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Nota da autora:

O livro possui conteúdo sensível que pode ser gatilho para alguns leitores:
abandono parental, abuso sexual e psicológico, tentativa e suicídio
Livro não recomendado para menores de 18 anos.
Copyright © 2023 Thamy Bastida
Todos os direitos reservados
Revisão: Lidiane Mastello

Esta é uma obra de ficção, nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos, são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.

Todos os direitos reservados.

É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte


dessa obra, através de quaisquer meios (tangível ou intangível) sem o
consentimento escrito da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código
Penal.2018
“Dedico à minha mãe Ana, que sempre foi
uma mulher forte e guerreira, um exemplo de mulher...
Dedico também a todas as mulheres do mundo
que foram fortes como a Anny.
Mulheres que lutaram e lutam como ela.
Vocês são incríveis e maravilhosas,
nunca deixem que tirem seu valor!”
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
Bônus Final
Agradecimentos
Olhei para o vídeo, sentindo a raiva crescer dentro do meu peito,
fechei meu punho com força, ignorei a dor em minha cabeça e sorri vendo a
imagem que me frustrava por inteiro.
Ele estava me desafiando, provocando-me, mas esse infeliz só viu o
meu lado complacente. Queria lhe parabenizar por sua coragem de tentar
me ferrar. Muito corajoso, confesso.
Ergui-me, ajeitei meu terno e minha gravata, olhei mais uma vez para
a imagem e dei as costas, saí da sala sabendo que estava sendo seguido.
— Achem esse filho da puta e o tragam até mim — ordenei, sentindo
as minhas mãos tremerem.
— De qual forma, senhor?
— Usem seus critérios, só o tragam até mim — rosnei, olhando
dentro de seus olhos e vendo o medo que minha expressão causava.
Vivo ou morto, morto ou vivo, tanto faz.
Só o queria longe da minha família e da minha vida.
Cansei de ser calmo...
Sentado em meu escritório, olhei para o arquivo que ultimamente
vinha mexendo mais que o normal, li mais uma vez o documento que meu
irmão Alexandre me trouxe sobre o André Rizzi...
Olhei para a imagem no meu computador, ainda não acreditava
completamente de onde ele veio e a forma como ele chegou até nós em tão
pouco tempo. Para ser sincero, ele sempre esteve aqui, atrás de nós, diante
dos nossos olhos e fomos incapazes em vê-lo. Eu sei que preciso me
preparar para o pior e já vinha fazendo isso desde o dia em que descobri sua
existência...
André Rizzi, o irmão inexistente que sempre existiu, a pessoa cruel
que quase conseguia superar sua mãe, Júlia Maria. Contudo, ainda não
sabia informar qual dos dois era o pior. Na minha humilde concepção
ambos empatavam, mas na minha na minha alma queria fazê-lo sofrer
assim como minha doce menina sofreu...
Descobri sua existência da mesma forma que sempre soube a minha,
mas agora seria minha vez de caçá-lo e observá-lo, querido cunhado. Agora
era minha maravilhosa vez de ver você sangrar, sua mãe te escondeu e fez
de você uma versão masculina dela, mas da mesma forma que hoje ela
pagava pelos seus crimes, você também pagaria...
Sabia que ele me aguardava da mesma forma que o aguardava...

Que começasse os jogos mais do que imortais, neste jogo o único


vencedor seria minha pessoa e não me importava o quão ferido eu saísse...
Guerra é guerra!
E ele, André Rizzi, se tornou meu inimigo mortal...

Desliguei meu computador e olhei para o relógio.


Hora de ir...

— Às vezes temo que ela não vá dar conta de tudo, sei que muitas
vezes sou protetor em excesso, mas apenas não gosto de sentir que ela está
sobrecarregada. Ninguém nasce sabendo, eu não nasci, mas compreendo
que talvez para ela seja mais difícil do que o normal cuidar dos trigêmeos.
Tem noites que acordo, e ela está sentada olhando para o nada e há dias que
vejo que ela está prestes a surtar, mas estou de mão atadas. Não posso
simplesmente chegar nela e dizer o que fazer, ela tem que seguir a própria
direção. Dizer a ela que tipo de mãe ela deve se tornar não é uma escolha
minha, eu queria que fosse, mas não é! ­— disse ao doutor. — Dói muito vê-
la sofrer, mas não posso tomar essas dores para mim... Não posso obrigá-la
a fazer o que não quer, só posso segurar sua mão e não permitir que ela
afunde dentro de si mesma. Acho que no momento é só isso que posso
fazer. — Sorri triste e olhei para o relógio. — Acho que por hoje nossa
sessão acabou. — Despedi-me e saí marcando uma próxima consulta.
Eu sempre sonhei em ter a família que tinha hoje, assim como a vida
que conquistei e obviamente sempre soube que nada nesta vida era fácil.
Tudo possuía suas dificuldades e era isso que fazia com que as coisas
fossem ainda mais interessantes.

Eu, Dante Boltoni, demorei para ter a família que tinha hoje e ainda
não estávamos cem por cento, mas nada era cem por cento, muito menos a
felicidade, a tristeza ou o amor.
É tolice querer tudo sempre no máximo sempre, às vezes tínhamos
que nos contentar com o mínimo. Era preciso saber viver com pouco para
que um dia, quando tivesse o máximo, você soubesse lidar e aguentar as
consequências que isto trazia.
Aprendi ainda novo que tudo que vinha fácil, ia embora fácil demais,
por este motivo sempre busquei as coisas mais perenes[1], os mais imutáveis
momentos, os mais duradouros sentimentos e sempre fugi de coisas
fugazes[2].
Queria passar para meus filhos o que havia de melhor nesta vida, mas
também desejava mostrar para eles o que havia de pior. Queria que eles
soubessem lidar com todas as situações diversas que viessem e não queria
que se perdessem dentro de si mesmo.
Quando você se perdia dentro de si era ainda mais complicado para se
encontrar, mas não era algo impossível. É apenas preciso ter força de
vontade e saber lidar com as situações que viessem sem querer a todo
instante se afundar, mas acho que não era a pessoa certa para falar algo
assim. Afinal, cada um enfrentava um problema ou lidava de uma
determinada forma e nem todos éramos fortes, mas não ser forte não
significava ser fraco.
Dirigi com cuidado pela estrada e estacionei no acostamento para
poder apreciar o final da tarde. Saí do carro olhando a tarde que se despedia
para a noite chegar com a lua e as estrelas. Adorava esses fenômenos
naturais da natureza, certas coisas que o homem não precisava tocar e nem
fazer, pois já era lindo e perfeito do jeito que era. O vento em meu rosto me
lembrava que ainda estava vivo, à beira de surtar, mas vivo. Estava muito
perto de matar um certo Rizzi e só precisava não perder a cabeça e colocar
tudo a perder.
Rizzi!
Rizzi!
André Rizzi, era esse o nome do meu mais novo e velho problema.
Sorri ao saber que quando pensei que havia me livrado dos filhos da
puta dos Rizzi do mal, descobri que ainda havia um deles à solta por aí.
Voltei a focar meus pensamentos na vista linda que estava sendo
agraciado, definitivamente era nisto que devia me focar.
Quando estava mais calmo e em paz comigo mesmo entrei no carro e
segui para casa. O caminho foi rápido, passei pelos portões e logo
estacionei. Como sempre fui para a porta da frente, subi os lances de escada
e me preparei para a recepção calorosa. Abri a porta e contei até sete. 1, 2,
3, 4, 5...
— Papai! — três vozes gritaram assim que passei pela porta e me
abaixei para sentir o abraço dos trigêmeos mais lindos do mundo.
— Meus pequenos! — disse, beijando o rosto de cada um. — Papai
estava morrendo de saudade de vocês e não via a hora de voltar para casa.
— Se sentiu tanta saudade, por que não veio antes? — perguntou
Bruna.
— Bruna! — repreendeu Anny. — Mamãe já falou que papai tem que
trabalhar.

— Mas mamãe, todo mundo fala que papai é birionário — disse toda
séria.
Minha filha era maravilhosa.
— Filha, não é porque somos afortunados que tenho que parar de
trabalhar — falei sorrindo. — Não trabalho só por mim, Bruna, tem pessoas
que não possuem muito e precisam do meu trabalho para ajudá-los. Papai os
ajuda sem cobrar nada em troca, aliás, não custa nada ajudar alguém.
Gentileza gera gentileza... Quando criamos esse ciclo em volta de nós,
conseguimos viver melhor e ainda mudamos um pouco do mundo para
melhor.
— Eu quero criar um ciclo assim diante de mim... — Nicholas disse
baixinho.
Olhei para ele e me vi refletido.
Meus filhos não eram idênticos, mas Nicholas era minha cópia quase
perfeita. Tínhamos os mesmos olhos, cabelo e cor de pele. Anny falava que
ele era minha mini versão e quanto mais ele crescia mais acreditava nisso.
— Papai, então tenho que trabalhar mesmo já tendo tudo? —
perguntou Bruna.
— Um dia você compreenderá melhor o que digo, mas por agora seja
apenas uma criança — disse, puxando seu nariz.
— Ser criança é bem melhor pai — comentou, fazendo com que
Anny e eu caíssemos na gargalhada.
— Papai, quando crescer quero trabalhar com o senhor — avisou
Pietro. — Mas agola quero brincar muito, muito! — exclamou rindo.

— Mas para frente você vai, filhão.


— Agora vão lavar as mãos que o jantar será servido — Anny disse e
todos dispararam correndo para algum banheiro.
Levantei-me do chão encarando minha linda esposa, Anny estava
cada dia mais linda.
— Acho que ainda não recebi um beijo da minha adorável esposa.
— Então meu sedutor marido quer um beijo? — perguntou,
caminhando em minha direção.
— Não me contento com um só.
Ela sorriu e a puxei de vez para mim, beijando seus lábios
maravilhosos que tanto amava.
— Vá tomar banho para que possamos jantar — disse, tentando se
afastar de mim.
— É isso que recebo da minha linda esposa, uma chuveirada sem
sexo — falei, indo em direção à escada de vidro.

— Mais tarde...
— Mais tarde — afirmei, subindo a escada.
Acordei sentindo um arrepio no meio das minhas pernas, arqueei as
costas do colchão ao sentir um beijo grego. O dente puxava meus lábios
maiores antes de afundar a língua em meu canal. Ah, Dante e sua língua
mágica! Eu amava sua boca em mim, adorava ser acordada desse jeito.
Definitivamente ele sabia como me deixar contente pela manhã.
Quando ele sugou meu clitóris soltei um grito, o suor escorria por
minhas pernas assim como minha lubrificação. Era uma mistura gostosa.
Porra! Oh, isso é tão bom!

— Abra os olhos e me veja devorar você, senhora Boltoni — ordenou


com sua voz rouca grave que tanto me excitava todos os dias.
Assim eu fiz e o observei me lambendo, chupando e comendo minha
boceta com sua boca, às vezes com velocidade às vezes devagar, me
torturando de uma maneira prazerosa.
— Dante — gemi seu nome.

Dante apenas me chupou com mais velocidade sem tirar seus olhos
dos meus, ele mexia a língua dentro de mim de uma forma tão erótica e
particular que me enlouquecia. Ele levou seu polegar até meu clitóris
massageando com delicadeza. Apertando na hora certa.
— Quero seu líquido doce na minha boca, senhora Boltoni, e só irei
ter um bom dia após beber do seu doce e delicioso gozo — rosnou.
Bastou essas palavras para que eu gozasse em sua boca gritando seu
nome com força. Ele sugou até a última gota e se levantou passando o dedo
em minha intimidade, ergueu-se e lambeu um por um.
— Como sempre delicioso — disse sorrindo de lado.
Ele estava gloriosamente nu, tão lindo, sensual, musculoso, tão meu...
— Agora, senhora Boltoni, irei ouvi-la gritar mais uma vez meu
nome, só que com meu pau atolado bem fundo e forte em você, está pronta?
— perguntou, massageando seu pênis longo e grosso.
— Como nunca estive! — exclamei, arrancando uma gargalhada dele.

Dante se posicionou sobre mim, lentamente foi entrando e minhas


paredes apertaram seu membro fazendo-nos gemer. Ele beijou minha boca
com delicadeza, enquanto sua mão apertava meu seio direito com força.
— Acordei faminto, senhora Boltoni — disse quando estava
completamente dentro de mim.
Seu pênis duro entrava e saía com tudo, alargando minhas paredes,
gemi alto, arranhando suas costas. Dante não foi lento e muito menos com
delicadeza.

— Você é minha, Anny, apenas minha! — rosnou, estocando ainda


mais rápido. — Diga que é minha!
— Apenas sua, senhor Boltoni! — Arranhei suas costas gozando.

Olhei para Bruna que estava fingindo olhar a paisagem ou qualquer


outra coisa, esta menina um dia iria me deixar de cabelo completamente
branco. Suspirei, tentando achar uma forma de conversar com ela, se fosse
Dante ele já teria resolvido, mas eu não era boa em corrigir nossos filhos.
Eu sempre temia ser como minha mãe e com isso acabava recuando na
criação deles.
— Bruna diga para a mamãe o que você fez, prometo que não irei
brigar nem nada, apenas me diga o que fez que iremos resolver
rapidamente.
— Eu não fiz nada, mamãe.
— Bruna!
— Eu só queria que ele blincasse também — falou emburrada.
— Você machucou seu irmão — disse séria.

— Ele que é fraco, mamãe, Nicholas só chora — retrucou irritada.


— Bruna, você está de castigo, sem brinquedo e sem qualquer tipo de
brincadeira lá fora por uma semana — pontuei séria, dando minha palavra
final.
— ISSO NÃO É JUSTO, QUERO O PAPAI! — berrou, fazendo
pirraça.

Seu pai não poderá te ajudar, minha filha!


— Vamos para o quarto agora, mocinha! — ordenei, pegando-a e
subindo para o segundo andar.
Ainda precisava ver melhor os machucados de Nicholas.

Deixei-a em seu quarto, saí e tranquei a porta, só assim para ela não
me desobedecer, para minha alegria havia grades na janela, se não temeria
sua queda. Bruna era geniosa e infelizmente só obedecia o pai. Tinha três
filhos opostos um do outro que na maioria das vezes faziam meus dias
difíceis. Porém, me recusava a ter uma babá. Dava conta dos meus
pirralhos. Dante era presente em tudo, muitas vezes sentia que o
sobrecarregava, mas não era como se eu fosse conseguir pará-lo. O homem
era pior que um trator.
Meu celular apitou avisando que uma mensagem chegou, destravei a
tela e abri a mensagem sem verificar o número.
— NÃO! — Um grito ecoou pela minha garganta ao mesmo tempo
em que uma lágrima estúpida escorreu por meu rosto.

Não acredito no que vi!


— Anny? — chamei entrando em casa sem ar. Não a vi na sala,
então fui para o escritório e nada. Subi as escadas correndo, fui ao quarto
das crianças e as vi acordadas com medo me olhando. — Oi, meus amores!
— cumprimentei sorrindo.
— Papai! — gritaram em uníssono, agarrando-se a mim. Apertei-os
contra o meu peito.
— Vocês já tomaram banho e jantaram? — perguntei, beijando a
testa de cada um. Eles fizeram que sim com a cabeça. — Vejo que estão de
banho tomado, irei contar uma história para dormir.
Arrumei os colchões no chão do quarto do Nicholas e me deitei
entre eles, contando a história do pequeno príncipe até que eles dormiram.
Saí do quarto e fechei a porta. Fui até nosso quarto e ao abrir a porta a vi
sentada na cama olhando para o celular com mágoa.
Fechei a porta, a passos lentos me aproximei dela, mas antes que eu
falasse qualquer coisa sua mão acertou o meu rosto com força. Pisquei
incerto sobre o que acabou de acontecer. Pisquei algumas vezes sentindo o
meu rosto arder.
— Acho que mereço uma explicação — comentei calmo, afastando-
me dela. Fui até a poltrona à direita, sentei-me com pesar. — Não mereço?
— Eu que mereço algo aqui, como pode fazer isso com a nossa
família, Dante? — indagou nervosa, ficando de pé, secando as lágrimas
com as costas da mão. — Por quê? — perguntou exasperada.
— Pela última vez repito que mereço uma explicação — roguei.
Anny andava para lá e para cá, e, por fim, veio em minha direção
como uma leoa. E me mostrou a tela do aparelho onde havia uma clara
montagem minha com outra mulher, o mais engraçado era que na mão da
tal mulher havia a aliança que se encontrava no dedo da minha esposa.
— Vai negar a amante? — debochou da minha cara, mas suas mãos
tremiam, e percebi que ela arranhou as coxas, pois havia sangue em seus
dedos e tufos de cabelos pelo chão. — Me diga! — gritou e tossiu.
O aparelho celular caiu ao chão, ela enfiou a mão entre o couro
cabeludo, mas antes de puxar, segurei sua mão a impedindo de se machucar
mais.
Fui empurrado enquanto ela se afastava batendo o pé no chão. Uma
raiva subiu por meu corpo parando em meu peito. Passei a mão no cabelo
nervoso. Movi meus ombros em movimentos circulares para tentar aliviar a
tensão, mas era impossível.
— Você melhor do que ninguém deveria saber que eu não lhe trairia,
Anny Bella! — exclamei já com a cabeça quente. — Merda, olha para essa
foto e veja se não é uma péssima montagem. Me dê uma razão pra te trair.
— Não sou o suficiente! — gritou. — Sou quebrada. Estupidamente
quebrada.
— Você é mais que o suficiente, e quem nessa terra não é quebrado?
— questionei. — Eu tenho cacos dentro de mim e sinceramente, tudo bem,
sou humano! Você é forte e mais inteira que qualquer pessoa, pare de se
subestimar ou diminuir a si própria.
— Me diz como eu faço isso? — perguntou, rindo nervosa.
— Você precisa confiar em mim — berrei cansado. — Um
casamento é movido a dois, Anny. Se quer meu amor eu te darei, se quer
minha proteção te dou, mas se não confiar no que temos é melhor
terminarmos — disse com amargura. Abri e fechei o punho. Caminhei para
longe dela, mas não saí do quarto por mais sufocante que fosse estar nele.
— Você quer me deixar? — indagou embargada pelas lágrimas.
— Se a cada discussão perguntar se vou te deixar, uma hora acharei
melhor ir — confessei em tom baixo.
— Eu te amo só tenho medo, entenda! — gritou, batendo na cabeça
e puxando os fios de seu cabelo com força.
Caminhei até ela a passos largos e segurei sua mão com força.
Parando-a, seus olhos suplicavam minha ajuda, mas neste momento não
sabia o que fazer.
— Para, para! — berrei, segurando-a.
— Dante, entenda eu vi a foto e supus que fosse verdade.
Soltei-a me afastando, passei a mão em meu cabelo nervoso. Engoli
em seco, puxei o ar e o soltei. Virei-me e a encarei encolhida, abraçando os
próprios braços.
— Eu nunca, nunca lhe dei motivo para duvidar de mim, nunca! —
Alterei-me mais uma vez. — Quero que reflita sobre suas suposições,
senhora Boltoni, e repense suas acusações.
— Você não entende...
— Eu compreendo perfeitamente e sei seus medos, mas também sei
o quanto me fere vê-la me acusando de traição quando eu jamais pensei em
tal coisa nem no passado e muito menos no presente, me conhece tão pouco
assim? — perguntei e gargalhei. — Olha, não é um bom dia, não é uma boa
hora e muito menos um bom momento. Tome um banho, irei pegar um
remédio pra te ajudar a dormir.
— Dante...
— Não, Anny Bella, pare onde está que no momento meus braços não
podem te dar consolo. — A dor cravada em minha garganta ao falar, mas
virei as costas e saí a passos largos, não podia mais ficar aqui.
Fui até o closet, caminhei até o final da minha parte, puxei os cabides
com roupa e pus minha digital abrindo o cofre. Peguei o calmante que
minha esposa não usava há tempo e tranquei de novo. Voltei ao quarto,
coloquei água no copo e a aguardei sair do banho, o que não demorou
muito. Ela saiu com os cabelos molhados, minha blusa antiga lhe cobria
como um vestido. Estendi-lhe os comprimidos e o copo d’água. O silêncio
era agonizante, porém, nossos olhos falavam por si só.
Ela tomou tudo em um só gole, largou o copo sobre a mesinha de
cabeceira e se deitou, cobrindo-se toda com os cobertores.
Fiquei até que ela dormisse, beijei sua testa e saí do nosso quarto. Fui
ao encontro dos nossos filhos que estavam dormindo profundamente no
colchão que coloquei no chão para eles, Amanhã conversaria com eles
sobre o que houve hoje, presenciaram a primeira crise da Anny, meu Deus,
nem sabia o que falar a eles ou como explicar.
Assim que verifiquei que estavam realmente bem e dormindo, me
permiti descer a escada e beber algo forte para poder absorver melhor este
dia e tomar as decisões certas para todos nós.

Desci as escadas refletindo sobre o que houve, mas, às vezes, nosso


cérebro via algo que realmente não era e cria diversas teorias sobre a
imagem vista. Quando se era exibido a imagem correta, você a enxergava
de uma forma mais clara e nítida, mas antes era preciso que alguém te
dissesse a verdade. A meu ver isso acontecia muitas vezes na vida...
Algumas vezes era preciso que alguém te dissesse ou mostrasse o que
fazer e se tornava complicado toda esta questão e teoria, mas era algo que
fazia parte do nosso dia a dia e não era exatamente algo que se podia mudar
por mais que quisesse.
Eu corri e corria muitas das vezes contra o tempo ou até mesmo
contra mim mesmo, às vezes fingia não ver algo para não ficar me
questionando e em outras não ter tais sentimentos para não ferir quem
amava.

Eu, Dante Ettore Boltoni, algumas vezes era ferido e sangrava como
se tivesse levado um tiro no peito, porém, por eles, minha família, sorria e
engolia a dor. Afinal, se eles me virem no chão remoendo de dor também
iriam cair, por isso, eles precisavam me ver em pé para que também não
caíssem.
Por eles estou de pé!
Hoje quando recebi a ligação de Nicholas pedindo para que eu viesse
para casa, quase bati com o carro no processo, pois eles nunca me ligaram
chorando. Meu coração quase saiu do peito ao ouvir a voz suplicante do
meu filho e por alguns segundos fiquei sem direção, sem chão e sem saber o
que fazer. Precisei de algum tempo para entender o nível da situação e no
fundo consegui ouvir os gritos da minha esposa, o que me levou a quase ter
um infarto.
Eu me vi sem saber o que fazer.
Quando cheguei ao andar de baixo, fui até o bar para beber algo bem
forte, mas desisti e optei por um chá, por isso segui até a cozinha para
prepará-lo.
Sentei-me na rede e com calma tomei meu chá. Precisava ser sábio,
pois minha família precisava de mim.
Quando voltei para o Brasil para ajudar Anny, sabia que não iria
permitir que ela saísse da minha vida. Lutei até mesmo contra mim para
mantê-la em pé e consequentemente me esqueci de mim, mas consegui me
levantar e passar pelas grandes ondas, inclusive, esqueci que a vida era
como o mar em que uma hora estava calmo e em outra agitado. Agora era o
momento em que as ondas estavam se levantando bravamente contra nós e
me questionava se saberia lidar com isso. Antes era apenas Anny e eu, mas
agora havia mais três crianças, os nossos filhos.
Olhei para as estrelas tentando encontrar entre as constelações paz.
Caralho, sentia-me exausto, havia tantas coisas pendentes, ainda precisava
entrar em contato com Eduardo, o filho da puta iria surtar, mas vejamos,
quem não iria? Puta merda! O que estava fazendo da minha vida? Meus
pensamentos estavam desalinhados a ponto de nem saber como dar o
próximo passo.
Merda, estou sem chão após muito tempo!

— Dante? — Alguém me chamou. — Dante, amor? — Uma voz em


súplica voltou a me chamar.

— Anny? — perguntei abrindo os olhos e logo me arrependi pelo


choque que a claridade me deu.
Merda dormi na rede! A dor nas costas era um aviso de que não tinha
mais idade para essas graças. Ergui os olhos e me deparei com Anny me
olhando assustada e seu rosto estava pálido.
— Acordei e não te vi na cama — disse quase chorando. — Fiquei
assustada.
Respirei forte, estava chateado com a situação de ontem, mas não
tinha força para mais uma briga. Mantê-la distante só pioraria a situação.
Engoli meu orgulho, abri um sorriso minimalista quadrado.

— Meu amor, vem cá! — disse, puxando-a para o meu colo. Abracei-
a apertado, beijei seu rosto e depois seus lábios. — Eu sempre vou estar ao
seu lado e jamais irei me afastar.
— O que vi foi tão... — Ela não completou a frase, e eu sabia
perfeitamente o motivo.
— Anny o que você viu não é a realidade — falei, tentando não
transparecer o quão chateado estava.

— Então o que era? — questionou confusa, irritando-me por ainda


insistir nisso.
— Uma montagem quase perfeita! — Quase me exaltei, mas contive
o meu tom de voz.
— Da foto de você beijando outra mulher e eu não ligo se quiser
outra mulher, apenas não me dei...

— Não beijei nenhuma outra mulher e nem vou, pelo amor de Deus!
— exclamei um pouco mais alto, cortando-a. — Anny, por favor, nunca
mais se humilhe assim por ninguém. Meu amor, sou completamente seu e
sempre serei. Nem ao menos olho para outra mulher. Vamos averiguar
quem enviou esta foto e veremos que é montagem. Olhe para mim senhora
Boltoni.
— Dante eu...
— Olhe para mim, Anny Bella Rizzi Boltoni. Estou pedindo para que
olhe para mim! — ordenei, puxando seu queixo fazendo com que ela
olhasse em meus olhos. — Não estenda isso em sua consciência e muito
menos em suas atitudes, se um dia esse casamento ir à ruína não será por
traição, mas sim por falta de confiança.
Vi lágrimas descendo por seu rosto e enxuguei cada uma delas com
delicadeza e precisão. Feria-me tanto vê-la assim, mas não sabia o que fazer
para mudar isto e sinceramente temia não ter muito o que fazer. Era uma
questão dela, não minha, porém acabava se tornando nossa.

— Eu amo você perdidamente. Beijo e até mesmo lambo o chão que


pisa. Eu te adoro, te reivindico todos os dias como minha e te mostro o
quanto te amo, mas parece que não estou fazendo um bom trabalho ou não
estou sendo transparente o suficiente. — Lancei um sorriso triste por mais
que não quisesse. — Eu te amo tanto, meu amor, e só em você pensar que
eu possa estar com outra pessoa me fere completamente, mas sei que tem
suas dúvidas e medos e por isso vamos trabalhar mais na confiança de
casal. Temos que confiar um no outro para que este barco veleje
corretamente.
Beijei seus lábios com carinho e me levantei com ela em meu colo.
Anny não disse nada, apenas colocou a cabeça no meu ombro e abraçou
meu pescoço. Segui para dentro da casa, subi a escada, deitei-a na cama e
me deitei ao seu lado. Ela colocou a cabeça em meu peito e se embolou em
mim como uma gatinha. Devolvi o abraço, apertando-a levemente contra
mim. Ela precisava do meu calor, mas talvez não tanto quanto eu precisasse
do dela. Se ela soubesse ou se ao menos se permitisse sentir todo o amor e
adoração que tinha por ela, não iria duvidar nem por um segundo o que
sentia por ela, mas aparentemente estava falhando em demonstrar o quanto
a amava.
Senti aos poucos sua respiração ficar mais tranquila e por fim ela
adormeceu mais uma vez. Não consegui nem sequer fechar meus olhos,
mas não iria me levantar. Anny precisava de mim ao seu lado, se manter em
meus braços e do calor que meu corpo proporcionava a ela. Desejava que
ela sentisse o calor do meu coração que batia por ela.

Ouvi a porta abrir, logo depois três cabeças surgiram olhando em


minha direção. Levantei minha mão e fiz um sinal para que viessem até
mim acompanhado por um sinal de silêncio que entenderam perfeitamente.
Nicholas correu para se deitar ao meu lado com a cabeça no meu peito
assim como a mãe. Pietro se deitou atrás da mãe e Bruna atrás de Nicholas.
Todos eles se enfiaram embaixo do edredom e logo adormeceram, quer
dizer quase todos, pois Nicholas estava acordado.
— Filho, durma ainda é cedo — disse na intenção dele adormecer.
— Papai, não estou com sono. Mamãe vai ficar bem? — sussurrou
alisando o cabelo da mãe.

— Sim, ela vai — respondi com firmeza.


— Não gosto de ver a mamãe chorando. Não gosto de ver ninguém
chorando, é doloroso — falou com a voz regada de emoção.
Pensei bem no que iria lhe dizer, pois Nicholas era uma criança bem
sensível com tudo e todos à sua volta. Podia parecer estranho para alguns,
mas para mim era algo bem normal e compreensivo. Ele me lembrava
bastante de mim quando era pequeno, só que a diferença era que eu não era
tão sensível e tão observador como ele. Ele era mais inteligente que os
irmãos e cada dia que se passava me mostrava mais isso, inclusive, na
escola já estavam querendo avançá-lo para duas séries acima da que ele
estava.
— Meu filho, há certas coisas que não podemos evitar, mas podemos
fazer sorrir quem chora e tornar o dia dela ou dele um dia melhor. Agora
tente dormir um pouco.

— Pai, mais uma coisa. Se não conseguir fazer a pessoa sorrir, o que
devo fazer? — perguntou, fazendo com que meu coração se apertasse um
pouco.
— Continuar tentando ou somente abraçar a pessoa e até mesmo ficar
ao seu lado sem falar nada — disse com calma, passando a mão em seus
fios negros. — Às vezes o silêncio é mais acolhedor do que qualquer outra
coisa. Não precisamos dizer ou fazer muito, só demonstre o quão sincero é
seu sentimento e não há nada melhor do que isso.
Por alguns instantes ele não disse absolutamente nada, sabia que neste
momento sua mente estava absorvendo tudo que disse e até mesmo devia
estar tentando achar a melhor forma de compreender minhas palavras.

— Entendi, é ter complacência[3] pelos outros, não é? — indagou,


tendo dificuldade para pronunciar “complacência” .
— Exatamente, meu filho, temos que sempre ter compaixão por
alguém seja da família ou não — falei, sorrindo e depositando um beijo em
sua cabeça.

O que ele ainda não sabia era que possuir benignidade[4] por alguém
muita das vezes era como ter uma faca cortando seu coração e você
precisava suportar, mas ele veria que no final valeria a pena, não
importando o quanto doesse.
— Papai, vamos ficar bem, né? — indagou com a voz arrastada.
— Sim, vamos ficar bem — afirmei, apertando-o mais contra meu
peito.
Temos que ficar bem!
Observei Dante que estava brincando com as crianças no pequeno
parquinho que construímos e meu coração se aqueceu com a cena diante de
mim. Dante era tão perfeito como pai, ele sempre dizia que nasceu para isso
e não duvidava.
Desde minha crise, há três dias, ele não ia para empresa e resolveu
tudo do escritório. Sentia que o estava sobrecarregando. Dante estava se
dividindo em cuidar de mim, da casa, das crianças e ainda tinha que
trabalhar. Estava me sentindo uma inútil, mas não era algo que pudesse
simplesmente mudar. Sofria de ansiedade, entre outras coisas e havia dias
em que estava bem, mas havia outros em que estava péssima.
A foto que me enviaram de Dante beijando outra mulher e que
verificamos ser uma montagem, fez com que eu desabasse e caísse em uma
forte crise. Na verdade, fazia dias que não estava me sentindo bem, mas
como fui avisada teria dias de glória e dias de luta. Achei que suportaria
sem ajuda, mas foi só algo aparecer que surtei.
Jane estava viajando e não achei justo tirá-la do seu momento de
descanso por minha causa. Ela era uma ótima psicóloga, mas ainda assim,
não podia deixar que suas férias em família fossem arruinadas por minha
causa. Pedi a Dante que me deixasse em casa quieta e por alguma razão
estranha ele concordou, mas confesso que foi bastante estranho ele ter
aceitado de bom agrado minhas decisões.
O que me deixava feliz, confusa e apavorada, acredito que apavorada
era o que me definia. Estava acostumada e a ter meu fabuloso marido
cuidando de tudo em cada detalhe, cada crise que passei ele tomou à frente
e resolveu tudo antes de conversar comigo ou melhor me avisar o que
estava fazendo e sempre afirmava que era para o bem da nossa família, mas
fazia um tempo não muito longo em que ele não estava fazendo tudo.

Ele simplesmente deixou algumas questões na minha mão, controles


o qual eu nunca pensei que teria um dia, mas agora tinha e não fazia a
mínima ideia de como fazer ou cuidar das coisas. Eu simplesmente tinha
medo ou vergonha de ir perguntar algo a ele, sabia que com toda certeza do
mundo Ettore seria paciente e saciaria qualquer dúvida minha, entretanto,
sentia que podia tentar resolver os problemas sozinha.
Agora com a mente clara percebia que caí em uma armadilha criada
pela minha própria cabeça, esperava tanto ser abandonada e traída que
acabava não confiando no que conquistamos. Às vezes, esquecia de que era
casada com um homem sexy, lindo, bilionário e ainda era extremamente
benevolente, o que significava que ele era uma raridade neste mundo e isto
me irritava muito, pois não era a única a saber disso tudo. A mídia sabia, as
mulheres sabiam. Droga! Dante poderia ser ao menos um pouco mais feio
ou menos rico. Para melhorar ou piorar a situação era um excelente pai o
que atraía mais cachorras no cio. É foda!
— Mamãe não vai brincar com a gente? — perguntou Pietro, fazendo
com que eu levasse um pequeno susto.
— Mamãe está cansada, filho, mas estou me divertindo daqui vendo
vocês brincando com o papai — disse, bagunçando seu cabelo castanho-
escuro.

— Mamãe te amo! — exclamou, abraçando-me.


— Oh, meu bebê, mamãe também te ama muito! — falei, abaixando-
me e beijando seu rosto com carinho. — Você e seus irmãos são as luzes do
meu mundo todinho.
— E o papai? — perguntou sapeca.

— Seu pai é o farol guia. Quando estamos perdidos ele nos guia...
Quando estamos no escuro ele se acende nos dando luz. Quando estamos a
naufrágio ele nos acha. Seu pai é um porto seguro.
— Papai não é de aço, mas é tão forte quanto o Superman —
comentou empolgado. — Sempre digo na escola que papai é melhor do que
os Vingadores.
— Sim, meu amor, seu pai é o melhor — concordei rindo.

— Mamãe você também é incrível e forte. É minha mulher


maravilha! — disse, beijando meu rosto.
Pietro era mais apegado a mim, era calmo e na sua, acredito que ele
era como eu. Bruna era independente, animada, brigona e se achava dona da
verdade na maioria das vezes e só Deus sabia o quanto eu surtava com essa
menina. Ela falava tudo que queria e quando queria sem pensar nas
consequências, teria que ter uma conversa séria com ela. Nicholas era
completamente fiel ao pai, meu Deus, era o único que puxou cem por cento
ao Dante. Ele era o pai todinho, inclusive na inteligência. Eles eram os
trigêmeos menos idênticos que conhecia, eram diferentes em tudo, inclusive
na personalidade.
Eduardo, Pietro e eu também éramos bem diferentes uns dos outros.
Eu era a caçula e eles sempre tentavam me proteger, mas acabava que
nenhum de nós tinha como se proteger.

Hoje eu protegia meus filhos de tudo e de todos, inclusive de mim


mesma.

Nem ao menos sabia o motivo de estar tão nervosa para conversar


com o meu marido e minhas mãos estavam suando de tão nervosa que
estava, por isso respirei fundo antes de bater à porta para entrar.
Era só bater à porta e entrar nada mais do que isso.
Não ia me custar nada, só precisava entrar para conversar com meu
marido.
Já jantamos, tomei banho, as crianças estavam dormindo e agora iria
conversar com meu sexy e apaixonante marido. Coloquei minha testa na
parede e fechei os olhos, estava parecendo uma menininha de quinze anos
que iria ver o boy magia pela primeira vez.
Anny Bella Rizzi Boltoni, você é uma mulher de trinta e poucos anos,
casada e com três filhos que ama mais do que tudo neste mundo, por isso se
comporte como tal e tome atitude.
Isto, preciso de atitude!
Por qual motivo bateria na porta quando podia entrar sem pedir?
Eu, hein!?
Tomando coragem, abri a porta de uma só vez entrando em seu
escritório. Ele me olhou por cima do notebook e voltou a olhar para a tela.
— Por isso disse que não era para tê-los enviado para os abrigos
federais, era para eles terem ido para os nossos abrigos — disse com raiva.
— Exatamente recorra para que eles fiquem conosco. — Ele ficou em
silêncio para ouvir a outra pessoa. — Tudo bem. Boa noite — falou,
fechando a tela do notebook, tirou o fone sem fio do ouvido e olhou para
mim. — Aconteceu algo? Está tudo bem?
— Vim conversar com meu marido, não posso? — perguntei de volta.

