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COPYRIGHT © 2021 J BREE
COPYRIGHT © 2022 EDITORA CABANA VERMELHA
TÍTULO ORIGINAL: BROKEN BONDS
Todos os direitos reservados.
Diretora Editorial: Elaine Cardoso
Editora: Mari Vieira
Tradução: Naiara Chiquetto
Preparação: Elaine Lima
Revisão: Elaine Cardoso / Sara Lima
Leitura Final: Gisele Oliveira
Ilustração Capa: Emilie Snaith
Tipografia: Bellaluna Designer
Diagramação digital: Elaine Cardoso
Nenhum trecho deste livro pode ser reproduzido em qualquer forma, eletrônica ou
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sem a permissão por escrito da autora, exceto para o uso de breves citações em
uma crítica do livro.
Aviso de gatilho: bullying, abuso sexual, tortura, violência e
morte.
SUMÁRIO
PROLÓGO
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SOBRE A AUTORA
Sinopse
Depois da morte de minha mãe e de seus Vínculos, fiquei aliviada
ao encontrar os meus. Eu tinha certeza de que com eles tudo ficaria
bem. Não ficou. O destino do nosso povo está em minhas mãos, e
sei que vai ser melhor se eu ficasse sozinha. Depois de cinco anos
fugindo, sou pega e arrastada de volta para encarar os homens de
quem fugi. Achei que estava fazendo a coisa certa. Agora, nem
tanto. North, Nox, Gryphon, Atlas e Gabe talvez nunca me perdoem,
mas de uma coisa eu sei, nunca vou me perdoar.
Gatilhos: bullying, abuso sexual, tortura, violência e morte.
PROLÓGO
ESTEJA PRONTA ÀS 6.
A mensagem de Gabe me acorda às cinco da manhã e minha
cabeça ainda está doendo e que nojo, e não obrigada. Bebo um
pouco de água porque me recuso a acreditar que isso é ressaca, e
desidratação deve ser o verdadeiro culpado.
Depois de ontem, não consigo me obrigar a ficar brava por ele ter
me acordado, mas ainda não estou animada para encontrar com
Gabe tão cedo assim na porcaria da manhã sem um maldito motivo.
Ele me acompanhou até o quarto na noite anterior e me deixou
na minha porta em segurança, sem me julgar por gemer e
cambalear pela escada, então acho que estamos em um verdadeiro
acordo de paz, como se agora que eu me provei para ele, mentindo
a seu favor e o protegendo, ele vá dar uma chance verdadeira a
essa amizade e parar de descontar tudo em mim a cada segundo.
Eu me visto em roupas confortáveis, já que não tem nada aberto
no campus a não ser o refeitório nessa hora da manhã, então não é
como se eu precisasse impressionar alguém lá embaixo. Noto mais
uma vez o quanto minha camiseta está larga em mim, agora que
meus músculos estão bem mais tonificados, e eu de fato, mesmo,
preciso arrumar um jeito de arranjar uma renda para comprar umas
coisas novas.
Não consigo nem exibir meu trabalho árduo, droga.
Desço as escadas pisando forte, fazendo barulho suficiente para
acordar o prédio todo porque elas são todas umas vacas
fofoqueiras, de qualquer forma, então não estou nem aí se eu
arruinar a última chance delas de dormirem até tarde no feriado.
Chego na frente do prédio ao mesmo tempo em que Gabe, e pulo
direto para cima de sua moto quando ele me oferece o capacete
extra.
Já estou especialista em prender o capacete direto e subir na
moto atrás dele, então em um minuto já estamos voando pela rua
com o motor roncando. O sol da manhã já está brilhando no céu,
mas o vento fresco matinal ainda está pinicando a pele nua de
minhas mãos entrelaçadas na cintura dele. Quando enfim
estacionamos na frente do centro de TT, Gabe desliga o motor e
estende o braço para eu poder descer sem cair de bunda.
Não é o lugar que eu estava esperando, mas Gabe tem uma
chave para entrarmos e me conduz para dentro, acendendo luzes e
se enfiando dentro do vestiário masculino para pegar sua mochila.
Entro no vestiário feminino para fazer o mesmo, e o novo par de
tênis, que apareceu de forma mágico após o banho de sangue no
labirinto, ainda está de um branco reluzente, já que só usei uma vez.
Eu não sabia que a faculdade tinha um orçamento para substituir
itens danificados, mas suponho que haja um motivo para Draven
cobrar uma fortuna de mensalidade.
Gabe sorri quando me junto a ele, parecendo animadinho
demais, e resmungo:
— Você me tirou do quarto no raiar do dia, antes de acabar meu
toque de recolher, pra malhar? Como conseguiu contornar a
obsessão que North tem por me manter presa?
Meu tom de voz áspero e rouco faz Gabe sorrir ao colocar a
mochila no chão perto da parede e tirar a camiseta. Faço tudo em
meu poder para não assistir à contração de seus músculos
absurdos, mas sou só um ser humano e, caralho, ele é mesmo
gostoso demais para descrever.
Porra. Não, preciso parar de olhar antes que meu vínculo saia
para brincar.
— North não a matriculou em TT pra lhe torturar, não importa o
quanto você queira acreditar nisso. Vínculos estão sendo
sequestrados na rua pela Resistência todos os dias. Os que
ouvimos falar não são nem metade da quantidade real de casos.
Precisa saber como se defender, ainda mais considerando que você
não tem seu próprio dom para usar. Está indo bem em TT, mas
ainda nem cobrimos nada sobre defesa pessoal, e quando eu disse
para North que vou a ajudar a treinar, ele concordou que você
precisa de todo auxílio que puder.
