinto, sua voz rouca reverbera pelo alto falante.
Converso um pouco com cada grupo que vejo, tentando dar
atenção a todos. A galera do futebol está na varanda e todos bebem
cerveja. O pessoal da minha turma da faculdade está espalhado por
todo lugar. Para um bando de nerds da biologia, esses caras são até
que bem sociais.
Bic está com o terceiro ou quarto copo de caipivodca na mão,
parecendo muito mais animada que antes, dançando e cantando
com Carol, Yuri e Pedro.
—Ei, vocês viram a Morgana em algum lugar? —Carol pergunta.
Todos nós balançamos a cabeça negando.
Yuri reclama da falta de animação da galera e dá a ideia de nos
sentarmos ao redor da mesinha de centro da sala.
—A gente podia fazer alguma brincadeira, tipo um Verdade ou
Consequência!
—Verdade ou Consequência? O que é isso, o fundamental? —
Zomba Bic.
—Tá bom, ícone da maturidade, o que você sugere? —Yuri rebate.
—Que tal um jogo de cartas? —Uma garota de cachos loiros
próxima ao nosso grupo, sentada de lado no colo de Matheus, meu
amigo do curso, sugere.
—Ah não, tem que ser um jogo mais dinâmico, pra todo mundo
jogar —Carol argumenta. —Que tal Cidade Dorme ou Vire a
Garrafa?
—Sem condições pra jogar Cidade Dorme, metade da galera aqui
nem raciociona direito mais! —Eu digo rindo.
—Eu amei a ideia do Vire a Garrafa! Vamos jogar esse! —Yuri diz,
se animando.
—Vire a Garrafa? Gente, isso aqui é Brasil, não filme de
adolescente americano!
—Para de ser chata, Bianca! Vai, Gatão pega uma garrafa aí —
Yuri aponta para mim.
Eu olho em volta e encontro uma vazia e em pé perto do sofá. Me
estico para buscá-la e ajeito minha posição no chão.
Sentados ao redor da mesinha, estamos: Eu; Matheus, encorajado
pela loura em seu colo. Acho que ela se apresentou como Sarah;
Carol logo ao lado deles e Bic. Yuri está do meu outro lado. Pedro
chegou, perguntou qual era o jogo e se sentou bem ao lado de Yuri.
Há outras pessoas na sala também, mas ninguém quis entrar na
brincadeira, estão apenas como espectadores.
—Espera, quais são as regras? —Bic pergunta antes que Yuri
possa iniciar a partida.
—Não tem regra, é só um objetivo. Beijar a pessoa que a garrafa
apontou —Yuri responde, dando de ombros.
Ah. Por algum motivo, eu não tinha me dado conta do que o jogo
se tratava. Existe então, uma possibilidade de eu beijar uma das
pessoas nesse círculo.
Reparei em Bic enrijecendo e a expressão em seu rosto ficando
mais sóbria. Se mais alguém do grupo se preocupa com a
brincadeira, não demonstra ou apenas nem se importa. A maioria
aqui já está embriagada demais para pensar muito.
O Matheus, por exemplo, está teoricamente no jogo, mas seu
único objetivo parece descobrir até onde Sarah vai deixar a mão dele
subir por dentro da saia de seu vestido.
Yuri resolveu que ia começar, e com um movimento na mão, fez a
garrafa dar várias voltas antes de parar com a ponta voltada para
Carol. Os dois deram gritinhos, riram, se debruçaram na mesa e
encostaram os lábios rapidamente. Depois, a Carol girou e beijou
Sarah, Bic beijou Pedro. Todos deram selinhos rápidos.
—Peraí, gente, isso tá muito sem graça.
—O que é agora, Yuri? —Pedro pergunta revirando os olhos.
—Esse jogo já tá ficando chato, repetitivo. Vamos apimentar mais
as coisas. Os beijos agora vão ter que durar pelo menos uns 6
segundos.
—Por que seis? —Bic pergunta.
—Sei lá, seis é um bom número —é a resposta de Yuri.
—Ahh, gostei. Vai, é minha vez —Sarah gira a garrafa o suficiente
para que a boca aponte para ela mesma. Ela sorri, gira o corpo e
ataca a boca do Matheus num beijo que dura, com certeza, mais do
que 6 segundos. Agora são 10... 15 segundos… Ok, nós perdemos
eles.
—Beleza, acho que esses dois não estão mais afim de jogar. É a
vez de quem, agora? —Carol pergunta rindo.
—Eu vou! —Pedro diz estendendo a mão para pegar a garrafa.
Percebo que ele faz pouca força para girar e a ponta começa a
parar em minha direção e dou risada quando ouço assobios. Então,
a inércia afasta o bico da garrafa para alguns centímetros longe de
mim, parando em… Yuri.
Bic e Carol gritam, soltam uma gargalhada alta e batem palmas.
—Ah, eu mereço —Yuri revira os olhos.
Pedro não solta nenhum comentário, apenas puxa o rosto de Yuri
com uma mão e beija sua boca com os lábios fechados.
As meninas dão mais um grito e uma contagem regressiva a partir
de 6, começa. Quando eles se separam, estou assobiando e rindo
também.
—Ai, que palhaçada —Yuri revira os olhos mais uma vez, mas
percebo que está lutando contra um sorriso a se formar em seu
rosto. Pedro tenta agir casualmente, mas sua pele clara não disfarça
o tom avermelhado em suas bochechas.
—Tá, de quem é a vez agora? —Pergunto, ainda dando risada.
—Acho que pode ser você, mesmo Ian —Carol empurra a garrafa
na minha direção.