— Claro que pode, apenas estranhei — disse calmamente, analisando-


me.
— Gostaria de conversar um pouco sobre tudo — falei, aproximando-
me um pouco da sua mesa de madeira escura.
Ele me olhou por alguns instantes e depois soltou um leve suspiro.
Passou suas mãos grandes por seu cabelo, bagunçando-o um pouco,
fazendo com que ele ficasse com um ar selvagem.
Era uma visão de tirar o fôlego.
Seus olhos vieram de encontro aos meus, fazendo com que uma
corrente elétrica passasse por meu corpo. Seus olhos escuros pareciam
esconder algo que desconhecia, mas que me intrigava bastante. Havia
mistérios que não conhecia e isto me deixava irritada, queria saber tudo
sobre ele e não queria que houvesse nada entre nós, mas parecia que não
estava sendo uma tarefa muito fácil nos manter bem um com o outro. Sentia
que havia uma grande parede invisível de gelo que nos separava e acho que
isto era minha culpa.
— Sente-se e me diga tudo, ouvirei e discutirei, caso for preciso —
afirmou, olhando em meus olhos.

— Quero falar com meu marido, não com o advogado — disse,


sentando-me na frente dele.
— Seu marido está bem diante de você, apenas fale e ele ouvirá e se
houver algo para ser discutido ele dirá — expressou com voz calma e
metricamente controlada.
— Você parece estar no modo empresário fodidamente bilionário que
se encontra em uma mera reunião de negócios — bradei irritada.

Ele suspirou mais uma vez com leveza.


— Sou empresário, bilionário e advogado... — falou com um tom a
mais no seu timbre vocal. — Mas aqui dentro desta casa sou apenas pai e
marido. Estou na sua frente como seu marido, então não me venha com
falsas acusações.
— Não estou acusando, apenas citando fatos — rebati, puxando o ar.
— Quais fatos? Diga-me quais são.
— Estes — disse mais alto. — Você está agindo como se esta nossa
conversa fosse uma reunião de negócios — esbravejei.
— Em qual momento fiz isso? — perguntou, erguendo uma
sobrancelha.
— QUANDO DISSE PARA QUE EU ME SENTASSE E FALASSE,
E QUE SE FOSSE O CASO VOCÊ DISCUTIRIA A QUESTÃO
COMIGO. VOCÊ ESTÁ SE AFASTANDO DE MIM — gritei nervosa.
— Me afastando de você?
— Não se faça de desentendido — reclamei, apontando o dedo na sua
cara. — Se não está feliz com o nosso casamento, me diga. Se não está mais
aturando meus problemas diga.

Dante apenas se recostou na cadeira, me olhou com uma expressão


indecifrável, ergueu uma sobrancelha e disse:
— Não estou me fazendo de desentendido, apenas estou tentando
compreender onde quer chegar. — Sua voz continha diversão. Será que ele
estava zombando de mim? — Agora me diga o motivo disso tudo.
— É óbvio que é porque não estamos bem. Mal estamos conversando,
não fazemos nada como casal e você nem me abraça à noite! — berrei com
todo o ar do meu pulmão.

— Se quer conversar comigo venha até mim, fico aguardando você


estar disposta a falar qualquer coisa comigo. Eu apenas fico esperando você
se sentir confortável o suficiente para vir até mim. Não quero pressioná-la a
nada, então apenas aguardo calmamente — explicou, colocando as mãos
sobre a mesa. — Não sei como está seu estado emocional e simplesmente
não sei por que você não diz. Não posso ficar te pressionando a me dizer
algo, Anny. Estou diante de você todos os dias só esperando estar disposta a
me dar migalhas. Estou até mesmo à espera de migalhas, senhora Boltoni,
mas a senhora não enxerga minha carência — comentou, dando um leve
sorriso de lado. — Se quer me beijar, me beije e se quer me abraçar, me
abrace.
— Dante eu... — Não sabia o que dizer. — Achei que estivesse
chateado comigo.
— Chateado não, mas se quer meu pau atolado bem fundo na sua
boceta venha até mim e sente bem gostoso. Estou sempre à sua disposição,
senhora Boltoni. Basta me tomar para si. — Ele abriu um sorriso sacana que
me arrepiou por inteira.
Um calor subiu em minhas pernas, fazendo com que minha boceta
ficasse bem encharcada de desejo por ele e engoli em seco. Dante
observava atentamente cada movimento meu, apertei uma perna contra a
outra em busca de algum alívio ou solução. Ele sabia o que fazia comigo e
sabia que me excitava com poucas palavras.

— Você está duro para mim? — perguntei, umedecendo os lábios.


O safado sorriu, olhou para baixo e ouvi o zíper da sua calça sendo
abaixado.
— Por que não averigua por contra própria? — rebateu com outra
pergunta.

— Dante, fale logo — pedi com a voz meio falha.


— Se quer se fodida basta vir me foder, senhora Boltoni — insistiu
calmamente.
Abri minha boca em choque. Dante falando sujeira era excitante!
Anny me olhou assustada sem dizer nada.
A forma como ela engoliu em seco, apertou suas pernas ou como me
olhava me deixava ainda mais excitado. Era visível para mim que ela estava
desconfortável e sem saber ao menos o que fazer. Queria rir, mas ao mesmo
tempo queria chorar de frustração por causa da situação em que estávamos.

Anny era frágil como uma folha e se passasse um vento por ela, iria
se mexer e até mesmo cair. Devido à sua última crise vinha tentando de
todas as formas deixá-la quieta para que lidasse com seus próprios
demônios. Não era algo fácil de fazer para mim, mas era algo que ela
precisava fazer por si mesma.
Doía-me o coração vê-la tão perdida, mas não podia dizer a ela o que
fazer. Precisávamos conversar, mas sempre era eu que iniciava a conversa e
no final ela sempre me deixava para resolver tudo.
Eu não me importava, mas percebi que minhas ações, por mais
simples e de boa fé que fossem, estavam atrapalhando seu crescimento
individual, mental e materno. Por isso que desde sua crise estava no meu
canto quieto, observando como ela estava, mas ela se isolou perdida em
seus pensamentos. Como sempre fazia, cuidei e cuidava dela só que a
distância, o que para mim era bem torturante, mas era preciso.
Estava aguardando com uma paciência de Jó, ela pular esta mesa e se
sentar bem gostoso em mim, mas via em seus olhos dúvidas sobre o que
devia fazer.

Isto era tão frustrante!


Só queria estar dentro dela, mas não seria eu a cruzar esta mesa e
comer minha mulher sobre ela. Queria que Anny viesse até mim, tomasse
as atitudes necessárias para me ter e que fosse ela a exigir que eu gozasse
dentro dela.
Continuei olhando dentro dos seus lindos e perfeitos olhos castanhos
e era gostoso ver o brilho de prazer emanando deles. Ajeitei-me na cadeira
e sorri de lado, enquanto ela abria a boca, mas nenhum som escapava de lá.
Ela estava perdida sem saber o que fazer, e sua frustração e inquietação era
mais do que visível.

— Senhora Boltoni, me permita dizer que temos duas soluções.


Primeira, você se levanta, caminha até mim, tira sua roupa e me fode. Já a
segunda, é aquela em que você sai pela porta que entrou sem gozar ou me
sentir dentro de você. Cabe apenas à senhora decidir se irá nos torturar ou
nos fazer gozar — disse com calma. — Qualquer que seja sua decisão não
irei contestar, a juíza aqui é você.
— Não vai nem ao menos defender a causa? — perguntou baixo.
— Não há o que defender. Bem, vejamos, a senhora está excitada,
molhada e necessitada do meu pau... Ele está à sua espera e a disposição
como sempre, somente para a senhora Boltoni, mas compreendemos se
você achar melhor dormir molhada e sem gozar.
— Esta é sua defesa? — indagou, apertando ainda mais suas pernas
em busca de algum alívio.
— Não fiz defesa alguma, minha senhora, apenas constatei os fatos
explícitos sobre a mesa — respondi tranquilamente.

Ter controle era algo que sempre tive e algo que admirava muito em
possuir. Se não fosse por esse autocontrole já teria cruzado esta mesa e a
tomado para mim, mas graças a Deus, conseguia me controlar
perfeitamente. Meu pau em minha calça estava duro feito pedra,
necessitado dela como sempre, mas precisava ser coerente. Sempre era eu
que atacava, deixei-a mal-acostumada e por isso estava aqui nesta tortura
infernal, esperando-a se levantar e me foder. Até mesmo estava contando os
segundos para que isto acontecesse.
Quando ela passou pela porta sem bater, não que eu me importasse,
confesso que fiquei curioso, mas deixei que ela falasse. Compreendi
imediatamente que ela estava sentindo falta do meu excesso de carinho e
proteção. Seu corpo estava com urgência do meu toque, mas ainda assim,
ela se encontrava perdida sem saber o que fazer.
Anny sempre esperou por mim no ato do sexo, não era algo que eu
me importasse já que amava manter o controle e lhe dar prazer acima de
tudo.

Adorava dar prazer a ela, mas tinha dias como o de hoje que queria
mais um pouco de atitude dela. Anny raramente falava besteira durante o
sexo, ela apenas gemia o meu nome e não reclamava disso. Cheguei uma
vez a pensar que devido ao fato dela ter adorado medir meu pau e espalhar
o tamanho dele para o mundo a deixaria ainda mais aflorada durante o sexo.
Ela não era mais tão tímida quanto antes, mas ainda possuía certa timidez e
era algo que compreendia perfeitamente.
— Por que não tira a roupa, senhor? — perguntou.
— Tiro sem problema algum — falei já retirando minha camisa, e
Anny na mesma hora desceu o olhar para o meu abdome trincado e
malhado. — Admirando a vista? — inquiri, sabendo que ela tinha uma
queda particular pelo meu másculo abdome.

Este másculo abdome já fez com que eu tivesse que ficar sob seu
olhar cerrado. De acordo com minha esposa, chamava muita atenção com
minha beleza e masculinidade. Acreditem, até mesmo já quase a vi brigar
em uma praia por minha causa. Tudo culpa da sunga branca que raramente
usava hoje em dia em lugares como a praia.
— Sempre admiro. Você tem malhado mais?
— À noite não tem muito que eu possa fazer para queimar calorias ou
me distrair, então desço para malhar um pouco.

— O fato de que não está transando te faz malhar mais?


— Sou um homem com bastante disposição — respondi, tirando
minha calça de moletom, ficando nu, já que estava sem cueca. — Preciso
fazer bastante coisa para poder me acalmar... A senhora irá sair ou ficar?
Ela me olhou, levantou-se tirando tudo com uma pressa exagerada e
em momento algum tirei meus olhos do seu corpo.
Eu amo seu corpo!
Gosto das cicatrizes que mostravam o quanto ela era valente, da
tonalidade creme da sua pele e dos seus seios nem muito grandes e nem
muito pequenos.
Adorava sua bunda, principalmente, quando dava alguns tapas nela, e
melhor ainda amava sua boceta, lugar onde sempre queria estar, mesmo
cansado, triste, com raiva, feliz ou até mesmo sem motivo algum.
Amava estar dentro dela, dando-lhe prazer.
A passos largos ela veio até mim e afastei a cadeira um pouco para
trás para que ela pudesse se sentar bem gostoso em meu pau ereto e pronto
para ação.
Quando pisquei os olhos, Anny já estava diante de mim segurando
minha ereção e devagar a introduziu em sua entrada escorregadia.
— Como imaginei você está pingando, meu amor — disse, segurando
sua cintura e beijando seu pescoço.

Ela gemeu baixinho, conforme meu pau ia entrando cada vez mais
fundo dentro dela.
— Morri de saudade de estar dentro de você, meu amor — afirmei
com voz mais rouca que o habitual. — Geme para mim, meu bem, geme
vai.
— Oh, Dante, isso é tão bom.

— Você gosta, né? Você gosta de ter meu pau bem fundo na sua
boceta? — perguntei ao pé do seu ouvido e na mesma hora seu corpo ficou
arrepiado. — Fala para mim se gosta ou não?
— Gostar? Eu não gosto... Eu amo, Dante — disse entre gemidos. —
Você é tão grande... Tão meu, apenas meu! E não te divido com ninguém.
— Sou apenas seu, senhora Boltoni.
— Sim, só meu!
Ao dizer isto ela começou a cavalgar em mim com uma força até que
admirável, era como se uma leoa tivesse sido solta. Ela descia e subia de
forma que tinha que me segurar para não gozar. A forma como sua
bocetinha apertava meu pau era alucinante.
— Oh, baby, você está me matando.

Necessitado de controle, tirei-a de cima de mim sobre seus protestos,


mas precisava controlar isto e estar por cima dela. Precisava meter com
força, meu desejo era arrebatador demais e desejava dar uns bons tapas na
sua bunda.
Oh, porra!
Eu a joguei sobre a mesa sem me preocupar com o que ia ao chão, dei
um tapa na sua bunda gostosa antes de entrar de uma só vez nela,
arrancando seu grito de prazer. A cada estocada que dava, via que precisava
ainda mais estar dentro dela.
— Dante, quero gozar — choramingou quando diminuí o ritmo. —
Deixe-me gozar.
— Em momento algum lhe impedi de gozar, meu amor — disse,
jogando ainda mais meu corpo contra o seu, fazendo com que seus seios
ficassem esmagados sobre a mesa de madeira. Aproveitei da sua posição e
toquei seu clitóris com leveza, fazendo movimentos circulares. — Você está
mais molhada a cada segundo e espremendo ainda mais meu pau. Meu
amor, você é tão gostosa... Tão perfeita para mim, sinto o quanto está
escorrendo em meu pau. Está me lambuzando todo... Faça o que quiser,
baby... Sinta e faça o que for preciso — digo, acelerando as estocadas.
— Ah! — Ela gozou, jogando sua bunda sobre meu pênis.
— Isso, meu amor, goze para mim, mas principalmente para você! —
exclamei, permitindo-me gozar também.
— Dante?
— Sim, minha vida.
— Podemos fazer isso novamente no nosso quarto em cima da nossa
cama?

Esta pergunta quase me fez rir, mas seria cruel rir da minha esposa
nesta situação.
Como ela podia ainda me perguntar algo assim?
— Podemos fazer no nosso quarto, na escada, no sofá, na cozinha e
na nossa cama se assim desejar — disse, beijando suas costas.

— Você ainda está duro.


— Apenas para você!
— Não consigo subir a escada.
— Eu te carrego — falei, saindo lentamente de dentro dela.
Vestimos nossas roupas pela metade e saímos do meu escritório às
pressas. Assim que terminei de subir a escada, a beijei com força e sorri ao
terminar. Abri a porta do nosso quarto, sorri e quase caí na gargalhada de
tão frustrado que fiquei.
— Acho que teremos que descer novamente — falei ao ver nossos
filhos dormindo na nossa cama.

— Uma ótima ideia, senhor Boltoni — disse, beijando meu pescoço.


Desci a escada, parando em cada degrau para beijar sua boca.
Amo beijar sua boca!

Adorava puxar seus lábios, sabendo o quanto isso a deixava com


tesão. Não negava e jamais negaria que ela era a mulher da minha vida.
Com precisão, disposição, diversão e bastante prazer fodemos a noite
inteira.
Na fria madrugada, entre sorrisos bobos e muitas carícias, fazemos
amor no tapete.
Não deixe para amanhã o que pode fazer hoje, apenas não deixe!
Olhei para a cara do Alexandre, sabendo que as coisas não estavam
como eu imaginava. Na verdade, estavam bem piores do que gostaria...
Meu irmão mais velho não era fã dos Estados Unidos da América,
mas por minha causa deixou o Brasil por alguns dias e estava aqui diante de
mim para me dar apoio. Ele e eu não éramos tão unidos como antigamente,
ele seguiu sua vida no Brasil, e eu a minha aqui em Boston, às vezes, sentia
que ele me culpava por nossa mãe estar do jeito que estava, e eu não sentia
nenhum remorso.

Daniella Boltoni, minha mãe, não era uma pessoa fácil de lidar, bem
ela era, mas desde o dia em que Anny voltou para minha vida, ela vinha
tendo certos surtos de ódio contra minha esposa. Nos Natais que passamos
juntos, ela se manteve contida e até mesmo próxima às crianças, mas não
tão próxima quanto Anny e eu gostaríamos. Anny não tinha mãe e a minha
mãe se recusava a apoiar nossa relação, o que complicava bastante. Meu pai
no início foi contra, mas depois me deu todo seu apoio, e até passava dias
conosco sem ser feriado, o que deixava meus pequenos felizes e minha doce
esposa mais aliviada pelas crianças terem ao menos o avô por perto.
Olhei para meu irmão que estava me olhando sério com seus olhos
negros, sua barba por fazer estava meio grisalha, o que aparentemente lhe
dava um certo charme, mas meu irmão era um solteiro convicto e nem
tentava entrar neste assunto. Thales e ele diziam que não precisavam se
casar e terem filhos para serem felizes, eu não estranhava esta atitude deles
já que desde sempre eu era o único que possuía o sonho de ter uma linda
esposa e filhos.

— Se continuar me olhando assim socarei sua cara — avisou meu


doce irmão.
— Estou admirando sua beleza, delegado Boltoni — brinquei
sorrindo.
— Esta sua felicidade me irrita, vai sorrir assim para sua mulher...
Porra!

— Para ela o sorriso é diferente, aliás, quando vai me apresentar


minha cunhada? — provoquei. — Você já está com 45 anos, irmão, daqui a
pouco vai estar sozinho e solitário com Thales ao seu lado. — Sorri ao
imaginar a cena na minha cabeça.
— Talvez seja ele e não ela — disse, e não me surpreendi.
— Então quando vai me apresentar? — perguntei, analisando-o.

— Sem perguntas? — questionou minha atitude.


— Se ele ou ela te faz feliz, te ama e te adora e não te magoa o tempo
todo, por mim tudo bem. Não há motivos para mim, seu irmão, julgar.
Porra, eu te amo desgraça dos infernos! Você me batia quando era menor,
mas agora eu bato também — disse sorrindo para ele. — Se está
preocupado com o que vão dizer, digo desde já, manda todos se foderem.
Alê, não liga para nenhum deles. Eu te amo e tenho certeza de que imbecil
do Thales também.
— Exatamente, irmão, meu amor por vocês é infinito igual as estrelas
do céu, por mais que o senhor Ettore tenha seus fiéis cães de guarda, ainda
sou o irmão legítimo de sangue e anuncio que estou vindo morar em Boston
— explanou Thales, surgindo das cinzas com seu típico sorriso de deboche.

— Você o quê? — perguntou Alexandre, olhando para ele.


— Eu vou morar em Boston — repetiu Thales, aproximando-se de
onde estávamos. — Já tenho alguém para ficar no meu lugar na empresa, e
papai concordou em passar o bastão para o Luiz Felipe, nosso primo —
explicou. — Faz um tempo que estamos testando o cara, deixando que ele
cuide dos pepinos maiores e ele está cada vez melhor. De longe irei auxiliar,
mas me cansei do Brasil — continuou, jogando-se no sofá. — Irmão, como
é ter um andar só para você? O trigésimo andar, para ser mais exato, da sua
empresa.
— Apaixonante! Cada vez que subo e olho a vista daqui de cima, me
sinto realizado — respondi sorrindo.

— O sonho de criança se tornou realidade — comentou Alexandre.


— Eu me lembro de você moleque dizendo a todos que um dia
construiria esta empresa gigantesca com reconhecimento mundial. Rimos
do seu sonho, cada vez que venho aqui e vejo o quão incrível esta empresa
é, me sinto orgulhoso de você caçula.
Este filho da mãe quer me fazer chorar só pode.

— Apenas sonhei, acreditei em mim e em quem estava à minha volta


— falei com calma. — Estava perdido e sem direção... Meu coração estava
destroçado, mas ainda tinha o sonho de construir este império. —
Recordações vieram à minha cabeça. — Não quis nenhum troféu que
ganhei, só queria ajudar as pessoas e hoje eu consigo. Não vou até todos,
mas os poucos que vou, faz com que meu coração tenha mais fé e calma.
Não construí esta empresa com o intuito de ficar bilionário e ser um dos dez
homens mais ricos do mundo... Eu apenas construí com o intuito de
alcançar as pessoas que alcancei. Não sei o nome de todos, mas sei que eles
sabem meu nome pelo simples fato de que consegui mudar o mundo deles e
lhes dar esperança para um mundo melhor.
— Este bastardo herdou o que há de melhor em nossa família —
afirmou Alexandre. — Vou ficar sozinho no Brasil?
— Tem a Sara — comentou Thales, mas ambos reviram os olhos.
— Ela já tem sua própria vida — falou Alexandre, e não pude
discordar.
— Todos temos nossa própria vida, e ela apenas é mais na dela.
— Acho que também virei para cá — Alexandre disse. — Já me
cansei de ser delegado em um país onde a lei é quase nula... Está na hora de
parar. — Sua voz soou convicta, mas sabia que para ele abrir mão do seu
distintivo era algo difícil e doloroso. — Arruma uma vaga para mim aqui,
irmão.
— Então, o que acha de trabalhar com jovens rebeldes? — perguntei,
tendo uma ideia. — Então, preciso de um treinador de luta para lidar com
os jovens e acho que você é a pessoa certa para mostrar a eles que podem
ser mais do que violentos e rebeldes.
— Por mim tudo bem. Gostei.
— Cadê Anny? — indagou Thales do nada.
— Em casa com as crianças — respondi, tentando esconder a
preocupação em minha voz.
— Ela está bem? — perguntou Alê.

— Está melhorando — disse, respirando fundo. — Ela teve uma crise


recentemente, mas está melhor. Saí de casa hoje depois de dias para vir aqui
conversar com Alexandre em particular. Ela está tendo que lutar contra si
mesma mais uma vez e não posso lutar esta luta por ela.
— E isso está te destruindo, não é? — perguntou Thales, e não
respondi por que não sabia o que responder a ele. — Você, Dante Ettore, a
ama tanto, mas tanto que faz de tudo para protegê-la de tudo e de todos e
algumas vezes até dela mesma. Você a mima de todo jeito, irmão, mas acho
que já sabe disso ou estou errado? — perguntou, já sabendo a resposta.
— Eu a amo além do infinito. É óbvio que há uma parcela de culpa
dentro de mim por não ter estado com ela quando ela mais precisou. Eu
cheguei dez anos depois e a encontrei destruída por inteira. Eu nem ao
menos sabia como tocar nela sem a ferir. — Minha voz soou tão dolorida
que mal me reconheci. — Apenas faço de tudo para que ninguém a
machuque, não quero e não suporto vê-la ferida. Acreditem quando digo
que para mim está sendo impossível assistir à luta dela e não fazer nada,
mas não posso mais mimá-la. Nossos filhos precisam dela e ela precisa de
si para ser mãe. Ela é incrível, mas precisa ser mais independente de mim.
Compreendem?

— Desde o dia em que se aproximou dela ainda criança, você se


tornou protetor com ela — comentou Alexandre, bebendo água. — Seu
amor por ela sempre foi perceptível para quem quisesse ver. — Fez uma
pausa dramática, digna de palmas. — Sempre invejei este seu lado
carinhoso e sábio. A forma como você olha para ela é como se ela fosse o
motivo pelo qual você respira. É lindo, mas preocupante para muitos.
— Eu sei que nossa conexão faz com que sejamos a arma para nos
auto machucar. Se quiserem me derrubar irão usá-la, é por este motivo que
estou lutando contra tudo e todos para manter minha esposa e nossos filhos
seguros.

— Você não é Superman, Dante — Thales disse. — Por mais que às


vezes você pareça invencível e muitos pensem que você é. Deixe-me dizer,
irmão, você não é. Se cuide também, irmãozinho.
— Eu vou — concordei firme.
— Este é o espírito — falou Thales, levantando-se do sofá. — Agora
vamos falar sobre sua sexualidade, irmão mais velho. Diga-me você é
versátil?
Antes que Thales pudesse dizer algo Alexandre voou nele e ambos
começaram a rolar no chão como cães de guarda. Para completar a
irmandade só faltava Carlos, Pedro e Marco e aí sim estaria completo.
Olhei para os porta-retratos em minha mesa, cada um deles aquecia
meu coração de várias formas e me trazia belas recordações de momentos
maravilhosos. Olhei para a foto tirada no dia do nascimento dos trigêmeos,
foi o dia em que questionei como poderia haver um amor tão denso e vasto
dentro do peito. Eles despertaram em mim algo que não sabia explicar e
muito menos sabia o que dizer. Eles eram meus maiores tesouros, minha
herança e minha maior e melhor herança. Não sabia se era o melhor pai,
mas fazia o impossível para tentar ser o melhor.
Sabia que iria falhar, mas quem não falhava?
Cada um dos meus filhos eram diferentes um do outro. Pietro possuía
a personalidade da Anny, Bruna era uma mistura de nós dois, só que com
mais energia e Nicholas era algo que procurava um dia entender, ele era
meu reflexo na aparência e na inteligência, mas tinha algo a mais nele. Sua
curiosidade com o mundo, vontade de querer ajudar o próximo,
sensibilidade com as dores do próximo, só fazia com que eu me
preocupasse com o seu futuro. Temia que um dia ele se revoltasse com este
mundo e neste dia ele iria cair de forma que meus conselhos não iriam lhe
ajudar. Ele teria que lutar por si mesmo.

As crianças ficaram eufóricas com os tios em casa para o jantar e


Anny me olhou desconfiada, mas não questionou nada.
— Tio, o senhor pode me ensinar a usar arco e frecha? — perguntou
Bruna a Alexandre.
— Para que a princesa quer aprender a flechar alguém? — indagou
meu irmão, cortando sua costela bovina, o filho da minha mãe amava
carnes suculentas. Anny fez o que esse miserável mais amava para o jantar.
— Princesa, é para os fracos quero ser rainha e guerreila — rebateu
minha filha, bebendo seu suco.
— Antes de ser rainha tem que ser princesa, querida — Thales disse,
fazendo Bruna abrir a boca chocada.

— Papai, por favor, me nomeie logo sua rainha! — exclamou,


olhando-me com os olhos mais pidões que o gato de botas. — Ser princesa
é chato, não posso mandar!
Todos caíram na risada, o que a deixou irritada, porque seu rosto
ficou vermelho e um bico se formou em seus lábios. Segurei o riso para não
a deixar ainda mais chateada, mas, porra, era quase impossível segurar o
riso.

— Paipai eu quero continuar sendo príncipe, ser adulto é muito chato


— Pietro falou. — Ir para escola já é ruim.
— Eu gosto de estudar! — exclamou Nicholas.
— Esse é literalmente seu filho, Ettore — provocou Thales.

— Eu também sou filha do papai, tio! — bradou Bruna irritada. —


Pai?
— Os três são verdadeiramente meus filhos, e, filha, você é uma
princesa e sempre será a minha princesinha e não tenha pressa de crescer —
disse, tomando à frente antes que ela e Thales caíssem em uma discussão
porque meu irmão não tinha limites. — Vamos comer a sobremesa? —
Mudei de assunto, ficando de pé.
O jantar foi regado a risos e brincadeiras onde pude apreciar minha
mulher sorrindo um pouco mais do que nos outros dias. Desde a noite em
que fiz com que ela viesse até mim, ela estava mais solta e ousaria dizer que
estava mais atrevida, mas desde aquela madrugada onde nos consumimos
na chama da paixão, ela ficou mais alegre e disposta por alguns dias. Onde
quer que me visse sozinho pela casa, me agarrava e me beijava
profundamente, mas fazia uns três dias que ela estava se distanciando
novamente. Tinha tentado ser eu a procurá-la, mas confesso que estava
sentindo uma certa recusa. Não sabia ao certo o que fazer para mudar isso,
precisava que fosse ela a me dizer o que precisava e o que havia de errado
para que eu pudesse lhe ajudar, mas não podia permitir que ela se fechasse
novamente e se caso isso acontecer sabia que teria que lutar uma batalha e
tanto para salvá-la de si mesma. Se caso ela se prendesse na sua concha
interior, temia não conseguir abrir e pegar minha pérola preciosa de volta.
Estes meros pensamentos me apavoravam de uma forma que não sabia nem
ao menos como reagir.
Oh, meu Deus!

Eu era tão dependente dela, que não sabia o que faria caso a perdesse
mais uma vez. Eu a perdi por dez anos e com toda certeza não sabia se
conseguiria passar por isso novamente...
Ela não percebia o quão dependente era dela.
Depois de colocar as crianças em suas devidas camas e dar boa noite
aos meus irmãos antes de cada um se enfiar em um quarto de hóspedes. Eu
me vi pensativo mais uma vez enquanto senti o jato quente d’água cair
sobre mim com pressão. Se minha esposa fosse esperta, certamente estaria
aqui comigo. Eu adoraria jogá-la contra esta parede de vidro do boxe e me
enfiaria bem fundo dentro da sua boceta, mas aqui estava ficando de pau
duro e totalmente ferrado por não querer bater uma.
Fechei meus olhos, encostando minha cabeça na parede com pesar e
me desliguei do mundo por alguns instantes, até que senti mãos pequenas
esfregarem minhas costas com certo cuidado.
— Sabia, senhor Boltoni, que suas costas são extremamente largas e
bem atraentes? — perguntou minha amada esposa, entrelaçando minha
cintura com seus braços.
— Não, eu não sabia — respondi ainda com os olhos fechados e feliz
por meus desejos serem atendidos.
— Estes braços também são bem sensuais — disse, beijando minhas
costas. — Eu amo cada pedacinho seu — sussurrou, beijando minha pele.
— Anny — gemi quando sua mão desceu por minha barriga.

— Você é meu? — inquiriu, segurando meu pênis com força.


— Meu amor, sou todo seu — reafirmei, pressionando mais minha
testa contra a parede.
— Só me ame — ordenou, segurando meus testículos.

— É o que mais faço — disse, virando-me e beijando levemente seus


lábios.
— Eu te quero dentro de mim — avisou suspirando.
— Eu também quero estar dentro de você, meu amor.

— Dante, quero engravidar de novo — disse, beijando meu pescoço.


— Não — neguei rapidamente.
— O quê?
— Você não vai engravidar — afirmei, olhando em seus olhos,
— Por quê? — perguntou confusa.
— Anny... — Tentei falar enquanto ela se debatia em meus braços.

— Não me toca — disse, saindo do banheiro.


— Porra! — exclamei socando a parede.
O que estava acontecendo com minha esposa?
“Não”, esta simples palavra saída da boca do Dante destruiu todos os
meus planos de aumentar a família. Acho que esse era o melhor momento
de termos mais filhos, pois teriam uma idade próxima aos trigêmeos e assim
poderiam crescer juntos. Vesti o roupão e saí a passos largos do quarto,
desci as escadas correndo. Minha cabeça estava uma loucura e o simples
fato de temer em perdê-lo me assustava tanto que até mesmo fazia loucuras
desenfreadas, em busca de soluções cabíveis que acabavam resultando em
mais problemas.
Parei de andar quando meus pés pisaram no gramado ao lado de fora,
parei, puxei o ar e o soltei, pus a mão abaixo do meu ventre, fechei meus
olhos e comecei a contar minha respiração. Eu sou forte! Aos poucos me
acalmei e por fim entendi o que estava me deixando tão desesperada, era
imagem de Dante com outra pessoa que não saía da minha cabeça e isso
estava me enlouquecendo de uma forma que mal conseguia pensar
coerentemente sobre certos assuntos.
Misericórdia, estava louca de ciúmes e querendo marcar território.
Sentei-me no balanço que havia no parquinho das crianças aqui no
quintal e olhei para cima. Hoje o céu estava tão estrelado, perfeito e
maravilhoso.
Lágrimas molharam meu rosto, mas nem liguei em secá-las já que
continuavam caindo. O vento leve balançava meu cabelo que estava
molhado devido ao fato de que iria fazer sexo com meu lindo e gostoso
marido debaixo do chuveiro. Ainda queria transar. Merda, péssima hora
para fazer drama, Anny, péssima hora, mas não iria voltar agora, ainda
queria mais um filho.

Puta merda, ainda bem que meus cunhados estavam dormindo, se não
assistiriam a um drama e tanto. Parando para pensar era estranho ter Thales
e Alexandre Bolton, já fazia um tempo desde que eles estiveram aqui sem
ser em alguma data festiva e sentia que tinha algo de errado. Não queria
questionar nada, vi que meu marido estava feliz com a presença dos irmãos
e meus filhos também. Eles precisavam deste contato com o resto da família
e não queria que meus pequenos crescessem em uma família destruída
como a minha.
Família, era tão difícil para mim falar sobre meus familiares já que os
que mais me importavam estavam mortos. Pietro, meu irmão e meus avós já
não estavam mais entre nós, sentia tanta falta deles.
Eduardo e eu não éramos próximos e pelo que vi nestes últimos anos
não seríamos. Ele assim como eu se fechou no seu casulo, mas ainda estava
conseguindo passar pela metamorfose para poder voar como uma borboleta,
era um processo lento que precisávamos aceitar e o maior problema era
aceitar.

— Por favor, não me diga que brigaram por nossa causa — disse
Thales, fazendo com que quase caísse do balanço. — Oh, me desculpe, não
é minha intenção te assustar.
— Oi, Thales, não ouvi você chegar — falei, olhando para ele que
estava sentado em um banquinho de madeira que Dante colocou na intenção
de descansar enquanto as crianças brincavam.

— Deve ser porque já estava aqui quando você chegou avoada e se


sentou no balanço chorando. Estava esperando você se acalmar para dizer
algo ou melhor contando os minutos para meu irmão surgir do nada feito
bala em tiroteio, mas você se acalmou e falei a primeira coisa que veio na
minha cabeça — explicou como se não fosse nada demais. — Quer
conversar? — perguntou, olhando-me.
— Não, briguei com seu irmão, foi apenas um mal-entendido e não
tem nada a ver com vocês aqui. Na verdade, estou feliz que estejam aqui —
falei, tentando ao menos lhe lançar um sorriso leve, mas falhei. — As
crianças ficaram bem felizes.
— Fico contente que não seja os motivos das suas lágrimas, senão
meu irmão socaria minha cara, e acredite, ele me derrubaria com um único
soco — disse rindo. — Agora o que te fez chorar, menina linda?

A forma como ele pronunciou a “menina linda” foi uma graça.


Thales era menos sério do que seus irmãos e ele sabia disso. Dante
era uma pessoa centrada, e Alexandre não era bem-humorado e raramente
deixava transparecer seus verdadeiros sentimentos.
— Eu me fiz chorar — falei chorando. — Tendo a estragar tudo,
sabe?

— É eu sei — concordou, pegando-me de surpresa. — Menina Anny,


acho você tão tola por achar que pode dizer algo ou fazer e simplesmente
sair correndo do meu irmão — disse com certa seriedade no olhar. —
Qualquer um vê que meu irmão para a porra do mundo por você se preciso
for. Caralho! Eu não entendo por que diabos você sempre foge dele. Minha
filha, se for para correr, corra para os braços dele. Tenho certeza mais do
que absoluta que ele não malha aqueles braços à toa, é certo de que ele irá
te segurar e não importa o peso que esteja com você — comentou, olhando
em meus olhos. — Eu não sou um cara que se apaixona, acredite, eu não
sou, mas sempre que vejo a forma como meu irmão te olha faz com que eu
deseje olhar para alguém assim também. Às vezes, não sempre, o acho
burro por te amar tanto, mas quem disse que mandamos no coração?
Acredito que mesmo se pudéssemos mandar, ele te escolheria sempre. Não
sou expert em assuntos do coração, mas afirmo que seja lá o que você tenha
dito para ele, não mudará nem uma única vírgula do que ele sente por você
— disse, fazendo-me chorar ainda mais por culpa. — Puta que pariu, você
está chorando ainda mais! Pelo amor de Deus, pare de chorar mulher, não
sei lidar com você chorando — falou exasperado passando a mão na
cabeça. — Eu só não sei e nem sou o Dante Ettore, até o nome mais bonito
ficou com o infeliz — resmungou, olhando para mim com uma expressão
de desespero. — Acho que é nesta hora que te abraço, não é?
Eu não consegui responder nada, pois havia uma bola engasgada em
minha garganta que me impedia de dizer uma única palavra. Eu só sabia
chorar em frente ao meu cunhado desesperado.