Ai.
Quer dizer, é verdade, mas isso não significa que não doa ouvir
essas palavras saindo de sua boca. Ainda mais com ele ali sem
camiseta, procurando alguma coisa na mochila. Meu Deus, até suas
costas têm músculos definidos, como diabos você fica trincado
assim na nossa idade? Esse tipo de merda não leva tempo? Talvez
os genes de metamorfo ajudem e, meu Deus, estou gostando do
resultado.
— Você está babando — Gabe diz, com presunção pingando de
cada sílaba, e alguma coisa nesse momento me dá segurança de
flertar também, só um pouquinho.
Sei que não pareço nada com as garotas perfeitamente em forma
e com tudo empinado da classe, mas já demonstraram interesse por
mim o suficiente no passado para eu saber que não sou uma
mocreia completa. Quando solto minha mochila ao lado da dele e
tiro a camiseta, ficando apenas com o top de treino, transformo o ato
de me curvar para a frente, para procurar minha regata de treino na
mochila, em um espetáculo.
Ele solta um gemido e para de respirar.
Preciso engolir a alegria exultante que está subindo pela minha
garganta, e quando visto a regata pela cabeça, arqueio minhas
costas um pouco mais do que é necessário, fazendo meus peitos
parecerem mais empinados que o normal.
— Porra, isso é maldade pura. Estou aqui pra ajudá-la e foi você
quem decidiu que sexo está fora de questão — Gabe reclama, pega
sua garrafa de água e sai andando na direção de um equipamento
de musculação.
Dou risada, soando como uma idiota depravada, mas estou
cansada demais e convencida demais para importar com como me
pareço aos olhos dele neste momento.
— Eu jogo pra ganhar, você devia aprender essa lição agora
antes que seja tarde demais.
Ele encolhe os ombros e começa a preparar o equipamento para
mim.
— Você causou tanto dano que já estou imune, Fallows. Qual o
máximo que você consegue erguer no supino agora?
Droga.
Preciso ignorar a direta e forçar minha voz a continuar estável
quando digo:
— Dois quilos e meio.
Ele revira os olhos para mim, então me olha feio.
— Sei que está sendo insolente agora, mas se tivermos que
começar com dois e meio, isso vai levar uma eternidade. Você não
vai sair daqui nunca.
Bom, na verdade eu não estava brincando, mas não discuto
quando ele coloca dez quilos e acena com a cabeça para eu
começar. Não tenho pressa, em grande parte para irritá-lo, mas
também porque não tenho ideia se realmente vou conseguir fazer
isso.
Meia hora depois, decido que prefiro só... morrer.
Decido que vou deitar e morrer se a Resistência vier atrás de
mim, porque nada no mundo pode ser pior do que essa musculação
toda. Porra, e eu achava que os circuitos de treino de Vivian eram
ruins. Gabe, sem sombra de dúvida, o faria passar vergonha, e
começo a me arrepender de ter oferecido aquela bandeira branca
idiota para ele.
É assim que ele está me punindo por tê-los deixado.
— Não vou fazer mais nada. Se tentar me colocar em outro
aparelho, vou gritar de forma histérica e sair correndo daqui. Vou
procurar a polícia, os Desfavorecidos com certeza vão me ajudar a
escapar desse tipo de abuso.
Gabe revira os olhos para meu drama e, embora ele também
esteja suando por causa do exercício, sua voz sai estável e nem um
pouco ofegante como a minha.
— Pode reclamar para Gryphon mais tarde se está odiando, foi
ele quem montou o treino. Ele parecia achar que você aguentaria,
mas acho que posso ligar para ele e dizer que você desistiu.
Porra.
Que droga, ele descobriu o jeito exato de como me fazer cair que
nem a porra de um patinho, porque essa merda é que nem acenar
uma bandeira vermelha para um touro e no mesmo instante volto a
levantar pesos e torcer para morrer. Preciso de cada técnica de
distração que já aprendi para conseguir, mas aguento uma hora
inteira e meu corpo colapsa no tatame assim que ele murmura que
acabamos.
— Não vou carregá-la de volta para os dormitórios, então é
melhor você se recompor, Vínculo.
Eu o xingo, mas sai como uma confusão ininteligível de gemidos
e ofegos que só faz Gabe rir. Não há chances de que um dia eu vá
conseguir me mexer de novo, então só aceito que agora moro aqui,
nesse exato lugar do tatame. Preciso muito tirar essas roupas
nojentas e suadas, mas minha mochila está a pelo menos um metro
e meio de distância e quase choro ao pensar em alcançá-la sozinha.
Gabe escarnece do meu choramingo e traz a mochila para mim
enquanto se dirige ao vestiário masculino. Ouço o chuveiro ligando
e acho que tenho cerca de dez minutos para me erguer do chão.
Vou precisar de cada segundo.
*
Decido que ser amiga de Gabe pode acabar sendo uma
complicação que não vale a pena se ele vai insistir em me fazer
malhar todas as manhãs, mas quando enfim consigo sair do chão,
ele nos leva para o refeitório e comemos juntos em um silêncio
agradável que nenhum de nós quer interromper.