Pego a garrafa e giro. Cinco voltas depois, vai diminuindo o ritmo
até parar em uma linha vertical bem na minha frente. Levanto a
cabeça e de repente fico tenso. Porque quem está na minha frente
é… Bic.
7
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
“Somos um do outro,
somos tão do mundo
Me chama pelo nome e vem me ver
eu não quero amar, eu quero você [...]
Quero ver você de novo
sem mexer no nosso jogo”
Coringa-Jão
Aconteceu.
Em algum momento futuro eu vou me arrepender disso, mas
agora? Foda-se. Quero aproveitar esse momento ao máximo.
Posso estar me contradizendo totalmente agora, mas, em minha
defesa, estou seguindo ordens médicas. Minha psicóloga fala muito
sobre me conectar e agradar a minha criança interior, então
considero que é isso o que estou fazendo.
Estou beijando nosso crush de adolescência, estou fazendo a
Bianca de uns anos atrás feliz. Ela teria muita inveja de mim nesse
momento e minha psicóloga teria muito orgulho, tenho certeza.
Logo depois que Ian e eu concordamos com o fato de que um
beijo não iria acontecer entre nós novamente, eu pude quase sentir
um arrependimento voltar à tona, tentei me segurar pois sabia que
estava fazendo o certo.
Ele, porém, não teve o mesmo autocontrole que eu e quebrou o
segundo silêncio que havia baixado entre nós literalmente largando a
toalha no chão e me prensando contra a parede do meu quarto, me
beijando com pressa, como se seus lábios não aguentassem mais
nem um segundo longe dos meus.
Ele fez todo o meu discurso sobre preservar nossa amizade ir para
a casa do caralho.
Eu não tive forças para resistir, retribuí ao beijo com a mesma
intensidade, sem hesitar, porque estaria mentindo se dissesse que
não passei todos esses dias sem reviver aquele último.
Agarro seus cabelos molhados e escuto um som gutural abafado
sair de sua garganta, me fazendo arrepiar por completo.
Suas mãos estão firmes em minha cintura e meus pés subiram na
ponta para acompanhar sua altura. O ritmo vai diminuindo e sua
boca devora a minha lentamente, provando e aproveitando cada
segundo. Seu perfume está misturado com o cheiro de chuva e o
beijo tem gosto do hidratante labial que eu estava usando.
Depois do que parecem horas, nós nos separamos. Estamos os
dois ofegantes, brigando por ar com nossos rostos ainda próximos.
Ele balança a cabeça, parece prestes a se desculpar.
—Não. Nem pense em pedir desculpas por isso —eu protesto,
antes que ele possa falar.
Ele solta o ar, rindo, mas não diz nada. Ficamos em silêncio
recuperando o ar. Agora com o clima entre nós um pouco mais leve,
ele indaga, ofegante:
—O que… que tipo de gloss você usa?
Solto uma risada. Eu esperava qualquer coisa, menos isso.
—Esse é de manga —respondo.
Ele assente.
—Muito gostoso.
—É —concordo com a cabeça.
—Bic?
—O que? —Sussurro.
—Eu vou te beijar de novo —ele diz com a voz baixa.
—Tá bom —eu assinto debilmente.
E assim, seus lábios voltam a deslizar sobre os meus. Sua mão
faz carinho na minha nuca, me arrancando outro gemido. Esse beijo
é mais lento que o outro, e é tão bom que sinto toda a extensão de
minhas pernas formigando. Na verdade, “bom” parece o mais ridículo
dos eufemismos.
Depois de algum tempo, que eu não vi passar, nos separamos de
novo. E entre mais respirações pesadas, ele implora:
—Por favor, não me pede pra parar com isso.
—Isso o que? —Questiono.
—Isso —ele aponta para o espaço entre nós. —Bic, isso aqui entre
a gente é bom, muito bom, e funciona. Eu não quero parar por aqui.
Sua declaração me assusta levemente. Balanço a cabeça,
começando a protestar, mas ele me interrompe, prosseguindo com
seu discurso:
—Sério, a gente sempre se dá bem, nunca brigamos e agora,
tem essa química surreal entre a gente. Qual o problema de a gente
ficar de vez em quando? O que pode dar errado?
—Quer uma lista? —Solto uma risada sem muito humor. —Ian, me
fala, qual é a sua sugestão? Uma amizade colorida? Porque se for,
eu não vou aceitar, sem chance.
—Não! Só tô dizendo pra gente deixar rolar. Continuamos amigos,
vida que segue. Mas se surgir uma vontade… a gente fica. Sem
complicação, sem momentos constrangedores e conversas
desnecessárias no dia seguinte.
—Basicamente, uma amizade colorida.
—Tá Bic, se você quiser chamar assim, fica à vontade —ele diz,
revirando os olhos.
Cruzo os braços.
—Eu tô falando sério, Ian.
—Eu também tô!
Mais um silêncio. Estou me cansando desses silêncios, eles não
são do tipo bom.
—Olha, foi só uma sugestão, tá? Não tem problema nenhum se
você…
—Eu vou pensar —interrompo.
Ele esboça um sorriso de lado.
—Tá bom, já é um começo.
—Tira esse sorrisinho da cara! —Aponto com o dedo.
—Que sorriso? —O sorriso em questão aumenta.
—Esse! Para com isso, é irritante —é lindo, na verdade, mas eu
jamais diria isso a ele.
—Bom, eu vou indo, então. Te vejo amanhã, se as aulas voltarem
—Ian diz.