— Anny vou te abraçar, okay? — perguntou já ficando em pé.


— Pode deixar comigo a partir de agora, Thales. — Sua voz disparou
feito um trovão.
Estou lamentável!

— Deixarei sim. Anny qualquer coisa abraça meu irmão, ok? —


inquiriu e não respondi. — Eu disse que surgiria do nada. Agora boa noite
— disse e saiu.
Não ia conseguir neste momento olhar para os olhos do meu marido.
Minha atitude no banheiro foi tão imatura que nem ao menos me
reconhecia. Estava tão desesperada que nem conseguia pensar direito e
temia que se abrisse minha boca para falar mais alguma coisa, faria mais
merda.

— Apenas me ouça — disse com seu timbre vocal grave e rouco.


Podia dizer que havia uma suavidade na sua voz controlada. — Minha
opinião continuará sendo a mesma — falou com uma tranquilidade
invejável. — Não é o momento certo para que possamos pensar em ter mais
um filho, mas precisamos focar nos três que estão aqui agora. Bruna está
rebelde e ficando egoísta, Pietro é calmo, mas não interage muito bem com
as outras crianças e Nicholas, ele está pulando de série mais rápido que o
normal — explicou, pegando-me de surpresa. — Nicholas percebe tudo que
acontece à sua volta, e isso é bom, mas ele sabe que tem algo de errado e se
sente culpado. Anny, eu te disse e repito. Você precisa me dizer o que está
acontecendo para que eu possa saber ao menos o que fazer. — Ele fez uma
pausa e suspirou pesadamente. — Somos um casal, uma família, e se tem
algo de errado me conte, você sabe que te ouvirei e de forma alguma virarei
minhas costas ou te julgarei. Desde quando eu te impeço de fazer algo? —
perguntou, deixando-me pensar, então continuou: — Se tem algo
acontecendo dentro da sua cabeça me diga e se acha que precisamos viajar
para resolvermos algo, bastar me dizer que largo tudo e simplesmente vou,
mas, por favor, me diga e quando discordo simplesmente não saia batendo o
pé com raiva. Sente-se e converse comigo, só não fuja de mim, meu amor.
Eu sou louco por você! Só me diga o que está havendo. Querer ter um filho
agora é algo que me pegou de surpresa e se caso já estiver grávida ficarei
feliz demais. Tudo que é para completar nossa família me deixa extasiado,
mas antes preciso que me diga o que está havendo.
Suas palavras sempre me traziam conforto em situações como esta e
não importava o quão terrível as coisas estivessem. Dante sempre me
colocava acima das suas próprias dores e isso me machucava ainda mais.
Eu não sabia lidar com o meu marido na maioria das vezes e isto era
verídico. Dante Ettore Boltoni, ainda era um enigma para mim na maioria
das vezes, ou melhor, quase sempre. Ele era melhor do que um personagem
de um livro de romance ou um príncipe encantado. Ele não só derrotava
dragões como também lutava minhas batalhas internas como se fossem
suas. Ele era perfeito e era meu. Às vezes era inacreditável que ele
realmente fosse real.
— Anny? — chamou e com muito custo ergui minha cabeça em sua
direção.
Ele estava sério e vestido com calça de moletom, uma regata que
nunca usava para dormir e com toda certeza estava sem cueca. Em uma
situação como esta drasticamente focava meu olhar no pau do meu marido.
— Acho que meu rosto é mais para cima — disse, mas nem ao menos
olhei para cima.
Ali eram vinte e poucos centímetros, o que acho bem fora do normal
e isto tudo cabia dentro de mim o que era bem louco. Até no pênis ele era
perfeito.
— Anny? Apreciando a vista?
— Na verdade, estou tentando tomar coragem para olhar para você —
respondi com a voz rouca pelo choro que cessou há pouco tempo.
— Apenas olhe em meus olhos — disse enquanto andava em minha
direção e rapidamente se agachou ficando cara a cara comigo. — Você não
deveria chorar tanto e concordo com meu irmão quando diz que você
deveria ter corrido para os meus braços e não para longe deles — falou,
passando o polegar por onde escorria algumas lágrimas fujonas. — Eu te
amo — afirmou, então me beijou com ternura e correspondi de imediato ao
seu beijo.
Eu amava seus lábios, a forma como ele explorava minha boca e
chupava minha língua fazia com que meu coração se apertasse mais, mas
ainda não sabia se era de arrependimento ou de paixão.

— Eu também te amo — disse, cessando nosso beijo. — Desculpa.


— Por que quer ter mais um filho?
Olhei para ele e respirei fundo sem ter ao certo o que dizer.

— Só achei que seria uma boa hora — respondo —, mas acho que
estou errada.
— Sim, você está. — Sua voz soou firme e grave. — Não é a hora.
— É nessa hora que pulamos do barco? — perguntei brincando,
tentando mudar a tensão entre nós dois.

— A vida é como o mar, há horas em que está tudo calmo e outras


que tudo está agitado, devemos saber velejar o barco em dias assim, me
compreende? Não podemos simplesmente abandonar o barco — respondeu
sério.
— Entendo, vou me esforçar mais — disse sorrindo.
— Bom, o que acha de se esforçar mais neste exato momento me
dando um maravilhoso boquete?
— Acho uma ideia maravilhosa — falei, entrando no seu jogo.
— Acho que hoje gozarei na sua boca, senhora Boltoni, e depois na
sua doce e apertada boceta. — Este tom de voz rouco, bem baixa, no pé do
meu ouvido me deixava tão excitada. — Aposto que já está molhadinha
para mim.

— Sempre estou — sussurrei mordendo o lábio inferior.


— Levante-se e vamos para a floresta — disse, surpreendendo-me. —
Hoje quero você contra uma árvore.
Gemi em resposta.

Dante assim é tão sexy!


Olhei para Anny que tentava ensinar a Pietro como se fazia um bolo
de chocolate, mas meu filho só sabia comer a massa que ainda estava em
fase de preparação. Ele olhou para mim com a boca toda suja, mostrando-
me seus lindos dentinhos que de brancos se encontravam marrons de tanto
chocolate. Bruna e Nicholas estavam sentados sobre o balcão da cozinha
pintando algo, eles não se interessaram pela culinária hoje. Pietro por ser
mais grudado à mãe estava ao lado dela sorrindo, enquanto Anny fazia todo
o trabalho que deveria ser dos dois.
— Papai? — chamou Nicholas.
— Oi, filho — disse, aproximando-me mais dele.
— Se eu pintar o mundo de verde ele ficará melhor? — perguntou.
— Como assim, Nick? — indaguei confuso.
— Papai o mundo precisa ser mais verde, a professora disse que se ter
mais árvores no mundo o ar seria mais limpo e se desmatar menos haverá
mais diversidade na biodiversidade. Mais árvores é sinal de mais animais e
mais ecologia ou estou enganado? — perguntou, surpreendendo-me. —
Vamos plantar mais plantas no mundo, papai. Também quero limpar os rios
e mares... Eu posso fazer isso?
— Você pode, todos nós podemos — respondi, sabendo que minha
voz era de puro orgulho e emoção.

— Quando crescer, desejo poder mudar o mundo, pai — disse


sorrindo. — Quero ser alguém melhor. Vou estudar muito para isso.
— Um passo de cada vez, Nicholas — falei, beijando sua testa.
— Às vezes é preciso correr, papai — comentou e voltou a pintar sua
floresta.

Nem sempre era preciso correr, mas ele só saberia disto mais para
frente, por agora deixaria meu menino sonhar e acreditar, pois era disso que
era feita a vida.
— Amo as árvores, meu filho — disse Anny com um sorrisinho
malicioso que se não fosse pelos nossos filhos neste cômodo, a teria a
jogado em cima desta bancada e enfiado meu pau bem fundo dentro dela.
— Depois vamos plantar algumas árvores lá trás, okay? — perguntou a
Nick que na hora se animou.
Anny estava melhor, eu acho, fazia dois dias que ela me falou sobre
ter mais um filho e tivemos uma conversa sobre isso. Ela disse que
compreendia, mas sabia que ainda havia coisas em sua cabeça e não havia o
que eu pudesse fazer a respeito, só me restava esperar. O bom desta história
foi que no fim fizemos sexo encostados na árvore, depois no chão, o que foi
bastante prazeroso. Amei devorar minha esposa enquanto ela estava
inclinada, segurando forte o tronco de uma árvore, enquanto metia forte
dentro dela.

Porra!
Só de me lembrar já me sentia excitado e pronto para mais algumas
rodadas. Respirei fundo para tentar abaixar a fera dentro da minha calça,
não queria assustar meus filhos.
Meu telefone tocou no meu bolso chamando minha atenção e quando
vi o nome da minha mãe na tela sabia que algo bom não era.

— Vou ali no escritório e já volto. Não coma toda a massa, Pietro —


alertei e saí a passos rápidos.
— Oi, mãe — atendi assim que fechei a porta do escritório. —
Aconteceu algo? — perguntei, deixando claro que estava estranhando sua
ligação.
— Não, não aconteceu nada, apenas queria conversar com meu filho
— disse com um tom de voz que até parecia sofrido. — Gostaria de
conversar sobre meus netos — falou, ganhando minha total atenção.

— Claro, pode falar — disse, sentando-me na minha cadeira.


— Gostaria que eles passassem mais tempo comigo, mas apenas nós
— esclareceu, e já entendi que estava excluindo Anny da visita. — Não
tenho muito o que conversar com sua esposa, então quero passar um tempo
somente com eles.
Respirei fundo para manter minha mais adorável calma, mas estava
ficando difícil.

— Mãe, Anny é mãe deles. Ela é minha esposa, a mulher que escolhi
amar.
— Dante, compreenda, meu filho — disse minha mãe com a voz
chorosa. — Eu amo meus netos, mas não consigo me entender com sua
esposa.
Ela nem ao menos tentava, mas me mantive quieto e deixei-a falar.
— Gostaria que eles passassem as férias aqui em casa comigo, seria
ótimo para minha reaproximação com meus netos e Sara também adoraria
passar mais tempo com os sobrinhos. Apenas os envie para ficar ao menos
quinze dias comigo.

Quinze dias... Quinze dias...


Minha mãe estava querendo algo impossível. Ela do nada veio com
essa ideia louca de que queria passar mais tempo com os netos, eu não tinha
nada contra isso, mas só de pensar que meus filhos ficariam longe de mim
por quinze dias me deixava perturbado. Gostava de mantê-los diante dos
meus olhos, o que para mim era bem mais prático e seguro, ainda mais
agora com essa nova e infeliz ameaça que surgia e sumia do nada. Não
queria manter meus filhos longe das minhas asas, era um pai coruja e não
negava isso. Sem falar que Anny estava em uma fase grudada nas crianças,
o que para mim era algo maravilhoso.
— Mãe, sinto muito em dizer, mas isso não será possível, as crianças
não vão sair daqui... Se quiser ficar com eles venha para cá, aproveite para
se aproximar da sua nora e passar mais tempo com o seu filho — disse e
ouvi seu suspiro frustrado. — Mãe, Thales e Alexandre estão vindo morar
aqui, ambos já até mesmo estão passando um tempo aqui para ver onde irão
morar e de que forma irão trabalhar. Aproveite e venha para passar um
tempo conosco — falei já sabendo a resposta.
— Eu não gosto daí e não sabia que seus irmãos estavam de mudança,
mas o que isso muda se nenhum deles passa sequer um tempo comigo. Só
tenho filhos ingratos — reclamou em um tom chorando. — Você foi o
primeiro a me abandonar quando foi embora por causa dela e agora se
mantém longe também por causa dela.
— Mãe — alertei.
— Não começa, Dante Ettore Boltoni, você sabe que o que digo é
verdade. Você parou e sempre para seu mundo por causa dela. Ela te feriu,
te fez sangrar e por causa disso você quase tirou a sua vida. Você pode
imaginar o que foi ver meu filho quase morto?

Fechei meus olhos sabendo o quão ruim isso foi para ela, mas gostaria
que minha mãe compreendesse que o que Anny fez para mim, foi uma
forma de me proteger e sabia perfeitamente que o que ela fez foi errado. Ela
deveria ter me contado a verdade, mas o que isso importava nesta altura do
campeonato?
Todos nós fomos feridos drasticamente, mas o que podia fazer para
melhorar a situação?
Como posso desfazer este nó?
Só eu enxergo Anny como uma vítima da circunstância?
Por qual razão tenho tantas perguntas e poucas respostas?
— Mãe, foi imprudência minha ter me lançado penhasco abaixo —
disse com uma voz cortante. — Eu agi por impulso e acabei pulando.
Que mentira mais mentirosa.
Quem estou tentando enganar?
Eu sabia o que estava fazendo, pulei porque não aguentava mais a dor
em meu peito, mas isso não vinha mais ao caso. O que passou já se foi e
assim como o rio não voltava, também não devíamos viver do passado.
— Dante, meu filho, hoje você é pai, me diga como se sentiria se
visse seu filho neste estado? — perguntou, insistindo nesse assunto tão
doloroso.
— Iria me sentir morto e falho — sussurrei mais para mim do que
para ela. — Eu choraria com ele e não o julgaria, estenderia minha mão e
lhe daria meu colo, enxugaria suas lágrimas e tentaria pegar suas dores para
mim — disse ao me lembrar como minha mãe reagiu. — Eu não o
condenaria ou muito menos gritaria em sua cabeça, mãe, tentaria curar sua
dor nem que fosse preciso pegá-la para mim — falei, sabendo que estava
por um fio. Este assunto era algo que ainda não superei, mas era algo que
evitava para o meu próprio bem. Anny e eu já nos perdoamos por isso. — A
senhora nunca me consolou, me lembro de vê-la amaldiçoando o mundo,
mas em momento algum chorou ao meu lado me abraçando. Senti falta da
senhora como mãe naquele momento.
— Eu fiz o que pude, não permiti que aquela menina se aproximasse
de você. Ela havia abortado um filho que nem ao menos era seu.
— Era meu, mas não foi ela que abortou. Ela foi obrigada a tomar os
medicamentos e o verdadeiro culpado assumiu a culpa por este ato. Ela,
assim como eu, foi vítima das circunstâncias, e, mãe, ela também sentiu a
dor de perder um filho.
— Para mim tanto faz. Vou desligar já que não poderei ficar um
tempo com meus netos, não tem motivo para ficar discutindo com você —
disse e desligou.
Amava a minha mãe, mas tinha horas que simplesmente não sabia
lidar com ela e com sua implicância descabida com minha esposa, mãe dos
seus netos. Achei que com o tempo ela deixaria a razão falar mais alto e
compreenderia que não havia motivo para ficar olhando para trás, mas acho
que ela não pensava assim.

Que tolice minha achar que tudo ficaria bem.


Talvez mais para frente as coisas viessem a se acertar e assim
poderíamos enfim passar um Natal sem fingir que estava tudo bem.
Que merda, parece que tudo estava desmoronando bem diante dos
meus olhos!

Diziam que o segredo de um bom relacionamento era o sexo e eu não


duvidava disso. Sexo era uma parte extremamente necessária para o
casamento e disso me recusava a abrir mão. Anny e eu precisávamos desta
conexão carnal que às vezes era como se estivéssemos com fome um do
outro, já em outras ocasiões era como se precisássemos apenas nos encaixar
um no outro como um quebra-cabeça. Havia momentos em que
precisávamos deste encaixe para que pudéssemos saber que estávamos bem
e que estávamos sendo o abrigo um do outro. Ela precisava do meu toque
para saber que estava tudo bem, então sempre buscava estar o mais
conectado possível a ela.

Olhei para minha esposa dormindo após uma gostosa maratona de


puro prazer, onde eu amei e adorei seu corpo. Foi extremamente prazeroso
embolar meu corpo ao seu. Adorava a tonalidade da nossa pele juntas, ainda
mais quando havia um certo brilho causado pelo suor do nossos corpos.
Amava beijar sua boca e depois descer esses beijos pelo seu pescoço, seios
e por fim chegar à sua doce boceta que foi feita para mim, apenas para mim.
Beijei seu ombro, puxei o cobertor sobre seu corpo nu e me levantei da
cama. Estava sem sono e ficar deitado aqui só me deixaria mais inquieto.
Vesti uma calça moletom e saí do nosso quarto em silêncio para não a
acordar.
Desci a escada a passos lentos sabendo que nem os cachorros estavam
acordados neste exato momento, o que para mim era ótimo. Precisava
pensar com calma e saber qual seria minha próxima jogada.

Adentrei meu escritório, fechando a porta atrás de mim com calma,


caminhei até minha mesa e me sentei na minha confortável cadeira. Antes
de ligar meu notebook respirei fundo, estava na hora de ver o que estes anos
todos evitei enxergar.
Nervoso, passei as mãos pelo meu cabelo, bagunçando-o ainda mais.
Eu precisava ver isso, mas era algo que estava sendo usado contra mim. Era
algo que precisava ver para entender melhor como montar meu plano de
defesa, pois precisava montar um plano excelente de defesa. Desta vez, se
precisasse ir ao tribunal, seria o advogado perante o juiz. Estava na hora de
Dante Boltoni se levantar e parar de se esconder atrás dos outros.
Peguei meu telefone, enviei uma mensagem para Alexandre.

“Comece o jogo, deixe-os acharem que perdi.


Não se preocupe ficarei bem.”
Ele não me respondeu de imediato.

“Dante, sei que está nervoso, mas podemos fazer isto de outra
maneira.
Você não precisa entrar na linha de frente.
Eu faço isso.”
Sorri lendo sua mensagem, pois não estava a fim de mudar de ideia.
Desta vez iria ficar na linha de frente.
Peito a peito, cara a cara, olho por olho.
“Obrigado, irmão, mas é minha família que está em jogo e eles vêm
em primeiro lugar.
Não se preocupe, sei me cuidar.”
Ele visualizou e não respondeu, pois sabia que não mudaria de ideia.
Alexandre sabia que por Anny e pelas crianças faria o impossível se tornar
possível. Gostaria de não ter que fazer tudo isso, mas nem sempre querer é
poder e eu me recusava a perder.
Agora com toda certeza é guerra!
Coloquei o pen drive, esperei o arquivo abrir, cliquei na única página
que havia para abrir e respirei fundo mais uma vez antes de dar play nos
vídeos que estavam ali.
Se eu soubesse o que veria jamais teria aberto, foi tolice e uma total
imprudência fazer isto, mas achei que daria conta do recado.
Minhas mãos tremiam...

Meu corpo tremia...


Estava me sentindo sufocado!
Uma lágrima escorreu pelos meus olhos e uma dor se cravou em meu
peito, então fechei meus olhos, permitindo-me chorar feito uma criança.

Estava desolado!
Oh, meu Deus, como doía!
Quando era criança ouvi minha avó me dizer que amar era dar e
receber, mas que, além disso, era saber apoiar seu parceiro em todas as
situações, respeitar quem te amava e receber o respeito de volta. Me lembro
que ela me dizia que muitas das vezes era preciso deixar seu parceiro
respirar um pouco sozinho para que na hora certa ou em caso de algum
problema, ele viesse até você e era isso que estava fazendo, esperando
Dante vir até mim.
Suspirei, vendo-o brigar com alguém do outro lado da linha
telefônica. Ele estava estranho tinha alguns dias, mas assim como ele me
deu um tempo para pensar, estava fazendo o mesmo com ele. Sabia que não
era a única com problemas internos e por isso compreendia que precisava
deixá-lo se dar um tempo. Não era boa em ler as pessoas, entretanto,
compreendia que meu marido precisava se resolver com ele mesmo.
Gostaria de poder ajudá-lo, mas neste exato momento estava nadando
contra as ondas da minha própria mente.
É frustrante e muito, mas o que posso fazer?
Precisava lidar com minha luta interna para que eu pudesse ajudá-lo
na sua. Apenas precisava continuar nadando sem deixar que as fortes ondas
me afundassem.
— Anny, temos que ir logo senão iremos nos atrasar para sua consulta
— disse, fazendo com que eu desse um pulo de susto e colocasse a mão no
peito. — Desculpa, não era minha intenção te assustar — falou, pegando
minhas mãos com carinho.
Ele era tão perfeito que era quase impossível não o amar ainda mais a
cada dia.
— Estava distraída — disse, selando nossos lábios de leve.
— Posso saber quem estava tomando sua atenção? — perguntou,
mordendo meu queixo.

— Ah, estava pensando em um moreno perigoso que não sai um


segundo sequer dos meus pensamentos. O desejo o tempo todo e o amo
tanto que às vezes chega a doer — respondi, olhando em seus olhos negros.
— Esse certo moreno perigoso e gostoso, é dono dos meus sonhos e desejos
mais profundos. Ele é sexy e melhor ainda só meu — falei, passando a mão
pelo seu peito musculoso com calma.
Ele é tão gostoso!
— Devo sentir ciúme desse moreno?

— Ele sabe compartilhar, não se preocupe — brinquei.


— Eu não compartilho, senhora Boltoni — declarou, beijando meu
pescoço. — Fico excitado em saber que pensa em mim todos os segundos
que pode, mas antes que eu te leve para o nosso quarto e te coma sem
pudor, vamos para a consulta. — Ele se afastou e piscou para mim. —
Vamos logo, senhora Boltoni.
Sorri para ele e o segui.
No quintal percebi que ele já deixou um dos seus brinquedinhos à
nossa espera. Dante amava carros e não poupava dinheiro para obter os
melhores e mais seguros. Eu apenas o seguia quando se divertia com seus
brinquedos de quatro rodas que mal dirigia já que temia estar um dia com as
crianças e perder o controle da direção.

Deus me livre ferir um dos meus bebês.


— Podíamos um dia sair por aí de moto — comentei quando ele já
estava na metade do caminho do consultório.
Dante me olhou pelo canto dos olhos, mas não disse nada.

— As crianças podem passar um tempo com sua mãe.


A mãe do Dante, minha sogra, me ligou ontem pedindo para que as
crianças ficassem um tempo com ela e respondi que pensaria. Ela não
gostava de mim e não a julgava por isso, errei feio com o filho dela no
passado, e ela temia que o machucasse de novo, hoje por ser mãe
compreendia perfeitamente este sentimento de proteção que ela criou com o
filho. Só esperava que um dia não ficasse guardando mágoa assim.
— Como assim? Minha mãe falou com você? — perguntou com um
tom de irritação na voz, o que me surpreendeu, enquanto fazia uma curva
fechada que havia na estrada.

— Sim. Ela foi breve e deixou claro que gostaria de passar mais
tempo com os meninos. Eu achei a ideia ótima — disse sorrindo levemente.
— Não tenho mais pais para eles chamarem de avós, só resta os seus, e é
muito importante que eles tenham uma boa conexão com os avós da mesma
forma que eu tive com os meus — falei com calma, estudando bem o que
estava dizendo. — Será bom para eles e para nós.
— Se minha mãe realmente quiser passar mais tempo com os netos
pode vir perfeitamente até nós — comentou de forma grosseira, o que quase
nunca aconteceu.
— Ettore, por favor, sua mãe não gosta de mim e entendo
perfeitamente, mas não posso permitir que por minha causa ela fique longe
dos netos. Isto não seria justo. Nossas diferenças podem se resolver com o
tempo, mas ela não pode e nem deve perder tempo com os netos — afirmei,
pegando sua mão e a apertando levemente. — Amor?

Ele respirou fundo, e não disse nada.


Dante estava estranho e sinceramente não sabia o que dizer ou fazer
para melhorar a situação. Estava completamente perdida comigo mesma
nesta situação toda. Em todos estes anos nunca vi Dante falar com raiva da
mãe e por mais que ele estivesse magoado com ela, jamais falou assim.
Uma situação preocupante que não sabia como resolver.
— Dante, eles precisam passar mais tempo com seus pais e passar dez
dias lá será ótimo. Caso as coisas não derem certo os buscaremos — disse
com cautela na voz.
— Vou pensar nisso, mas não estou bem com esta ideia — falou
baixo, mas sério.
— E sobre viajarmos de moto por aí? — perguntei, passando minha
mão por sua coxa, dando leves apertos.
— Acho uma ideia incrível — respondeu, pegando minha mão,
subindo-a pela sua virilha até posicioná-la em seu pênis meio ereto. —
Aperte outra coisa sem ser minhas coxas malhadas, senhora Boltoni. — Seu
timbre vocal ficou mais baixo e rouco o que fez com que minha boceta se
contraísse e minha calcinha começasse a ficar úmida.
— Dante! — pronunciei, apertando seu maravilhoso pau.
— Agora não, senhora Boltoni, chegamos — anunciou estacionando
o carro, retirando minha mão. — Deixa eu me acalmar um pouco, senão
vão me chamar de tarado — comentou, dando um pequeno sorriso de lado.

Se Dante usasse uma calça mais apertada, seu pau ficaria bem-
marcado que me deixava cheia de raiva. Ele é pauzudo demais e qualquer
coisa marcava o monumento que ele tinha entre as pernas, o que era bem
irritante para mim, pois as mulheres mal desviavam os olhos.
Ai que ódio!
Quando ele estava mais “calmo” descemos do carro e seguimos rumo
ao elevador. Dante segurou minha mão firmemente, já sabendo do meu
medo deste maldito troço metálico que sempre achava que ia cair. Quando
estava sozinha com as crianças e entrava em um elevador me segurava o
máximo possível para não surtar.
Sorri para a recepcionista ao passar por ela e seguimos até a sala da
doutora Jane. Dante largou minha mão quando chegamos à porta e me
beijou de leve. Sorri para ele e entrei, não precisávamos dizer uma só
palavra, sabia que ele me apoiava e me dava forças como sempre.
A Doutora Jane já estava sentada em sua poltrona e se levantou para
me cumprimentar.
— Anny, quanto tempo! Como vai? — perguntou, abraçando-me.
— Faz um tempinho, como foram suas férias? — perguntei de volta.
A melhor forma de evitar uma pergunta era fazendo outra.
— Foram ótimas — respondeu como se não tivesse evitado dizer se
estava bem ou não. — Sente-se, por favor.
Olhei para o divã e para o sofá, e optei desta vez pelo sofá marrom
que neste exato momento me parecia muito mais acolhedor. Tirei minhas
sandálias, me deitei no sofá como se aqui fosse minha casa e talvez até
fosse já que amava estar aqui. Gostava muito de conversar com a doutora
Jane.
— Sabe, Jane, estou um pouco confusa, mas também estou com raiva
e com uma clareza maior das coisas à minha volta.

— Pode me explicar melhor, Anny?


— Tive um surto feio, foi uma crise que me deixou de cama e fez
com que tivesse que tomar alguns calmantes. Tudo isso foi na frente dos
meus filhos. — Senti minha garganta ficar seca. — Eles que ligaram para
Dante e só me acalmei quando ele chegou. — Fiz uma pausa, enxugando
minhas lágrimas. — Eles devem estar achando que sou louca. Meus filhos
não merecem uma mãe louca.
— O que fez com que tivesse esta crise? — perguntou.
— Vi uma montagem onde Dante beija outra mulher, então surtei —
confessei com voz baixa e tremida por causa do choro. — Dante explicou
para eles, e Jane precisa vê-los cuidando de mim. Fazia algum tempo que eu
não estava bem e esta foto foi o gatilho para minha queda.
— Como você está agora, Anny?
Esta pergunta não deveria ser feita para mim desta forma, mas ela fez.
— Estou melhor. Dante e eu conversamos e resolvemos certas
questões do nosso casamento.
Dante sempre me ajudava e sempre fazia de tudo para que
pudéssemos ficar bem.
Ele é meu porto seguro...

Preciso controlar minha dor e meu ódio...


Preciso me manter sobre a água e não submerso por ela...
Preciso não me deixar afundar e só preciso continuar nadando.
Continue nadando, Dante Ettore...
Só continue nadando.
Olhei à minha volta me recordando da primeira vez que estive aqui e
a vi, na época me apaixonei pela Anny Rizzi, já sabendo que se tornaria a
senhora Boltoni, minha esposa. Amava a forma como meu sobrenome
combinava com ela, pois Bella nasceu para ser minha. Eu a amava tanto que
tinha horas que me perguntava o que mais seria capaz de fazer por esse
amor. Era capaz de fazer tudo e não me importava se ficaria destruído no
processo, o que me importava eram eles...

Somente eles.
Podia suportar o que fosse por eles, pois por eles eu podia tudo.
Repetia isso para mim todos os dias e temia todos os dias o que isso
significaria daqui alguns anos. Eles me veem como seus portos seguros,
mas mal sabiam que eles eram o meu.
Levantei-me da cadeira e olhei o relógio, sabendo que a consulta hoje
iria demorar um pouco. Desci para o térreo e segui para a rua, pois
precisava tomar um pouco de ar para refrescar um pouco a mente. Na
calçada observei os carros passando, assim como eu no outro lado da rua
havia pessoas que queriam atravessá-la ou até mesmo só caminhavam por
caminhar como eu. Às vezes só queremos um tempo para nós mesmos.
— Oi, moço grande — disse uma voz infantil que na mesma hora
reconheci.

— Quanto tempo, Romeu Smith — falei, virando-me para ele.


Esta criança com toda certeza estava bem melhor do que anos atrás.
— Faz um tempo, Ettore. — Sorri ao ver a forma como ele
pronunciava meu nome, pois era engraçado. — Ainda sinto dificuldade em
dizer seu nome — confessou sem graça.
— Estou vendo, mas relaxa — disse, bagunçando seu cabelo. — Você
cresceu — comentei o óbvio.
— Fiz o que o senhor disse. Minha meta é ser tão grande quanto o
senhor — falou, sorrindo para mim.
— Seja grande, Romeu — me limitei a dizer.

— Serei igual a você — disse, e senti orgulho do menino. — Estou


bem melhor. Minha mãe recebeu ajuda de um homem chamado Dante
Boltoni e hoje estamos bem. Vou a uma boa escola e espero um dia me
tornar um grande homem. Minha família não passa mais por dificuldades
por causa deste homem e minha mãe não apanha mais do meu pai, porque
Dante Boltoni o colocou na cadeia. O cara é incrível! — exclamou com os
olhos brilhantes. — Você é meu exemplo de vida, e ele é meu herói. —
Suas fortes palavras chegaram até meu peito.
— Romeu, Romeu... Seja o que desejar ser, mas de forma alguma,
passe por cima de alguém — ensinei, olhando para ele. — A vida é
complicada, mas jamais perca a esperança no amanhã, nunca se esqueça do
ontem e de forma alguma deixe de viver o hoje. Acredite em si mesmo,
acredito que você será uma pessoa exemplar e com toda certeza será o herói
de alguém um dia. — Apertei seu ombro e sorri.
— O senhor é filósofo? — perguntou inocente.

— Não, eu não sou — respondi sorrindo ainda mais para ele.


— Suas palavras são de conforto e trazem paz para quem as ouve,
mas me pergunto se trazem para o senhor.
Suas leves palavras me acertaram em cheio.

— Tento seguir o que creio e digo o que acho e acredito — disse mais
para mim do que para ele. — Sabe, Romeu, acredito que tudo posso por
quem amo e por acreditar nisso faço acontecer. Acredite em si mesmo e
faça acontecer.
— Um dia, serei como o senhor, mas por agora estou em fase de
crescimento. — Ele me arrancou uma gargalhada.
— Cresça devagar. Não tenha pressa.

— Romeu, vamos embora — alguém o chamou.


— Tchau, Ettore — disse e saiu correndo até sua mãe.
O caso da mãe dele foi um caso complicado, pois ao mesmo tempo
em que ela queria denunciar o marido, possuía esperança de que ele
melhoraria um dia. Não foi fácil fazê-la entender que precisava de ajuda,
mas no final deu tudo certo, e ver hoje Romeu Smith bem era uma
recompensa e tanto, algo que dinheiro nenhum poderia me recompensar.
Valia a pena lutar pelos injustiçados.
— PAPAI? — gritou Bruna, tirando-me dos meus pensamentos.
— Oi, minha princesa — disse sorrindo para ela.
— Até que enfim me atendeu — reclamou, batendo o pé no chão. —
Papai onde vamos passar as férias de verão?

Olhei para os três que me encaravam com expectativa. Eu não sabia o


que dizer, nem ao menos havia planejado algo a não ser ficar em casa.
Observei minha esposa que entrou no cômodo e se recostou na parede me
olhando. Acho que isso era um complô para que pudesse me decidir logo.
Quem diria que um dia eles se virariam contra mim?
Sentia-me abandonado.
Respirei fundo sabendo o que Anny queria, porém por mais que
discordasse da sua decisão e opinião, iria aceitar por mais difícil que fosse
para mim. Deixaria que eles ficassem quinze dias no Brasil com meus pais,
mas com toda certeza meus seguranças estariam junto e conversaria com o
meu pai sobre minha mãe. Não podia permitir que eles ficassem apenas
com minha mãe, vai que ela ouse falar mal da Anny para as crianças.
Preferia desconfiar a confiar de cara.
— Vocês passarão quinze dias com os seus avós no Brasil e o restante
das férias passaremos na Itália, o que acham? — perguntei, vendo Anny
sorrir abertamente.
— Legal! — exclamaram os três juntos. Começaram a pular e saíram
correndo junto com os cachorros.
— Que ótima decisão, senhor Boltoni — ela disse, aproximando-se
de mim.

— Gostei da ideia de viajar de moto com minha fabulosa esposa por


aí — comentei sorrindo para ela. — Como você está? — perguntei, já que
desde a hora em que chegamos da sua sessão ela estava na dela.
— Estou bem. Senti falta e hoje pude matar um pouco a saudade —
confessou. — Amor, você está bem?
Olhei para seus olhos e me perguntei por um instante o que lhe dizer,
mas sinceramente não sabia.

Não podia lhe dizer que vi um vídeo que mal me permiti dormir a
noite ou que me levantei e chorei com as lembranças do que vi. Se eu disser
isto a ela teria que mostrar qual vídeo era, e isso a destruiria. Então, por
estas razões, me calei e sorri.
— Estou apenas com saudade da minha esposa cavalgando sobre mim
— disse sorrindo safado.
— Quando quiser conversar venha até mim — falou, fazendo com
que meu peito doesse mais um pouco. — Assim como você me espera, eu
também te esperarei — explanou sorrindo com os olhos cheios de lágrimas.
— Eu te amo e seja lá o que for venceremos juntos.

Este foi o gatilho para que fosse submerso pelas minhas dores. Chorei
na sua frente e caí de joelho no chão. Anny correu até mim e me abraçou
com força. Como um menino assustado a abracei com força. Ela beijou
meus lábios e enxugou minhas lágrimas com carinho. Não estava sabendo
lidar com o que vi e olha que estava preparado para tudo.
— Dante, meu amor, estou aqui — afirmou, apertando-me, enquanto
me beijava tentando enxugar minhas lágrimas.
— Estou com medo — confessei com a voz rouca.

— Estou aqui — declarou, consolando-me.


— Só fique aqui ao meu lado — pedi em um fio de voz.
Eu me prendi a ela como se minha vida dependesse disso e
estranhamente dependia.
Estava cercado de amor e com toda certeza sendo esmagado também.
Anny estava me agarrando com a cabeça em cima do meu peito, Nicholas
estava do outro lado da mesma forma e no outro lado da cama Bruna e
Pietro estavam agarrados ao meu pé. Só faltavam os cachorros na cama.
Misericórdia!
Eu mal conseguia respirar, mas me sentia querido e amado desta
forma.

Desde a hora em que tive a crise de choro, tomei um banho, me deitei


e logo depois eles apareceram e não saíram mais de perto. Bruna e Pietro
pentearam meu cabelo, Anny me deu comida na boca e Nicholas segurou
minha mão o tempo todo. Nem um deles me deixou só e era nessas horas
que era grato por ter minha família ao meu lado.
Eles eram minha fortaleza.
Meu tudo!

— Papai? — Nicholas sussurrou, chamando-me.


— Oi?
— Vai chorar de novo? — questionou.
Movi minha cabeça para seu lado e por alguns segundos me
questionei o que iria respondê-lo. Ele era esperto e perspicaz, com toda
certeza tinha meu gene.