É um choque para mim a quantidade de alunos que conhecem e
amam Gabe, e passo metade do tempo em que comemos sendo
apresentada a alguém novo que parou para conversar sobre alguma
coisa de esportes com ele ao passar pela mesa. Sou educada, mas
não amigável porque, sendo sincera, meu círculo social já está
começando a ficar grande demais para o meu gosto. Eu estava feliz
só com Sage, mas agora tenho Sawyer, Félix, Gabe e, merda, Atlas,
cujas mensagens ainda são a primeira coisa que vejo quando
acordo e a última coisa que leio antes de adormecer todas as noites.
Não posso me dar ao luxo de ter todas essas pessoas sentindo
minha falta quando as abandonar.
Invento uma desculpa para Gabe sobre precisar terminar alguns
trabalhos e ele me acompanha de volta ao dormitório sem
questionar minha mudança de humor repentina. Quando estou no
meu quarto, mando mensagens para Sage e Atlas com a mesma
desculpa sobre estudar e depois passo o resto do dia fuçando no
meu celular e tentando não surtar por estar presa aqui com todas
essas pessoas de quem estou começando a... precisar. Porra,
necessito de todos eles. Preciso da amizade deles como nunca
necessitei de nada antes e isso me deixa bem ferrada.
À tarde, por fim me obrigo a abrir meus livros, então por volta da
meia-noite, quando parece que meus olhos já estão sangrando, eu
me arrasto para a cama.
Acordo às quatro da manhã com meu celular tocando.
Ignoro, porque que se foda qualquer um dos meus Vínculos que
esteja tentando estragar minha semana me acordando a essa hora.
Reviro na caminha de merda e cubro a cabeça com o travesseiro
quando o telefone começa a tocar de novo. Sei que é melhor não
ignorar, sei que eles não estariam fazendo isso só para me irritar, e
que com certeza tem algo importante acontecendo, mas depois de
treinar com Gabe ontem, fiquei absolutamente exausta.
Não é tão fácil ignorar as batidas à minha porta que começam
dez minutos depois.
Porra, pode ser que eu assassine quem quer que esteja aqui.
Disparo para fora da cama e abro a porta de uma vez, pronta
para derramar sangue, mas encontro Gabe parado ali, ofegante e
surtado. Esqueço minha fúria por ter sido acordada enquanto o
examino. Ele não está usando nada além de um short de basquete
e cada centímetro de sua pele dourada está brilhando sob a luz do
meu abajur porcaria.
Caramba, ele é magnífico.
Algumas portas se abrem no corredor e garotas mal-humoradas
colocam a cabeça para fora, e me encaram como se fosse minha
culpa Gabe ter aparecido aqui fazendo um escândalo no raiar da
merda do dia.
— Onde está seu celular? Por que diabos não atendeu? — Gabe
diz rouco, mas estou ocupada demais tentando reiniciar meu
cérebro quebrado para responder, todo meu atrevimento e
sarcasmo de costume desapareceram graças à aparência dele e,
quando passa por mim para entrar no meu quarto, noto seus pés
descalços. Meu cérebro pode não estar funcionando por completo,
mas compreendo uma coisa.
Ele mudou de forma e correu até aqui.
— O que aconteceu? Droga, Gabe, o que diabos está
acontecendo? — Fecho a porta e me recosto nela, tentando com
todas as forças não olhar para ele enquanto anda de um lado para o
outro, examinando tudo como se esperasse ter que nos defender
contra um maldito exército inteiro espreitando por trás da porcaria
do meu espelho rachado.
— Doze Favorecidos foram levados hoje à noite. Três deles
desse prédio, estavam voltando de uma festa e foram pegos do lado
de fora. North disse que seu GPS não tinha saído do lugar, mas...
eu precisava ver por mim mesmo.
Porra.
Porra. Isso está saindo de controle, se eles não me deixarem ir
embora logo vou acabar sendo pega, e isso vai ser o fim de tudo. O
medo me faz retrucar:
— Não preciso de uma porra de babá!
Ele volta a se virar para mim e rosna:
— Então atenda a porra do seu celular!
Estou mais aberta do que de costume, porque na verdade é bem
fofo pensar que ele correu o caminho todo até aqui só porque não
atendi meu celular, mas ainda estou tendo um surto a respeito de ter
amigos e Vínculos me segurando aqui.
— Você mesmo disse que North verificou o GPS, não tinha
motivo para correr aqui e acordar a droga do prédio todo!
Ele estreita os olhos para mim, então seu peito sobe e desce
enquanto ele respira fundo para se acalmar, o que talvez signifique
que ele está tentando encontrar um pouquinho de paciência para
lidar com minhas baboseiras.
— Você disse que éramos amigos... bom, é isso que amigos
fazem, Oli. Quando não atendeu seu celular, precisei ter certeza de
que não tinham levado você. Ser minha amiga é desse jeito, é pegar
ou largar.
Não tenho escolha a não ser pegar, porque estou cansada
demais para discutir com Gabe. Não posso mudar nossa situação, e
com certeza não posso baixar a guarda perto dele, mas toda a
disposição para brigar com ele que costumo ter, apenas
desapareceu.
— Ok. Está bem, certo, agora você sabe que estou viva e
prometo que vou atender a merda do celular da próxima vez. Vá pra
casa e me deixe dormir mais algumas horas.
Eu me jogo na cama, e nesse momento percebo que não estou
vestindo nada além de um short velho e regata, mas ou Gabe não
reparou, ou não fez comentários sobre o quanto me pareço com
uma mendiga, graças a Deus. Volto a me deitar sobre o travesseiro
horrível e tento ficar confortável, mas é impossível com ele parado
ali, observando-me como se eu fosse tão absurdamente
interessante aqui no meu quartinho de merda que não tem sequer
um objeto pessoal. Nem mesmo um lençol ou cobertor decente.