Espera, ele vai embora agora? Por acaso ele veio até a minha
casa no meio de uma tempestade só para me dar mais um beijo
desconcertante e me deixar maluca pelo resto da noite? Que tipo de
tortura psicológica é essa?
—Já vai? —Pergunto, sem me conter.
—Quer que eu fique? —A porcaria do sorriso de lado presunçoso
voltou.
—Quero, mas desfaz essa cara agora. A gente vai ver um filme.
—A gente vai assistir ele inteiro, dessa vez? —O idiota pergunta.
—Sim. Você vai ficar de um lado do sofá, e eu do outro.
Saio do quarto e ando em direção à sala.
—Sim senhora —ele bate continência atrás de mim. —Prometo
que vou me comportar.
Faço questão de escolher um filme de suspense e que eu nunca
tenha visto antes, com o intuito de prender minha atenção o
suficiente e me fazer esquecer momentaneamente que Ian está há
poucos metros de mim.
É claro que meu plano não dá certo, pois estou constantemente
sendo lembrada de sua presença e sinto seus olhos sobre mim
durante maior parte do filme.
Ele cumpre com sua promessa e se comporta, não faz nenhuma
investida. Não sei dizer se fico aliviada ou decepcionada com isso.
Quando o filme acaba, eu o levo até a porta. Ele se vira para se
despedir de mim com um beijo no rosto, assim como sempre faz,
mas dessa vez, muda a rota para minha boca e me dá um selinho,
me pegando de surpresa.
Depois que se afasta, pisca para mim e entra no elevador, me
deixando parada na porta com o coração palpitando.
Eu odeio o quanto me sinto atraída por ele. É assustador. Mais
assustador ainda é ter noção do poder que eu acabo dando a ele de
destruir meu pobre coração palpitante.
16
Ian
Bianca
Não sei do que Ian tanto reclama da irmã, ela é uma fofa. Só um
pouco quieta demais, não falou muito desde que cheguei.
Depois que saímos da faculdade, Ian me deixou em casa e foi
buscar Sophia na escola. Aproveitei para tomar um banho e trocar de
roupa, então ele voltou e me trouxe de novo para sua casa.
Agora, ele está tomando banho enquanto eu e Sophia estamos
sentadas no sofá, assistindo Miraculous Ladybug. E ela está em
completo silêncio, assistindo o desenho. Talvez esteja tímida, mas
não me dá a menor atenção. Eu adoro conversar com crianças, por
isso não me controlo e tento puxar assunto com ela, mesmo ela não
parecendo interessada.
—Que lindo seu lacinho, Sophia! —Elogio, apontando para as
maria-chiquinhas que prendem os fios de seus cabelos dourados.
—Obrigada —ela responde com educação, mas não tira os olhos
da tela.
O que eu falo agora? Não estou acostumada a ser ignorada por
crianças, geralmente elas gostam de mim. Quando eu e Sophia
fomos apresentadas, eu fiz questão de não cometer o erro de dizer
algo como “Lembra de mim? Te peguei no colo quando você era
bebê! ” e essas coisas que a gente ouve quando é pequeno e
encontra aquela pessoa conhecida da família que nunca viu na vida.
Todos já passamos por isso, é péssimo. Dá vontade de responder
com “É claro que eu não lembro, senhora! Meu cérebro não estava
nem desenvolvido nessa época! ”
Realmente não sei o que fiz de errado, ou como começar uma
conversa que conquiste essa menininha e a faça gostar de mim. Mas
então, me surpreendendo, Sophia respira fundo, gira seu corpo em
minha direção e fecha as mãos juntas. Parece estar se preparando
para fazer uma pergunta muito importante e eu tenho que me
segurar para não rir e perder pontos com ela, mas o gesto é tão fofo!
—Desde quando você conhece o meu irmão? —Ela olha no fundo
dos meus olhos.
Tento conter minha surpresa, eu não esperava por essa.
—Nossa, tem muito tempo. Antes mesmo de você nascer.
Ela não gosta nem um pouco dessa resposta. Claro, nenhuma
criança gosta de ser lembrada que é criança perto de um adulto.
Merda, por que eu disse isso? Agora ela vai me odiar.
—Eu só tenho cinco anos, nem é tanto tempo assim.
Franzo o cenho. O que ela quer dizer com isso?
Antes que eu pudesse responder, ela me lança outra pergunta.
—Ele já te deu um apelido?
Não sei para onde ela está tentando levar esse interrogatório, mas
eu rio respondendo:
—Aham! Ele me chama de Bic.
—Isso é nome de caneta —ela franze as sobrancelhas claras.
—Foi o que eu disse a ele, mas ele parece ser viciado em dar
apelidos bobos pras pessoas.
—Ele me deu um apelido também, e não é nada bobo —ela diz,
num tom defensivo.
—Deu? E qual é?
—Não posso te contar, é uma coisa só nossa —ela diz fechando
os olhinhos castanhos e empinando o queixo.
Então uma lâmpada se acende em cima da minha cabeça. Já sei o
que está acontecendo aqui. Ela tem ciúmes da minha amizade com
seu irmão.
Tenho vontade de gargalhar alto, mas obviamente me contenho.
Achei que ela não gostasse de mim. Tipo, de mim mesma.
Não costumo me importar muito com a opinião alheia, mas quando
se trata de crianças, é diferente, porque na maioria das vezes, elas
são seres muito verdadeiros e pouco influenciáveis por juízos
externos.
Agora que sei que seu julgamento sobre a minha pessoa não é
nada pessoal, relaxo. E tento contornar a situação.
—Ele sempre fala muito bem de você, sabia?
Isso atrai sua atenção novamente para mim.
—Sério?