— Papai deve chorar mais um pouco sim, mas não por agora —
respondi sincero. — Estou machucado ainda e a ferida é interna, por isso
ela leva mais tempo para sarar, mas logo estará curada — sussurrei para ele.
— Não é errado ou feio chorar, Nicholas, lágrimas não fazem ninguém mais
fraco só demonstram que somos humanos — disse e podia jurar que seus
olhos escuros estavam brilhando.
— Você é forte, papai, você é meu herói — afirmou, passando a mão
no meu rosto. — Prometo que um dia serei metade do homem que é. Quero
ser uma rocha igual a você — falou e me abraçou. Fechei meus olhos
sentindo o peso das suas palavras sobre mim e eu nem sabia o que dizer...
Na verdade, nem sabia o que me dizer. Eu era forte, mas neste
momento me sentia fraco e derrotado, mas estava tudo bem.

Dias ruins são necessários para que os bons venham.


Eu era bom em lidar com situações difíceis, além de ser bom em
perceber o que havia de errado e resolver o mais rápido possível.
Era bom em proteger minha família!

Era ótimo no requisito do amor, mas não era bom em me proteger de


avalanches que vinham contra mim. Meus sentimentos eram intensos o que
significava que minhas dores também seriam, mas como dizia para mim
mesmo era só dar um passo de cada vez.
Sempre gostei de ter pensamentos positivos e amigáveis sobre as
coisas, é claro que não sobre absolutamente tudo, principalmente sobre
família e lealdade.
Sempre pensei positivo.

Nos tribunais devorava meus inimigos, na empresa mantinha tudo sob


controle, mas em casa me sentia muitas das vezes pequeno e sem controle
da situação. Anny na maioria das vezes deixava que eu resolvesse as coisas
e por mais que eu não me importasse às vezes me sentia sobrecarregado.
Ela estava tendo seus momentos difíceis e compreendia perfeitamente.
Fechei meus olhos e tentei dormir, mas ao fechá-los vieram as
imagens daquela maldita filmagem. Não conseguia respirar e por mais que
tentasse sentia que não conseguiria. Não era para doer tanto assim, sabia de
tudo e até mesmo ouvi sobre isso, mas assistir era algo que corroía minha
alma. Um nó se formou em minha garganta e mais uma vez a vontade de
chorar apareceu.
Meu Deus do céu, o que está havendo comigo?

Quando foi que perdi o controle das minhas próprias emoções?


Estava navegando em um barco à deriva dentro de mim mesmo,
precisava sair do meio desse redemoinho, mas me perguntava como. A
confusão de sentimentos crescia dentro de mim.
Olhei para o teto escuro em busca de algum vestígio de sono, mas
meu Deus do céu estava difícil. Não acho que dormiria esta noite, a menos
que o cansaço me vencesse na marra. No meu pé senti alguém se mexendo
e resmungando algo, Bruna como sempre. Anny estava mais grudada a mim
e Nicholas ainda estava acordado, este menino precisava dormir.

— Filho, durma — disse baixinho.


— Só depois de você, papai — rebateu, fazendo cafuné na minha
cabeça. — Espantarei todos os pesadelos que tentar pegar o senhor,
prometo.
Ele ao menos poderia ter um pouco menos de inteligência e deixar
para ser mais esperto daqui a alguns anos.

— Papai está sem sono, mas você tem aula amanhã — falei com
calma e baixo para não acordar os outros.
— Você trabalha amanhã. Posso ir com você amanhã para a empresa?
— perguntou animado.
— Você tem aula — relatei o óbvio.

— Já fiz a prova final e passei, pode olhar no bilhete que a professora


mandou, sendo assim, não preciso ir amanhã — contou, surpreendendo-me.
— Estou de férias já!
Este menino com toda certeza seria mais inteligente do que eu, porém
era inegável que também seria mais sensível, o que significava, que ele se
quebraria com mais facilidade e se reconstruiria com mais dificuldade. A
vida era um bálsamo que nem sempre tratava a alma, mas sim a destruía.
— Sendo assim, não vejo o motivo de não ir comigo. Agora durma —
pedi já quase suplicando.
— Papai, vou cantar para você dormir — disse, e abri um sorriso
sincero para ele. — Era uma vez um lugarzinho no meio do nada com sabor
de chocolate e cheiro de terra molhada...
Ele cantava bem e aos poucos minhas pupilas foram ficando pesadas,
enquanto suas mãos pequenas na minha cabeça me fazendo cafuné eram
como fogo latente em meu coração. Seu carinho e preocupação me
encheram de alegria e de esperança de que poderia suportar tudo. Não
importava os momentos sombrios da vida, nada era perfeito e era esta
imperfeição que dava graça à vida.
Nunca pensei que aos meus trinta e seis anos, prestes a completar
trinta e sete, seria cuidado e posto para dormir pelo meu filho de quatro
anos. Acho que alguns ciclos eram quebrados quando menos esperávamos...

Hoje de manhã acordei com eles me chamando e fiquei surpreso ao


receber café da manhã na cama e muito carinho.
Anny me olhava com expectativa de que em algum momento fosse
desistir da ideia de ir trabalhar, mas se ficasse em casa enlouqueceria com
toda certeza. Precisava distrair minha mente um pouco e trabalho era algo
perfeito para isso. Antes de sair de casa e deixar Bruna e Pietro na escola
afirmei a ela que tudo ficaria bem e que era apenas uma fase de
autoconhecimento. Não gostava de preocupá-la, mas sentia que às vezes
isto seria impossível.
Olhei para minha mini cópia que estava vestindo um terninho
parecido com o meu. Nicholas estava chamando atenção e não podia fazer
nada para mudar isso, inclusive, não me cansava de olhar para ele.
Meu filho estava lindo!
Desde o segundo em que pisamos dentro da empresa, todos pararam
para nos olhar, ou melhor, para dizer, “olha para ele”. Esta criança, pequena
de cabelo escuro e olhos cor de petróleo, estava conseguindo chamar mais
atenção do que um ator de Hollywood. Ele sorriu e cumprimentou a todos
com simpatia.
Entramos no elevador e digitei o número do último andar. Quando as
portas metálicas se abriram, saí, cumprimentei minha secretária e ela como
sempre sorriu simpática e me passou a agenda do dia.
— Senhor, há uma reunião daqui alguns minutos com o senhor Liard
e o senhor Haylock. Após o almoço uma reunião com o senhor Meditte —
falou enquanto andávamos.

— Obrigado — agradeci e entrei na minha sala. — Pode ficar à


vontade — disse ao Nick quando o coloquei no chão.
Ele só acenou, pegou um livro para ler e andou até o sofá do canto.
Subiu nele e começou a folhear as páginas. Esse garoto gostava de ler.
Tirei meu paletó, coloquei atrás da minha cadeira e antes de me
sentar, liguei o computador e comecei a revisar alguns casos que mereciam
atenção máxima. Fiquei alguns segundos assim até que minha porta foi
aberta por dois trogloditas, um ruivo e outro negro.
— Papai Dante! — exclamou Pedro, chamando-me pelo maldito
apelido que me deu.
— Oi, tio Pedro — disse Nick, ganhando a atenção dos dois. — Oi,
tio Marco.
— Nick, você já é parecido com seu pai sem estar vestido assim, mas
criança amada você está idêntico ao seu pai, hein? — Ele se virou e olhou
para mim. — Este menino é sua cópia fiel, meu amigo, está de parabéns.
Você com toda certeza soube usar o pincel, não só você como este ruivo
safado aqui também — disse, apontando para Marco que estava todo sério
na sua, como sempre.

— Ninguém tem culpa se você não sabe usar o seu, meu amigo —
rebateu Marco. — Olá, pequeno imperador, como você está? — perguntou
Marco indo até ele e o pegando no colo.
— Vou bem... — respondeu meu filho sorrindo. — Sou um pequeno
imperador?

— Seu pai é o grande imperador e você um dia será um — disse o


ruivo e revirei os olhos.
— Quero ser tão grande assim não, tio. Às vezes ser pequeno é
melhor do que ser grande — declarou, deixando-me orgulhoso.
— Errado você não está — Marco falou e o devolveu ao sofá.

Eles olharam para mim, depois para Nicholas e por fim se sentaram
nas cadeiras à minha frente.
— Esse menino é diferente. Ele tem sua inteligência, carisma,
simpatia, educação e percepção, mas não deseja ser igual a você — Pedro
comentou.
— Cada um segue seu caminho. Ele é uma criança e seja lá qual
caminho escolher, darei meu apoio se for algo certo — disse, encarando os
dois. — Sinto que o caminho dele será o oposto do meu, mas não sei ao
certo o que dizer. Ele é apenas uma criança e crianças crescem e mudam. —
Respirei fundo. — Nunca sabemos qual caminho eles seguirão até estar
nele. Se ele cair, o ajudarei a se levantar, mas se caso ele escolha cair o
deixarei no chão. Ser pai é muitas das vezes deixar que o filho crie asas e
voe. Ele ainda é um pássaro sem asas, por enquanto posso lhe dizer qual
caminho seguir, mas só por enquanto. Por agora não pensarei muito no
amanhã dele e sim no agora. Porque agora ele ainda está debaixo das
minhas asas — falei e percebi que ambos concordaram comigo.
— Ninguém me disse que ser pai era viver com medo — comentou
Pedro. — Já conversei com minha Jadyzinha que dois é o limite do negão
aqui. Se um dia tive o sonho de montar um time de futebol americano, já
não tenho mais — comentou, e gargalhei junto com Marco. — É sério,
ontem acordei com a criança correndo sem roupa alguma pelo corredor
gritando: “AH, EU TE AMO, MEU AMOR”. Eu nem ao menos sei onde ele
aprendeu a cantar a música do Sidney Magal — falou, e gargalhei mais
ainda. — Hoje de manhã Luther tentou descer da escada com uma garrafa
pet e eu não sei lidar com isso. — Dramatizou, levando a mão ao peito. —
Cara, eu não tenho mais vinte anos e meu coração é fraco.

— James estes dias deu um de Arrow e lançou uma flecha no vaso


favorito da Melanie, acreditem a explicação dele foi a melhor — comentou
Marco, e sorri ao imaginar a Melanie brigando com o filho, afinal, a mulher
era louca demais.
A reunião de negócios virou uma louca reunião sobre filhos e não
poderia ser melhor.

Observei meu filho analisar o senhor Meditte que o olhava com


desdém por ser só uma criança. Certamente seu olhar não intimidava
Nicholas que em momento algum desviou o olhar do homem, com certeza
meu filho seria um bom homem de negócios um dia.
— Como estava dizendo, não vejo motivo de não ter um melhor
investimento em energia sustentável — falei com calma.
— Senhor Boltoni, sabemos que os custos de um projeto deste porte
são muitos, sem falar nos riscos que corremos com os vândalos — disse o
senhor Meditte.
Meditte era um senhor que desejava fazer negócios comigo, mas não
da minha maneira e sim da sua. Ele era burro ou estava achando que me
convenceria a investir tanto dinheiro em algo que nem ao menos achava
correto.
— Podemos usar a energia eólica — propôs.
— Mas não faz mal aos pássaros? — perguntou Nicholas para mim.
— Sim, faz — respondi.

— Papai não pode machucar os passarinhos — disse, enquanto me


lançava um olhar pidão.
Menino esperto!
— Como percebeu não há como aceitar esta proposta. Quero maior
investimento na luz solar — expliquei, levantando-me. — Pense nisto e
caso mude de ideia entre em contato, bom dia. — Peguei Nicholas no colo e
saí da sala. — Se lembra que papai disse que tinha que ficar quieto?

— Papai, não podia deixar que eles machucassem os passarinhos do


céu — falou, defendendo-se.
Não digo nada, afinal o que mais posso dizer? Ele é minha mini cópia
e é como se eu estivesse discutindo comigo mesmo em uma versão mais
jovem.
Peguei nossas coisas em minha sala e desci para o estacionamento,
por hoje deu, após prender Nicholas na cadeirinha, entrei no carro e dei
partida sendo seguido pelos seguranças, o percurso foi tranquilo e rápido.

Cheguei à minha casa antes das seis da tarde, mal tirei Nicholas da
cadeirinha e ele saiu correndo gritando pela mãe. Anny surgiu na porta e o
abraçou apertadamente o girando no ar. Gostava de assistir a interação
deles.
Subi os degraus com mais calma e antes que chegasse até minha
mulher para lhe dar um beijo, fui atacado por duas coisinhas pequenas. Abri
meus braços e me agachei para poder abraçar meus pequenos.

— Papai! — gritaram, abraçando-me.


— Olá, minhas vidas! — exclamei, beijando cada um deles. Pietro e
Bruna grudaram em mim não me dando escolha a não ser pegá-los no colo
para entrar em casa. — Como foi o dia de vocês? — perguntei enquanto me
sentava no sofá.
Eles me contaram como foi o dia deles e que as provas foram um
pouco difíceis, mas que foram bem. Ouvi tudo prestando bastante atenção
no que eles estavam falando, brinquei um pouco e subi para um banho
rápido.

Quando a água morna bateu na minha pele, percebi o quanto estava


cansado e tenso. Fiquei um pouco debaixo do chuveiro permitindo que as
lágrimas rolassem em meu rosto. Sentia-me tão fragilizado que nem ao
menos conseguia lidar com as minhas emoções. Não sabia ao certo o que
estava havendo comigo, mas era como se algo estivesse desmoronando.

Encontrei minha família reunida na sala de cinema, rodeados de


guloseimas, apenas me juntei a eles comendo e fingi assistir ao filme
infantil qualquer que passava. As crianças estavam elétricas e demoraram a
dormir. Quando enfim adormeceram desci a escada para o andar de baixo e
saí para o quintal, pois precisava tomar ar fresco.
Fiquei alguns minutos olhando as estrelas e ouvindo os grilos
cantando até sentir a presença da Anny atrás de mim. Ela me abraçou por
trás, beijando minhas costas.

— Uma vez, meu marido me disse que precisamos ter um bom


diálogo para que pudéssemos ter uma boa relação — disse baixinho,
subindo e descendo sua mão em meu peito.
— Seu marido estava muito certo — comentei, pegando sua mão e
apertando. — Eu vi algo do seu passado que me destruiu — disse, sentindo
minha voz ficar falha.
— Seja lá o que você viu, saiba que não me fere mais — falou firme.
— O que passei não me fere mais, Dante. — Anny se virou para mim,
pegando meu rosto em suas mãos. — Meu amor, não se machuque com este
passado. Eu te amo e seu amor e compaixão por mim foram a minha
salvação. Não se maltrate com estas imagens a qual você me faz esquecer
todos os dias — disse firme, passando muita segurança.

— Doeu em mim, ver você sendo es...


Anny colocou o dedo na minha boca, calando-me.
— Não se torture com isto, Dante Ettore, por favor, é passado. Você
me salvou e agora eu irei te salvar — afirmou, colocando uma das mãos em
cima do meu coração.
— Faça me esquecer o que vi — pedi, ou melhor, implorei.
— Com toda certeza — concordou ficando na ponta do pé e
sussurrou: — Irei te fazer gritar meu nome esta noite, senhor Boltoni. Irei te
mostrar que aquilo é passado e você verá o quanto meu corpo é bem tratado
por você.
Ela pegou minha mão me levando para dentro, mas especificamente
para o quarto secreto de espelho...
— Quando era criança, perdi a fé em um mundo melhor. Não tinha fé
em nada e em ninguém. Só sentia dor e medo. Me lembro de desejar ser
amada pela minha mãe, mas nunca fui. Me lembro de tentar ser uma boa
menina, mas nunca parecia ser boa o suficiente. Me lembro de tentar...
Tentei muitas vezes até que ele enfim surgiu me abraçando, me fazendo
promessas que um garoto da sua idade não poderia fazer. Ele cumpriu cada
promessa e ainda cumpri e mesmo sem perceber cuida de mim
perfeitamente. Mesmo quando estava ao seu lado caída, ele cuidou de mim.
Ele possui um mau hábito de cuidar das pessoas, sabem? — perguntei, mas
não esperei resposta para continuar falando. — Quando era mais nova e
passava por uma sessão de estupro, corria para ele... Corria para seus braços
e ele cuidava de mim mesmo sem saber de nada. Não sei o que fiz para
merecê-lo na minha vida, mas ainda assim, ele continua comigo e eu o amo.
— Olhei para nossa aliança. — Isso é tudo. Obrigada pelo apoio.
Fui aplaudida e andei até minha cadeira.
Participava de um grupo de apoio, não sempre, mas algumas vezes
aparecia. As meninas eram legais e cada uma possuía uma história triste e
difícil. Muitas delas não tiveram e não tinha apoio fora daqui e era isso que
me entristecia.
Quando a reunião acabou, me despedi das meninas e saí. Hoje estava
guiando o carro e por mais que soubesse que havia seguranças me seguindo,
ainda assim, era eu que estava no comando do volante. Isto para mim já era
um passo e tanto.

Não gostava de dirigir, mas depois da pequena crise do Dante após


ver algo do meu passado que nem me interessei em ver, percebi que
precisava amadurecer mais rápido e com certa urgência.
Eu havia evoluído, mas de um tempo para cá sentia que estava
descendo ladeira abaixo. Precisava frear a minha queda e me reconstruir.
Sou capaz, eu sei quem sou!

Meu marido e filhos precisavam de mim, precisava me reerguer por


eles, e, principalmente, por mim.
Entrei no meu carro, afivelei o cinto, dei partida no carro e segui
rumo ao destino já traçado em minha mente. Pelo retrovisor vi os
seguranças me seguindo e nem se quisesse conseguiria despistá-los, pois
havia um rastreador no meu carro. Dante gostava de segurança e não me
esforçava para reclamar sobre isso, às vezes era chato, mas compreendia
sua preocupação, afinal não tínhamos uma vida fácil.
Desde quando a vida é fácil?

Só tínhamos mais problemas familiares que o normal.


Minha sogra me odiava e a entendia por mais que não gostasse.
Gostaria neste exato momento de poder fechar meus olhos, mas se eu
fizesse isso causaria um maldito acidente. Acelerei o carro para adiantar
minha vida antes de ir buscar as crianças na escola, menos o Nicholas que
mais uma vez foi com o pai para a empresa. Os dois eram tão parecidos que
até me orgulhava de ser mãe dessa coisa linda que chamava de filho.
Eu me orgulhava de ser mãe deles e muito.

Eles eram tão espertos, inteligentes e especiais...


Tão meus filhos.
Suspirei de alegria ao ver que enfim cheguei ao meu destino tão
esperado. Liguei a seta para avisar que iria virar e entrei. Os seguranças me
seguiam, mas com o tempo aprendi a ignorá-los, ao menos tento.

Saí do carro e caminhei até a costa, onde vi uma cabeleira ruiva


observando o mar à frente. O vento forte balançava meu cabelo de um lado
para o outro sem pena. Amava sentir o vento em meu rosto, era algo que
fazia com que eu me sentisse viva.
— Está atrasada, senhora Boltoni — disse sem se virar para mim. —
Como você está? — perguntou ainda observando o mar.
— Estou melhor do que deveria — respondi ficando ao seu lado. —
Como você está? — indaguei sem medo e acredito que se fizesse essa
pergunta há um ou dois anos teria medo de fazê-la.

— Tenho quatro filhos, uma esposa louca, amigos, leis e um trabalho


quase perfeito. Estou bem — comentou com a voz monótona.
— Dante comentou algo com você?
— Sobre o quê?

— Sobre não estar bem ou não conseguir nadar — falei exasperada.


— Se ele não está conseguindo nadar, ele boia até conseguir nadar
novamente, mas não para. Se o barco afunda, ele constrói outro e volta a
navegar para o alto-mar — declarou, virando-se para mim. — Eu não
durmo com ele e muito menos acordo ao seu lado. Então, é sua obrigação
saber se ele está nadando ou não, Anny.
Sua forma grosseira de falar fez com que meus olhos se enchessem de
água.

Lágrimas estúpidas!
Ele e eu nos amamos, fomos para o quarto de espelhos, mas ainda
sentia que não estava tudo bem. Não sabia como resolver isto e estava
entrando em desespero. Por minha causa meu marido chorava e não
conseguia dormir à noite. Por minha causa ele ficava se remoendo e se
sentindo culpado.
Porra, isto está demais para mim!

Eu só quero saber se ele está nadando.


Caminhei para mais perto da ponta admirando o mar, se desse mais
cinco passos cairia deste penhasco. Bastava dar cinco passos, mas não faria
isto. Sentia o vento, a maresia e observei o oceano.

Ele é tão vasto[5]...

— Quando nossa perna dá cãibra em alto-mar, o procedimento mais


seguro é se acalmar, boiar e esperar por ajuda ou a perna voltar ao normal.
Às vezes demora um pouco mais do que o necessário, mas ainda assim, é
preciso sentir a dor, a agonia e o medo... Engolir água, se manter calmo até
sua perna voltar ao normal e você poder voltar a nadar.
Levei um susto, inclusive, dei uns passos para frente quando ouvi a
voz mais linda do mundo e ele me segurou como sempre vinha fazendo.
— Cuidado com a beirada, meu amor, não estou muito a fim de me
jogar nesse marzão para te salvar. Eu não me importo em pular atrás de
você, mas tenho certeza de que a água está gelada demais — disse no pé do
meu ouvido.
— Dante! — Foi o que consegui dizer.

Não sei quando ele chegou aqui e muito menos se Marco o avisou, só
não sabia como meu marido veio parar aqui e precisava me explicar esta
situação toda.
— Não sou de aço, meu bem. Tenho dias bons e ruins, mas está tudo
bem eu não estar cem por cento — disse ainda me abraçando por trás, e eu
amava a sensação de ter seu corpo junto ao meu. — Agora vá buscar nossos
filhos que tenho uma reunião em poucos minutos. Dirija mais devagar, e,
por favor, se mantenha longe desta beirada. — Ele me virou para si
lascando um beijo intenso em minha boca, um beijo recheado de promessas.
— Te amo.
— Te amo.
Ele me acompanhou até meu carro e seguiu seu destino.
Guiei mais devagar, tentando entender como ele chegou tão rápido até
mim. Precisava ter uma conversa com os seguranças, mas antes iria buscar
meus filhos. Estacionei o carro em frente à escolinha, saí dele, indo até os
portões e assim como eu, havia outras muitas mãe e babás à espera das
crianças. Joguei meu cabelo para trás e ajeitei meus ombros, deixando-os
ainda mais reto.
Quando os vi vindo correndo, abri um sorriso imenso, mas não sabia
se era maior do que o deles. Acho que a recompensa por ser mãe estava em
pequenos atos de amor e carinho como este.
— Mãe, mãe! — gritaram em uníssono. — Mãe, mamãe...
Não sabia qual deles atender primeiro, então me abaixei e abri meus
braços.

— Meus amores! — disse quando eles se chocaram contra mim.


Eles começaram a falar ao mesmo tempo, então apenas olhei para
eles, esperando que se acalmassem. Levei-os para o carro, os coloquei na
cadeirinha, me certifiquei se estavam seguros e fechei a porta. Antes de
entrar no carro, fiz um sinal para o segurança que veio na minha direção a
passos largos.
— Senhora Boltoni?

— Se ficar falando para meu marido cada passo que dou, irei fazer
com que seja demitido, okay? — rosnei, mostrando minha raiva. — Pouco
me importa se está fazendo a merda do seu trabalho — disse, entrando no
carro e dando partida.
Coloquei uma música infantil e as crianças começaram a cantar
animadamente, o que me distraiu um pouco. Não gostei de saber que os
seguranças ficavam passando para o Dante cada passo dado.
Eu sei me cuidar!
Não sou louca...
Eu sou foda!
— Anny, podemos conversar? — perguntou Dante após colocar as
crianças para dormir.
Eu o segui no corredor até nosso quarto, onde ele fechou a porta e me
olhou sério. Eu amava este olhar sério em seu rosto. Ele ficava sexy e me
deixava cheia de tesão. Adorava seus olhos escuros, seus braços fortes que
marcavam qualquer coisa que ele vestisse, seu abdome sarado...

Eu o amava tanto que às vezes chegava a doer.


— Não adianta me olhar assim — disse, cruzando os braços.
— Estou te olhando normalmente. — tentei me defender.
— Bella, você não pode ameaçar meus seguranças por fazerem seu
trabalho — me repreendeu.
— Ele ficou me espionando — argumentei.
— Ele estava fazendo o trabalho dele — rebateu paciente. — Eu me
preocupo com sua segurança, então, por favor, colabore comigo. Não me
importo que dirija, até mesmo incentivo você a fazer isso, mas tudo tem seu
limite.

— Então me seguiu para ouvir minha conversa com o Marco? —


indaguei, cruzando os braços.
— Não, eu já estava lá. Valentina sequestrou Nick para ir com ela a
uma obra e saí para pensar. Estava lá e fui notificado da sua chegada, já
havia visto Marco, mas não fui até ele, e ouvi a conversa de vocês. — Seu
tom de voz calmo e sereno me disse que realmente era verdade.
— Gosto de conversar com Marco, mas não gosto de ter seus
seguranças atrás de mim o tempo todo. Marco é meu amigo. — Por alguma
razão estúpida disse isto.
— Eu sei e não me importo. — Exibiu seu lindo sorriso.
— Seu sorriso é lindo — elogiei babando.
— Não mais que o seu. — Abri para ele o meu mais belo sorriso.
Ele tinha o dom de me fazer sorrir, me sentir bem comigo mesma o
tempo inteiro e queria fazer o mesmo por ele.
— Preciso te mostrar algo.
— Não quero ver o vídeo do meu passado — disse já nervosa.
Seus olhos ficaram tristes e ele tentou disfarçar, mas falhou
miseravelmente.
— Não é ele. É outra coisa — disse sério. — Precisamos conversar
sobre isto.

Eu sabia quando o buraco era bem fundo e este com certeza era bem
embaixo. Respirei fundo, sabendo que agora era hora de ser forte e ligar o
foda-se para quem além de nós fosse se ferir.
Esta guerra agora também era minha.
Anny Bella Boltoni chegou sem intenção de levantar bandeira de paz!
Férias, eu nunca pensei que ficaria com meu coração apertado em
saber que meus filhos estavam definitivamente de férias. Observei a
animação deles por saber que passariam quinze longos dias, para mim, com
a avó no Brasil, minha terra natal que tanto odiava. Eu já amei aquele lugar
de paixão, mas hoje só tinha más lembranças.
Más recordações que assombravam minha mente dia após dia e não
gostava destas lembranças. Não era algo que pudesse simplesmente apagar
da minha memória, infelizmente.
Anny não sabia para onde correr com as malas, os três estavam uma
agitação só, querendo levar tudo e ao mesmo tempo nada.

Crianças sendo crianças!


Respirei fundo, engolindo a vontade de mandá-los ficar debaixo das
minhas asas, talvez fosse melhor ficar em casa. Definitivamente, não gostei
desta ideia de ficarem com a minha mãe, mas o que podia fazer nessa altura
do campeonato?
Não queria decepcionar meus filhos e muito menos minha esposa,
mas por mim ninguém ficaria longe um do outro.
Na maioria das vezes era a pessoa que sempre pensava em tudo, em
todos, no melhor, e que muitas das vezes colocava tudo e todos acima dos
próprios sentimentos. Era uma pessoa benevolente, entretanto, até eu,
possuía um limite e ousava dizer que estava estourando o meu. Havia uma
guerra dentro de mim que me queimava de dentro para fora.
Ser bonzinho...

Ser legar...
Ser gentil...
Ser sempre o cara que levava um tiro pelas costas estava me ferindo
demais e meus braços estavam cansados de nadar contra as grandes ondas.
Precisava de um tempo para me reconstruir, mas não podia jogar tudo para
o alto e sair. Era exatamente por isso que ainda estava aqui de pé, tentando
ser mais forte do que era, assumindo batalhas e mais batalhas que pareciam
nunca ter fim. Estava cansado e saturado, essa era a dolorosa verdade.
— Papai, posso levar meu videogame? — perguntou Pietro.
— Não — disse, sorrindo para ele. — Filho, vocês vão levar somente
o básico, nada mais que isso. Agora temos que ir, senão perderemos o voo.
— Mas, papai, o senhor é dono do jatinho, ele tem que nos esperar. —
Bruna e sua mania de grandeza que só pioraria com o tempo em que ficaria
com minha mãe.

— Sim, sou o dono, mas ainda assim, compromisso é compromisso e


hora marcada é hora marcada. Sejamos pontuais, minha filha, e gentis com
todos à nossa volta, independente de classe social ou não. — Olhei em seus
olhos quando falei e não sorri, deixando claro que o assunto era sério. —
Ter dinheiro não significa que podemos fazer o que bem entendemos, Bruna
Boltoni.
— Então para que serve o dinheiro? — perguntou emburrada.
— Para quase nada se não souber usá-lo da maneira correta —
respondi suspirando cansado. — Assunto encerrado, agora vamos.

Anny não disse nada o que não sabia se era bom ou ruim.

O caminho até o aeroporto foi em total silêncio, o que para mim foi
bom, quer dizer, foi ótimo. Não queria ser incomodado e não fui.
Quando adentramos o jatinho, me assegurei de que a viagem seria
tranquila e cada um deles estava em sua poltrona, com os cintos afivelados
e quietos.
Ótimo!

Virei o pai chato que dava esporro nas crianças por nada.
Que cruel, hein, Boltoni?
Levantei-me e fui para a parte de trás sabendo que minha esposa me
seguia em silêncio, o que eu menos queria agora era uma discussão.

— Você está bem? — perguntou quando me virei para ela.


— Estou sim, por que a pergunta?
— Não sei. Você parece estressado e mal-humorado com todos —
disse baixo, colocando sua mão sobre meu rosto com carinho. Apreciei a
maciez da sua mão e seu toque delicado me acalmou um pouco.
— Bruna está ficando esnobe — falei triste. — Sabe que não os quero
com minha mãe, mas concordei com isso.
Anny fechou os olhos, abrindo novamente com certo brilho de
desafio.

— Bruna é uma criança difícil. Fico com ela o tempo todo e sei quão
complicada ela pode ser. Sua mãe tem direito de passar mais tempo com os
netos. — Respirou fundo ao dizer tudo isso.
— Eu passo tempo com eles, Anny — rebati chateado com sua fala.
— Acho que não me entendeu. — Ela abaixou a cabeça e respirou
mais fundo que antes. — Eles passam mais tempo comigo do que com
você... Você trabalha e indiretamente a Bruna joga na sua cara que não
precisa trabalhar tanto já que possui muito. Ela chama sua atenção de tudo
que é lado. É óbvio para mim que você é mais próximo do Nicholas, assim
como sou do Pietro que é meu grude, mas Bruna não tem em quem grudar.
Ela se sente deslocada, eu a entendo completamente. Ela é uma menina
entre dois irmãos.
Acho que compreendi, mas Bruna sempre foi mais de ficar na sua e
mais independente de todos. O fato dela ser mais moleca sempre fez com
que eu preferisse deixá-la mais independente e não ficar tratando-a o tempo
todo como uma princesinha, mas acho que cometi um equívoco e
consertarei isso.
— O Nicholas é mais apegado a mim, mas dou atenção por igual a
eles. Anny, nunca desmereci nenhum deles para favorecer o outro e se
briguei com ela hoje foi porque mereceu.
— Eu sei, mas acho que na cabeça dela a razão está a seu favor e não
ao seu, Dante. Converse com ela, amor.
— Conversarei.
Anny me roubou um beijo antes de voltarmos.
Os três estavam quietos, o que era bom, mas preferia eles falando e
falando sem parar. Teríamos algumas horas de voo e esse silêncio era
perturbador.
— Crianças, papai vai contar uma história para vocês — disse,
ganhando a atenção deles. — Era uma vez um rapazinho que nasceu em um
lugar bem pobre, ele não tinha o que comer e nem o que vestir direito,
mesmo assim, ele era feliz. No outro lado da cidade havia um menino da
mesma idade só que este não passava dificuldade nem nada do tipo. Um
certo dia, eles ficaram cara a cara um com o outro. Eles não se maltrataram
e nem se trataram com indiferença, ambos sabiam que não havia diferença
entre eles, eram humanos e nada mais do que isto. Nem todos nascem com
uma vida privilegiada como a nossa, mas isso não significa que vocês têm
que tratar as pessoas como se elas fossem inferiores... Vocês não são
melhores que ninguém, mas sim iguais a todos. Ajudem quem precisa,
amem quem merece amor e sejam dignos do que possuem. Sejam
amigáveis e justos. Não humilhem ninguém e sempre ajude o próximo sem
esperar nada em troca, a melhor coisa que recebemos é um sincero obrigado
e um sorriso no rosto. Não sou melhor que ninguém porque sou milionário
e muito menos vocês — falei de uma forma suave. — Nunca maltratem
alguém por ter mais do ele e se fizerem isso irão me machucar muito,
crianças. Desde agora aprendam que a vida é um sopro, uma hora você tem
tudo e outra você não tem nada, mas por agora sejam só crianças e
brinquem muito — afirmei sorrindo.
— Papai, tenho que ajudar meus coleguinhas, né? — perguntou
Pietro.
— Sim, meu anjo — respondi sorrindo.
— Agora quem está feliz em ir para o Rio de Janeiro? — indagou
Anny, animando a todos.

— EU! — os três gritaram juntos.


Sorri para tentar entrar na diversão, mas estava impossível.
Quando enfim o jatinho pousou no caloroso e infernal Rio de Janeiro,
saí com Anny e as crianças com cuidado. Aqui no Brasil eram três da tarde
e esperava que as crianças se adaptassem ao clima e ao fuso.

Os seguranças pegaram nossa bagagem e seguimos para o carro que


me levaria até a Barra, onde meus pais moravam. Pedi para que eles nos
aguardassem em casa, eles moravam em um condomínio luxuoso, para
minha mãe morar lá é ficar perto das suas amigas dondocas que amavam
falar mal uma das outras.... Anny e as crianças olhavam para fora abismado
enquanto passávamos pelas ruas movimentadas do Rio.
Não gosto daqui, não mais, mas fazer o quê?
Perdi na votação.
Perdemos quase uma hora no engarrafamento até que por fim
chegamos ao destino, o qual não ansiava nada. Estava tão, mas tão
depressivo com isso, que porra até meus pensamentos em geral estavam
negativos. Odiava ter estes pensamentos negativos.
Mal paramos o carro, meu pai abriu a porta do carro e Anny liberou
as crianças que correram até o avô, uma cena linda de se ver.
Minha mãe surgiu na porta, bem-vestida, com um sorriso agradável
no rosto e ela veio mais devagar, mantendo um ritmo mais lento ao andar.
As crianças se soltaram do meu pai e correram até ela, que para
minha surpresa abriu um largo sorriso sincero para elas. Ela se abaixou e se
permitiu receber o abraço triplo.
— Ela fez até bolo de chocolate para eles — disse meu pai, parando
ao meu lado e me puxando para um abraço. — É bom ver você de novo,
filho.

— É bom vê-lo pai — afirmei, e o abracei forte.


Poderíamos ser mais próximos, mas aparentemente tudo contribuía
para que não fosse assim, era uma correnteza que lutava havia muito tempo
e já estava ficando cansado, mas ainda podia lutar mais um pouco.
Eu sei que posso...
— Dante querido — cumprimentou minha mãe, vindo até mim.
Abracei-a com carinho e me esqueci por alguns segundos dos nossos
problemas. Ela era minha mãe e merecia meu respeito, mesmo que odiasse
minha esposa. Eu simplesmente não conseguia lidar com essa situação, ela
era minha mãe.
— Mãe, como a senhora está? — perguntei quando nos afastamos.

— Agora vou bem — respondeu seca.


Ela não falou com Anny e minha esposa não forçou nada.
Ficamos para o lanche da tarde, vimos o quarto onde eles ficariam e
ouvimos o que meus pais planejavam fazer com eles Na hora da despedida
Anny quase chorou, mas conseguimos sair de lá sem derrubar uma só
lágrima. Seguimos para a casa do Eduardo, o irmão de Anny, pois estava na
hora de conversarmos sobre o vídeo.
Eduardo tentou abrir um sorriso ao abrir a porta da sua casa, mas
falhou claramente. Ele morava em uma cobertura no Leblon, o que lhe dava
uma vista linda, fomos guiados até seu escritório em silêncio absoluto.
Eduardo ainda era uma porção de caco esparramado no chão. Ele
estava melhor do que antes e acho que era por causa da tal Maria Eduarda,
mas enquanto ele não se permitisse sentir, jamais iria conseguir superar o
que ficou para trás.
— Eu vi o vídeo e até mesmo fui ao presídio conversar com o
Leandro — disparou. O fato dele não chamar o Leandro de pai não me
surpreendia. — Ele disse que André havia nascido morto, mas pelo que
estamos vendo ele está mais do que vivo — debochou sendo imparcial.