Olho feio para Gabe, o que ele ignora por completo ao se sentar
no chão, com as costas apoiadas na porta e os olhos brilhando um
pouco na escuridão, o único sinal de que ele está tendo dificuldades
de controlar seu dom no momento.
Porra, não quero mesmo brigar com ele, e digo com minha voz
esganiçada e exausta:
— Ainda estou cansada, Gabe, por favor, só me deixa dormir.
Ele dá de ombros e olha pela pequena janela suja.
— Não vou deixar você sozinha aqui enquanto a porra da
Resistência está sequestrando gente. Só vai dormir e de manhã vou
ao refeitório com você antes da aula.
Suspiro e puxo o cobertor até meu queixo, mas é bizarro demais
tentar dormir com ele sentado ali, então desisto antes de sequer
tentar.
— O que o Conselho está fazendo quanto a isso? Não vá me
dizer que estão sentados deixando as pessoas serem sequestradas.
Ouço Gabe soltar um longo suspiro, mas mantenho os olhos no
teto.
— Alguns deles querem fazer isso mesmo. São covardes demais
pra montar um plano e ir atrás deles, estão falando umas besteiras
sobre serem pessoas superiores e manterem a paz.
Dane-se isso, não tem essa de ser superior quando se trata
dessa gente. Vão pegar qualquer fraqueza ou demonstração de
moralidade e usá-la para te destruir.
Sei disso por experiência própria.
— E o que North acha disso? O que ele está fazendo pela
comunidade com todo aquele dinheiro e poder que tem? — Minha
voz está mordaz, Gabe não me responde por um minuto, e o quarto
cai em um silêncio carregado, repleto de todos nossos segredos.
Meu celular vibra embaixo do travesseiro e, sem pensar, eu o tiro
para ver a mensagem de Atlas.
Ouvi falar sobre os sequestros. Teve sete aqui durante a noite
também. Vou insistir por uma transferência, não vou ficar sentado
aqui e deixar você enfrentar essa merda sozinha.
Engulo em seco porque não quero que ele venha. Atlas é a
pequena alegria a qual me permito por causa da distância entre nós.
Se ele aparecer aqui, vou ter que afastá-lo assim como fiz com os
demais, e isso me deixa devastada neste momento.
— De quem é esse celular?
Porra.
Eu o enfio debaixo da coberta, mas não adianta esconder agora,
Gabe já viu e já percebeu que não é o modelo mais antigo de
iPhone que North me deu. Não, é o reluzente e novinho em folha
que Atlas me enviou. Está no plano dele, e me permito aceitar isso
porque ele é o único para quem já mandei mensagem por aqui.
— Oli, onde você arrumou isso?
Reviro os olhos, então dou as costas para ele, porque mais uma
vez ele está me provando que todos eles acham que são meus
donos e têm o direito de tirarem cada uma das minhas liberdades.
— Atlas o enviou para mim, agora corre para me entregar para
North como o bom cachorrinho que você é.
O silêncio se faz mais uma vez, então ele murmura baixinho:
— Porra, você é uma vaca, Fallows.
Mesmo assim, ele não se levanta, até que chega o momento em
que o sono me domina.
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SOMOS MAIS UMA VEZ jogados nas aulas como se nada tivesse
acontecido e é estranho pra caralho.
Gabe finge que não discutimos sobre sua visita espontânea ao
meu quarto e sobre o celular, e começamos a passar todas as
manhãs no centro de treinamento nos exercitando e repassando a
rotina de exercícios de defesa pessoal de Gryphon. North não
aparece na minha porta para arrancar meu celular, então tenho que
presumir que Gabe ficou de boca fechada a respeito. Mais ninguém
parece preocupado com os sequestros, embora eu note a
segurança extra no campus, os guardas nos vigiando de forma
discreta enquanto nos locomovemos entre os blocos.
Sawyer fica colado do lado de Sage, e só a deixa para ir para
suas próprias aulas, e tenho certeza de que só faz isso porque sabe
que Gabe está nos acompanhando. Quanto mais olho pelos
corredores, mais percebo que as pessoas estão andando em
grupos, como se todos os Vinculados estivessem ficando juntos por
segurança, então talvez não estejam tão imperturbados quanto
parecem à primeira vista.
Na sexta-feira, Gabe e eu nos separamos de Sage e Sawyer e
nos dirigimos ao TT, e, mesmo com todos os treinos extras que
estamos encaixando antes das aulas, eu me vejo temerosa em
voltar lá com os outros alunos. Fico esperando que Vivian decida
nos levar de volta ao labirinto, e meu corpo ainda está sentindo as
dores da última vez.
Ele não faz isso.
Quando estou vestida em minhas roupas de ginástica e entro na
área de treinamento, encontro vários caras de Equipes Táticas
espalhados. Metade deles se vira para dar uma boa olhada em mim,
o que é bastante desanimador, em especial quando fica claro que
eu os conheço.
São os que me pegaram e me arrastaram de volta para cá.
Estou prestes a andar até um deles, o cara que me derrubou e
me segurou no chão da cafeteria em que eu trabalhava, e chutar as
bolas dele com tanta força que até seus malditos ancestrais sintam,
quando Vivian grita para começar a aula.
— Vamos voltar para o tatame e trabalhar técnicas de defesa
pessoal.