—Aham, ele diz que você é muito esperta.
—O que mais ele fala? —Ela pergunta, curiosa.
—Ele disse que você um dia fez com que ele ficasse um tempão
fazendo um sanduíche para você. Eu achei aquilo muito engraçado.
—Foi bem engraçado mesmo —ela dá uma risadinha.
Fiz ela rir, acho que estou ganhando pontos!
—O que você acha de a gente aprontar com ele de novo? Tipo,
armar uma pegadinha? —Proponho, sussurrando.
O rosto de Sophia se ilumina e eu desconfio que tenha dado um
passo mais próximo de conquistar sua simpatia.
—Já sei!
18
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Ian
A gente não se viu. Naquele dia, eu fui chamado para uma reunião
de pais no colégio da Sophia. Depois do episódio com aquele garoto
no estacionamento, o pirralho contou à mãe sobre o que aconteceu e
ela fez um escândalo enorme na escola. Por isso, a diretora chamou
os pais do garoto, que eu descobri que se chama João Vitor, os pais
da Sophia e eu, o vilão, para uma conversa.
Os dois já são de turmas diferentes, então o que ficou resolvido foi
que a Sophia e o tal João Vitor estudariam em turnos separados, ela
de manhã e ele, à tarde. A diretora garantiu que o discurso anti-
bullying é muito defendido pela instituição e que repudia esse tipo de
comportamento. João Vitor pediu desculpas para minha irmã e ficou
por isso mesmo. Eu não pedi desculpas a ninguém, e nem teria feito
se me solicitassem. É claro que a minha vontade era que o moleque
fosse expulso da escola, e esperava até receber um olhar de
desaprovação e talvez mais um esporro do meu pai, mas fiquei
surpreso quando, depois que saímos da sala da coordenação, ele
me olhou com uma certa admiração no olhar.
—Olha, meu filho, eu não posso dizer que estou orgulhoso por
você ter ameaçado uma criança que tem menos da metade da sua
idade e tamanho... —Ele me disse, quando andávamos em direção
ao estacionamento. —Mas eu fico feliz que você tenha defendido a
sua irmã.
Não estou acostumado com isso. Aquela aprovação partindo dele,
aquele olhar. Não soube nem como responder. Fiquei em silêncio,
mas deixei aquele sentimento estranho marinar dentro de mim.
34
Bianca
Ian
Bic entra na água direto. É incrível ela não tomar um choque
térmico no processo. Sua alegria é tão contagiante que ela parece
uma criança que nunca viu água na vida. E falando em criança,
Sopa, usando uma boia em cada braço rechonchudo e o rosto inteiro
branco de protetor solar, corre em direção à ela dando gritinhos de
felicidade ao nos ver chegar.
Eu sento na areia, debaixo do guarda-sol com Sandra. Depois de
algum tempo, ela me pergunta se eu quero entrar na água, mas eu
nego, me contento em ficar olhando daqui, Bic e seu sorriso gigante,
o cabelo molhado caindo nas costas, a água escorrendo por seu
corpo…
—Quer jogar? —Meu pai aparece de repente, me tirando de meu
devaneio, de calção e duas raquetes de madeira nas mãos.
—O que é isso? —Eu pergunto, fugindo da resposta, sabendo
muito bem reconhecer as raquetes de frescobol.
—Bora! Vamos ver se você consegue deixar a bola no ar por mais
de duas tacadas.
Isso é um golpe baixo, eu não jogo há muito tempo. Até porque eu
só jogava com ele, quando era moleque. Mas mesmo assim, eu cedo
à provocação e me levanto da canga de praia.
Meu pai me entrega uma das raquetes e dá a primeira tacada, eu
consigo rebater, ele joga de volta para mim e mais uma vez eu
sustento.
Na terceira tacada, ele joga alto demais, mas percebo que é de
propósito, ele quer me desafiar. Eu ando para trás a passos curtos e
rápidos, com os olhos na bolinha vermelha flutuando e,
surpreendendo nós dois, eu não a deixo cair, jogando para ele numa
tacada até que favorável.
Meu pai abre um enorme sorriso.
—Boa!
E aí está, mais migalhas de aprovação paterna.
Por algum motivo, isso causa um efeito certeiro em mim pois, sem
conseguir me conter, eu sorrio de volta e me sinto agarrado a esse
sentimento adormecido por tanto tempo dentro de mim mesmo.
Jogamos por mais algumas partidas, mas mesmo com minha
estreia promissora, eu ainda estou muito enferrujado com a falta de
prática. Nosso recorde é de 6 raquetadas antes da bola cair na areia
e ir rolando até a parte rasa do mar.
Engolindo meu orgulho, admito que me diverti bastante jogando
com meu pai, como não fazia há muito tempo. É a porcaria do
sentimento nostalgia, tenho certeza.
Saímos da praia e voltamos para a casa para almoçar. Mazé
preparou um salmão com molho de alcaparras, purê de batatas e
uma salada, que estavam uma delícia e fiz questão de elogiar.
A tarde rapidamente chega, eu e Bic colocamos nossas coisas em
nossos respectivos quartos. Ela escolheu o melhor quarto, o com
vista para o mar, paredes em tons de azul escuro e com uma âncora
de madeira logo acima da cabeceira da cama de casal. Eu fiquei com
o quarto amarelo e branco, decorado com um timão de madeira
gigante pendurado na parede. Meu pai e Sandra ficaram com o
quarto azul claro de estrela do mar e Sopa com o quarto coral com
decoração de cavalo marinho.