— É inacreditável isso! Você tem um irmão gêmeo que está


infernizando nossas vidas a preço de quê? — perguntou Anny.
No vídeo que mostrei a Anny dias atrás, o seu irmão André, que era
gêmeo do Eduardo, fazia certas coisas erradas que podiam estar ligadas a
certos acontecimentos do passado. Em um dos vídeos que ainda não mostrei
à minha esposa, o vi indo visitá-la no tempo que estava naquela maldita
clínica psiquiátrica e sua visita feriu minha esposa. Ele bateu nela e até
mesmo riu do seu estado lamentável. Eu não sabia o que dizer e nem ao
mesmo podia dizer isso a ela.
— Eu não sei de nada. Olha só, eu o quero morto, preso ou sei lá o
quê. Ajudarei no que puder, mas não tenho saco e nem paciência para lidar
com nossa família fodida — Eduardo disse, e Anny abaixou a cabeça em
silêncio.
Eduardo se levantou e foi para a sacada encerrando o assunto, fui
atrás dele a passos mais lentos e tranquilos. Enquanto Anny saiu do
escritório.
— Já foi a um psicólogo? — perguntei.
— Não quero ir a um, Dante — respondeu seco.
— Você precisa de ajuda para lidar com tudo que envolve sua família,
Eduardo, você está parado no tempo, não está vivendo — disse, olhando
para ele que me encarava de volta.

— Acha que não sei disso, porra? — esbravejou, cerrando os pulsos.


— Tem uma menina que está ao meu lado por alguma razão desconhecida
para mim. Minha cabeça está fodida e eu me sinto mais morto do que vivo.
Agora surge das cinzas do inferno um irmão gêmeo do mal, cadê a
pegadinha, Dante? — indagou rindo. — Estou cansado, muito cansado e
saturado dessa porra toda. Se eu pudesse me deixaria afogar, mas...
— Tem algo que não permite. A vida está nos ensinando a lutar,
então, meu caro cunhado, vamos lutar, nada de bandeira de paz. Anny está
mais forte, eu estou mais fraco... Estamos entre altos e baixos e a vida é
assim. Sua mãe fodeu com todo mundo, mas ainda assim, sua irmã não a
odeia. É incrível, eu sei. Eu amo o fato de que consigo suportar mais do que
deveria. Você é resiliente, Eduardo, mas não afunde seu barco. Pegue o
remo e reme. Seu irmão sumiu do mapa, mas vamos achá-lo. Até lá irei
ficar atento e viver minha vida da melhor forma possível, sabe por quê?
— Não.
— Porque a vida é única e escolho vivê-la como se cada segundo
fosse o último.
— Dante você deveria ser psicólogo e não advogado — comentou,
voltando a olhar para o céu.
— Eu sou bom em argumentar, Eduardo, apenas isso — revelei,
olhando o céu. — Você sabe que não podemos perder, então junte a porra
dos seus cacos e se erga, porque se algo acontecer com minha família
porque você se recusa a lutar, eu te mato — falei, pondo a mão em seu
ombro. — Não é um aviso.
Rio de Janeiro já foi um dia minha casa, mas agora era só um lugar
onde tinha que vir visitar. Ainda tinha a casa do lago que meus avós
deixaram para mim, era o único lugar desse estado que amava e adorava
estar presente. Tinha ótimas lembranças com minha avó e meu avô sem
contar dos momentos românticos que passei com Dante na beira do lago ou
no gramado perto da estufa ou mesmo as noites em que ficamos deitados
olhando as estrelas no céu.

Meu Deus!
Ainda me recordava da nossa dança na chuva, uns dias antes da
audiência em que levou meu irmão Pietro, trouxe o Eduardo e fez com que
os culpados pagassem, mas entre tantas vitórias houve muitas perdas. Acho
que nada nessa vida era cem por cento certo, quer dizer, apenas a morte. Ela
sim era a única certeza de que tínhamos que um dia iria acontecer.
Houve uma época da minha vida em que eu desejei a morte como
uma pessoa perdida no deserto anseia por água. Eu a quis tanto, mas tanto
que até mesmo ousei ir até ela. Foi uma tolice que me levou a ter outras
consequências, as quais, sempre estariam marcadas em minha alma. Eu
poderia dizer que fazia tudo parte do processo, mas seria uma grande e tola
mentira.
O que houve comigo e o que aconteceu com outras meninas era uma
consequência da maldade humana. Fui vítima e por muito tempo me senti
culpada, me lembrava de ter noites em que me culpava tanto que até uma
faca cravada em meu peito doía menos do que minha consciência. Era
incrível a quantidade de labirintos que nossa mente nos levava e desolador a
quantidade de vezes que éramos afundados por ela. Sabia o quão cruel era
se perder dentro da própria mente. A mente se tornava uma prisão sem
grade, mas sem escapatória e era terrível!

Levantei-me da cama sabendo que meu lindo e maravilhoso marido já


se levantou há muito tempo e ainda eram sete da manhã. Ele não conseguia
dormir bem aqui no Rio, ao menos não quando estávamos cercados de
problemas, o que estava se tornando rotina, mas a grande questão era que
ver o Dante tão abatido assim, era algo novo para mim. Ele era sempre tão
invencível, mas dessa vez parecia estar cansado de lutar e por isso estava
querendo tomar mais à frente da situação. Meu marido era um herói que
precisava descansar um pouco.
Se até Superman tinha suas fraquezas, por que Dante não teria?
Fui até o banheiro fazer minha higiene básica, até cheguei a lavar o
rosto, mas acabei optando por um banho rápido. Saí do banho com uma
toalha na cabeça e outra em volta de mim. Abri a mala ainda arrumada,
peguei uma calça jeans preta, uma blusa polo branca, calcei uma sapatilha,
penteei meu cabelo e saí do quarto. O apartamento do meu irmão era
grande, mas era solitário já que era visível que só ele morava aqui. Era uma
casa oca, sem vida e acho que era assim que ele se sentia por dentro. Eu
sabia como era este sentimento e sensação tão cruel.
Cheguei à sala e não vi ninguém.
Segui até a cozinha e vi Eduardo sentado em uma cadeira, encostado
ao balcão, tomando uma xícara de café. Seu cabelo era castanho assim
como o meu e seus olhos possuíam a mesma tonalidade castanha que os
meus. Ele era mais velho, mas quando o via assim, ele parecia um garotinho
tristonho que precisava de algo, ou melhor, de alguém.

— Bom dia, Anny — disse sem me olhar. — Dante saiu cedo e não
me disse aonde ia.
— Bom dia, Dudu — o chamei pelo velho apelido. — Ele tem
assuntos a tratar com os irmãos e com toda certeza precisava correr um
pouco para espairecer a mente — falei, enquanto me servia de uma xícara
de café, colocando leite. — Eu apaguei isto sim — confessei e nós dois
rimos. — Estava cansada e ficar algumas horas com minha sogra que me
odeia me deixou mais exausta.
— Não entendo isso. Não é novidade que ela pegou um ódio mortal
de você no passado, mas agora depois de tudo que foi revelado, manter isso
é tolice.

Eu poderia concordar com ele, mas não conseguia mais.


Olhei para o meu irmão, peguei um pedaço de bolo de banana e me
sentei ao seu lado.
Amo bolo de banana com canela, isto sim é vida!

— O filho dela quase se matou por mim, foi embora por mim e quase
se destruiu por mim. Eu a entendo e por mais bizarro que seja isto eu faria o
mesmo se alguém fizesse um dos meus filhos sofrer assim. — Suspirei
cansada, nem parecia que acabei de acordar. — Ela gosta de mim, mas do
nada fiz o filho dela virar cacos. Ele é um homem praticamente perfeito,
vamos ser sinceros, mas ainda assim, eu o feri muito. Meu passado e nossa
família ainda estão o ferindo. Dante está sangrando assim como você e eu, e
não sei o que fazer para mudar isso. Me sinto em uma encruzilhada onde a
espada já foi cravada e a cruz está posta diante de mim.
Ele abaixou o rosto e suspirou.

— Perdemos dez anos das nossas vidas por causa da nossa mãe
maldosa, mas não podemos perder mais dez anos por medo de viver.
Escolhi viver e estou vivendo minha vida. Nada é perfeito, mas tenho a vida
dos sonhos pelo menos para mim. — Segurei sua mão. — Eduardo, vi o
quanto perdeu, mas se continuar assim vai perder muito mais. Não seja uma
casca oca, seja você o lagarto que vira borboleta. Se permita ter cores e
vida... Se permita ser feliz, seja feliz Eduardo Rizzi e busque por sua
felicidade.
Ele apertou minha mão e sorriu de leve para mim.
— Estou em busca da felicidade, Anny, mas a deixo escapulir a cada
palavra errada que digo. — Seu suspiro pesado fez com que meu coração
doesse. — Eu a perdi por causa do meu próprio medo.
Olhei para ele sem saber o que dizer, acho que a Maria o deixou.
— Você perdeu a batalha, mas não a guerra. Vá atrás dela.
— Se ela não me quiser?
— Lute pelo amor dela da mesma forma que ela lutou por você,
Eduardo.
— Mais tarde vejo essa luta, mas agora vamos conversar sobre André
Rizzi. — Sua rispidez era tão visível que até me arrepiei. — Eu tenho um
irmão gêmeo que surgiu das cinzas do inferno e está aterrorizando nossas
vidas... Acho que precisamos resolver isto o mais rápido possível. Vivo ou
morto para mim é a mesma merda, então, tanto faz, mas creio que para você
talvez vivo seja mais útil. — A raiva em sua voz era tanta que me assustou.
— Eu não sei quem ele é, só sei que está nos ferindo. Eu nem ao
menos até dias atrás sabia da existência dele... Eduardo estamos em um
barco à deriva e talvez ele tenha a sua versão da história. Ele cresceu longe
de todos nós... — Não sabia mais o que dizer.

— Então isto significa que ele teve uma vida melhor que a nossa
Anny — supôs. — Vamos lá, eu vivi em um circo de horrores, onde fui o
palhaço da história, assim como você, só que em vez de risos de alegria
demos gritos de dor e sorrimos lágrimas de tristeza, então, por favor, ele
teve uma chance de ter uma vida melhor que a nossa ao menos eu acredito
nisso.
A dor dele me feriu mais uma vez.
— Não sou um herói ou inocente, mas também não sou o vilão desta
história de terror em que vivo. Ele teve a chance de buscar ajuda e de nos
procurar, mas ao invés disso escolheu nos ferir. Então não, eu não o perdoo,
mas sim o condeno.
Bebi meu café com leite já frio e respirei fundo antes de tentar dizer
algo para ele, mas não sabia o que dizer. As palavras certas pareciam não
surgir, havia um grande quebra-cabeça em minha mente, a qual não sabia
nem onde estava a primeira peça. Estava perdida dentro disso tudo, tendo
muitas dúvidas e poucas certezas. Esperava tudo ao ver aquele vídeo que o
Dante me mostrou, menos um irmão idêntico ao Eduardo. Levei horas para
compreender o que o Dante dizia e me explicava. Era inacreditável, mas era
real.
Na minha cabeça se passavam várias teorias sobre o que podia ter
acontecido com ele, mas com nenhuma delas conseguia chegar a uma
conclusão definitiva.
— Talvez assim como nós, ele seja uma vítima da nossa mãe. Não
sabemos de nada a não ser que ele é cruel, mas eu duvido que ele tenha
nascido assim. Vamos ver no que isso vai dar e ter fé de que tudo vai acabar
bem. — Apertei sua mão e sorri para ele. — Agora me fala sobre a Maria
— pedi.
— Ela é sorridente, alegre, feliz e linda. — Ele parecia distante a
cada palavra que dizia. — Ela é meio que inocente, sabe? Enfrenta várias
lutas, principalmente com a irmã doente, mas isto não vem ao caso. Ela é
forte, determinada e não importava quantas vezes a afastava, ela sempre se
aproximava de mim até mesmo quando fui cruel, mas do nada ela se cansou
de mim e se foi. — Ele soltou uma risada sem vida. — Eu nem ao menos
tive chance de tentar...
— Você tem agora, vá atrás dela... Só para a morte não tem jeito, o
resto conseguimos ajeitar — repeti as palavras da vovó Rizzi.

— Acabei de ter um paradoxo[6] — disse, e soquei seu ombro de leve.


— Eu vou atrás dela, mas depois que isso acabar, não quero colocá-la em
risco... Não por mim.
Neste ponto, fui obrigada a concordar com ele.
Ficamos em silêncio e arrumamos as coisas do café. Lavei a louça e
ele secou, enquanto rimos e contamos algumas piadas como bons irmãos
deveriam fazer. Estávamos progredindo aos poucos, ele ainda estava recluso
na sua concha oca e não sabia ao certo como me aproximar. Foram longos
anos distantes, onde nós dois fomos feridos cruelmente por quem mais
deveria nos amar. Tínhamos uma cicatriz na alma e no nosso corpo como
prova viva disso. Meu irmão Pietro escolheu a morte, e hoje com a mente
mais clara o entendia, por mais que também enxergasse que poderia tê-lo
ajudado mais, mas agora era tarde, ele já se foi.
Contei para Eduardo sobre as crianças e disse que queria ter mais um
filho logo. Ele ficou contente e quanto mais eu falava sobre meus filhos,
mais ele perguntava. Eu disse que Pietro era quieto e contido, Bruna
atrevida e se achava dona da verdade e Nicholas era a cópia fiel do pai até
na personalidade.

Decidimos que iríamos marcar um grande churrasco na casa do lago,


assim ele poderia conhecer melhor meus pequenos e eles o tio. Quem sabe a
irmã do Dante, a Sara também fosse com os seus filhos, iria convocar a
Lucy que já estava aqui no Rio e o pessoal de Boston, Pedro, Jady, Marco,
Mel, Carlos, Val e as crianças, o que poderia se tornar uma grande reunião
em família. Seria um sonho se realizando e meus filhos mereciam isso.
Lutarei por isso!

Fechei meus olhos enquanto o vento forte batia em meu rosto. Meu
cabelo foi jogado para trás com a força do vento, o que me lembrava que
devia cortá-los o mais rápido possível, pois estavam enormes. Observei o
Oceano Atlântico diante de mim e ele era lindo. Abaixo de mim, as ondas
se chocavam contra as pedras da mesma forma que estava me chocando
contra estas ondas que vinham fortemente contra mim. A diferença era que
não era uma rocha, era de carne e osso e sentia que uma hora quebraria.
Estalei meu pescoço enquanto tentava aquietar minha alma que estava
tão agitada quanto o vento que vinha de todas as direções. Estava uma
bagunça por dentro em uma guerra silenciosa, que não sabia se venceria e
se vencesse em qual estado ficaria.
Fechei meus olhos tentando até mesmo calar as vozes que havia
dentro de mim. Uma lágrima escorreu pelo meu rosto e minhas mãos
tremiam. Estava cansado de tanta, mas tanta coisa...

Eu sinto que estou tão agitado quanto o mar.


Meu Deus, me ajude aqui, porque está mais difícil do que imaginei e
sei lá como aguentei antes, mas desta vez estou com a minha alma gritando
entre dor e medo. Desta vez tenho além da Anny, três filhos sob ameaça. Eu
tenho tudo fora do controle dentro de mim e estou quase perdendo o
controle que exerço fora de mim, até mesmo a situação está perdendo a
direção. Esta guerra está sendo mais cruel do que imaginei que seria.
Há anos me joguei deste penhasco por diversas razões, desejei que a
dor em meu peito parasse, então em um momento de desespero busquei a
morte.
Que tolice a minha!
Agora, mais de dez anos depois, me recusava a cometer o mesmo
erro. Parecia que estava dentro de um paradoxo entre erros e acertos. A
diferença que percebi era que descobri que era dependente do que sentia
pela Anny e depender era viver perigosamente, mas era preciso aceitar e
acreditar no que meu coração me dizia. Eu a amava e por ela entrei neste
tornado, mas por nós sairia vitorioso desta guerra que precisava ter um fim.
— É raro ver Dante Ettore Boltoni tão desolado. — A voz de quem
menos esperava soou em meus ouvidos.
Eu poderia responder de imediato, mas estava meio que cansado,
então deixei o silêncio prevalecer entre nós dois. Edward era um cara que
assim como eu conservava o silêncio, ele sabia quando se devia falar e
quando devia parar. Não sabia se era por causa da sua profissão ou por
causa da sua personalidade, mas de qualquer forma ele sabia se manter na
sua.
— Estou exausto desta merda toda — enfim disse.

— Ele não é um psicopata, se é essa a sua pergunta. Ele quer que


vocês o busquem, o cacem e o temam, mas o fato de vocês estarem tendo
uma vida normal está deixando-o irritado. Daqui a pouco ele dará um passo
em falso e então o pegaremos.
— Bom — falei, secando as lágrimas em meu rosto.
— Você não está tendo essa descarga emocional só por causa disso,
Dante, então gostaria que conversasse comigo, sou seu amigo — disse,
enquanto se encostava ao meu lado.

— Estou sentindo o peso da minha mãe e sua rejeição à Anny. O


passado da Anny me deu uma coça bem dada. Tem alguém querendo ferrar
meu casamento e mandando fotos inexistentes para minha esposa que teve
uma crise na frente dos nossos filhos. Estou perdendo as rédeas da situação
e isso me assusta muito. Perdi recentemente tia Ana, estou perdendo minha
mãe e minha filha está quase se tornando uma megera. Ainda tem este
irmão da Anny que surgiu das cinzas para me infernizar. Só estou cansado
— expliquei e mais uma vez queria chorar.
— Você normalmente é um cara centrado que nunca perde o controle,
mas desta vez você está perdendo. Anos estão por fim caindo sobre você,
Dante. Isso é bom. — Olhei para ele assustado.
— Todos temos um limite
e você ultrapassou o seu. Você não é de ferro e tem um coração... Um
coração que foi ferido. Você tem um senso de justiça que clama dentro de
você e neste exato momento você não está podendo fazer nada, por isso está
deste jeito, tão cansado. Permita que este furacão dentro de você saia e diga
tudo o que pensa, Dante. Seja sincero com todos, mas exclusivamente
consigo mesmo.
Ele saiu do meu lado, entrou no seu carro e foi embora me deixando
sozinho com meus próprios pensamentos e lacunas que minha amável
consciência criava.

Olhei para minha esposa rindo junto com os meus irmãos e Eduardo
enquanto assistiam a um filme na TV. Era o final da tarde, tivemos uma
manhã estranha, mas a tarde melhorou, Lucy e Edward vieram para nos ver,
o que deixou Anny feliz e acabou me deixando um pouco mais alegre
também, pois sua felicidade sempre acabava se tornando a minha.

Não ligamos ainda para meus pais para conversar sobre as crianças,
chegamos ao consenso que meus pais precisavam passar mais tempo com
os netos sem nós dois em cima o tempo todo. Era difícil, mas não é como se
pudéssemos fazer algo, ao menos eu não podia. O celular de todos
começaram a tocar no mesmo instante, mas Alexandre fez um sinal e
atendeu o dele primeiro.
— Sim? Compreendo, passarei a informação a todos aqui, não precisa
se preocupar. — Ele desligou o telefone e olhou para todos nós antes de
suspirar fortemente.
— André Rizzi acabou de ser pego em Boston, tentando invadir uma
área privada da sua empresa, Dante.

Meu coração acelerou.


— Sua equipe, junto com o Pedro e Marco, já estão na delegacia. Não
haverá interrogatório sem sua presença, mas você precisa voltar agora para
Boston e seria bom se o Eduardo fosse junto.
A única coisa que queria neste exato momento era socar esse infeliz.
Assim que pousamos em Boston, senti a tensão aumentar
desenfreadamente. Pedro junto com sua equipe de segurança nos esperava
com carros preparados para nos levar direto à delegacia, onde ocorreria os
interrogatórios. Anny segurava minha mão firme, ela estava tentando ser
forte, mas vi que sua armadura se encontrava tão rachada quanto a minha.
Ela precisava de mim em pé, mas não sabia ao certo se conseguiria me
manter, ao menos não mais e não dizemos uma única palavra durante todo o
percurso à delegacia.
Meus irmãos estavam em outro carro, tentando amenizar o máximo
possível a situação, mas sabíamos que isto era uma bomba que precisava
explodir. Meu maior medo neste momento eram meus filhos, mas o Pedro e
o Marco já resolveram isso para mim e ganharam mais uma vez minha
eterna gratidão. Bruna, Pietro e Nicholas iriam com os meus pais para
minha ilha particular e lá ficariam até toda esta merda se resolver.

Odeio me sentir fora do controle!


Estava com raiva de mim mesmo por não conseguir ao menos
controlar meus medos...
Eles me viam como um cara forte, mas não me via assim, ao menos,
não mais. Estava fraco e por alguma razão esgotado tanto mentalmente
quanto fisicamente. Meu coração estava passando por turbulências que não
esperávamos, mas o que fazer quando não se havia nada para fazer?
Respirei fundo e apertei a mão da minha esposa em busca de força ou
de algum calor além do meu.

Meu Deus o quão lamentável estou me tornando!


Eu não poderia ir como um tubarão para cima de André Rizzi, mas
Marco poderia e faria isso. Ele era bom na área criminalista e seu passado
infernal nesta hora se tornava um excelente aliado. Eu queria, quer dizer, eu
queria poder socar o infeliz e depois fazer com que ele pagasse por cada
mísero erro que cometeu durante toda sua vida...
Queria que ele pagasse por fazer as pessoas que mais amava sofrer.

— Acho que não iremos viajar de moto por aí tão cedo — comentou
Anny.
— Vamos sim, meu amor — disse em um tom suave, mas sem
certeza. — Resolvendo este assunto poderemos ir até Las Vegas de moto,
mas desta vez sem despedida de solteira e comigo ao seu lado — comentei,
relembrando um certo acontecimento do passado.
— Foram só algumas doses e homens dançando nus — Anny disse
sorrindo.

Quase mordi minha língua para não a lembrar em voz alta que sorriu
quando a fiz ficar horas desejando gozar, mas não podia. O castigo foi ruim
para nós dois, pois amava vê-la gozar, mas a torturei com raiva por ela ter
ido a um lugar cheio de homens nus e ainda ter ficado bêbada. Era ciumento
e possessivo, às vezes me irritava comigo mesmo, por causa desses
malditos sentimentos que não conseguia controlar, sem falar que isso me
deixava tão irritado que acabava descontando na parede que não tinha culpa
de nada.
É complicado demais amar alguém!

— Não me lembrem deste dia — disse Pedro, sentado no banco da


frente. — Eu vi Dante surtar, Carlos virar o capeta em pessoa, e melhor o
Marco ficar calmo. Aquele dia foi algo inovador para mim. Eu fiquei de
boa, minha novinha terrorista aprendeu que o único pau que ela deve ver é o
meu — pontuou rindo, e todos nós rimos com ele, esse era um dos dons do
Pedro, deixar a situação mais leve e tranquila, inclusive, o ar ficou mais
leve para respirar.
— Eu sei que vocês têm a noite dos rapazes e nós as das meninas —
argumentou Anny. — A Jady contou que estamos pensando em ir à Ibiza?
— perguntou minha esposa, surpreendendo-me.
— Como assim Ibiza, Anny Bella? — indaguei.

— Estamos pensando em ficar cinco dias por lá já que as crianças


estão de férias. Os trigêmeos estão no Brasil, os gêmeos da Val irão para o
México, os filhos do Marco não sei e a mãe do Pedro disse que não se
importaria em ficar com os netos — respondeu sorrateira, algo que eu não
sabia.
— Preciso conversar com a novinha que dorme na minha cama, assim
não dá! — falou Pedro em um tom meio chateado. — Ibiza é meu sonho de
puto e minha mulher que vai para lá, para melhorar sem mim! — reclamou,
levando a mão ao peito. — Vou mandar uma mensagem no nosso grupo e
falar sobre esta merda de Ibiza. Porra, mulher terrorista do cão! Como ela
ousa fazer isso com meu pobre coração? — disse fazendo um drama. —
Vou até ligar para o meu médico, preciso de uma ressonância para ver se
meu pobre coração aguenta esta traição.
Pedro merecia um Oscar por sua atuação.

Anny explodiu em gargalhada, enquanto dei sorrisos mais discretos.


Por agora deixaria Ibiza de lado, mas logo iria analisar isto melhor com
minha esposa fujona.

Quando o carro parou, sabia que daqui em diante teria que ser o mais
forte possível, não por mim, mas por Anny. Abri a porta do carro, saí
olhando para os lados, estendi a minha mão à Anny que a pegou e a ajudei a
sair do carro. Envolvi meus braços em volta da sua cintura, caminhei
rapidamente rumo à delegacia e Marco surgiu no topo da escada que nos
levava à entrada com a cara fechada. Subi os degraus largos com calma,
assim que chegamos ao topo da escada, Anny me soltou e abraçou meu
velho amigo, mais chegado que meus irmãos. Quando Anny o soltou,
apertei sua mão com firmeza e ele sabia que não falaria nada por agora.
Entramos na delegacia e Marco nos guiou até uma sala mais privada, onde
estavam o delegado da minha confiança e mais dois seguranças da nossa
equipe.
Ótimo!
— Senhor Boltoni — cumprimentou o delegado Aris. — Senhora
Boltoni. — Acenou para Anny. — Quando o senhor quiser pode entrar e
falar com ele.
Virei-me para minha esposa, beijei sua testa e saí porta a fora com
Marco e Alexandre me acompanhando em silêncio. Antes de entrar na sala
de interrogatório, parei e respirei fundo, tentando controlar minha fúria,
pois não podia estragar tudo.
— Entrarei sozinho e depois de sete minutos podem entrar, mas por
agora isso é algo entre mim e ele — disse, deixando claro que não queria
companhia, enquanto puxava a maçaneta para entrar e o policial que estava
na porta não disse nada.

Assim que entrei, vi a cópia quase idêntica de Eduardo, sentado em


uma cadeira de ferro com as mãos algemadas sobre a mesa grossa de
madeira escura. Ele levantou a cabeça ao sentir minha presença e sorriu
como se estivesse feliz em me ver. Fechei a porta atrás de mim, caminhei
até a cadeira que se encontrava à sua frente, a puxei e ouvi o ferro ranger no
chão, mas não tentei ser suave. Sentei-me diante dele à vontade e relaxado
aos seus olhos, coloquei minhas mãos entrelaçadas sobre a mesa, olhando
em seus olhos e meu ato o irritou.
O que fez com que ele cometesse todos estes crimes e erros?
Sabia que cada um de nós tinha uma história por trás da grande capa
que colocávamos sobre nós mesmos.
— Dante Ettore Boltoni é uma honra conhecê-lo pessoalmente —
disse sorrindo.
— Se fosse mais próximo teria ido ao meu casamento com sua irmã,
André — falei, abrindo um leve sorriso. — Bem, vejamos, nem ao menos
sabia da sua existência, então, não há problemas em sermos distantes um do
outro, ou há?
O rosto dele ficou vermelho de raiva, o que chegava até a ser cordial
para mim. Sabia que ele queria me colocar medo, mas este jogo eu jogava
há mais tempo.
— Não sou membro dessa família fodida, mas adoraria ser alguém
próximo a você — afirmou, tentando conter o tremor de raiva que passava
por seu corpo.

— Se fosse mais próximo da sua irmã, minha esposa, também seria


próximo a mim — disse suavemente.
— Você e minha adorável irmã, vivem em um mundo apenas de
vocês, onde o resto são meros figurantes, ou estou errado? — provocou
sorrindo abertamente.
— Está mais do que errado — rebati e suspirei. — Todos são minha
família. Somos próximos daqueles que desejam ser próximos de nós, mas
há casos que preferimos nos isolar.
— Como a sua mãe? — perguntou, tentando me irritar
— Como a sua, a minha e mais aqueles que odeiam aqueles que mais
amo — respondi calmo.
— Acho que compreendi, mas onde eu me encaixaria, já que nem
meu irmão Eduardo parece se encaixar — alfinetou, revirando os olhos
castanhos, um marco da família Rizzi.
Seu sorriso presunçoso estava me dando nos nervos.
— Eduardo não quer ser próximo e não posso fazer nada sobre isto,
mas caso você não tivesse cometido ou estivesse fazendo as merdas que
está, estaria sentado à minha mesa em um dia de domingo comendo junto
com aqueles que amo. — Abri um sorriso de leve e continuei: — Você fez
seu caminho e eu estou fazendo o meu, assim como cada um faz suas
escolhas, André. Cabe a você e a mim aceitar as consequências dos nossos
atos.
— Você é realmente bom com as palavras, Dante — elogiou.

— Eu sou o que sou, e você o que é? — perguntei, passando as mãos


em meu cabelo tranquilamente.
André fechou os olhos e por alguns instantes sua mão tremeu. Sabia
que ele estava buscando calma dentro de si e se fosse em outras
circunstâncias talvez estendesse minha mão, mas neste momento minha
mão só serviria para dar um soco na cara dele.
— Ainda não me achei ao certo, mas duvido que eu vá me encontrar
novamente — disse com o olhar perdido.
— Bem lhe desejo boa sorte — falei, levantando-me.
— Não vai me perguntar por que fiz tudo isso? — questionou
alterado.
— Por quê?

— Eles tiveram tudo e eu nada.


— Ah, sim, me desculpe, eles realmente tiveram uma vida perfeita e
maravilhosa — ironizei. — Nossa, eu realmente vi minha esposa e
cunhados terem a vida mais perfeita deste mundo. — Olhei para ele,
abrindo um sorriso debochado. — Mas, está tudo bem, não é? Cada um tem
a vida que o outro deseja... Só os escravos sabiam o quão terrível era a
escravidão, e só quem sente o chicote nas costas sabe o quanto dói. —
Respirei fundo. — Vejamos assim, você sofreu, mas para você eles tiveram
uma vida de ouro. É como sempre digo, cada um enxerga o que quer e
espero que faça uma boa estadia na prisão.
Caminhei rumo à porta, mas antes que eu a abrisse ele disse:
— Eu não disse que a vida deles foi boa, apenas aleguei que eles
tiveram tudo e eu nada, e sim adorei fazer as coisas que fiz.

Mantive-me parado e sem reação.


Acredito que ele sabia que vi o vídeo, por isso me virei para ele e abri
um sorriso gentil.
— Cada um sabe o que faz e somos donos dos nossos próprios
destinos. — Abri a porta, saí disparado para longe dali e ninguém me
seguiu o que foi bom.

O infeliz feriu a própria irmã por raiva ou sei lá o quê, queria tanto
socá-lo que só Deus sabia o quanto estava me segurando para não o matar.
Eu sentia como se um vulcão adormecido tivesse entrado em erupção
dentro de mim, e minha raiva eram as lavas quentes que destruía tudo o que
visse pela frente.
ÓDIO!
Entrei no banheiro masculino correndo até a pia para jogar água na
minha cara na tentativa de conter minha raiva, depois de três jatos gelados
no rosto ainda me sentia irritado e com bastante raiva. Precisava acalmar a
tempestade que estava se formando dentro de mim, por isso fechei meus
olhos tentando buscar o meu “eu” verdadeiro. Este ser refletido no espelho
com raiva e ódio não era eu...
Eu não era assim...
Eu era muito mais do que isto.
Se fosse sincero comigo, veria que estava mais incrédulo com esta
situação do que com medo. Era irreal ver tudo que minha menina teve e
ainda tinha que passar. Anny merecia mais do que este mundo oferecia a
ela, até mesmo mais do que eu lhe dava. Anny merecia o mundo, mas não
este mundo de dor, e sim um mundo onde ela só pudesse sorrir. Às vezes
sentia que ela chorava mais do que ria e era triste viver assim. Fazia o
possível pela sua felicidade, mas tinha horas que falhava. Afinal, não era
perfeito.
— Dante? — Ouvi sua voz, mas não abri meus olhos. — Amor? —
Senti suas mãos sobre meu braço descendo até meus pulsos. — Está tudo
bem?

Eu poderia até mesmo mentir para ela, mas hoje não.


— Ficarei — disse ainda com os olhos fechados. — Tranca a porta —
pedi.
Segundos depois ouvi Anny passar a chave na porta e soube pelo som
dos seus passos que ela ainda estava perto da porta. Talvez fosse uma
loucura o que ia fazer, mas quem se importava?

Precisava me conectar a ela, senti-la em mim e estar dentro dela.


— Meu amor, eu te darei duas opções, você fica ou sai.
— Eu fico.

— Boa escolha, senhora Boltoni. — Abri meus olhos e me virei para


ela com rapidez.
Caminhei até ela a passos largos, coloquei minha mão na sua cintura e
a puxei para mim já me curvando para beijar sua boca. Anny em resposta
entrelaçou os braços no meu pescoço, enquanto nos beijamos
desesperadamente. Apertei o máximo que pude nossos corpos um contra o
outro, minha mão invadiu seu couro cabeludo dando pequenos puxões nos
seus fios longos macios. Devorei sua boca com força, fazendo com que
nossas línguas se movimentassem em uma dança perigosa e sensual, e com
minha outra mão em sua cintura magra mantive nosso corpo colado,
criando um pequeno atrito entre nossos sexos. Meu pau estava duro dentro
da minha calça quase rasgando minha cueca boxer. Nós nos afastamos um
pouco por falta de ar, mas mordi seus lábios e os puxei com o dente. Desci
minha mão que estava em sua cintura até sua bunda e apertei com força
arrancando um gemido dela. Sorri de leve antes de puxá-la para meu colo e
seu grito de surpresa podia nos dedurar, mas quem ligava?
Andei com Anny até a bancada de mármore que havia ali e a coloquei
sobre ela já devorando sua boca mais uma vez, estávamos sedentos um pelo
outro. Parei nosso beijo e comecei a desabotoar sua calça enquanto ela
tirava a própria blusa. Quando vi sua calcinha vermelha de renda, sofri com
meu pau que ficou ainda mais duro se é que isso era possível. Anny
desabotoou o sutiã, jogando-o para o lado, então olhou para minha calça.
Sorri travesso e comecei a me despir rapidamente, em questão de segundos
meu pênis ereto estava apontado diretamente em sua direção.

Estava pronto para ela.


— Ainda me surpreendo com o tamanho dele — disse, mordendo o
lábio inferior.
— Você sabe perfeitamente que ele cabe dentro de você, baby. —
Aproximei-me dela. — Está molhadinha para mim, senhora Boltoni —
disse, enfiando dois dedos na sua cavidade lentamente e com o dedão
apertei seu botão, fazendo-a soltar um gemido. — Gema mais baixo —
alertei, tirando meus dedos de dentro dela, levando até minha boca os
chupando. — Docinho. — Segurei meu pau e a puxei mais para a beirada,
com certo cuidado entrei nela, sentindo sua boceta me apertar a cada
centímetro que meu membro entrava.
— Dante! — gemeu.
Quando estava totalmente dentro dela, comecei a entrar e sair
aumentando o ritmo. Ela me agarrou, tentando controlar seus gemidos e
beijei sua boca com força, sentindo minha energia voltar a cada estocada
que dava dentro dela. Eu a peguei no colo, encostei-a na parede começando
a meter mais rápido e faminto dentro dela, enquanto dava algumas
mordidas no seu pescoço e lábios. Anny se segurou no meu ombro,
tentando também ter algum controle da situação, mas falhou na nossa briga
por controle. Aumentei ainda mais minhas estocadas quando senti que ela
iria gozar, assim que ela gozou mordendo meu ombro para não gritar,
diminuí meu ritmo e me permiti gozar dentro dela.

— Anny! — gemi rouco e abafado em seu pescoço.