Espero o mesmo tipo de gemidos que o porão despertou de
todos, mas, em vez disso, uma animação quase que instantânea se
espalha. Todas as garotas começam a olhar umas para as outras, e
os caras a flexionar os músculos, como se essa fosse uma
oportunidade de impressionar.
Continuo no meu lugar de costume atrás do grupo, mas Gabe se
aproxima para ficar comigo e dois dos seus amigos do futebol se
juntam a nós, dando um aceno respeitoso de cabeça na minha
direção. Bato meu ombro de leve em Gabe, aponto para o cara da
Equipe Tática que quero assassinar a sangue frio, e pergunto:
— Qual o nome dele?
Ele franze o cenho e se inclina para murmurar baixo no meu
ouvido.
— Kieran Black. É o segundo em comando de Gryphon e tem um
temperamento difícil, então fique longe dele.
Concordo com a cabeça, mas acho que ele está se esquecendo
de que eu também tenho um temperamento difícil, e ele já foi
incendiado, está queimando dentro de mim e pronto para botar fogo
naquele filho da puta.
— Vamos ver quanto vocês todos já esqueceram, sim? Hanna,
Ty, vão para o tatame e repassem as posições, os ataques e
bloqueios que já treinamos.
Um dos amigos de futebol de Gabe avança, assim como uma das
garotas. Hanna não é uma fofoqueira ou uma das assanhadas, e
seus ombros são tão musculosos e definidos que acho que ela vai
esmagar qualquer um que a enfrente, porque ela sem dúvida é
fodona. É quase o suficiente para fazer me sentir bem intimidada.
Bem, é isso.
Porém o lance é que já tenho treinado essas posições, graças ao
tempo que passo com Gabe, mas não sou idiota a ponto de contar
isso para alguém. Fico só assistindo enquanto Hanna e Ty
repassam os movimentos, como se estivesse vendo algo novo.
Hanna é muito melhor do que eu, é claro, mas a movimentação
de pés de Ty é desleixada. Percebo ao mesmo tempo que Vivian,
cuja boca está curvando para baixo e, quando ele chuta o calcanhar
de Ty, o par vai pro chão em um montinho ofegante, grunhindo.
Abafo um risinho que me rende uma olhada feia de Kieran.
Gryphon não faz nenhuma tentativa de olhar em minha direção, o
que já sei que se deve à sua crença de que sou uma pirralha
desprezível, então isso dói um pouco.
Uma vez que voltam a ficar de pé, Vivian avança para o espaço
vazio e fala com sua voz retumbante:
— As regras são simples, vence o primeiro a colocar os ombros
do oponente no chão, e sob nenhuma circunstância vocês têm
autorização de usar seus dons.
Ah, perfeito, o tipo exato de competição que eu de fato tenho uma
chance de vencer, e considerando as posições e movimentos que
Gabe tem treinado comigo, estou bem confiante de que vou
derrotar... alguém. Mesmo que seja só a primeira pessoa que me
subestime, vai ser bom para minha autoconfiança e meu humor
depois desse show de merda que foi a semana que tivemos.
Talvez meus Vínculos me deem um tempo se souberem que
posso me defender mesmo sem um dom. Duvido, mas, ei, existe
uma esperança.
— Fallows, suba no tatame. Preciso ver o quanto você está
atrasada nisso para poder descobrir como diabos vou lhe nivelar.
Reviro os olhos para Vivian antes de sorrir para ele.
— Se continuar pegando no meu pé, as pessoas vão comentar,
velhote.
Todos os caras da Equipe Tática na minha frente ficam rígidos,
como se estivessem chocados por eu falar com seu amado
treinador desse jeito, mas Gryphon só balança a cabeça, ainda
mantendo os olhos em qualquer lugar, menos em mim.
Odeio tanto isso.
— Para com essa merda. Não vou deixar você de fora só porque
fala demais. Vai lá, derrube Hanna no tatame e vou ficar
impressionado o suficiente para não fazer você dar voltas correndo
por ser uma linguaruda.
Rio dele, embora comece a me aproximar.
— Se você acha que isso é ser linguaruda, ainda não me viu
dando o meu melhor, mas certo, me jogue no precipício para seu
próprio deleite doentio.
Gabe sorri, abaixando a cabeça para o tatame para que Vivian
não veja que ele está se divertindo comigo provocando o velho
treinador. Tenho a impressão de que ele não se safaria disso tão
bem quanto eu.
Hanna é muito musculosa e, quanto mais me aproximo dela, mais
hesito, pois não esperava que ela fosse tão sólida de perto. Ela não
sorri ou tenta me provocar, só espera eu tirar meus sapatos e subir.
Ficamos paradas ali, olhando uma para outra, até Vivian decidir
começar o combate:
— Vai.
O primeiro erro dela é ir direto para a ofensiva, disparando para
mim e atacando, mas, depois de uma semana com Gabe fazendo a
mesma coisa, estou preparada. Usar o impulso dela contra ela
mesma, jogá-la por cima do meu ombro e plantá-la no tatame é tão
fácil como respirar.
Gabe é no mínimo o dobro do tamanho dela, então sou um pouco
brusca, mas antes que eu possa soltá-la e pedir desculpa por ser
uma babaca, ela dispara seu dom contra mim e me manda voando
pela sala, jogando-me contra uma parede.
O gritinho que sai de mim é vergonhoso, mas não consigo
impedir meu choque por ela ter quebrado as regras só porque eu a
derrotei com muita eficiência.