O pôr do sol está quase se aproximando, e para mim, essa é a
hora perfeita para pegar uma praia. Sem o sol forte para queimar a
pele e menos gente na areia, apenas o som das ondas quebrando e
o céu laranja contrastando com o azul do mar. Perfeito.
Do lado de fora da casa, olho para cima e, na varanda do quarto
do andar de cima, vejo Bic escorada no parapeito. Ela percebe
minha presença, olha para baixo e sorri. Sorrio de volta.
—Já viu a praia secreta que tem aqui? —Pergunto.
—Secreta? —Seus olhos brilham em curiosidade.
—Vai deixar de ser agora. Quer ir lá conhecer?
—Agora! —Seu sorriso aumenta ainda mais e ela some da
varanda. Escuto seus pés batendo nos degraus da escadaria de
madeira enquanto ela desce, vindo me encontrar.
35
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Visto meu biquíni e uma camiseta dele. Ele diz que vai de bermuda
mesmo, então descemos. Em silêncio, para ninguém mais acordar.
Agora que está completo, só resta cair tudo. Porque é claro que eu
retribuo. É óbvio que eu o amo. Porque eu sempre amei.
42
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Bianca
Ian
Bianca
Ian
Ian
Bianca
Ian
Bianca
Ian me pressiona contra a porta enquanto me beija com uma
intensidade capaz de arrancar todo o ar dos meus pulmões. Ele me
abraça e me segura com urgência, como se estivesse me vendo pela
primeira vez em anos.
—Que saudade de você —eu declaro.
—Eu também tava —ele sorri e volta a marcar com beijos o meu
pescoço.
—Tá, então, o que a gente é agora? —Eu pergunto, depois que
recupero meu fôlego.
—A gente é o que a gente quiser. Eu não preciso de rótulos, eu só
preciso de você.
Por mais brega que isso tenha sido, eu sinto meu coração
amolecer com essas palavras.
—Falei pros nossos amigos que o que nós temos não tem nome
—digo.
—Eu fiz a mesma coisa —ele sorri. —Acho que o que a gente tem
não tem nome porque é especial demais pra ser definido em um
termo só.
Outro sorriso bobo se estica no meu rosto, sinto meu coração se
encher ainda mais. Ele está inspirado hoje e empenhado em falar
bobagens românticas clichês. Será que passou esse último mês
lendo Shakespeare ou coisa parecida?
—Isso foi lindo, mas se alguém perguntar, eu vou simplificar e
dizer que a gente namora, tá bom?
Ele solta uma gargalhada alta.
—Tá. Eu concordo.
—Então… eu sou sua namorada agora? —Eu passo os braços por
seu pescoço, o puxando para mais perto.
—Sim. Minha namorada —ele diz, sorrindo para mim daquele jeito
que faz meu estômago tremer. —Mas só se eu puder ser o seu
namorado.
—Hum… eu vou ver e te aviso.
Ele revida a provocação me dando mais mordidinhas no pescoço e
me arrancando gritinhos.
A porta atrás de mim se força para ser aberta, eu e Ian nos
entreolhamos, antes de sairmos de trás dela.
Sophia aparece e sobe os olhos para nós dois.
—Vocês já estão de bem? —Pergunta.
—Sophia, você pegou meu celular sem eu saber? —Ian questiona,
pousando as mãos na cintura, olhando sério para a menina.
—Peguei… —Ela responde.
Num movimento rápido, Ian a pega pela cintura e a joga por cima
do ombro. Começa a fazer cócegas nela e a menina desata a dar
gritinhos e a rir alto.
—Você é uma peste, mas também é a melhor cupida do mundo —
ele diz, rindo junto com ela.
—Você não tá bravo comigo? —Sophia pergunta tirando o cabelo
do rosto de modo desajeitado, quando Ian a coloca de volta no chão.
—Não. Tô feliz. Agora, vaza, já passou da sua hora de dormir e eu
quero ficar sozinho com a minha namorada.
—Que namor… —Ela franze as sobrancelhas loiras e depois abre
a cara de espanto mais cômica de todas —Vocês estão
namorando??? —Pergunta, pasma, se virando para mim.
Eu apenas balanço a cabeça, confirmando.
Depois disso, ela se recupera do choque, vira de costas, alcança a
maçaneta e, antes de sair, aponta o dedinho indicador em nossa
direção, dizendo:
—Juízo, hein?
Ian e eu esperamos ela fechar a porta completamente para
cairmos na gargalhada. Gargalhada essa que dura pouco, pois logo
depois, ele me puxa de volta para seus braços e volta a me beijar
com pressa. Temos muita saudade para matar.
Em algum momento, no meio disso, ele desgruda minhas costas
da parede do quarto e me conduz até sua cama, sem interromper o
beijo.
Ficando por cima de mim, seus beijos vão ficando mais lentos. Eu
arrasto as unhas por suas costas nuas ao passo que ele passa as
mãos por todo meu corpo, me arrancando gemidos cada vez mais
difíceis de controlar.
—Eu já levei uma advertência por causa do barulho nesse
apartamento uma vez. Então, por favor, não me faça receber outra.
—Isso só depende de você. Se isso quer dizer que você não vai
fazer ser tão bom dessa vez, então…
—Ah, eu vou fazer —ele garante, com a voz grave e sedutora no
pé do meu ouvido. —Vai ser tão bom que você vai se lembrar por
semanas.
Correntes elétricas percorrem meu corpo inteiro.
Ian não perde tempo, volta a me beijar enquanto vai subindo
lentamente a barra da minha camiseta. E geme ao descobrir que eu
não tive tempo de colocar um sutiã quando saí de casa.