Ficamos um tempo abraçados nos recuperando.
— Senhor Boltoni estou com calor.
— Não se preocupe, sou seu bombeiro, senhora Boltoni — brinquei
sorrindo e me permitindo não pensar no que nos esperava além desta porta.
— Estou disposto a apagar todo o seu fogo!
Meu corpo suado me dedurava e o rosto vermelho de minha esposa
nos dedurava ainda mais, mas qual casal não transava por aí?
Duvido muito que seríamos os primeiros ou os últimos, mas bem,
estávamos em uma delegacia com o irmão da Anny sendo interrogado e era
uma situação bem diferenciada, mas neste exato momento estava deixando
tudo isto de lado por alguns instantes.
Anny se ajeitava diante do espelho me lançando sorrisinhos
carinhosos, ela estava linda com a carinha de quem acabou de gozar
bastante contra uma parede. Vesti minha jaqueta e passei as mãos por meu
cabelo, tentando deixar os fios menos bagunçados, mas só tentei mesmo.
Tinha noção que quando passasse pela porta de madeira, iria voltar à
realidade, a qual não podia fugir por mais que tentasse. Iria encarar esta
terrível realidade e compreendia perfeitamente que dias ruins eram
necessários para que bons viessem. Neste exato momento estava tentando
entender de onde vinha tantos dias maus porque estava difícil suportar toda
esta soberba sobre mim, ou melhor, sobre nós.
Fechei meus olhos com força, tentando me concentrar no momento
em que acabei de ter com a minha esposa. Busquei em mim essa recente
recordação do nosso íntimo momento de prazer, mas parecia que entrei no
meio de um tornado onde tinha que lutar bravamente para me encontrar de
novo e de novo. Estava começando a me perder dentro de mim mesmo e
isso não era algo bom.
— Está tudo bem? — Anny perguntou.
Abri meus olhos, encarando-a através do espelho e seu rosto que até
pouco tempo atrás estava feliz, agora se encontrava preocupado.
Como pode se preocupar comigo? Será que ela não vê que é com ela
que deve se preocupar? Minha menina valente está se preocupando com o
cavalheiro armado. Mulher insolente!
Como pode aquecer meu coração de amor e de preocupação ao
mesmo tempo? Eu a amo tanto que muitas das vezes esqueço que seu amor
por mim pode ser na mesma proporção.

Até onde iríamos pelo nosso amor? Quais os limites para quem se
ama?
Eu me via indo além de todos os limites, mas ela aguentava ir além?
Às vezes me perguntava se duvidava muito da sua dureza ou se apenas
temia vê-la ferida mais uma vez.
— Ficarei melhor quando tudo passar — repeti minhas palavras. —
Não se preocupe, senhora Boltoni, já, já, estarei sorridente, mas agora
temos que voltar e ver até onde tudo isso está indo — disse, abrindo um
sorriso para ela.

— Sabe que pode contar comigo para tudo, né? — perguntou com
uma carinha fofa.
— É claro que sei — concordei sorrindo. — Só estou perdido aqui
dentro, mas já me encontro, aliás, todos temos dias ruins, não é?
Anny se virou, caminhou até mim me abraçando apertado, devolvi o
abraço na mesma intensidade e seu corpo junto ao meu me acalmou.

— Me desculpe por fazê-lo passar por tudo isso — disse baixo.


— Eu passaria por muito mais por você.
— Por quê? — indagou estupidamente.

Respirei fundo e soltei o ar devagar.


— Eu deveria te dar umas boas palmadas na bunda. Anny você deve
estar com algum problema hoje, só isso justificaria sua pergunta tola. Eu te
amo incondicionalmente e você ainda me pergunta o motivo de eu te amar.
É tolice sua não acreditar no meu amor por você... Eu não sou de aço, mas
sou capaz de suportar o peso do mundo por você, Anny. — Peguei a ponta
do seu queixo e o levantei para cima, fazendo com que ela olhasse para
mim. — Não faça este tipo de pergunta novamente, está bem?
— Está bem, me desculpe. Eu só estou tentando entender — disse
triste.

Vê-la triste me deixava ainda mais ferido.


— Minha Bella, eu também estou tentando entender estes sentimentos
e confusões dentro de mim, mas meu amor por você é tão certo quanto o
amanhecer — falei e beijei seus lábios suavemente.
— Eu te amo muito — sussurrou.

— Eu te amo além dos mares até o fim e o início do dia... — afirmei,


ganhando um sorriso.
— Acho que devemos ir.
— Também acho.
Peguei sua mão e saí com meu peito menos pesado.

Diziam que os filhos sempre puxavam algo dos pais e o André Rizzi
puxou o veneno da mãe, infelizmente.

Observei as expressões de Marco, sabendo que ele não estava nada


feliz com o que André falou e o fato dele se recusar a chamar um advogado
de defesa não estava ajudando muito. Era como se ele quisesse estar preso e
esta atitude era bem estranha, mas sabia que ele seria deportado para o
Brasil e lá pagaria pelos seus crimes que não eram poucos. Ele sabia de
tudo que fez e desejava ser punido por isto.
A grande questão aqui é...
Qual é o motivo por ele desejar tanto ser punido?
O que ele realmente quer além de ferir minha esposa?
Eram muitas perguntas às quais não estava conseguindo obter uma
resposta decente. Anny segurava minha mão com força, mas não falava
nada, só ouvia tudo. Preferia que ela chorasse e gritasse a guardar tudo para
si. Sabia que se ela se fechasse não conseguiria entrar e se eu não entrasse,
não sabia como iria cuidar das suas feridas. Eu só desejava cuidar dela e
nada mais do que isso, pouco me importando como estava.
— Você sabe que o que cometeu é um crime gravíssimo? —
perguntou Marco a André.
— Todos nós cometemos crimes ao decorrer da vida, mas nem todos
somos punidos — respondeu calmamente. — Você foi punido pelos seus,
Marco Haylock? — indagou com certo deboche na voz.
Marco não se abalou, ou ao menos não demonstrou o quanto esta
pergunta o incomodou. André queria fazer um joguinho mental que me
irritava, mas ele veria que Marco não cairia diante dele e que neste joguinho
éramos especialistas.

— Não creio que o meu caso esteja em julgamento aqui, mas sim, eu
paguei e pago por meus crimes, mas na minha sentença final eu encontrei o
que poucos encontram — respondeu o ruivo sorrindo tranquilamente. —
Diga-me, André Rizzi, por qual motivo não apareceu antes?
— Não teria graça aparecer no início do show. Aliás, o melhor
espetáculo sempre é o último ou estou enganado?
— Às vezes no final só resta fechar as cortinas — comentou Marco.
— Mas por quê?
— Mais uma vez este porque irritante... Que chato! Vocês são
entediantes, esperava mais diversão — reclamou.
— Ah, por favor, vá para o circo, mas aquele da prisão — disse
Marco, ficando em pé. — Seja bem-vindo à família, André.
Vi os olhos do André se arregalarem com as últimas palavras do
Marco, por essa ele não esperava. O ruivo fez uma jogada de mestre ao
tocar naquilo que incomodava o meliante. Virei minha cabeça e observei
Anny respirar fundo fechando os olhos como se estivesse tentando acalmar
o próprio coração. Eu a puxei para os meus braços, beijei o topo da sua
cabeça e senti gotas quentes pingarem na minha camisa. Anny me apertava
forte sem emitir um único som, ela estava se calando, mas suas lágrimas a
denunciaram.
Ninguém falava nada...

Todos ficaram em silêncio, o que tornava as coisas mais irritantes. Ao


menos quando havia algum barulho você conseguia ignorar a própria
irritação dentro de si, mas quando tudo estava em silêncio ficava difícil.
— Não o manteremos por muito tempo no nosso território, senhor
Boltoni. Ele será deportado no máximo em sete dias — disse o delegado.
Respirei fundo, levantando meus olhos para encará-lo.

— Sei disso, mas no Brasil ele não sairá impune — afirmei com raiva
na voz.
O delegado acenou com a cabeça e saiu da sala apressado
acompanhado pelos demais, ficando apenas Anny e eu. Virei minha cabeça
e através do vidro espelhado, vi que André estava sorrindo sozinho.
Desgraçado!
— Vamos superar mais essa, né? — perguntou minha doce menina.
— Sim, iremos superar mais essa — afirmei sem ter certeza. — É só
uma tempestade.
— Acho que podemos dançar na chuva, né? — indagou, levantando a
cabeça para me encarar.
— Sou um péssimo dançarino, mas aceito a honra desta dança —
respondi e beijei sua testa.
— Você dança melhor do que eu — disse sorrindo de leve.
— Só um pouco melhor — confessei, passando a mão por seus fios.
Ficamos um tempo grudado um no outro por um tempo nos
balançando de um lado para o outro, após um tempo perdidos no nosso
mundo decidimos sair de mãos dadas. Não fui atrás do delegado nem nada,
pois Marco resolveria tudo.
Quando saímos da delegacia, vi que todos ainda nos aguardava com a
cara fechada, os únicos sorrindo eram Pedro e Thales, dois idiotas, mas
eram idiotas que deixavam o ar mais leve.
— Sabe, Annyzinha, meu sonho é ver você se requebrando até o chão
em um baile funk — comentou Pedro quando nos aproximamos e arregalei
os olhos para ele. — Aqui não tem um baile, mas têm boates brasileiras. O
que acham de hoje irmos para dançar e esquecer um pouco dos problemas?
— perguntou sorrindo mais ainda.
— Eu amei a ideia, Pedrão! — disse Thales, batendo no ombro dele.
— Eu topo — respondeu Anny.

— Então hoje tem bailão na boate dos ricaços! — exclamou Pedro,


jogando os braços para o alto.
— É hoje que arrumo uma mulher para mim! — disse meu irmão.
Thales realmente é uma figura.
— Pedro achou a novinha dele em uma boate — comentou Marco,
surgindo atrás de mim.

— Quero novinha não. Sou velho e quero alguém acima dos vinte e
sete, este negócio de papa anjo não é comigo — Thales falou sério. Ele
adorava provocar o Pedro.
— Do meu ponto de vista o amor não tem data, hora, cor, raça, aliás,
o amor é o amor e não há diferenças para ele. Idade é algo mínimo —
comentou Alexandre, cortando o barato do Thales.
— Você poderia ser um irmão mais velho gentil — reclamou Thales.
— Cresça que iremos ter uma conversa de adulto — disse Alexandre
sorrindo.

— Dante é o mais novo. — Me meteu no peito com as bochechas


inflamadas.
— Ele é mais maduro que todos nós juntos — rebateu Alexandre.
Sorri de lado, fui até o carro abrindo a porta de trás para Anny entrar
e me sentei ao lado dela fechando a porta.
— Para casa — avisei ao motorista que deu partida no carro.
Coloquei o cinto de segurança assim como a Anny e o caminho foi
feito em silêncio, onde cada um de nós estava preso em seus próprios
pensamentos. Eduardo estava no carro de trás com meus irmãos e me
perguntava como será que estavam os pensamentos dele.
Se para mim tudo isso estava confuso, imagina para ele? Acho que
todos nós estamos passando por uma fase bem difícil. A vida era rodeada de
momentos difíceis e ruins, aliás, quem disse que a felicidade é plena?

Era nosso dever construí-la todos os dias, mas construir uma ponte
sobre o oceano não era fácil e o resultado era que fazia valer a pena todo o
transtorno e dificuldade.
Olhei para a janela observando o sol ser pôr, hoje à noite teria muito
trabalho, e só queria poder ficar em casa sem fazer nada. Vejamos bem, o
lindo do Pedro inventou de todos sair hoje à noite, só não soquei a cara do
meu bom amigo mais chegado que irmão, por complacência[7] a mulher dele
que teria que cuidar do seu rosto ferido.
Merda!
Eu era caseiro e hoje não era um dia bom para sair, mas já que estava
diante de uma grande onda...
Por que não surfar sobre ela?

Nunca diga que a situação não pode piorar, pois acredite ela vai
piorar!
Estávamos sentados na área vip observando as meninas dançarem
loucamente. Minha esposa, para minha alegria, estava de calça comprida,
mas a blusa com um decote enorme estava me matando. Estava na minha
por puro cansaço e desgaste mental, sem falar que o som alto do inferno
estava me deixando com uma baita dor de cabeça e amanhã estaria
triturado...
Tudo culpa do Pedro!

— Às vezes acho que minha esposa é uma criança — comentou


Marco, observando Melanie sorrindo feito boba.
— Isso é bom — disse Thales. — Significa que ela ainda possui uma
alma jovial e pura.
— Se Melanie for pura, a Anny é santa Maria — disse Pedro. — Você
diz isto da Melzinha porque não ficou mais de uma hora com ela tensa,
pode acreditar verá o quão louca esta mulher é!
Thales olhou para Marco esperando que ele defendesse a mulher dele,
mas ele não faria, e sorri com a cena que se iniciava.
— Melanie é adorável, mas pura não — disse Marco, dando uma
golada na sua bebida. — Melanie é vida louca. Tarada que só, por isso ela
não é pura.

Pedro, Carlos e eu caímos na gargalhada deixando os outros


espantados.
— Então retiro o que disse da Melanie — falou Thales. — Me
candidato a ser o santo desse grupo.
— É melhor. Daquele grupo nem a Jady se salva, acredite todas foram
convertidas à loucura e ao pecado carnal do sexo... — Pedro disse com um
falso tom amargurado.

— Essa é minha meta de relacionamento — afirmou Alexandre


sorrindo.
— Achei que você iria ficar solteiro pelo resto da vida, irmão —
provocou Thales.
— Ficarei solteiro pelo mesmo tempo em que um consolo é enfiado
no seu rabo — rebateu rindo. Alexandre e suas gentilezas.

— Marco agora nos diga qual a real situação — pediu Eduardo,


mudando de assunto.
Todos olhamos para Marco com expectativa.
— Ele não poderá mais entrar nos EUA e pagará por seus crimes no
Brasil. O fato dele assumir todos os crimes faz com que sua pena seja
reduzida, infelizmente, mas podemos tentar aumentar o máximo possível e
lutar para que ele não fique em regime semiaberto. Temos que usar certas
provas contra ele, mas precisamos que o Dante libere e esta é uma decisão
somente dele. — Respirou fundo. — Temos algumas provas de certos
delitos que ele cometeu além do que o Dante tem, mas não é algo tão
grandioso para a justiça brasileira. Temos algumas ameaças, roubos, mas
precisamos achar a do tráfico que sei que ele está envolvido e a de falsa
identidade já que ele se passou por outra pessoa — Marco explicou, não
escondendo a frustração na voz.
Ele tomou um gole da sua bebida, olhou dentro dos meus olhos como
se me pedisse permissão para continuar.

— Sabemos que tentaram invadir nossa empresa é apenas uma


distração, mas a questão a ser solucionada é qual será o próximo passo do
seu comparsa ou dos comparsas. — Respirou fundo. — Ele é bom em fazer
joguinhos mentais, o que é um perigo para Anny — disse e me olhou. —
Não podemos deixar os dois sozinhos em uma sala.
Isso eu já sei.
— Qual é a boa notícia? — perguntou Eduardo.

— A boa notícia é que estamos seguros — respondeu Marco.


— Por enquanto... — disse Eduardo. — Minha mãe ferrou tudo mais
uma vez.
Eu gostaria de poder discordar dele, mas não podia. Anny conseguiu
perdoar a mãe, mas o Eduardo não. Bella perdeu dez anos da sua vida presa
em um sanatório, Eduardo perdeu dez anos em um hospital, sua esposa e
filho e era por isso que ele a culpava tanto. Se minha mãe matasse minha
esposa e filhos também enlouqueceria ou me perderia dentro da minha
própria dor, e com toda certeza não a perdoaria. Era uma escolha difícil,
mas era a escolha que todos nós tínhamos que fazer um dia.

— Dante, meu amigo, antes de tudo quero que me prometa que não
irá enlouquecer — Pedro disse do nada.
— O quê? — perguntei confuso.
— Promete? — insistiu.
Por alguma razão olhei para a pista de dança e vi uma cena que ferveu
meu sangue. Levantei-me na mesma hora e os meninos fizeram o mesmo.
Caminhei a passos rápidos em direção à minha esposa que estava dançando
com um desgraçado agarrado à sua cintura.

Calma, porra nenhuma!


Puxei Anny para trás de mim na mesma hora em que dei um soco na
cara do sujeito que nem ao menos conseguiu revidar e caiu direto no chão.
As meninas gritaram, enquanto os rapazes me seguraram e olhei para eles
com raiva, tentando me soltar, mas eles me apertaram mais.
— Me soltem, eu vou para casa — esbravejei.

Eles me soltaram, peguei a Anny pela mão, desci a escada seguindo


para o caixa para pagar a nossa conta, e ela não falou nada.
Quando tirei a pulseira do seu pulso para pagar a conta percebi que
ela estava bêbada, o que não era nada bom e eu nem vi isso acontecer.
Inferno!

Paguei tudo e segui para o nosso carro, onde o motorista já estava me


esperando com a porta aberta. Anny entrou primeiro, eu me acomodei ao
lado dela, ela se encostou no assento e logo fechou os olhos. Coloquei o
cinto de segurança nela e em seguida o meu.
O caminho para casa foi vigiando Anny para que ela não vomitasse
em si mesma, mesmo assim, paramos duas vezes no decorrer do caminho
para que ela pudesse vomitar. Ela não falava nada, só me olhava de um jeito
que quase partiu meu coração, mas não iria falar nada com ela bêbada e a
culpa pelo que aconteceu era minha por não ter vigiado minha esposa.
Assim que desci do carro, peguei-a no colo e a levei para dentro da
nossa casa. Ela adormeceu em meus braços, mas iria acordar com o jato
d’água sobre si. Subi a escada em total silêncio, entrei no nosso quarto
seguindo direto para o banheiro. Eu a coloquei deitada na banheira vazia,
comecei a tirar seu sapato e roupas, fiz o mesmo com as minhas já que
sabia que com toda certeza tomaria banho junto com ela. Quando terminei,
peguei minha esposa mais uma vez no colo, entrei no boxe e verifiquei se o
chuveiro estava regulado para água morna. Sabia que Anny não suportava
tomar banho na água muito gelada devido ao que aconteceu com ela no
passado.
Abri o chuveiro e na mesma hora ela gritou em choque, ela me olhou
espantada, se debateu e não a soltei.
— ME SOLTA! — gritou, mas a segurei mais firme. — Dante se não
me soltar irá cair comigo — avisou e eu a segurei ainda mais firme. — Isto
já está te fazendo sangrar... Me solta, Dante — implorou.
— Eu gosto de quedas livres, baby — disse, olhando em seus olhos
mesmo com minha visão embaçada pelas lágrimas que escorriam dos meus
olhos assim como sabia que estava escorrendo dos dela.
— Até o fim?
— Além!
Eu poderia jogar tudo para o alto e fugir, mas me perguntava o quão
covarde seria ao fazer isso. Aguentava o mundo contra nós, pois sabia que
ela estaria ao meu lado e eu ao dela. Para alcançar a paz, primeiro era
preciso vencer as guerras...
A vida era injusta na maioria das vezes, mas nem sempre.
Observei o sol nascer com cautela, admirando quão perfeita era a
natureza. O vento frio da manhã contra meu rosto me lembrava que ainda
era humano e que estava vivo. Anny se encontrava adormecida em nossa
cama e duvidava muito que ela fosse acordar cedo ou se quando acordasse
estaria bem. A dor de cabeça com toda certeza reinaria hoje, mas um porre
às vezes fazia bem. Era claro que eu odiava, mas não havia nada que eu
pudesse fazer em relação a ela. Daria alguns remédios para dor de cabeça e
faria com que ela bebesse bastante água, era o máximo que podia fazer por
ela nesta situação.
Respirei fundo, inalando o ar puro.
Gostava desta calmaria pela manhãzinha e de ver o vento leve
balançar as folhas das árvores. Um dos principais motivos pelo qual quis
morar em um lugar mais distante da sociedade, foi a tranquilidade que era
viver cercado pela mais diversa e gratificante natureza. Aqui o ar poluente
da cidade não chegava, o que era ótimo.
As crianças e os cachorros gostavam daqui, além desse lugar
tranquilizar Anny.
Quando os raios de sol bateram no meu rosto, passando-me seu calor,
sorri ao me sentir ainda mais vivo. Ultimamente as coisas estavam ficando
mais complicadas que o normal, mas não havia nada que eu pudesse fazer
neste exato momento para mudar, só podia deixar que as coisas se
ajeitassem. Voltei para o quarto e Anny ainda se encontrava na mesma
posição. Segui para o banheiro, tomei um banho frio e fiz minha higiene
matinal. Após terminar meu ritual sagrado da manhã, me senti melhor para
começar o dia de verdade.

Vesti uma roupa qualquer, desci para o andar de baixo e o fato das
crianças não estarem em casa me deixava chateado, já que não teria que
preparar um grande café da manhã. Definitivamente, a casa ficava mais
vazia e triste sem eles.
Neste horário, o Nicholas já estaria acordado e me olhando com
curiosidade, a Bruna acordaria reclamando e Pietro seria quieto como
sempre. Que saudade da agitação matinal! Isso porque eles estavam apenas
há alguns dias fora. Era um pai coruja e não negava isto de forma alguma.
Entrei na cozinha já ligando a máquina de café, mas antes que
pudesse fazer qualquer outra coisa meu Iphone tocou no meu bolso.
Olhei o nome do Pedro e estranhei.
— Qual o problema? — perguntei sendo direto.
— Dante, um filho da puta tentou invadir meu sistema, melhor
dizendo nosso sistema — esbravejou. — Estou aqui na empresa e já
neutralizei o vírus deles jogando outro em cima — disse nervoso. — Mais
uma coisa... Nossa filial em Nova York sofreu um atentado — continuou, e
bufei. — Nenhum ferido, os seguranças agiram da forma que os treinei, a
polícia está fazendo a parte deles e nossa equipe interna também vai fazer.
Apoiei-me no balcão tentando entender como toda essa merda podia
estar acontecendo. Não podia mandar o Marco para Nova York agora, então
só me restava uma opção, eu mesmo ir.

— Reforce toda nossa segurança. Vão tentar de novo e de novo —


disse nervoso. — Mantenha os funcionários seguros em todas as filiais, nas
ONGs e fique atento. Nos abrigos veja quem entrou recentemente e nos
prédios de moradia que fornecemos, veja se todos estão seguros. Triplique a
segurança dos meus filhos — ordenei.
Meu coração se apertava só em saber que algo podia acontecer com
eles.
— Farei tudo isto, mas alguém precisa ir até Nova York. Se quiser eu
vou — disse Pedro.

— Eu irei. Eles estão tentando nos cercar por todos os lados, mas
estão esquecendo que sou peso pesado.
— Vamos acabar com essa palhaçada, Boltoni.
— Com toda certeza. — Desliguei e respirei fundo, pois ainda não
eram nem oito da manhã.

— O que houve? — Eduardo perguntou.


— Estão atacando minhas empresas — respondi, virando-me para ele
que já estava assim como eu, vestido e de banho tomado. — Bom dia.
— Acho que é um péssimo dia, mas bom dia.

— Dias ruins são necessários para que os bons venham — disse,


olhando em seus olhos castanhos.
— Sua fé de que tudo vai dar certo é impressionante, Dante, mas
perdi minha fé na humanidade há algum tempo. Para mim todos os dias são
iguais, eu tive dias melhores até pouco tempo atrás, mas estraguei tudo de
novo e de novo — contou tristonho. — Às vezes me sinto uma estátua
parado no tempo, sendo dilacerado por dentro.
— A escolha é sua se continuará no chão ou se colocará em pé —
falei calmamente para ele. — O tempo está passando, mas se você quer ser
uma estátua a escolha é sua... Somente sua e temos certeza de que por trás
das nuvens escuras se encontra um radiante sol. — Olhei para ele e sorri. —
Basta saber lidar com os dias de chuva, mas não se esqueça que são os dias
de chuva que regam a terra e faz com que os frutos cresçam.
— O que está querendo dizer, Dante? — perguntou confuso.
— É preciso ter chuva, do mesmo modo que é preciso ter dias de sol.
Tudo precisa de equilíbrio, mas se só reclamar não viveremos. Aproveite a
tempestade e molhe seu jardim para que quando o sol vier sua rosa esteja
pronta para ele. — Pisquei para ele que por fim sorriu. — Agora pegue os
pães para que possamos comer.
Ele gargalhou um pouco mais alegre.
Eduardo não entendia que se continuasse se ferindo com os próprios
cacos não resistiria por muito tempo.
Eu fiz um misto quente enquanto ele batia uma vitamina para que
pudéssemos tomar. Liguei o som, procurei por algo brasileiro e cantamos
como loucos as músicas dos anos noventa. Por alguns instantes paramos de
nos preocupar com as coisas ruins e focamos no atual momento em que
estávamos vivendo. Ele era desafinado, mas era engraçado vê-lo tentar
sambar sem sucesso, se o Pedro estivesse aqui tiraria tudo isso de letra.
— “Sorria que eu estou te filmando...” — cantávamos juntos.
— Que coisa mais linda acordar com estes dois homens lindos
cantando.

Pulamos ao ouvir o som da voz da Anny.


— Bom dia, meus amores — cumprimentou sorrindo.
— Não é nada bom acordar com essa cantoria de quarta — disse
Thales, surgindo com a cara toda amassada. — Bom dia para quem não se
encontra com dor de cabeça.

— Bom dia — completou Alexandre, surgindo do além. — Os


Travessos isso sim era pagode bom — disse ao reconhecer o grupo de
pagode.
Começamos todos a cantar e a sambar na cozinha, e benza a Deus que
ela era ampla e grande. Anny e eu sambamos agarradinhos e ela disse que
não estava com dor de cabeça, o que era bom para mim, e, principalmente,
para ela.
Não sabíamos se tomávamos café ou se cantávamos Raça Negra. Foi
algo divertido que alegrou nossa manhã já recheada de problemas, mas o
que seria da vida sem alguns bons sorrisos?

Chamei Anny para o escritório logo após o almoço para conversar, ela
me acompanhou e ao olhar para a mesa soltou um sorrisinho safado, o que
me fez balançar a cabeça ao também me recordar da cena.
Anny se sentou na quina da mesa, enquanto me sentei na minha
confortável cadeira.
— O que houve? — perguntou com as pernas meio abertas para mim.

Oh, baby, neste jogo sou bom e melhor do que você, então não
comece o que não vai poder continuar.
— Teremos que ir a Nova York, ou melhor dizendo, eu tenho que ir
— disse, e ela arregalou os olhos.
— Eu vou contigo. O que houve? — perguntou mais uma vez.

— Um pequeno atentado na minha filial em Nova York e preciso ir


ver a magnitude do problema — respondi, olhando em seus olhos.
— Meu Deus, acha que foi meu irmão?
Tentei não a deixar nervosa e muito menos preocupada com coisas
desnecessárias, mas estava difícil controlar a situação em geral.

— Não sabemos ainda — disse, e coloquei minha mão sobre sua coxa
apertando-a de leve. — Eu te amo.
— Eu te amo — afirmou, colocando a mão em meu rosto com
delicadeza. — Ouvi dizer que em Nova York tem ótimas lojas e estou
precisando de umas comprinhas mesmo.
Sorri para ela, subi minha mão por sua perna até chegar à sua boceta,
colocando um dedo dentro dela, observando minha amada abrir a boca.
Não custa nada me atrasar um pouquinho...
Não gostava deste lugar, na verdade, odiava Nova York por diversas
razões, mas nenhuma que valesse a pena falar. Construir uma filial aqui foi
uma jogada para ajudar as pessoas, mas se não fosse por isso eu nem pisaria
nesta cidade. Anny ao meu lado olhava tudo à sua volta, já estava
concentrado em entrar logo na empresa e resolver tudo o mais rápido
possível. Assim que os seguranças me viram, sorriram e acenaram com a
cabeça, e o gerente correu em minha direção afobado, como sempre. Suel
Justin era um cara estranho para muitos, mas para mim era uma pessoa
honrada que foi digno da minha confiança, até agora.
Seu cabelo loiro e pele clara pareciam não combinar com seus olhos
escuros, e seus óculos fundo de garrafa sempre se destoava em seu rosto
retangular. Algumas mulheres diriam que ele era bonito, outras que era feio,
mas a maioria diria que ele era charmoso. No final, ele era um nerd que só
pensava em trabalho e computação, pior do que eu fui um dia.
— Senhor Boltoni — cumprimentou assim que se aproximou. — Que
bom que chegou. — Olhou para Anny e sorriu. — É uma honra conhecê-la,
senhora Boltoni.
— É um prazer conhecê-lo... — Ela parou e me olhou na esperança
de que eu dissesse o nome dele, mas ele tomou a minha frente.
— Suel Justin.
— Diferente seu nome. — Reparou minha esposa.
— Meu pai queria Samuel, mas minha mãe odeia esse nome — disse
sorrindo. — Foi o nome de um garoto que ela gostou quando menina, mas
tomou ranço do homem. Então na briga surgiu Suel Justin. — Ele coçou a
cabeça. — Senhor Boltoni, o delegado Webber deseja conversar com o
senhor.
— Vamos até ele.
— Ele está lá em cima nos aguardando.
Segurando a mão da Anny segui para o elevador.
Nossas filiais possuíam somente dez andares, para não acoplar a
função que pertence à sede. No elevador Anny grudou em mim com toda
sua força, eu sabia que o medo de elevadores ainda existia.

Chegando ao andar da presidência, demos de cara com dois homens


armados, respirei fundo, passando por eles, adentrando à sala da presidência
dando de cara com o delegado que olhava para o teto.
— Delegado Webber — disse, chamando sua atenção.
— Dante Boltoni em pessoa, a lenda do mundo dos negócios que
apenas com trinta anos se tornou um dos cinco homens mais ricos do
mundo. Que honra conhecer este jovem prodígio.

A forma como ele se referiu a mim não me agradou nem um pouco.


— Não acho que estamos aqui para falar da minha capacidade e sim
da sua e dos seus homens. Quem é o infeliz que ousou atentar contra minha
empresa? — perguntei de forma grosseira.
— O homem se chama David Siltan, pelo que parece ele tem ligação
com André Rizzi, irmão da sua esposa — disse, e Anny apertou ainda mais
forte minha mão.
Olhei dentro dos olhos azuis do delegado e sorri de lado.
Algo não estava certo no que ele falava, mas deixaríamos isto para
trás, por ora.
Puxei Anny para o lado direito da sala ampla, onde havia um sofá de
couro branco, coloquei-a sentada, agachei-me na sua frente, peguei seu
rosto em minhas mãos e sorri.
— Não deixe que esta infeliz situação te afete. — Eu já estou afetado,
mas quem liga? Eu aguento. — Vamos resolver tudo isto o mais rápido
possível.
— Não se preocupe. Eu estou bem, Dante — disse sorrindo. — Só
não gosto que tudo isto seja lançado contra você.

Doce menina mulher, meu psicológico aguenta mais coisa do que o


seu, então, eu que devo lidar com o peso pesado.
— Relaxa, neste mar eu sou o tubarão — falei, piscando para ela.
Ela soltou uma risada que aqueceu meu coração.

Levantei-me e caminhei até o delegado que nos olhava com


curiosidade.
— Desejo falar com o senhor David Siltan... Agora!
— Terá que ir até à delegacia, senhor Boltoni, mas só lhe darei dez
minutos.

— Será o suficiente.
O caminho para a delegacia central que ficava no centro foi rápido e
tranquilo, graças a Deus. Anny não disse mais nada, muito menos eu e Suel
que nos acompanhava e abria a boca a cada segundo, mas logo fechava de
novo.
Desci do carro, segurando a porta para Anny e nossos seguranças
estavam atentos à nossa volta. De longe vi um paparazzi do inferno tirando
fotos nossas.
Odeio esses sites de fofoca de merda!
Caminhei escoltado à delegacia com Anny ao meu lado.
Anny não poderia entrar comigo, por isso a deixei na recepção e
seguindo o delegado indo de encontro ao Siltan. Quando abri a porta fiquei
tentando entender como não percebi antes que era ele, pois eu me lembrava
dele.
Fechei a porta de madeira atrás de mim e caminhei até a mesa onde
ele estava sentado algemado, sentei-me à sua frente e finalmente ele me
olhou.

David mudou muito desde a época da faculdade e ele era mais velho
do que eu. Devia ter quase quarenta anos enquanto eu trinta e seis, quase
trinta e sete.
— Dante, você veio! — exclamou feliz ao me ver. — Achei que não
te veria nunca mais.
— Você parece feliz em me ver. Por que está fazendo estas coisas,
David?
— Por você!
— Por mim?
— Sim. Você é a razão de fazer o que fazemos — disse, deixando-me
chocado. — Dante todos nós te admiramos, mas não conseguimos chegar
até você, então criamos o projeto Dante, tudo que queremos é a sua atenção
e conseguimos.
— Vocês feriram inocentes — acusei. — Minha esposa!
— Nem tudo é perfeito — falou sorrindo. — Sempre têm aqueles que
caem no processo, te admiramos, desejamos sua atenção e conseguimos —
disse radiante. — Sobre sua esposa não fizemos nada, isso foi obra do
André por vingança do passado dele. Nós te amamos, Dante. Você é
incrível!

Uma bola se formou na minha garganta, pois eu nunca pensei que


viveria isso.
Essas pessoas existem?
Isto que eles são é o quê?

O que eu perdi nesta maldita vida?


— Onde o resto de vocês se encontram? — perguntei, abrindo um
sorriso mais falso que nota de sete reais. — Quero conhecer o resto de
vocês, meus admiradores, vocês são incríveis.
Ele sorriu e começou a chorar.

Puta que pariu a situação só piora!


— Eles vão amar te conhecer. Você é maravilhoso, eles estão no
Brooklyn em uma casa na rua sete com a pichação D.B na entrada —
respondeu, e fechei meus olhos, tentando compreender melhor a situação
em que estava.
— Saindo daqui eu vou até lá. O que mais vocês fizeram para chegar
até mim? — indaguei sorrindo.
— Fizemos várias coisas, mas você nem sequer olhava para nós.
Então optamos por uma tentativa mais agressiva, mas foi tudo por amor a
você.
— Eu sei que foi. Agora eu tenho que ir — disse, me pondo de pé. —
Até breve, David. — Até nunca mais.
Saí da sala a passos rápidos, meu coração se encontrava acelerado em
excesso e nunca me senti assim antes.

Anny ao me ver correu em minha direção.


— O que houve, Dante? — perguntou exasperada.
— Foi por minha causa — disse baixo.

— O quê?
— Os atentados nas empresas, as ameaças foi tudo por minha causa
para chamarem minha atenção.
— Por quê?

— Não sei, eu realmente não sei — confessei triste.


— O que vai fazer?
— Vou acabar com tudo isso.

Chega de joguinhos!
Descobrimos que no total eram vinte e sete homens e dez mulheres
participantes de um grupo de fanáticos por mim, e na casa onde eles
estavam havia diversas fotos minhas, da minha família e da minha empresa.
Eles aparentemente só queriam chamar minha atenção, só que neste
processo feriram diversas pessoas. Eles estavam presos e confessaram todos
os crimes, afirmando que foi por amor a mim, eu sabia que havia um grupo
de fãs na rede social como no Instagram e Facebook, mas não neste nível.

Tudo isso fez com que Anny e eu ficássemos mais tempo em Nova
York. Foram longos sete dias e hoje finalmente poderíamos ir embora.
Todos os envolvidos foram condenados, pois havia provas o suficiente, sem
contar que confessaram seus crimes de uma forma diferenciada. O que mais
me chocou foi que eles atropelaram Anny há quatro anos e por causa deles
minha esposa ficou em coma entre a vida e a morte, sempre que me
lembrava daquele dia sentia medo de que pudesse se repetir.
Eu não estava conseguindo dormir direito e Anny percebeu, mas não
falava nada e era grato a ela por isso. A única coisa que me tranquilizava
era saber que meus filhos estavam seguros e em paz. Nunca pensei que meu
instinto de proteção ficaria tão aguçado por eles. Protegia a Anny de tudo e
de todos, mas com eles, meus filhos, sentia como se o mundo fosse uma
grande fera determinada a comê-los. Eu queria deixá-los seguros, mas ao
mesmo tempo queria fazer com que eles voassem. Temia não conseguir
guiá-los ao caminho certo e sabia que a vida era tão incerta quanto o mar,
uma hora a maré se encontrava calma, já na outra se encontrava disposta a
destruir tudo. Eu só desejava que eles soubessem lidar com os maus e os
bons momentos, pois a vida era uma escola que só concluíamos na morte.
No caminho para o aeroporto onde o jatinho nos esperava, fiquei em
silêncio e pelo retrovisor via os seguranças nos seguindo. Eu tive que
reforçar o nosso nível de segurança, e isso era desconfortável, mas era
preciso.
Quando o carro parou ao lado do jatinho, desci e aguardei Anny sair
pelo outro lado. Os seguranças pegaram nossa bagagem e entraram na
aeronave. Fiquei esperando minha esposa passar por mim, quando Anny
passou, peguei suas mãos e a puxei para mim. Segurei sua cintura e olhei
em seus olhos castanhos, houve um tempo em que os vi sem vida e
recheados de medo, já hoje estava vendo no fundo deles medo, mas não
mais dor ou morte.
— Me desculpe. Você não deveria ter que passar por tudo isso.
— Você é tão inteligente para certas coisas, mas tão tolo para outras
— disse, colocando sua mão macia em meu rosto. — Você não tem culpa de
nada, então, por favor, não me peça desculpa. Dante, você suporta tudo por
mim e porque não posso suportar tudo com você e por você? Eu sei que
posso ser forte, Dante.