— Jesus Cristo, será que a gente algum dia vai passar uma aula
sem algum de vocês machucar a Fallows? A menina vai precisar de
uma carteirinha do pronto-socorro desse jeito — Vivian resmunga,
mas me forço a ficar de pé e aceno com a mão para ele.
— Estou bem, não precisa ficar nervosinho pensando na
papelada.
Os alunos ao meu redor soltam uma risadinha nervosa, como se
achassem que que vão ser assassinados por estarem rindo comigo.
Esfrego a parte de trás da minha cabeça, mas não estava
fingindo, estou mesmo bem. Fico surpresa quando Hanna aparece
na minha frente franzindo a testa.
— Desculpa, não acredito que fiz isso! Não perco controle do
meu dom há anos. Não faço ideia de como isso aconteceu. Você
está bem? Precisa de ajuda pra ir até a enfermaria?
Ela parece bem sincera, e só gesticulo para ela deixar para lá.
— Não é a primeira parede em que me jogam, sem problemas.
Ela concorda com a cabeça, levanta-se e vira para encarar
Vivian, mas continua perto de mim como se estivesse esperando eu
desmaiar ou algo do tipo. Tento voltar a me concentrar na aula, mas
é como se a energia do lugar tivesse mudado e agora a tensão está
emanando de todos os lados. Olho ao redor, mas não há sinal de
onde isso está vindo, então forço minha atenção de volta aos
combates ocorrendo no tatame.
Sou obrigada a ficar sentada pelo restante da sessão, mas uma
competição árdua se inicia e é legal demais assistir. Rodada após
rodada, assistimos enquanto os grupos se tornam cada vez
menores. Sinto um tipo estranho de orgulho de Vínculo por Gabe
vencer todas as lutas, até ser o último de pé.
Vivian resmunga um “muito bom” para ele, mas Gabe se
empertiga como se tivesse recebido elogios intermináveis, e é bem
bizarro. Todos voltamos aos vestiários para trocar de roupa e Hanna
continua um pouquinho perto demais de mim o tempo todo. Começo
a achar que o pedido de desculpa dela foi só de fachada e ela está
prestes a me dar um soco enquanto estou de calcinha, mas quando
a porta do vestiário fecha, ela inspira fundo.
— Puta merda, sério mesmo, achei que estava prestes a ter
minha vida toda destruída pela Equipe Tática inteira do Shore por
ter jogado você longe. Juro, não tive intenção de fazer isso. Não
tenho ideia por que meu dom se descontrolou.
As palavras dela saem de uma vez e levo um segundo para me
lembrar que o sobrenome de Gryphon é Shore.
— Está tudo bem, é provável que só ficaram chocados por você
ter desrespeitado as regras de Vivian. Não estou ferida, não se
preocupe com isso.
Ela geme e tira as roupas para vestir seu jeans e camiseta. Eu
fico um pouco mais constrangida em me trocar na frente de todos,
mas é só por que metade das minhas roupas não me servem mais e
é vergonhoso não poder me vestir do jeito que eu quero.
— Todos nós sabemos o que aconteceu com Zoey, sei que não
devo perder o controle perto de você. Nunca mais vou deixar isso
acontecer.
Franzo o cenho para ela, mas Hanna ainda está resmungando
pra si mesma e preciso a interromper para dizer:
— Zoey perdeu a posição porque atacou alguém da sua equipe,
não teve nada a ver comigo. Fica de boa, Gryphon na verdade não
me suporta. Você vai ficar bem.
Ela para e me encara por um instante, então nega com a cabeça.
— Ele visitou a família dela pessoalmente. Eu estava na casa
dela terminando um trabalho que fizemos juntas, e foi a coisa mais
aterrorizante que já vi. Merdas pessoais à parte, você ainda é o
Vínculo dele, e Gryphon Shore não é alguém que você decide irritar
por simples capricho.
Hanna joga a mochila por cima do ombro e sai apressada, antes
que eu possa decifrar metade do que ela disse. Fico parada no
vestiário até ele esvaziar, agarrando meu moletom com as mãos,
enquanto questiono tudo que pensei que sabia sobre esses meus
Vínculos.
*
Quando Gabe e eu chegamos na mansão de North para nosso
jantar de Vínculos, ainda estou uma pilha retorcida e desordenada
de emoções. Não gosto de me sentir assim, não sei qual é minha
situação de verdade com qualquer um deles, e Gabe fica me
olhando como se eu estivesse prestes a me debulhar em lágrimas.
Quer dizer, ele não está tão equivocado, isso talvez aconteça.
Ele destranca a porta da frente como sempre, mas quando
entramos, somos logo interpelados por duas funcionárias da casa e
pelo motorista de North. Gabe não parece preocupado, mas me
sinto muito desconfortável porque já vi essas pessoas dúzias de
vezes e ainda não sei seus nomes. Eu me sinto uma elitista e otária
por não ter me apresentado para eles de forma adequada.
O motorista inclina a cabeça para mim em um gesto respeitoso e
gesticula para as funcionárias.
— Srta. Fallows, o conselheiro Draven vai comparecer a um
jantar na cidade esta noite e a senhorita vai se juntar a ele. Ele está
em um telefonema no momento, mas deixou instruções para que
esteja pronta daqui a uma hora, então precisamos agilizar.
Ah, porra não. Absolutamente não.
— Eu não...
— Srta. Fallows, precisa mesmo se apressar. O conselheiro
Draven não vai estar disponível para conversar com a senhorita por
algum tempo e temos muito a fazer.