Me sinto pegando fogo, quero mais, sinto uma vontade
incontrolável de arrancar nossas roupas imediatamente.
Mas, de repente, a porta se abre mais uma vez.
—Ian, você viu…
Puta que pariu. O tio Bento.
—Pai! —Ian grita, se apressando para cobrir meu corpo com o
seu.
—O que… essa é a Bianca? —Tio Bento pergunta enquanto eu
tento ao máximo me encolher e esconder.
—Pai! Cacete, não sabe bater, não?
—Como eu ia saber que você tinha alguém aqui? Eu nem vi ela
entrando!
Eles gritam um com o outro, exaltados, e tudo o que eu quero é
sumir, evaporar da face da terra. Ou morrer, talvez. Tanto faz, eu
estou com tanta vergonha que morreria aqui mesmo, sucumbiria aqui
neste colchão. Meu Deus, que vergonha!
—Dá pra você sair, por favor? —Ian pede, com pouca gentileza e a
voz elevada, apontando para a porta.
—Tá bom! Desculpa! —Seu pai responde, igualmente alterado.
Quando fecha a porta, Ian suspira e sai de cima de mim. Eu rolo
de barriga para baixo na cama, ainda cobrindo o rosto com as mãos.
—Me mata. Por favor, me mata agora.
Ian ri. ELE RI.
—Calma, podia ser pior.
—Como? COMO ISSO PODERIA SER PIOR, IAN?
—Se ele tivesse aparecido uns cinco minutos mais tarde. Aí sim,
seria um problema.
—Meu Deus, eu nunca mais vou conseguir olhar na cara do seu
pai —eu choramingo com o rosto enterrado no travesseiro dele.
—Bic, calma. Já foi. Em algum momento isso ia acontecer, né?
Agora ele vai precisar se acostumar com a minha namorada
passando a noite aqui em casa.
O jeito como ele me chama de sua namorada me faz sorrir de um
jeito incontrolavelmente bobo.
—Você tá amando poder dizer isso, né? —Viro a cabeça para ele.
—Sim. Minha namorada. —Ele sorri e me puxa para mais um
beijo.
Momentos mais tarde, Ian me empresta uma de suas blusas largas
e nós decidimos dormir. Apenas dormir. Bom, ao menos por
enquanto.
Ele se aconchega a mim, segurando minha cintura contra seu
corpo. Sussurra no meu ouvido:
—Te amo.
—Te amo —eu sussurro de volta.
Meu peito se aperta, mal cabendo tanta felicidade dentro dele.
Poderia dizer que me sinto completa aqui com ele, mas não é
verdade. Eu aprendi que sou uma pessoa inteira. Ian é um acréscimo
na minha vida, e é o melhor que eu poderia pedir.
Mas também preciso admitir que, depois dos últimos dias, eu
nunca pensei que voltaria a ser tão feliz assim.
Epílogo
Bianca
7 meses depois…
Já está quase na hora de cantar parabéns e meu namorado
sumiu.
Tendo em vista de que ele é o irmão da aniversariante, é bom que
apareça logo atrás daquele bolo antes que a Sophia perceba seu
sumiço.
Essa festa é o sonho dela. Aparentemente, ela criou um fascínio
tão grande com os super-heróis da Marvel nos últimos meses e
insistiu tanto que esse fosse o tema de sua festa, que sua mãe
precisou desistir da temática de LadyBug e teve que ceder.
Uma de suas exigências foi ter todos os heróis principais,
principalmente o Homem-Aranha, em pessoa aqui, mas isso não
seria possível. Sophia disse que entende a situação, mas claramente
está um pouco triste com isso. Até agora, porém, acho que
conseguimos distraí-la desse fato.
—Bianca, o Ian não tava com você agora mesmo? —Sandra
pergunta, se aproximando de mim, tentando disfarçar o nervosismo.
—Tava, mas disse que ia no banheiro e não voltou mais!
—Meu Deus do céu, será que esse garoto passou mal? —O pai
dele indaga.
De repente, o Parabéns da Xuxa, tocando nos alto falantes, é
interrompido e a voz da cerimonialista aparece no lugar, fazendo um
anúncio.
—Atenção, criançada! Uma visita surpresa chegou aqui no
cerimonial especialmente para o aniversário da Sophia. Quem será
que é, hein?
As crianças começam a se agitar, gritando e especulando o que
possa ser a surpresa.
Então, um sujeito vestido de Homem-Aranha, o Homem-Aranha do
Andrew Garfield, diga-se de passagem, aparece agachado no chão
na pose oficial do herói, do outro lado do salão.
Ele dá um salto e fica de pé. Todas as crianças gritam e correm em
sua direção.
Ai, meu Deus.
Tio Bento se aproxima de mim e pergunta:
—Aquele é o…
—É —confirmo antes dele terminar a pergunta, segurando uma
risada. Eu reconheceria aquela bundinha de qualquer lugar. E meu
Deus, como essa fantasia fica bem nele.
Ian cumprimenta as crianças, se abaixa para ficar do tamanho
delas e responde suas perguntas, com a maior paciência e carinho.
Ele diz que está sem suas teias no momento, então não pode
demonstrar seus saltos como um verdadeiro Homem-Aranha faria.
Mesmo assim, as crianças parecem hipnotizadas por ele.
—Quem é a aniversariante? —Ele pergunta, olhando em volta,
fingindo não ver a loirinha bem em sua frente, olhando para ele com
um brilho nos olhos.
Sophia levanta os dois bracinhos o mais alto que pode.
Ian, ou melhor, o Homem-Aranha pega uma caixa escondida
debaixo de uma das mesas do salão e entrega para a menina.