— Você é forte, Anny. Você é incrivelmente forte. Como pode achar


que te acho fraca? Você é imensamente forte, Anny — falei suavemente. —
São poucos que suportam o que você suportou... É a minoria que consegue
recomeçar igual a você. Não duvido da sua força, mas temo pelo seu bem-
estar. Seu irmão na verdade, não é um problema grande, André Rizzi tem
uma rixa com todos vocês por se sentir abandonado — disse, ocultando
certas coisas. — Com ele iremos nos resolver, ou melhor dizendo, o Marco
resolverá. Vamos apenas viver um dia de cada vez.
— Um dia de cada vez — repetiu.

Entramos jato, nos acomodamos e o aguardamos levantar voo.


Enquanto o jatinho decolava fui admirando as nuvens e percebi o quão leve
elas eram. Elas traziam sombra em dias de sol e chuva quando precisava,
mesmo assim, sempre dávamos toda nossa admiração ao azul do céu. A
pobre nuvem não ganhava atenção, muito menos admiração e às vezes ela
só desejava ser reconhecida.
Reconhecimento?
É isso que o André quer...

Ele desejava ser reconhecido e ajudou a mãe a maltratar a irmã em


busca de afeto. Ele repetia o tempo todo que Anny, Pietro e Eduardo
tiveram de tudo enquanto ele não teve nada...
Ele só queria ser tratado igual, era essa a charada.
Ótimo!

Assim que pousássemos iria conversar com Marco e Alexandre, pois


tínhamos que melhorar isso...
Virar esta situação, pois com toda certeza André tinha um psicológico
ferrado.
Não queria diminuir seus maus feitos e, sim, eu o odiava, mas em
busca da razão cometíamos muitas loucuras.
Eles ouviam o que dizia em silêncio.
Eduardo às vezes fazia uma ou duas caretas, mas não me interrompia.
Estávamos há mais de uma hora em uma reunião para tentar lidar
melhor com a situação, mas no final sabíamos que seria uma guerra entre
Eduardo e ele. O que André fez a Anny não iria sair impune, mas minha
justiça ele sentiria da mesma forma que minha esposa sentiu a sua raiva
descabida.
Neste caso seria olho por olho, dente por dente, e ele pagando por
seus crimes.

Era uma pessoa compadecida[8], mas não perdoava tudo.


Por fim, chegamos à mesma conclusão de que André pagaria perante
a justiça e que os fanáticos por mim eram um problema maior do que
gostaríamos, por isso minha comissão de imprensa faria uma declaração
pública sobre este assunto, deixando claro que não compactuávamos com
nenhum tipo de vandalismo ou atos de má-fé. Que minha corporação
prezava pelo bem-estar de todos, sendo do Sul até o Norte e que
procurávamos sempre ajudar o máximo possível, além de sempre incentivar
o bem.
Seria uma declaração chata de se fazer, mas necessária.
Anny optou por ir se deitar em nosso quarto, por isso, estava fora
desta linda e perfeita reunião. Quando todos cansamos, resolvemos seguir
cada um para o seu canto, entretanto, ainda continuei no escritório perdido
em pensamentos, tentando achar a razão disto tudo, mas quanto mais
pensava mais sentia um nó se formando em minha cabeça sem falar na
dorzinha chata de cabeça. Respirei fundo, tentando achar a linha da lógica
que com toda certeza perdi em algum momento.
Que irônico, acho que estava perdendo todo meu autocontrole por
nada. Dizem que todos somos dignos de ter dias ruins ou de ter dias bons.
Estava tendo meus dias ruins, mas com a certeza de que os bons viriam em
breve, muito em breve. Afinal, a esperança é a última que morre.

“Não se permitir cair.”


Estava repetindo isto para mim a cada segundo.
Eu sou forte...
Sou maravilhosa...
Sou mulher...
Sou resiliente!
Eu podia passar por tudo isto sem ter uma crise ou sem cair no chão.
Eu sei que podia! Poder era querer e eu queria!
Ver Dante sobrecarregado estava me destruindo de uma forma
inexplicável de se compreender, o quanto meu peito doía ao vê-lo no chão.
Dante estava destruído por tantos motivos, os quais muitos deles
desconhecia. Ele estava tentando esconder muitas coisas para não me ferir,
mas estava se ferindo no processo.
Dante era um príncipe, mas até os mais belos contos de fada podia se
tornar um pesadelo e ele estava se esquecendo disso. Eu precisava lhe
mostrar isto de alguma forma, mas não sabia como. Acredito que o que
podia fazer neste momento era lhe dar meu amor, meu carinho e minha
imensa paixão.

Levantei-me da cama e caminhei até o nosso closet. Segui até uma


das gavetas e peguei um conjunto de lingerie sexy, escolhi uma calcinha
preta fio-dental com renda na parte da frente, com o sutiã todo de renda, um
espartilho e uma liga. Soltei meu cabelo, bagunçando-o um pouco,
finalizando com um batom vermelho. Peguei um roupão, vesti e saí do
quarto. Desci a escada ansiosa e dei graças a Deus por não me encontrar
com os irmãos do Dante ou com o meu.
Parei na porta do seu escritório e dei uma conferida para ver se tudo
estava em seu devido lugar. Após verificar que tudo estava okay, abri a
porta de madeira sem bater, entrei, trancando-a atrás de mim e Dante me
encarou com as sobrancelhas levantadas.
Esse homem é sexy e lindo demais!
Misericórdia!
Dante era tão perfeito, tão maravilhoso, tão meu que às vezes não
acreditava que este homem era todo meu.
Dei alguns passos para me distanciar da porta desamarrando o roupão,
o jogando ao chão bem devagar. Eu o vi engolir em seco e me olhar com
mais precisão, avaliando cada detalhe do meu corpo.
— Não importa quantas vezes veja seu corpo, sempre perco o fôlego
— disse, deixando-me excitada. — Eu amo o seu corpo... Amo cada detalhe
que há nele, mas o meu maior prazer em seu corpo está em te dar prazer,
senhora Boltoni. É muita ousadia aparecer assim achando que serei um bom
homem...
Sorri sedutoramente para ele.

— Quem disse que quero que seja bom? — perguntei, aproximando-


me dele. — Você já é bom demais — comentei.
Parei diante da mesa de madeira, apoiei-me nela e joguei meu corpo
para frente. Meus seios balançaram e ele seguiu o movimento. Quando ele
deu seu sorrisinho de lado, sabia que seria bem fodida por meu marido.
Dante se colocou de pé, olhando para mim começando a se despir
calmamente e este autocontrole era irritante na maioria das vezes.
Quando ele abaixou a cueca, contemplei sua magnífica ereção. Este
homem é meu prazer eterno! Dante era um sonho de princesa safada sendo
realizado, mas a realidade era melhor que o sonho...

Muito melhor!
Ele passou a mão por seu grosso pênis que apontava para cima. Sua
espessura e comprimento ainda me assustava, mas amava senti-lo todo
dentro de mim. Ele saiu de trás da mesa se masturbando de leve, seus olhos
nunca saíam de mim e tinha certeza de que seus passos eram calculados.
Dante é um pecado de tão gostoso que é!
Seu olhar ficou tão intenso que acabei recuando, o que fez com que
ele viesse até mim a passos lentos. Estava molhada e tinha certeza de que o
que escorria pela minha perna era minha excitação. Engoli em seco quando
meu corpo tocou na parede fria, fazendo-me sentir pequenas ondas de
choque por meu corpo estar em chamas. Fechei meus olhos por uns
segundos e quando abri novamente vi que ele se encontrava a centímetros
de mim, inclusive, sua ereção já me tocou e eu o queria tanto que até doía.
Uma das suas mãos grandes tocaram meu rosto com delicadeza e
carinho, enquanto a outra segurou minha cintura, descendo pelo meu
abdômen até minha vagina e ele não era tão delicado quanto estava sendo
no meu rosto. Abri minha boca para soltar um gemido, e ele sorriu com
meu ato, enquanto seus dedos brincavam comigo, causando-me ondas de
prazer. Quando seu dedão começou a massagear meu clitóris, gemi mais
alto, colocando minha mão em seu peito musculoso. Dois dedos
introduzidos em mim me torturavam de prazer, enquanto seu dedão
lentamente massageava meu clitóris. Sua mão em meu rosto desceu para
meu pescoço devagar até meu seio direito, onde ele passou as costas da mão
algumas vezes antes de segurar meu mamilo com dois dedos, apertando
bem de leve. Fechei meus olhos e acabei batendo minha cabeça na parede,
enquanto uma combustão de calor passava por meu corpo. Gozei sem
perceber e ele não parou. Levei uma das minhas mãos até seu pau, sentindo
o quanto ele estava molhado de pré-gozo. Comecei a masturbá-lo com força
e com voracidade, mas sabia que ele não gozaria agora por ter um controle
venerável.

— Adoro este seu rostinho vermelho de prazer... Amo a forma como


você sempre me recebe bem e, meu amor, fico extasiado cada vez que grita
meu nome — disse com seu timbre vocal rouco que me deixava ainda mais
molhada. — Agora quero que levante sua perna esquerda que irei entrar em
você sem pudor algum... Mais uma coisa, prefiro você nua sempre, mas
confesso que amei este espartilho. Agora se me permite irei arrancar o que
você chama de calcinha. — Ele rasgou minha calcinha e meu sutiã.
Antes que eu pudesse levantar minha perna, ele fez e logo em seguida
entrou dentro de mim com calma, fazendo com que eu o sentisse
perfeitamente. Não conseguia pensar em nada quando ele saía um pouco me
deixando vazia para em seguida dar uma estocada forte, fazendo com que
eu gritasse seu nome.
— Hoje você está gritante, meu amor, acho que na próxima vez irei
tapar sua boca e não será com a minha, mas por agora irei te calar com a
minha boca.

Dante me beijou com paixão, seu ritmo das estocadas nunca


diminuíam e gozei mais uma vez, sentindo meu clímax chegar. Ele mordeu
meus lábios e meu pescoço, e certamente teria marcas, mas quem liga?
Minhas unhas em suas costas com toda certeza deixariam marcas
também.
Abri meus olhos, contemplando sua boca aberta e seus olhos negros
brilhosos, enquanto me mexia, seguindo o ritmo de uma música criada
pelos nossos gemidos e pelo barulho dos nossos corpos batendo um contra
o outro. Era uma dança onde o ritmo se agitava e se acalmava...

Era a nossa dança.


Quando ele gozou dentro de mim, gemendo meu nome baixo, me
senti ainda mais completa e realizada.
O suor que escorria dos nossos corpos me dizia que esse exercício era
o melhor de todos.
— Pronta para o segundo round, senhora Boltoni?
— Nasci pronta!
Só espero amanhã poder andar...
Dias depois...
Voltamos ao Rio de Janeiro para buscar as crianças, pois não
aguentava mais ficar longe dos meus filhos.
Anny ao meu lado sorria à toa, depois de uma rapidinha no jatinho,
tive que tapar sua boca com minha mão para que ninguém a escutasse.
Meus irmãos já estavam bem estabilizados em Boston, já Eduardo
continuaria no Rio, por falar em Eduardo, ele teve uma conversa bem
amistosa com André, que acabou com ele socando o irmão gêmeo até
André desmaiar. Eu, particularmente, adorei sua reação, mas me perguntava
o que o levou a essa agressão.
Meu fã-clube de fanáticos estava bem preso e sem data certa para sair,
o que era um grande alívio para minha mente. Agora só precisava me
resolver com minha mãe e o André Rizzi, e esta última conversa seria
apenas entre mim e ele. Como disse antes, não deixaria passar nada que ele
fez a Anny.

Ele foi condenado a quinze anos de prisão, mas aparentemente sofria


de problemas psicológicos e sua sentença podia ser reduzida por este fato.
Edward ficou de me informar melhor sobre este assunto.
Observei o sol se pondo através do vidro do carro.

Essa cidade um dia foi meu lar, mas hoje só me trazia dor e raiva.
Cidade das maravilhas. Cidade maravilhosa, mas para mim
significava apenas transtorno e dor.
Balancei minha cabeça, tentando me concentrar no que realmente
importava. Precisava ver meus filhos urgentemente.
— Estava pensando que poderíamos ficar um tempo na casa do lago
com as crianças — disse Anny, atraindo minha atenção. — O que acha?
— Acho que a Itália é mais atrativa, mas podemos ficar — respondi,
apertando sua mão que repousava em minha perna.
— Podemos chamar o pessoal para ficar com a gente, inclusive já
vejo a Melanie dançando funk até o chão — disse sorrindo, e gargalhei.
— Vamos evitar que Marco tenha algum ataque cardíaco, mas é bem
capaz do Pedro ter. Ele com toda certeza é o rei do drama, é meu amigo e
irmão, mas, puta merda, não dá com o Pedro. Esses dias ele me ligou
porque o Luther tinha corrido pelado pela casa toda às sete da manhã —
contei, lembrando-me da voz de desespero do meu amigo.
— Aquele menino é a cópia fiel dele. Até em relação ao drama, já a
Leena é tão carinhosa e na dela.
— Do avesso é só Danielle, Bruna, James e Luther. O restante é
calmo e na deles — disse sorrindo.

— Nicholas é uma criança tranquila.


— Ele é observador e calculista — falei mais baixo. — Não sei ao
certo o que se passa na cabeça dele. Ele é curioso e muitas vezes observa os
dois lados da moeda, sua inteligência às vezes me assusta — confessei.
— Ele é parecido com você.

Sorri para ela, mas não respondi.


Nicholas tinha minha aparência por completo, mas não tinha minha
personalidade, aliás, era muito cedo para falar sobre isto. Ele era apenas
uma criança, meu bebê e ainda estava na fase de descoberta da sua
identidade.
Ninguém se tornava o mesmo de quando era criança, eu mesmo não
era como era quando tinha sete anos ou menos. Com o tempo
amadurecíamos, e claro que com nossos erros e acertos faziam com que nos
tornássemos o que éramos, mas nada era impossível e se por acaso errarmos
podíamos acertar na próxima vez. O segredo era nunca perder a fé e
esperava que nenhum deles a perdesse.

Quando o carro estacionou em frente à casa dos meus pais, saí


correndo e quando a porta da frente se abriu, meus filhos saíram correndo
até mim. Sorri, ajoelhando-me para recebê-los e quando seus bracinhos me
envolveram, me senti completo.
— Que saudade de vocês, pequenos, papai sentiu tanta, mais tanta
saudade que mal conseguia respirar — disse, dando um abraço de urso
neles.
— Papai, para de drama! — pediu Bruna.

— Não é drama, minha filha, é saudade que mal cabe no meu peito
— argumentei, beijando seu rosto.
— Também senti sua falta, papai... Sua e da mamãe — disse Pietro,
soltando-me e correndo até a mãe.
Soltei Nicholas e Bruna que correram para a mãe quase a derrubando.
Vi minha mãe se aproximando com meu pai, enquanto Sara, minha
irmã, se encontrava encostada na parede ao lado da porta me olhando.
Infelizmente, não éramos tão próximos, ela depois que se casou se
aproximou muito da família do marido, mas eu também não podia falar
muito, afinal meu caso não era diferente. Olhei meu pai que sorria
abertamente para mim, enquanto minha mãe me olhava com cautela.
Levantei-me indo de encontro a eles a passos curtos e ao me aproximar da
minha mãe, lhe dei um abraço apertado. Ela ficou em choque, mas na
mesma hora devolveu o abraço. Tendíamos a ignorar certos sentimentos
dentro de nós e por mais magoado que eu estivesse com minha mãe ainda
sentia falta dela, do seu carinho, do seu amor e dos seus abraços. Um lado
da história tinha que ceder e não dava para ambos ficarem eternamente
puxando a corda, por isso estava cedendo hoje...
Por ser filho e pai.
Não queria que no futuro meus filhos tivessem este tipo de relação
comigo ou com a Anny. Não queria ter uma família quebrada, já bastava os
Rizzi. Com os erros deles estava mudando os meus e aprendendo que tudo
que tínhamos era a família.
— Meu filho eu te amo tanto — disse minha mãe fungando.
— Mãe, eu também te amo. — Afastei-me, beijando sua testa com
carinho.
— O velho aqui também não ganha um abraço? — perguntou meu
pai.
Fui até ele sorrindo e o abracei apertado.
Eu me parecia com meu pai e meu filho se parecia comigo, era uma
geração de Boltoni que como dizia minha avó: “Uma geração linda pra
caralho”, eu só não tinha covinhas e dava graça a Deus por isso.
Caminhei até minha irmã e sorri para ela que me olhava séria.

— Não mereço um abraço? — perguntei, fazendo cara de triste.


— Com trinta e seis anos na cara quase trinta e sete vem me fazer
essa carinha barbada de cachorro sem dono, me poupe, Ettore — disse,
olhando-me nos olhos.
— Eu ainda sou seu irmão caçula — resmunguei, fazendo bico.

— Meu irmão caçula, com três filhos nas costas e pelo no saco —
falou, batendo o pé no chão. — Toma vergonha nesta cara que quando tiver
ao menos vinte e três centímetros de pau conversaremos — disse com
deboche.
Pela primeira vez dei graças a Deus pela Anny ter medido meu pênis.
Obrigado, meu amor, por me medir mais de uma vez!
Podia jogar na cara da minha irmã meus vinte e oito centímetros e
meio. É isso, agora podemos conversar sério.
— Então, lhe informo que aqui, dentro dessa cueca boxer, tem mais
que vinte e três centímetros. Minha esposa mediu! ─ contei com orgulho
que nem ao menos deveria ter.
Ela abriu a boca e fechou, abriu novamente e fechou para em seguida
olhar para baixo, exatamente para o meu pau.
— Você é um cavalo! — exclamou alto.
— PAPAI NÃO É UM CAVALO! — berrou Nicholas. — Papai é
humano, titia, cavalos são animais, papai é um animal sim, mas racional,
então ele é humano — disse sério para a tia.
Sara me olhou e depois olhou para a minha mini cópia, balançou a
cabeça e por fim sorri para a criança que a olhava com indignação.

— Titia só está brincando com o papai, está bem? — perguntou,


fazendo voz fofa.
— Brincadeira tem limite, tia. Vou abraçar minha mamãe — disse e
saiu correndo até a Anny que conversava com a minha mãe e meu pai.
— Ele com toda certeza é seu filho! — comentou Sara.

— Tem algo de mim nele. Agora podemos ter uma conversa séria?
— inquiri, tocando seu ombro.
Ela revirou os olhos algumas vezes antes de me responder.
— Vamos entrar — concordou e saiu andando.

Segui minha irmã até o escritório do papai e assim que entrei tranquei
a porta. Ela se sentou em uma poltrona preta no canto e eu puxei uma
cadeira para me sentar em frente a ela.
Observei minha irmã respirar fundo e passar a mão nos fios negros
que estavam na altura do seu ombro, enquanto abria a boca e fechava
constantemente. Era provável que ela estivesse buscando as palavras certas,
mas também era certo de que estivesse tentando não me ferir com sua
rispidez. Eu não esperava gentileza e muito menos empatia neste momento.
De certa forma os mantive distantes tanto no passado quanto no presente.
Quando fui embora para Boston anos atrás, deixei tudo para trás, inclusive
minha família. Estava ferido, desolado e perdido dentro de mim mesmo...
Eu só queria esquecer aquilo que me feria e recomeçar longe da dor,
mas me enganei e vivi achando que estava vivo. O estranho aqui só estava
passando o tempo sem certa direção, estava quebrado e achava que estava
bem. Fui tolo, mas foi essa tolice que me fez ser quem era e tinha orgulho
disso.
— Me perdoe — pediu baixo, e olhei para ela confuso. — Você é
meu irmão caçula e não te apoiei em quase nada. Fui viver minha vida,
esquecendo que vocês também faziam parte dela, me isolei dentro do meu
próprio mundo, porque para mim era mais fácil. — Ela sorriu. — Acho que
nenhuma família é perfeita, mas podia ter feito mais por você e ter lhe dado
mais apoio... Você é meu irmão... Eu vi você cair e não fiz nada, na
verdade, eu fiz algo sim... Virei minhas costas e fui embora. — Ela enxugou
uma lágrima e sorriu.

Suas palavras me pegaram desprevenido.


— Você é tão incrível, Dante... Tenho tanto orgulho de você, tanto
orgulho em saber que você enfrenta qualquer situação de cabeça erguida. Só
me perdoe por não fazer nada.
Abaixei minha cabeça em busca do que falar para ela. Mordi meu
lábio inferior, passando as mãos pelo meu cabelo. Uma lágrima solitária
escorreu pelo meu rosto, seguida por mais algumas deixando de ser
solitária.

— Está tudo bem. Eu me afastei por escolha e por medo há anos, mas
não era sua obrigação correr até mim... Não era obrigação de nenhum de
vocês, optei por um caminho longe de casa em busca da minha própria casa
e encontrei meu lar. Um lugar para chamar de meu — expliquei, olhando
em seus olhos. — Todos nós seguimos nossos caminhos e está tudo bem,
Sara. Eu me mudei para outro país, me refiz e reconstruí minha vida. Hoje,
eu não sou o mesmo de três anos atrás ou o mesmo de cinco meses,
mudamos constantemente porque a mudança faz parte da vida de quem
somos. Não me peça desculpa por viver sua vida... Minha queda foi prevista
pelos céus, só eu que não vi... Escolhi travar minhas batalhas, mas vocês
não são meus soldados. É tempo de sermos mais próximos e unidos... É
tempo de sermos mais irmãos e não apenas parentes, mas não olhe para o
passado, é tudo aprendizado, ensinamento e vida — disse e sorri para ela.
— Vamos preparar um churrasco na casa do lago com todo mundo junto e
misturado — avisei, e ela gargalhou.
— A tropa de Boston vai vir?

— Com toda certeza!


Às vezes achava que era o homem mais sortudo deste insensato
mundo.

Minha sogra e eu nos encaramos por alguns instantes, e respirei fundo


sabendo que precisava conversar com ela, pois precisávamos resolver esta
situação. Ela precisava me ouvir e eu a ela, estávamos em uma
encruzilhada, perdidas em nossos próprios caminhos. Eu ao menos acho
que encontrei o meu, mas ela era um caso à parte. Deixei meu sogro levar
as crianças para dentro da casa correndo atrás de um bolo de cenoura com
chocolate e andei até a mulher que deu à luz ao meu marido. Entendia a
raiva dela, compreendia perfeitamente porque era mãe e por ser mãe sabia o
quão ruim era ver um filho sofrer a dor dele. Esta dor se tornava nossa em
uma proporção que só quem era mãe sabia.
— Posso conversar com a senhora? — perguntei quando estava mais
próxima a ela.
Ela respirou fundo, balançou a cabeça em sinal positivo antes de
pegar minha mão e me guiar até os fundos da casa onde tinha um balanço
rodeado por flores. Ela se sentou, e eu me sentei de frente para ela. Minha
sogra me encarou em silêncio, esperando que eu fosse falar algo, e respirei
fundo tomando coragem para começar.

— Sempre tive medo do escuro, ainda novinha sabia o que o escuro


me causava... Não o escuro do quarto quando as luzes estão apagadas, mas
sim o escuro que há dentro das pessoas e este escuro me apavora até hoje.
— Dei um sorriso torto e continuei: — Não quero que sinta pena de mim,
não quero que sinta raiva, ou até mesmo que me console, estou bem. Hoje
vejo meu passado como um passado que superei, mas antes de superá-lo eu
sangrei, gritei, implorei, desejei morrer, mas eu não desejava isto quando
estava ao lado do Dante. Seu filho fazia com que eu me sentisse especial e o
toque dele apagava qualquer outro toque de repulsa. Talvez esteja falando
tudo meio confuso, mas é assim que hoje me recordo deste mar de dor e
confusão. — Uma lágrima escorreu dos meus olhos. — Perdi muita coisa,
mas ganhei coisas que ninguém jamais poderá tomar de mim. Perdi tudo,
mas ganhei o maior amor do mundo. Não estou falando do amor do Dante,
estou falando daqueles três seres pequenos em sua cozinha. Eu juro para a
senhora, que é por eles que entendo seu medo, você teme que eu vá
derrubar seu filho novamente, mas eu não vou e nem quero. Me perdoe por
fazer seu filho sofrer ou por feri-lo com minhas feridas, mas não lhe peço
perdão por amá-lo, pois este pedido de desculpas em especial a senhora
jamais ganhará de mim. Eu o amo, amo seus defeitos, suas feridas e seu
sorriso. Oh, meu Deus, amo até o jeito mandão dele ser. A senhora pode
não saber, mas ele é o sol que eu tanto ansiei em meus dias de escuridão.
Ele sempre foi minha estrela guia... Quero que sejamos uma família unida,
não tive isso, mas anseio que meus filhos tenham... Desejo que eles tenham
mais do que tive e que eles sejam felizes. Quero que a senhora seja para os
meus filhos o que a minha avó foi para mim, ela era minha heroína. —
Enxuguei minhas lágrimas e abri um sorriso para ela que tinha algumas
lágrimas escorrendo pelo seu rosto.
— Não sei ao certo o que falar, Anny... Você é forte, vejo força em
você só por vir até mim e dizer tudo isso... Eu te perdoo e quero ser mais
próxima dos meus netos e do meu filho... Podemos sim ser uma família
unida — disse sorrindo levemente para mim. — Você é uma mãe
maravilhosa, eles são tão educados e simpáticos... São o orgulho — falou,
levantando-se, e eu fiz o mesmo.

Estendi minha mão, mas ela me puxou para um abraço.


— A vida não foi gentil com você, muito menos eu. Me perdoe por
feri-la, Anny. Você fala que Dante é sua estrela guia, mas quando olho para
você, percebo que você é sua própria estrela guia. — Ela se afastou de mim
segurando meu rosto com suas mãos delicadas. — Você é sua estrela guia,
menina. Meu filho é uma luz brilhante, mas não é a sua luz. Você é forte,
resiliente e luz. — Ela enxugou minhas lágrimas. — Você é grande, Anny.
— Ela beijou meu rosto e levantou meu queixo. — É por isso que meu filho
te ama... Você é gigante. Sempre mantenha sua cabeça erguida, Anny...
Sempre. Você não teve uma mãe exemplar para se espelhar, mas você é uma
mulher e mãe digna de ser espelhada. Você reflete aquilo que poucos
conseguem, você reflete a raridade... Você reflete vida.
Soltei um soluço, abraçando-a mais forte, enquanto algo dentro de
mim se acalmava e ficava em paz. Algumas vezes era preciso ceder e pedir
perdão para ser perdoado. Uma vez que você baixava a guarda conseguia
ver o que antes não via e enxergar que éramos mais do que erros e acertos...
Éramos todos vida e dignos do perdão, mas bastava saber pedi-lo.
Minha alma agora estava mais calma e meu coração se encontrava
mais tranquilo. Podia agora respirar com mais leveza, mas me perguntava
se realmente era minha própria estrela guia.

Eu sou a minha luz?


Agora enxergava com clareza que dei as costas para o escuro e estava
de frente para a minha luz.
Tinha teorias que não conseguimos
explicar.
Histórias que não conseguimos compreender e contos que
não eram nada além de contos. Castelos que eram derrubados quando a
maré chegava, casas que o vento forte não levantava uma telha, mansões
que a chuva fraca molhava tudo por dentro.
Havia abrigos que não conseguimos achar em dias de vendavais, mas
não era por falta de procurar, era porque passávamos tempo demais
buscando algo que sempre esteve dentro de nós.

Às vezes esquecíamos que éramos o próprio abrigo, que éramos o


abrigo que tanto procurávamos, mas de forma alguma devíamos esquecer
que éramos a própria tempestade de areia que surgia no deserto. A grande
questão de tudo era que esquecíamos o fundamental para nos lembrar do
que não importava.
Quando alguém estava se afogando, sua primeira reação era subir à
superfície a todo custo, mas muitas vezes o que necessitávamos era nos
calar, buscar calma, subir à superfície e com calma boiar sobre as águas ou
nadar com mais calma possível até a costa. Sei que parece ser algo
impossível, mas não era só difícil. Precisei me submeter às águas para
entender que precisava ter calma, e não raiva ou desespero. Precisei ficar
sete dias isolados com minha família para entender que não importava o
que viesse a acontecer, era capaz de suportar.
Estava ficando cego de raiva e de dor. Era mais que uma tempestade
de dor ou raiva.

Eu iria causar dor ao André Rizzi, mas entendi que ao fazer isso me
igualaria a ele. Eu não era caos, eu não era uma pessoa má...
Eu era benevolência e complacência...
Eu era mais do que eles pensavam de mim ou até mesmo mais do que
eu pensava de mim. Obviamente não era perfeito e nunca seria, mas
compreendia que era quem era e me orgulhava do homem que me tornei.
Ultimamente vinha passando por muitos dias ruins, mas até na
tempestade era possível sorrir e eu vinha sorrindo entre lágrimas e
gargalhadas, aliás, a vida não era um conto de fadas, onde tudo no final ia
dar certo e ponto final.

A vida era uma agridoce realidade, onde o ponto final era a morte.
Então, enquanto estivermos vivos tudo se tornava possível e todo ponto se
tornava vírgula.
Sorri, ao ver minha mãe conversando com a Anny alegremente.
Ambas se resolveram ontem, e por isso, ficamos na casa dos meus pais.
As crianças dormiram conosco na cama, o que para mim foi ótimo.
Amava tê-los perto de mim ao alcance dos meus braços. Era pai urso,
protetor ao extremo, mas acho que todos éramos de certa forma assim.
Gargalhei quando meu pai tentou fazer Nicholas colocar uma pipa no
alto, sabia que meu filho não gostava dessas coisas. Se eu fosse meu pai iria
tentar fazê-lo brincar com outra coisa, já Bruna estava com sua pipa rosa no
alto do céu.
Menina travessa!
Pietro se encontrava sentado no colo da mãe, ele era grudado a ela de
uma forma que me surpreendia. Pietro era igual ao irmão da Anny quando
mais novo, alguns podiam até dizer que era a reencarnação do falecido, mas
como não acreditava nisso via apenas como mera coincidência. Cada um
tinha um pouco meu e da Anny, quer dizer, Nicholas puxou a mim
completamente. Ninguém dizia que eram trigêmeos, inclusive eu não dizia.
Meus filhos eram tão diferentes. Tão únicos...
Meu telefone tocou e ao olhar a tela suspirei. Levantei-me e segui
para dentro da casa.

— Edward, o que houve? — perguntei já temendo a resposta.


— Dante, preciso que venha até a clínica onde André Rizzi está sendo
internado — disse, e quase pulei.
— Como assim? Explica isso melhor, por favor — pedi, passando a
mão no meu cabelo.

— Marco pediu para que eu e outro psicólogo, junto com um


psiquiatra, fizéssemos uma avaliação clínica e psicológica nele. Ele sofre de
bipolaridade tipo 1[9], assim como o Pietro sofria — explicou, e respirei
fundo. — A diferença entre um e outro, é que André sofre de síndrome de
Estocolmo[10] e de Borderline[11] e ele precisa de ajuda, Dante.
Respirei fundo mais uma vez. Puta merda! Isso explicava muitas
coisas, mas não esperava encontrar tantas síndromes em uma só pessoa.
Sabia que a Bipolaridade leva à depressão e ao suicídio devido à alta
alteração de humor aos picos de euforia que logo desciam para uma grande
tristeza. Agora, uma pessoa com Borderline podia ter Bipolaridade tipo 1?
Ambos possuíam quase as mesmas características.
— Estou indo encontrar vocês, me envie o endereço — pedi, e
desliguei.

Quando me virei para avisar que ia sair, dei de cara com Nicholas me
olhando, parei por alguns segundos olhando para meu filho. Ele tinha uma
inteligência acima da média, era na dele e não gostava de interagir muito.
Não, meu filho era normal, mas acho que faria com que todos eles
passassem por um neuropsicólogo.
É isso, todos passariam por uma avaliação só por garantia.
— Papai, está tudo bem? — perguntou minha mini cópia.
— Está sim... Papai só vai ter que sair rapidinho, mas já volto —
disse sorrindo para ele. — Papai te ama.
— Te amo mais, papai! — respondeu sorrindo.
Ele era perfeito e não tinha nada... Ele era meu filho independente de
tudo... Ele era meu filho.

Assim que cheguei à clínica, dei de cara com Edward que me


aguardava sério como sempre. Quando fui passar por ele, senti meu braço
sendo segurado, olhei para ele e fiz um sinal negativo com a cabeça.
Respirei fundo e quando ele me soltou, o segui para onde quer que fosse.
Edward me guiou para a área externa onde havia seguranças e enfermeiros.
Seguimos até um banco onde nos sentamos e admiramos as inúmeras flores
que havia ali.
— Dante antes de você ficar cara a cara com André gostaria de
conversar com você sobre três coisinhas básicas — disse com um tom
neutro. — Primeiro, vamos começar com o que mais me surpreendeu no
seu cunhado, Borderline, ele foi diagnosticado com autismo, mas ele não é,
sei que ele tem um problema na coordenação motora, mas ainda não sei de
onde isso veio. — O loiro fez uma pausa e me encarou com atenção. —
André possui pouca interação com as pessoas e tem excesso de raiva
constante, o que é normal devido à sua atual situação e provavelmente
tiraram proveito disso — disse bem calmo. — Ele é inteligente, mas não
possui uma boa coordenação motora com o braço direito e a perna esquerda
por isso usa mais o braço esquerdo, dando a entender que é canhoto, mas
não é. O fato dele também sofrer de bipolaridade não ajuda em nada, na
verdade, só piora a situação. — Ele suspirou e continuou: — Não sei se
reparou, mas ele torce constantemente os dedos da mão e tem uma adoração
incomum pela mãe, o que nos leva até o terceiro diagnóstico, a síndrome de
Estocolmo que é quando uma pessoa passa a ter uma adoração fora do
comum por quem lhe fere. É como o surgimento de um amor, mas passa
amar quem lhe fere e machuca, não é falta de vergonha na cara, mas sim
uma doença. Há muitas mulheres que apanham, são estupradas e continuam
com seus agressores, pois acabam desenvolvendo a doença e isto é mais
comum do que imaginamos.
Respirei fundo, e ele continuou falando:
— Você já sabe o que é bipolaridade, mas gostaria de lhe explicar
sobre Estocolmo, tem alguma dúvida?
— Não, não tenho. Posso conversar com meu cunhado?
Ele suspirou e se levantou.
Segui Edward para dentro da clínica onde passei por uma pequena
vistoria antes de seguir adiante. Os corredores possuíam paredes brancas
sem vida, inclusive, as portas eram brancas com os números em cinza.
Paramos diante de uma porta e Edward a abriu para mim. Entrei e vi André
vestido em um roupão branco olhando para as janelas com grades. Ele não
se virou para mim e continuou olhando para fora igual um pássaro que
desejava voar.
— Olá, André — disse, chamando sua atenção para mim.
— Dante Boltoni em pessoa mais uma vez — falou ainda sem me
olhar. — Veio me bater igual eu bati na Anny? — perguntou sorrindo. —
Olho por olho... Seria algo justo você me bater com a mesma barrinha de
ferro que bati na pequena Anny Bella. — Ele sorriu e se virou para mim. —
Prefere que eu tire minha roupa para igualar a situação? Ou prefere tirá-la?
Sabe, Dante, mamãe dizia que a princesa Rizzi precisava sangrar e eu fiz
isso, legal, né? — perguntou sorrindo abertamente. — Aqui dentro... —
Apontou para a cabeça. — É uma bagunça, mas eu gosto das coisas
bagunçadas, aliás, nasci no meio da bagunça e morrerei diante dela, não é
mesmo?
Calma, ele é uma pessoa doente. Uma pessoa que precisa de ajuda,
mas esta ajuda não será minha. Eu não consigo ajudá-lo mais do que isto.
Darei a ele uma excelente ajuda médica e não permitirei que ele sofra
quaisquer maus tratos, mas somente isto.