Estou prestes a virar e correr gritando de volta para o campus,
mas Gabe planta uma das mãos nas minhas costas e me dá um
empurrão gentil na direção das funcionárias, impelindo-me para toda
essa farsa de noite.
Sou conduzida por um labirinto de casa até um quarto em algum
lugar do segundo andar e, assim que entro, há mulheres
“trabalhando” em mim, despindo-me e se esforçando para me
transformar na Vínculo bonita, obediente e calada que North quer
esta noite.
Entendo que a culpa não é da mulher que está me vestindo em
um deslumbrante vestido Dior, ou da tímida garota cuidando dos fios
em tom de lavanda do meu cabelo, então fico de boca fechada e as
deixo fazerem seu trabalho. Posso assassinar o traseiro pretensioso
de North quando ele rastejar para fora de qualquer que seja a rocha
em que está se escondendo.
Os funcionários são bons demais em saber como lidar comigo,
então, em vez de me conduzirem escada abaixo até onde North
está, eles me levam direto para a garagem em um elevador que eu
não sabia que existia e me depositam direto dentro de um dos Rolls-
Royce dele, trancando as portas para eu não conseguir escapar.
Preciso usar uma variedade de técnicas de meditação que
aprendi no decorrer dos anos para me acalmar, porque estou
prestes a esfaquear alguém. Não ajuda em nada eu estar perto de
menstruar e que todos esses hormônios extras estejam me
deixando tão sedenta por sangue que meu dom está me implorando
para sair para brincar.
Estou envolta de forma segura pela concha de uma atitude fria
quando North enfim chega e escorrega para o assento ao meu lado,
sem ao menos me cumprimentar ou pedir desculpas, e eu o ignoro
por completo.
Vou acabar com ele durante esse jantar.
Ficamos em um silêncio infernal e desconfortável no trajeto até a
cidade.
Faço o melhor que posso para não ficar mexendo no vestido,
mas nunca usei nada tão chique na vida. Uma parte de mim está
preocupada que eu pareça uma idiota, como uma criança brincando
de se fantasiar com as roupas da mãe, e North me ignorar dessa
forma não ajuda nem um pouquinho. Ele nem está com o celular na
mão como desculpa, está apenas olhando pela janela com uma
carranca como se fôssemos um casal de velhinhos que gosta de um
silêncio forçado mais do que tudo.
É só quando paramos em uma luz vermelha na frente do
restaurante que ele por fim fala comigo.
— Esse jantar é sobre mais do que você e sua atitude. Se você
se importa mesmo com a comunidade Favorecida tanto quanto diz,
vai se comportar o melhor que pode, seja lá o que isso signifique.
Odeio esse cara.
Odeio North e todas as suas manipulações. Cada parte dessa
experiência veio de ele ter me observado e aprendido a meu
respeito sem que eu notasse, só para então usar tudo isso contra
mim e conseguir exatamente o que quer.
Odeio não, desprezo.
O motorista para na área dos manobristas, e North o espera abrir
a porta para nós dois, ajeitando o Rolex em seu pulso e endireitando
os ombros como se estivesse se preparando para ir à guerra.
Eu me controlo e me preparo para fazer a coisa certa, posso
esperar até o fim da noite para arrancar seus olhos com as unhas
por ser o pior ser humano que já conheci, e estou incluindo a
escória que ele chama de irmão nessa avaliação.
North me ajuda a descer do carro, então me conduz para dentro
do restaurante e até uma mesa com a mão firme nas minhas costas.
A pele por baixo de sua mão está quente e formigando, e preciso
dizer para meu vínculo se acalmar nessa porra porque nós o
odiamos. Ele não gosta de mim, não me trouxe aqui como seu
amado Vínculo, sou só um peão em seu tabuleiro de xadrez.
Os outros membros do Conselho se levantam de suas cadeiras
quando nos aproximamos. Meus joelhos começam a tremer porque
isso é pressão demais para jogar em mim sem nenhum aviso ou
preparo. Ele apenas espera que eu saiba que porra fazer aqui e,
sendo honesta, é bem provável que vou ferrar tudo mesmo sem
querer.
Há pelo menos vinte pessoas presentes e todas elas sabem meu
nome, e me cumprimentam quando falam com North, e me sinto
uma idiota parada aqui com ele nesse vestido, maquiada, em cima
de salto alto e com essa droga de cabelo lavanda!
Todos me olham de cima a baixo, avaliando cada centímetro
meu, e isso faz com que eu me sinta uma leitoa premiada em uma
feira rural. Cada um deles quer registrar todos meus atributos, como
a extensão das minhas pernas, os tons azuis dos meus olhos, qual
é minha postura exata, e me dar uma nota de acordo. Posso dizer
quais deles decidiram que não estou à altura dos seus padrões e
aquela raiva violenta faísca dentro de mim de novo.
North puxa a cadeira para mim e eu murmuro um “obrigada” ao
me sentar com cuidado, alisando o vestido sobre minhas coxas em
uma tentativa de me acomodar.
Quase pulo para fora da minha própria pele quando North se
debruça e beija o topo da minha cabeça, como se eu fosse alguém
preciosa para ele, e preciso morder a língua. Isso tudo é uma
atuação, uma demonstração de união e controle para ninguém
questionar seu poder e integridade.
Mas sei muito bem quanta tortura consigo aguentar e não tem
ninguém nessa sala que possa arrancar essa verdade de mim. No
entanto, North é mesmo um político bom pra caramba.