Um sorriso do tamanho da lua se estende por seu rosto pequeno,
ela começa a abrir o presente sem nem pensar duas vezes.
De lá, sai um unicórnio de pelúcia colorido e brilhante. Bem
parecido com as pelúcias que ela já tem, mas esse é cinco vezes o
tamanho dos outros. É o bichinho número 50, para completar sua
coleção.
Sophia solta um grito de empolgação tão estridente que eu temo
que os copos de vidro nas mesas se quebrem.
Ela pula no colo do Homem-Aranha e ele a abraça forte, girando-a
em seus braços.
Então, ele a põe de volta no chão e se despede do grupo de
crianças, dizendo que precisa ir salvar o mundo com o Homem de
Ferro.
Sandra e Bento, juntamente com a cerimonialista, começam a
recolher os restos da caixa de brinquedo que continha o unicórnio.
Pouco tempo depois, Ian reaparece com suas roupas normais, e se
junta ao resto da família atrás do bolo para cantar o parabéns.
Ian
Quando o bolo é cortado e as crianças voltam a se dispersar pelos
brinquedos do cerimonial, eu reapareço ao lado da Bic. Beijo seus
lábios rapidamente como sempre faço quando chego perto dela e,
mesmo depois de meses de namoro, ainda sinto faíscas, como se
fosse a primeira vez.
Sophia vem correndo em nossa direção e diz:
—Inham, você perdeu, o Homem-Aranha de verdade apareceu
aqui!
—Não acredito! Era ele mesmo?
—Pois é, olha só o que ele me deu! —Ela levanta o braço e mostra
o unicórnio gigante de pelúcia.
—Que legal, Sopinha! —Eu me empolgo junto com ela.
Sophia se vira para ir embora, mas volta. Gesticula com a mão,
pedindo para eu me abaixar, e quando o faço, ela pula no meu
pescoço.
—Obrigada pelo presente, eu amei —sussurra para mim.
Eu sorrio e digo de volta:
—De nada, Sopinha. Amo você, tá bom?
—Tá bom —é sua resposta.
Depois disso, ela corre de volta para onde estão o resto de seus
amiguinhos.
—Ela sabe que era você, né? —Bic adivinha.
Eu confirmo e nós dois rimos.
—Eu já deveria saber que é impossível enganar essa criança —eu
constato.
Bic deita a cabeça no meu ombro e eu aproveito para respirar seu
cheiro frutado.
—Eu te amo, sabia?
Desde que pude expor essas palavras pela primeira vez, tenho
vontade de dizê-las sempre. É como um vício.
—Hum… quanto? —Ela pergunta, fingindo pensar.
—Muito —sussurro e abaixo a cabeça para encontrar seus lábios.
—O suficiente para colocar aquela fantasia de Homem-Aranha de
novo?
—Se você estiver sugerindo algum tipo de fantasia sexual, pode
esquecer, linda. Aquele troço é um inferno para tirar e colocar.
—Eu não tava sugerindo isso, seu tarado! —Ela desfere um tapa
no meu peito, corando. —Mas você realmente fica muito gato usando
ela.
—Fico, é? —Levanto uma sobrancelha, sorrindo de lado.
—Uhum... —Bic me abraça pela cintura e sobe na ponta dos pés
para me beijar.
—Com licença, você é o irmão da aniversariante? —Uma mulher
ruiva, não muito mais velha que eu, usando uma roupa preta e
segurando uma máquina fotográfica, interrompe nosso momento.
—Sou… —Eu respondo.
—A mãe dela tá te chamando ali pra gente tirar umas fotos,
vamos?
Engraçado, eu tenho a impressão de que já vi essa mulher em
algum lugar. Antes de eu dar qualquer passo, Bic se pronuncia e
sana minha curiosidade.
—Amanda?
—Bianca? —A ruiva ergue as sobrancelhas. —Nossa... quanto
tempo! —Ela dá um sorriso, tentando esconder o desconforto e
então, olha de mim para Bic e pergunta:
—Ele é seu… namorado?
—É —Bic sorri, simpática.
—Ian —eu ofereço a mão, me apresentando.
—Prazer. —Amanda estende o sorriso amarelo ao me
cumprimentar. —Eu achei que você fosse… —Ela se dirige a Bic.
—Eu sou bi. —Minha namorada esclarece, enfraquecendo um
pouco o sorriso.
—Ah, sim… Bom, vamos, Ian?
—Claro, só me espera um minutinho, eu já vou.
Amanda assente.
—Bom te ver, Bianca! —Diz, indo em direção ao painel de fotos.
—Igualmente. —Bic responde, sem perder a educação.
Quando ficamos sozinhos, eu e Bic nos olhamos e fazemos a
mesma careta, arregalando os olhos.
—Meu Deus, que constrangedor —ela sussurra.
—Que merda de mundo pequeno —eu reclamo. —O que essa
mulher veio fazer sendo fotógrafa do aniversário da minha irmã?
—Relaxa, Ian, não é nada de mais.
—Você tá tranquila com ela estando aqui?
—Tô. Já tem muito tempo desde o que rolou entre a gente. E você,
vai ficar bem? —Ela pergunta.
—Eu? Claro —digo, flagrando Amanda de longe, esquadrinhando
minha namorada de cima a baixo. —Só espero que ela pare de olhar
pra você desse jeito.
—Ela não tá me olhando, tá esperando você chegar lá pra tirar as
fotos.
—Hum —resmungo.
—Vem cá —ela me puxa e arruma meu cabelo com os dedos.
—Tô bonito? —Pergunto, sorrindo de lado quando ela termina.
—Lindo! —Ela ri e me dá um selinho.
—Vem logo, Inham! —Ouvimos Sophia gritando de longe e
viramos o olhar para ela. A menina exibe um sorriso enorme e, só de
ver, um idêntico surge no meu.
—Seis anos. Passa muito rápido —eu suspiro. Uma parte de mim
sente muito por não querer ter participado dos anos iniciais da vida
da minha irmã, mas a outra parte é grata por nós termos o resto de
nossas vidas para passar um ao lado do outro.
—É, ela já é quase uma mocinha —Bic também suspira. —Mas vai
se dar bem, seis anos é uma boa idade.
—Seis é um bom número —eu digo, lembrando de que seis foi o
número exato de segundos que nos trouxe até aqui. Seis míseros
segundos.
Bic sorri para mim, captando o que eu disse. Eu acho que nunca
me senti tão sortudo na vida, e é só porque sou o motivo desse
sorriso.
Sei que em algum momento no futuro, eu vou ser idiota o
suficiente para fazer esse sorriso sumir e quem sabe até transformá-
lo em lágrimas, mas farei tudo o que puder para recuperá-lo.
E sei disso com a certeza de que ficaremos juntos por quanto
tempo nos for permitido e, se depender de mim, vai ser pela a vida
inteira. Porque sempre foi ela, sempre fomos nós. Nós e essa coisa
gigante, assustadora e intensa que consome nossas almas. Essa
coisa que nos une. Esse amor, essa amizade, esse laço. Essa coisa
sem nome.
FIM
Agradecimentos
O processo de escrita desse livro foi, resumidamente, solitário. Eu
fiz tudo sozinha. E se você estiver pensando que eu digo isso para
me gabar ou para fazer você sentir pena de mim, pare agora, porque
não é nada disso.
Tenha em mente que eu escrevo esses agradecimentos sem a
menor noção do futuro desse livro. Não sei se ele vai ser um grande
sucesso ou um enorme fracasso. Portanto, estou nesse momento,
sentada na minha cama com esse notebook velho no colo, sem
ninguém de casa vendo, escrevendo essa nota totalmente sozinha
e... cagada de medo.
O futuro em si é um pavor. Por isso, acho que não há nada mais
justo que começar agradecendo a Dani de cinco meses atrás que
não parou de escrever nem quando não tinha mais ânimo para abrir
o computador. Que teve que se segurar para não contar para
ninguém sobre uma cena superlegal que escreveu porque achava
que ninguém ao seu redor se importava o equivalente ao tamanho da
sua empolgação e não tinha ninguém para compartilhar a descoberta
recente de que a escrita é uma coisa incrível, mágica e empolgante.
Em segundo lugar: Letícia, eu e esse livro devemos TUDO a
você. Você foi a primeira a ler a história da Bic e do Ian e se
apaixonar por eles junto comigo à medida que eu ia escrevendo. Se
não fosse por cada áudio e cada mensagem sua, eu não teria
passado do 6º capítulo. Você ajudou a acender na minha cabeça a
ideia de que isso poderia chegar a ser algo real, algo que eu nem
havia tido a ambição para cogitar ainda. Muito obrigada por isso. A
internet é um lugar aterrorizante às vezes, mas eu sou muito grata
por ela ter me conectado a pessoas como você!
Evelyn, minha amiga que a faculdade me presenteou, que tem o
maior coração do mundo e a maior paciência comigo (te amo por
isso), você é uma das pouquíssimas pessoas que eu tive coragem o
suficiente para contar sobre essa ideia sem noção de me tornar uma
escritora. Obrigada por estar do meu lado mesmo morando tão
longe, seu apoio e sua amizade significam o mundo para mim.
Ana Luiza, minha irmã mais nova que de repente se tornou a
melhor revisora que esse livro poderia ter. Muito obrigada pela ajuda,
pelo apoio e me desculpe por te fazer ler dois capítulos enormes de
cenas sensuais tendo em mente que sua própria irmã estava por trás
delas. Deve ter sido uma experiência horripilante, mas foi necessário!
Acho que é válido compartilhar também que o processo de escrita
desse livro caminhou lado a lado com o meu processo pessoal de
“saída do armário”. E eu acho que, inconscientemente, depositei na
Bianca o medo que eu tinha de contar para os meus pais sobre a
minha sexualidade e meu Deus, não existem palavras que
descrevam a minha gratidão por ter eles e por eles serem eles!
Pai e mãe, vocês são os melhores do mundo. Vocês me apoiam
de olhos fechados, mesmo isso sendo arriscado às vezes. Muito
obrigada por tudo, especialmente por serem o total oposto da Valéria
e do Sérgio! Amo vocês mais que o infinito, para sempre!
E obrigada a você, leitor/a/e que leu até aqui! De verdade, muito
obrigada por ter dado uma chance a esse pequeno mundinho que eu
criei. Eu espero que a história da Bic e do Ian tenha tocado seu
coração de alguma forma. E pode esperar mais histórias, porque o
universo desses personagens só começou!
Com amor, Dani s2
About The Author
Daniela Lira
Dani tem 21 anos e mora no Espirito Santo. Ela é a apaixonada pela
arte -qualquer tipo de arte- e recentemente descobriu que sua
verdadeira paixão é contar histórias. O Que Temos Não Tem Nome é
seu primeiro romance publicado. Você pode encontrá-la no instagram
(@danisheverso), tiktok (@danishereads) ou isolada em seu quarto
lendo, escrevendo, desenhando e fugindo desesperadamente de
qualquer emprego convencional.