Concordo com cada pedacinho de fofoca a respeito das políticas
e projetos dele que ouvi desde que fui arrastada até o campus
Draven, como a comunidade Favorecida fazer mais para ajudar os
Desfavorecidos, ou encontrar soluções melhores para a questão dos
Favorecidos órfãos, agora que a Resistência tem sequestrado e
matado tantos Favorecidos. Ele não quer ficar sentado assistindo as
pessoas sofrerem, ele é proativo quanto à segurança e sobre nivelar
a diferença de riqueza entre as famílias das classes mais altas e os
Favorecidos de áreas mais humildes.
Não tenho escolha aqui, a não ser bancar o Vínculo obediente.
Coloco um sorriso meigo no meu rosto e faço contato visual com
todas as pessoas à mesa. Quando North se senta ao meu lado,
coloco minha mão na dele por cima da mesa, onde todos podem
ver, porque se ele tem direito de fazer um show, também tenho.
North não reage, seus dedos apenas contraem de leve sob meu
toque, e tento não pensar a respeito da repulsa que meu Vínculo
sente com a sensação da minha pele na dele. Porra, como vou
suportar esse jantar inteiro sem ter uma droga de colapso ou
estourar com ele? É muito difícil, mas mantenho o sorriso colado no
meu rosto, mesmo quando meu próprio vínculo começa a se
lamentar dentro de mim.
— Então, tudo voltou a estar bem no seu mundo, Draven? — o
homem diz mais velho de aparência distinta na extremidade da
mesa. Ele é bem bonito, mas há alguma coisa de desconcertante no
sorriso em seu rosto.
Sua Vinculada é uma mulher magra de aparência desesperada,
sentada ao lado dele apontando um sorriso de escárnio na minha
direção. Ela nem mesmo tenta disfarçar o desdém que sente por
mim, e me vejo sentando mais empertigada e me colocando em
uma pose de luta, porque nada me deixa pronta para uma briga
como um olhar de repulsa.
— Oleander precisava de um tempo para se conhecer. Ela tem
uma tendência selvagem que nenhum de seus Vínculos queria
sufocar, embora estejamos felizes de tê-la conosco mais uma vez.
— A voz de North é suave e profunda, e ele gesticula para meu
cabelo como se a cor só provasse que sou muito com o que lidar, e
não uma garota de 19 anos com livre-arbítrio e meu próprio senso
de personalidade.
Sorrio e pisco de forma encantadora para ele como se tivesse me
elogiado e estivéssemos em perfeita sintonia, não temos nenhum
problema aqui, estamos absolutamente encantados de estarmos
presos um ao outro pelo resto de nossas vidas por causa desse
vínculo idiota.
Os dedos dele apertam os meus de novo, e não sei se é um
aviso para eu deixar para lá, ou se está mostrando surpresa pela
facilidade com que decidi concordar com essa besteira que está
forçando para cima de mim.
— Eu mesmo estou muito feliz em ver os dois juntos. North faz
muito pelo nosso povo para merecer ser abandonado por uma
criança indisciplinada — a mulher sentada diz à minha esquerda.
O olhar dela penetra no meu e dou o meu melhor para não
desviar os olhos, para não me acovardar diante dessa tentativa de
demonstração de poder. Ela está arrumada com perfeição, com o
cabelo preso em um penteado cuidadoso e um vestido cujo
caimento sobre o peito exibe seus seios através da renda verde-
esmeralda, fazendo dela a imagem da elegância. Ela está mexendo
o coquetel com seu dom, girando o dedo sobre a borda do copo em
uma tranquila exibição de poder que muitos dos membros do
Conselho à mesa observam com desconfiança.
O que me faz imaginar do que todos eles são capazes.
North ri baixinho e puxa minha mão para debaixo da mesa, de
modo que nossas mãos unidas repousam em cima de sua coxa. Os
olhos da mulher acompanham o movimento e a vejo se encolher. Ai
meu Deus. Ai meu Deus, porra, essa é uma de suas ex-namoradas,
que veio me provocar porque está irritada por eu ser o Vínculo dele.
Ela está sentada aí dizendo besteira para mim não porque deixei
meu Vínculo para trás, mas porque está irritada por eu ter voltado e
agora ela precisa competir comigo.
Bem, isso é uma piada, porque não quero nada com esse filho da
mãe insensível. Meu sorriso se transforma em uma exibição de
dentes.
— Estou ciente de como meu Vínculo é maravilhoso, obrigada.
Será que esse jantar já pode acabar, por favor?
Algo tão simples quanto descobrir que meu Vínculo esteve
mandando ver com uma das convidadas do jantar é o suficiente
para mudar meus planos de apresentar uma frente unida.
North consegue sentir a mudança no mesmo instante, e me
pergunto se é uma habilidade inata de ler as pessoas, ou se tem
algo a ver com qualquer que seja o dom que ele esconda sob seus
ternos perfeitos. Seus dedos apertam os meus de novo, e eu os
arranco de suas garras.
Se ele achava que eu era uma pirralha petulante antes, não faz
ideia do que esse jantar despertou em mim agora. Posso estar
disposta a contrair a mandíbula e me esforçar aqui pelo bem maior,
mas no segundo em que estivermos fora desse lugar, vou destruir
esse cuzão.
19
J Bree é uma sonhadora, escritora, mãe, agricultora e criadora de
gatos.
A ordem das prioridades muda diariamente.
Ela mora em uma pequena fazenda em uma pequena cidade
rural na Austrália, da qual ninguém nunca ouviu falar. Ela passa os
dias sonhando com todos os seus namorados das histórias de
livros.
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