Não podia ir além disto...


— Vim apenas lhe informar que ficará aqui pelo tempo que for
preciso para o seu tratamento e não irá para a prisão devido à sua condição
de saúde — disse, lutando contra minha própria mágoa e dor.
— Só isso? — indagou rindo.
— Você já vive na sua própria cela, não preciso infligir dor ou lhe
fazer sofrer. Você é sua prisão, você é sua queda e sua catástrofe, só posso
lhe desejar boa sorte em sua jornada — falei e saí o mais rápido possível.
Não parei para falar com ninguém no caminho para fora da clínica e
quando vi meu carro quase corri até ele. Entrei e dei partida, não parando
para absolutamente ninguém. Dirigi, me concentrando na estrada evitando
pensar muito, não podia pensar muito, se pensasse iria bater e Deus me livre
ter meus filhos me visitando no hospital todo ferrado.
Quando não consegui mais dirigir, encostei no acostamento, coloquei
minha testa sobre o volante e por alguma razão chorei, talvez meu choro
fosse de frustração, raiva ou até mesmo dor. Só sabia que meu coração
estava uma bagunça e mesmo estando tudo muito agitado de uma coisa eu
tinha certeza. Estava orgulhoso de mim mesmo por não usar a raiva e nem a
fúria contra o André, usei o que me restou de complacência com ele. Sabia
que ele não merecia, mas eu merecia.
Não fiz por ele e sim por mim...
Não queria me sentir um monstro e me tornar o que mais repudiava.
Não sei quanto tempo fiquei parado, liguei o carro de volta e segui
meu percurso de volta para a minha família, mas por alguma razão desviei
do caminho e segui até o cemitério.
Estacionei o carro e desci seguindo até um túmulo que não visitava há
muito tempo. Na verdade, nunca o visitei depois do enterro.
Fiz o caminho de pedra até onde ele foi enterrado, desta vez nenhum
trovão bradava no céu e o único brado era o de dor que vinha direto do meu
coração. Ele se encontrava ferido, mas batendo.
Meu coração era guerreiro e já aguentou coisas piores.
Parei diante da lápide escrita Pietro Rizzi, sorri para o túmulo e me
sentei ao lado sorrindo levemente.
— Fala aí, cunhado. Quero sair deste mundo insensato, mas é só uma
fase ruim demais... Ruim pra porra... Está difícil, mas eu aguento e sei que
suporto qualquer coisa por amá-los — disse rindo. — Estou rindo de
desespero. Sabe, um dos trigêmeos tem seu nome, ele é dócil e carinhoso,
mas acho que aí de cima você está vendo tudo isso... Às vezes acho que há
um anjo cuidando de nós, mas a meu ver um desses anjos é você, então,
muito obrigado. Sempre que vejo uma borboleta me lembro de você. Você
encontrou suas verdadeiras asas na morte, não te julgo, até mesmo te
compreendo. Você foi tão corajoso! Ah, Pietro, a vida aqui embaixo é
confusa e tem horas que quase caio com tremores que passamos, mas por
pessoas como você, sua irmã, meus filhos e por mim me mantenho em pé.
Seu irmão, André Rizzi, ao nascer foi escondido pelos médicos a pedido da
sua mãe, poderia ter sido ele ou Eduardo, mas ele teve esse azar... Sinto que
na verdade todos vocês tiveram esse azar. Se olhar bem para a verdade,
verei que ele, assim como vocês, foi uma grande vítima da sua mãe, Júlia
Maria. Ele viveu todos esses anos escondido, sendo maltratado todos os
dias, ele não se encontra bem, mas espero que um dia fique. O médico que
ajudou sua mãe a esconder o segundo bebê e que o tempo todo ocultou a
existência de dois fetos foi morto sete meses atrás, eu sei que não é
coincidência, mas duvido que vá existir mais provas sobre isso. André
nasceu da escuridão e cresceu sem nenhuma compaixão, por mais raiva e
mágoa que tenha dele, também sinto dó! Ele não sabe o que é luz, não sabe
o que é habitar na luz e muito menos viver com ela. Ele não é uma boa
pessoa, mas um dia poderá ser. Vou ficar bem, não agora, mas irei. — Olhei
para o céu. — Continue aí de cima olhando por nós, obrigado — disse,
levantando-me.
Senti meu telefone vibrar em meu bolso, quando vi o nome da minha
irmã atendi sem preocupação.
— Oi, irmãzona.
— DANTE, CORRE PARA O HOSPITAL A ANNY ESTÁ AQUI!
— gritou.
Meu coração começou a errar algumas batidas...
Dizem que costumamos inventar pretextos para lidar com a dor ou até
mesmo preferimos fingir que ela não existe. Na verdade, é muito mais fácil
fechar os olhos e não ver tudo aquilo que te fere.
A vida era recheada de temporal com vários trovões que cortavam no
céu, com seus ecos genuínos nos iluminando e seus mais belos e
apavorantes raios. O belo às vezes era assustador, e assustado era como me
sentia neste exato momento.
Parado no meio de um cemitério diante de vários túmulos, sendo que
um deles é do meu falecido cunhado, respiro fundo, tentando me acalmar
para saber agir com cautela. Eu não sabia o que houve, mas antes de saber
precisava me acalmar e tranquilizar meu coração que soava neste exato
momento como trovões no alto do céu. Fechei meus olhos e tentei acalmar
meu coração insensato que insistia em bater rápido e errar algumas batidas.
Abri meus olhos e fiz o caminho de volta para o carro, andei
apressado e com bastante cautela para não tropeçar e me estropiar todo.
Assim que cheguei ao estacionamento, vi um dos seguranças me
aguardando, andei até ele e lhe dei a chave do carro, pois não tinha a
mínima condição de dirigir. Entrei no banco de trás, colocando o cinto de
segurança em busca de alguma segurança para o meu coração. Sentia-me
sufocado, na verdade, tudo que se tratava da Anny e das crianças me
deixavam desesperado, assustado e medroso. Era como se toda minha
coragem e força fossem sugadas pelo medo.
Chegava a ser irônico, mas se compreendia que quando se amava
alguém além do que se possa imaginar qualquer mísera pedra que os fizesse
cair me derrubava com um impacto maior ainda. Eu morria por eles, mas
também vivia por eles...

Acho que era assim o amor, você se doava e em troca recebia algo
além do que muitos podiam imaginar. Eu não conseguia calcular o tamanho
do meu amor por eles e não existiam números exatos...
Não para o amor.
Quando o motorista me deixou na entrada do hospital, entrei feito um
louco, desviei dos seguranças, das pessoas e de quem mais estivesse na
minha frente, só precisava chegar até ela. Cada passo longo que dava me
sentia ainda mais ansioso, era como se estivesse correndo uma maratona e
não terminasse. Minhas mãos estavam trêmulas e minhas pernas pareciam
que receberam uma dose exagerada de adrenalina. Sentia como se fosse
capaz de correr quilômetros e mais quilômetros, e só parei quando vi minha
mãe na recepção tentando ligar para alguém. Andei até ela e quando parei à
sua frente vi que ela estava chorando. Parei e por alguns segundos perdi o
ar. Minha mãe me olhou, engoliu em seco e fungou profundamente, com
seus atos já podia supor que o pior aconteceu. Olhei em seus olhos em
busca de alguma dica ou explicação, mas nada veio até mim.

Não havia sinais de que tudo se encontrava bem, minha mãe colocou
a sua mão esquerda sobre meu braço e o apertou como forma de conforto,
mas por qual motivo ela estava me consolando?
Eu não conseguia perguntar e ela não conseguia dizer, e não sabia ao
certo quanto tempo ficamos nos encarando, só paramos quando alguém me
chamou e ao me virar dei de cara com um policial civil.

— Senhor Boltoni, desculpa atrapalhar esse momento em família,


mas é preciso que sua mãe e esposa vão à delegacia dar o depoimento sobre
o que houve. Sou o investigador Fernando Cabral — disse, apresentando-se.
Apertei sua mão, sentindo-me perdido sobre o motivo dele estar aqui.
— Investigador pode me informar o que está acontecendo? Acabei de
chegar.

— Aparentemente sua família estava passeando pelo jardim botânico


quando um dos moradores de rua surgiu por erro da segurança do local, seu
filho foi até ele e o sujeito o esfaqueou.
Dei dois passos para trás.
— MENTIRA! — gritou Anny, surgindo do nada.

Virei-me para sua voz e vi algo que fez com que meu mundo
desabasse mais um pouco. Sua blusa estava toda suja de sangue e seus
olhos estavam vermelhos de tanto chorar, aliás, ela ainda estava chorando.
— Por causa desta segurança meu filho foi ferido, ele estava
alimentando o morador de rua como o ensinamos. Vocês chegaram
agressivos e um de vocês tirou uma faca que acabou atingindo meu
pequeno menino — disse Anny, olhando com fúria para o investigador. —
Meu filho se feriu por causa de vocês, por preconceitos de vocês. A sorte é
que o corte não foi profundo e precisou apenas de alguns pontos, mesmo
assim, a negligência de vocês foi desnecessária. Não se trata ninguém da
forma como vocês o trataram — falou alterada para o investigador Cabral
que ouviu tudo calado.
Saber que um dos meus filhos estava ferido me corroía por dentro,
mas saber que apesar de tudo ele estava “bem” me deixava mais tranquilo.
Respirei com calma e olhei para minha esposa que parecia que ia pular no
pescoço do policial. Ela estava parecendo uma leoa prestes a pegar sua
caça, era algo sexy e quente de se ver. Balancei minha cabeça e caminhei
até ela, puxando-a para os meus braços. Beijei sua testa, ela me abraçou
com força e começou a chorar desesperadamente. Escondi meu rosto entre
seu pescoço para esconder as lágrimas que escorriam dos meus olhos.

Não conseguia nem imaginar o quanto tudo foi desesperador para ela.
— Ele sangrava tanto, mas tanto — disse entre soluços. — Dante
achei que iríamos perder nosso filho. Era tanto sangue, senti tanta dor...
Achei que iria perder nosso menino... Ele está bem, mas me doeu na alma.
— Foi qual deles?
— A sua mini cópia! — exclamou, olhando-me brava. — Aquele
menino tem seu gênio. Ele quer ajudar todo mundo, quer alimentar todo
mundo e quer adotar todos os cachorros da rua. Ele é definitivamente seu
filho, acredita que ele chorou quando disse que não poderíamos levar os
cãezinhos da rua para casa? — disse em um tom acusatório.
— Ele está bem? — perguntei, ignorando suas pequenas acusações.
— Levou sete pontos e ficará esta noite no hospital — respondeu, e
balancei a cabeça em afirmação. — Ele está bem, mas até agora não falou
nada. Ele olha para o teto ora suspirando ora chorando. Não sei o motivo —
disse e suspirou.
— Vá para casa com a minha mãe, tome um banho e fique com as
crianças, passarei à noite com ele — avisei, beijando seus lábios. — Vá
descansar.
Ela me olhou apreensiva antes de olhar para si, respirou fundo e fez
que sim com a cabeça.

— Promete que vai me ligar se algo acontecer?


— Prometo — respondi, beijando seus lábios mais uma vez. — Te
amo.
— Eu te amo!

Meia hora depois após fazer meu cadastro, fui levado até o quarto
particular em que Nicholas estava. Assim que abri a porta, entrei, vendo-o
deitado em uma cama grande demais para ele, coberto com um cobertor
meio azulado. Havia alguns aparelhos ligados a ele, monitorando seus
batimentos cardíacos e outro lhe dando soro na veia.
Ele me olhou e fechou os olhos novamente, envergonhado.
Ele estava envergonhado, por isso se encontrava mais quieto que o
normal.
Literalmente ele é meu filho!
Caminhei até ele, me sentei na poltrona ao seu lado e ele continuou na
dele, quieto. Sorri mais aliviado ao perceber que ele estava bem, pois quase
morri mil vezes no percurso para cá. A princípio achei que a Anny estava
ferida, mas quando falaram que foi um dos meus filhos quase desabei. Ao
ver Anny suja de sangue e quebrada me mantive forte e me manteria até
ficar sozinho, só então me permitiria chorar um pouco. Descobri com o
tempo que precisava ser o pilar da minha família e por isso me mantinha em
pé mesmo sem forças. Esse sentimento de proteção, amor e carinho dentro
de mim sempre fazia com que me sentisse mais forte para eles. Se não fosse
por isso já teria caído há muito tempo e duvido muito que conseguiria me
erguer outra vez...
Olhei para minha mini cópia e sorri, acho que precisava falar algo.

— Sabe, a vida é recheada de algarismos que nem sempre


conseguimos compreender... Eu até mesmo entendo algumas, mas acredite,
são anos de estudo para obter uma ou duas respostas — disse, e ele abriu os
olhos. — Quando criança queria poder salvar o mundo de uma só vez, mas
com o passar do tempo percebi que não é possível, então, fazemos o que
pudemos e até mesmo mais, mas, meu filho, não temos superpoderes e por
ser meros seres humanos, de carne e osso só podemos abraçar a quantidade
que nossos braços aguentam. Eu na sua idade, não entendia, e até hoje não
entendo essa politicagem toda, mas acredite, Nicholas, um dia você
entenderá que hoje somos esfaqueados e amanhã será você a receber um
sorriso doce em agradecimento. — Lágrimas caíam pelo seu lindo rosto. —
Hoje você não entende e nem aceita estes conceitos, esta politicagem e até
mesmo deve estar com raiva de mim, mas no futuro você verá que o que te
falo hoje está certo — disse sorrindo triste.
Ele engoliu em seco, secando as lágrimas com certa raiva.
Este menino era sensível demais a certas coisas, por agora não me
preocupava, mas com o futuro sentia que teria certos problemas...

— Não quero entender nada, pai — disse, respirando fundo. — Só


não entendo a crueldade humana. Por que temos mais do que os outros? —
perguntou, olhando para mim.
— Porque nada é igual, Nicholas. Por ter mais que muitos ajudamos
quem nada tem, é assim a vida criança. Não é justa, mas fazemos o que
podemos para deixar o mundo melhor. Lutamos na maioria das vezes com
um time pequeno. Eu venci muitas lutas, mas há outras que só vocês, a nova
geração, poderá vencer. A vida é nublada de dias de luta e dias de glória,
cabe a nós saber lidar com a vitória e a derrota.
Ele me olhou e fechou os olhos chorando ainda mais forte.

Levantei-me, caminhei até ele, abaixei-me e dei um beijo na sua testa


ao mesmo tempo em que o abracei com certo cuidado. Foi isso que meu pai
fez comigo quando chorei pelos mesmos motivos que ele...
Foi isso que meu avô me disse no dia em que chorei por horas, sem
parar por causa de um menino que morava na rua e foi morto por nada.
— A vida não é repleta de felicidade, mas posso te dizer que ela é
recheada de esperança. Não chore à noite toda por causa dos homens maus,
não deixe que eles tirem de você sua fé... Você é forte, Boltoni... Você é
mais do que pode imaginar... — repeti para ele o que me foi dito anos atrás.

— Um dia serei forte igual a você, pai — disse, entrelaçando seus


braços no meu pescoço.
— Espero que você seja mais do que fui um dia, meu filho.
Assim que cheguei à casa dos meus sogros, tomei um banho
demorado, Bruna e Pietro estavam dormindo ao lado do meu sogro e sabia
que não conseguiria dormir. Minha mente estava a mil e meu corpo parecia
que recebeu uma alta dosagem de adrenalina, sempre que fechava meus
olhos, via a imagem do meu filho sendo esfaqueado. Eu achei que iria
perdê-lo e essa dor estava no meu peito. Agora conseguia entender um
pouco mais minha sogra por ter ficado com raiva de mim quando o Dante
pulou do penhasco.
É uma dor terrível que só quem é mãe sabe.
Quando meus soluços se acalmaram, saí do banho, me sequei, vesti
algo leve e me deitei na cama macia perdida em meus pensamentos.
Meu Deus, como minha mãe pôde deixar que eu passasse por tudo
que passei?

Como ela pôde não se compadecer da minha dor?


Cheguei a pensar que algum dia conseguiria entendê-la, mas hoje
tinha três filhos, era a mãe que ela nunca foi e não a entendia de forma
alguma.
Há dias perguntava aos céus como podia haver pessoas tão cruéis
assim...
Como podia uma mãe não amar seu próprio filho?
Eu não conseguia encontrar respostas por mais que tentasse e
acreditava que não havia explicação para os atos ruins ou para a falta de
amor.
Tentei me acalmar para poder ao menos me levantar da cama, com
muito esforço me coloquei em pé e peguei o celular para ver se Dante
mandou alguma notícia sobre nosso filho, mas não havia nada. Respirei
fundo, pois estava ansiosa para receber notícias, mas se até agora ele não
mandou nada era porque estava tudo bem.

Saí do quarto me arrastando e desci a escada tão devagar quanto uma


tartaruga.
Minha nossa, me sinto péssima!
Quando estava no último degrau quase me aplaudi.

Assim que entrei na cozinha vi minha sogra e a irmã do Dante


conversando, assim que sentiram minha presença pararam de falar e me
olharam com compaixão, o que me deu ainda mais vontade de chorar. Segui
até elas, peguei um copo para beber água e elas não falaram nada. Não
sabia o que dizer sem chorar, creio eu que elas também temiam dizer algo
que me fizesse chorar.
— Anny está mais calma? — perguntou Sara.
— Estou sim — respondi, olhando para ela, sorrindo de leve. — Foi
um grande susto, mas ele logo estará em casa novamente.
— Coração de mãe nunca se encontra preparado para essas coisas.
Ele é igual ao Dante em relação às pessoas, ele só é mais quieto e na dele.
Nicholas quer ajudar a todos igual ao pai, e isto significa que ele será um
excelente homem no futuro, a criação que vocês dão a eles é ótima. Você
está de parabéns — disse minha sogra sorrindo.
Todos duvidaram que eu seria uma boa mãe, mas como tia Ana me
disse uma vez, calei a boca de todos e ainda iria calar muitas bocas. Não
tive uma boa base, porém tinha dentro de mim a vontade de ser melhor a
cada dia e não só pelos meus filhos ou por Dante, mas por mim mesma...

Anny Rizzi Boltoni.


Tive tudo para ser uma péssima mãe e pessoa, mas lutei e nadei
contra a correnteza que havia dentro de mim para ser quem era hoje.
Evoluir era mais do que casar e ter filhos...
Era crescer como pessoa e me tornar cada dia alguém melhor.

Enfrentar um leão por dia não era fácil, assim como era difícil pisar
na cabeça da serpente sem ser picado. A vida era cheia de temporais que se
formavam do nada, mas cabia a cada um lidar com seus dias de chuva.
— Dante e eu trabalhamos para que eles sejam boas pessoas, tanto
agora quanto no futuro — disse sorrindo.
Elas não falaram mais nada e saí da cozinha indo para a parte externa
da casa, pois precisava de ar fresco, além de pensar um pouco na vida.
Fiquei um bom tempo sentada no balanço olhando para o céu até que
senti a presença de alguém ao meu lado, virei-me e vi Eduardo.
— Como você está?

— Achei que iria morrer ao vê-lo sangrando daquela forma — falei e


comecei a chorar. — Nunca pensei que sentiria uma dor dessa... Eduardo
dói tanto. Eu achei que perderia uma parte da minha alma e se ele... — Não
terminei a frase chorando compulsivamente.
— Eu sei que dói... Todos os dias sinto esta dor... Todos os dias
carrego a culpa pela morte do meu filho, da minha esposa e do nosso irmão,
Pietro... Todos os dias dói e sinto que cada dia estou morrendo um pouco
mais — disse baixo, alisando meu cabelo. — Você não sabe o que eu faria
para ter ao menos um tempo a mais com o meu filho... Eu queria ao menos
ter me despedido deles... Eu perdi tudo, inclusive eu, Anny. — Ele soltou
uma gargalhada triste. — Ansiei a morte por tanto tempo e às vezes ainda a
quero para mim, mas por alguma razão me mantenho aqui nesta complicada
terra. Há um sentimento de solidão dentro de mim que não sai por nada
nesse mundo. Sabe, minha caçulinha, a vida é uma incógnita.
— Ela te fez sofrer muito, né?
— Optei por fugir ao invés de lutar... Deixei vocês, meus irmãos, para
trás e fugi. Era para ter ficado e lutado, mas fui tão covarde que perdi mais
do que poderia imaginar. Duas vidas foram tiradas por minha causa e ainda
tem o Pietro que foi em seguida... Anny, eu poderia ter arranjado um jeito,
mas agora é tarde para pensar nas possibilidades.
— Poderia desde o começo ter contado tudo para o Dante e ter pedido
ajuda a qualquer pessoa, mas todos tivemos medo... Não fomos covardes,
fomos vítimas dessa crueldade sem cabimento. — Olhei para ele e sorri
entre lágrimas. — A vida nos maltratou muito, mas ainda estamos aqui em
sã consciência — disse, pegando sua mão. — Eu te amo, Eduardo.
Eduardo se abaixou, me abraçou e em silêncio choramos. Após um
tempo, ele se afastou e beijou minha testa.

— André está internado em uma clínica psiquiátrica, Dante


concordou e assinou os termos — contou e senti um choque passar pelo
meu corpo. — Lá ele será bem tratado e cuidado pelo que entendi, Dante
fez questão. Seu marido está colocando seus laços familiares acima das
feridas dele. Só um tolo para não ver que Dante se encontra lutando uma
grande batalha interna e afirmo que ele está sofrendo. Você precisa tomar
um posicionamento em relação a certas coisas, não é justo ele ser
bombardeado sozinho. Anny, seu marido está à beira do penhasco e uma
brisa forte pode derrubá-lo. Esta é a hora de você ser a rocha para que ele
possa se levantar.
Suas palavras foram como uma facada no meu coração.
É claro que percebi que Dante estava sofrendo, mas ignorei os sinais
pelo simples fato dele ser forte e resiliente, mas via o grande erro que estava
cometendo.
Dante sempre ficava em pé por nós e tomava minhas dores...
Ele era meu escudo, mas acho que estava na hora de me tornar o
escudo dele.
Eduardo ao ver que não falaria mais nada, se levantou e foi embora.
Peguei meu telefone, discando o número do Dante que atendeu no
segundo toque.
— Oi, meu amor.
— Oi, como ele está?
— Dormindo profundamente por causa dos antibióticos.

— Dante, você está bem? — perguntei em um fio de voz.


Ele ficou em silêncio por um tempo, o que fez com que meu coração
batesse mais forte. Sentia medo do que ele ia responder e de não poder
aguentar os fardos que ele carregava ou dele não conseguir se abrir comigo.
— O carrossel nunca para de girar... A vida não para em um só ciclo...
O dia vira noite e a noite vira dia — disse com a voz rouca que tanto
amava. — Dê seu coração a rosa e ela te dará o seu, compartilhe sua
esperança com alguém que ela lhe dará um sorriso sincero... A vida não é
tão fácil quanto pensamos, nada é tão fácil quanto desejamos, há parâmetros
que nos distingue do preto no branco... Tudo tem seu equilíbrio e o que não
está equilibrado... Equilibramos. Veja bem, não estou bem, mas está tudo
bem. É normal ter dias ruins, aliás, não é preciso o sol se pôr para à noite
chegar? Entenda que estou em uma fase crucial para mim, mas não é nada
que não possa aguentar. Fui eu que declarei guerra e serei eu a assumir as
consequências. Nem tudo é sobre estar bem ou não, às vezes é sobre poder
descansar, então, pode descansar meu amor, eu vou cuidar de tudo — falou
com a voz regada de carinho.
— Deveria te dar um soco, Dante Ettore Boltoni, por ser tão fofo e
maravilhoso.
— Ah, meu amor, o único que vai socar algo serei eu... Socarei meu
pau dentro de você com força.
Sua voz rouca mandou um sinal direto para o meio das minhas pernas
e engoli em seco a vontade de me tocar.
— Quando você for se deitar massageie seu clitóris com leveza e
enfie dois dedos dentro dessa boceta que é minha. Imagine minha boca te
chupando e que ao invés dos seus dedos seja meu pau sedento por você.
Quero que goze chamando meu nome e não é um pedido é uma ordem, meu
amor.
Puta que pariu!

Estava toda arrepiada com o timbre vocal rouco e sexy do meu


marido.
— Eu quero você aqui.
— Você me terá, mas não hoje. Me aguarde que chegarei sedento e
faminto por você!
Acho que gozei com isso.
Dante tinha uma ferocidade e sabia que às vezes ele se controlava por
minha causa, mas agora ele simplesmente me tomou para si, me
enlouqueceu e eu não era louca para reclamar.
— Agora coma alguma coisa e descanse... Nosso filho está bem, não
se preocupe tanto comigo... Ficarei bem... Eu te amo.

— Eu também te amo. — Assim que disse isso ele desligou.


Dante não era um ser humano, era um anjo!
Diziam que havia um grande buraco negro no céu que sugava vidas.
Diziam que existiam máquinas do tempo. Diziam que tubarões eram
criaturas perigosas e matavam centenas de pessoas...

Diziam que o dinheiro comprava tudo...


Só não diziam que o maior buraco que existia na minha concepção se
encontrava dentro do ser humano, aquele vazio escuro que muitos possuíam
dentro de si. Na minha teoria não existia máquina do tempo e sim a
evolução do tempo. Para mim as máquinas eram as pessoas que se perdiam
em seus próprios tempos ignorando a necessidade do próximo, de amar uns
aos outros e de ter fé em si mesmo ou no outro. Não via tubarões como
grandes predadores, melhor dizendo como grandes assassinos, os
verdadeiros assassinos e monstros eram os seres humanos, esses sim eram o
veneno do planeta, o câncer que matava praticamente tudo que tocava e era
destes predadores que tinha mais medo, infelizmente. Afirmava que o
dinheiro não comprava tudo, pois não comprava valores que eram passados
dos mais humildes aos exaltados, o que queria dizer que não podia se
comprar amor, não o verdadeiro e puro amor, assim como não se comprava
a sinceridade ou a benevolência. Era isso que eu queria que meus filhos
compreendessem no futuro, não importava que eu fosse o cara mais rico do
mundo ou o quinto, eles tinham que ter humildade e entender que eles além
se ser as armas também eram aqueles que puxavam o gatilho. Por mais que
muitos dissessem que era escolha nossa apertar ou não o gatilho contra
alguém, decisões difíceis eram tomadas em nossas vidas. Cabia a cada um
de nós saber o peso dessas decisões.
Respirei fundo ao ver Nicholas olhando atentamente pela janela do
carro, o caminho de volta para a casa dos meus pais foi feito em silêncio.
Nicholas perdido em si e eu em mim. Ficamos dois dias no hospital, o que
não era nada bom e não permiti visitas além da Anny, sim, fui o paizão
urso, tinha minhas razões desconhecidas para muitos, mas lógicas para
mim.

Hoje no Rio uma garoazinha caía do céu para muitos lavar a alma e
para outros fazer a máscara cair, mas bem, esse era o meu ponto de vista.
Nicholas assim como eu, era centrado e na sua, no tempo em que
ficamos no hospital, ele passou mais tempo lendo do que falando e não que
eu fosse reclamar, mas ele não era uma criança de muita interação ou de
gostar de fazer brincadeiras. Como a Anny dizia, nosso filho era um
mistério peculiar que um dia teríamos de descobrir, mas não agora. Sentia
que devia ensiná-lo tudo que sabia, e fazer com que ele se tornasse alguém
melhor do que eu, mas sabia que não podia mudar sua personalidade, cada
um construía sua própria história e ele estava construindo a dele da mesma
forma que eu estava escrevendo a minha. Nem sempre nossas pegadas eram
apagadas, algumas ficavam e marcavam todos aqueles que por ela passava,
quando eu morresse queria ao menos deixar nesta terra a verdadeira
herança...
Meus filhos. Queria que eles fossem pessoas benéficas. Oh, meu
Deus, por qual motivo meu coração se apertava sempre que pensava no
futuro deles? Não podia surtar agora, ao menos não agora!
Respirei aliviado quando o carro parou diante da casa dos meus pais,
saí e ajudei meu menino sair. Eu já esperava uma festa, mas creio eu que ele
não. Subi os degraus com ele, tomando cuidado para que ele não caísse ou
se machucasse, e ele me olhava vez ou outra como se fosse louco.

Será que esta criança não vê que só estou tentando ajudá-lo?


Assim que abri a porta, gritos foram ouvidos e um monte de confete
caiu sobre nós.
— Nickizinho do Pedrão ouça com muita atenção, esta é a sua festa
cheia de emoção. Você não pode dançar, mas dançamos por você!
Entãoooooo, ohohoh é a festa do Nickizinho cheio de amor, batam palmas,
dão uma rodadinha, levantem as mãozinhas e gritem, BOLTONIZINHO
HERÓI DA NAÇÃO!

Todos aplaudiram a música ridícula do Pedro, e meu filho soltou uma


gargalhada que aqueceu o meu coração.
Pietro e Bruna correram até o irmão, abraçando-o com força, e me
orgulhava desta união. Puta que pariu, não é que este final rimou!
Vi todos batendo palmas, enquanto Jady e Melanie dançavam junto
com as crianças, Marco estava no canto com o Henry em seus braços e a
cabeleira ruiva do menino era idêntica à do pai, assim como a do James,
mas com toda certeza James era cópia fiel do Marco na aparência. Luther se
encontrava agitado no chão batendo palminhas, ele tinha a animação do
Pedro e com toda certeza era um Liard legítimo, já a Leena era calma e
tranquila nem parecia ser filha do demônio do Pedro, me perdoe tia Perla
por chamar seu filho assim.
Anny veio até mim me abraçando, na mesma hora, devolvi o abraço e
cheirei seu pescoço deixando um beijo ali. Eu amava o cheiro dela e
adorava tê-la em meus braços, uns dos meus maiores prazeres. Eu a amava
tanto que podia jurar que até doía.

— Senhor Boltoni, senti a sua falta — disse em um tom sexy que


deixou meu pau em alerta.
Péssima hora para ficar de pau duro!
— Hoje vou dormir agarradinha com você — avisou, passando a mão
por meus bíceps.

Abri um sorriso, mordendo o nódulo da sua orelha e lambendo a


pontinha.
— Quem disse que iremos dormir? — perguntei baixinho.
Anny me olhou, sorriu safada e escondeu o rosto no meu peito.

Sorri, voltando minha atenção para as crianças na esperança de que o


volume em minha calça diminuísse e graças a Deus funcionou.
Ficamos à tarde toda com as crianças e a noite na hora de dormir os
três acabaram pedindo para dormir conosco, não negamos este pedido e até
mesmo podia jurar que dormi antes das crianças.
Acordei sentindo um peso leve sobre meu corpo e ao abrir meus olhos
dei de cara com a Bruna deitada sobre mim. Ao meu lado estava Anny, na
ponta Pietro e no outro lado Nicholas. Olhei o relógio e ainda eram cinco da
manhã.
Cedo demais para qualquer coisa...
Não iria conseguir voltar a dormir, por isso tirei Bruna com cuidado
de cima de mim e saí da cama. Andei até a porta do quarto tendo todo o
cuidado do mundo para não acordar ninguém, desci a escada e fui para o
lado de fora da casa. Assim que abri a porta o vento frio do início da manhã
bateu em meu rosto, mas o que me surpreendeu foi ver Marco e Pedro
sentados na grama do jardim da minha mãe, pelo que parecia não fui o
único a perder o sono.
Caminhei até eles e me sentei na grama verde mais bem tratada que
meu cabelo se bobeasse.
— Só está faltando o Carlos, mas ele não pôde vir e nem a doida da
Valentina — disse Pedro assim que me sentei. — Sua mini cópia tem um
pouco do seu gênio, mas tome cuidado com isso, Dante. Ele possui um
olhar revoltado e isto é motivo para você e a Anny se preocupar um dia.
Respirei fundo e não falei nada porque concordava com ele.
— Crianças tendem a mudar conforme vão crescendo, eles
amadurecem e entendem coisas que quando jovem são incapazes de aceitar.
A percepção das coisas muda, aliás, todos nós estamos sujeitos a mudanças,
sendo elas boas ou más... Não há motivo para cobrarmos amadurecimento
dele, ele é só uma criança e não é justo o julgarem por ter compaixão ao
próximo.
Continuei observando o céu, por agora não tinha o que responder,
pois ele sabia que concordava com tudo que foi dito. A vida era um navio
em alto-mar, nunca sabíamos o que podia acontecer, onde hora vinha ondas
gigantescas e hora a calmaria das águas. A vida era assim e bem, ainda
havia o meio-termo, mas este raramente víamos e por isto dizia sempre para
mim que estava tudo bem, mesmo não estando. Dias ruins também
chegavam para quem merecia ter um dia bom. Estava aprendendo a não me
cobrar e me julgar tanto, escolhi ser eu, optei por lutar minhas guerras e
cabia a mim suportar o fardo.
— Acho que não se pode saber o futuro... Olha bem para nós, Marco
está casado e com quatro filhos, em qual sonho futuro previmos isto? —
disse soltando uma gargalhada. — Eu me casei com uma jovem terrorista e
tenho dois filhos, Dante construiu tudo que sempre sonhou... A vida é cheia
de curvas e embaraços, mas dane-se estamos vivos! Estamos vivendo e
aprendendo... Nada neste caralho é perfeito, e é isso que a torna mais bela
na minha linda constatação... A vida é mais do que certo ou errado, é mais
do que preto ou branco... Ela tem cores escuras, claras e quentes. A vida é o
que somos.
Ouvir as palavras do Pedro me trouxeram conforto e mais esperança.
— Sou o único que teve a cama invadida por toquinhos de gente? —
perguntei, passando a mão por meu cabelo.
— Não, na minha tem quatro e mais uma mulher espaçosa para
caralho! — Bufou Marco.
— Na minha tem dois e mais os chutes que levei na costela, Luther
roda na cama achando que é um lutador de MMA — disse Pedro, e caímos
na gargalhada. — É sério, negrinho invocado da porra!
Até Marco soltou algumas gargalhadas e ficamos ali até todos
acordarem.
Olhei para minha esposa tentando entender o que ela dizia, mas não
entendia nem se quisesse. Olhei dentro dos seus olhos castanhos e me
perguntei, como um olhar tão angelical podia me falar algo deste nível.
Olhei à minha volta e vi que Marco e Pedro estavam com a mesma
expressão de surpresa que eu.
— Calma, vamos devagar nesta porra — disse Pedro olhando para
Jady. — Você disse que quer ir a um baile? Baile? Jovem terrorista, você
está doida nesta merda? Você vai bailar na nossa cama, eu por cima e você
por baixo, sentindo o batuque do martelo que entra e sai.

Limite, Pedro precisa de limite.


— Se você não quiser ir eu vou! — disse Jady com cara de raiva. —
As meninas e eu iremos de boa.
Marco me olhou, fazendo um sinal de afirmação com a cabeça.
Respirei fundo e tomei à frente desta confusão.

— Não vamos a baile de favela, mas tem um ponto aqui no Rio que
tem uma festa de rua, podemos ir lá... É isso ou nada, senhoras — disse, e
Anny bufou, enquanto Melanie e Jady abriram um sorriso.
Elas subiram para se arrumar e cocei minha cabeça enquanto o Pedro
se jogava no sofá bege da minha mãe, aliás, graças a Deus meus pais foram
com minha irmã a uma festinha de criança e levaram a turma toda. Minha
única preocupação era se meus pais conseguiriam dar conta de nove
crianças.
Uma hora depois estávamos todos na maravilhosa festa, as meninas já
chegaram dançando um funk qualquer que tocava nas grandes caixas de
som. Marco bufou, Pedro comprou uma cerveja, e eu fiquei na minha, só
observando todos e tudo ao meu redor. Anny dançava com as meninas
sorrindo, ela estava feliz por ter este momento com as garotas, mas não era
fã de lugares assim, preferia um pagode. Pedro começou a dançar e optei
por também me mexer, pois não queria ficar parado feito uma estátua.
Marco demorou, mas enfim começou a se mexer também.
Curtimos algumas músicas e de forma alguma ousamos tirar os olhos
das nossas esposas. Caminhei em busca de água para mim, mas no meio do
caminho fui parado pela mão de uma mulher alta e de cabelo escuro que
conhecia bem. Quando pensei em desviar, ela se jogou em mim quase
beijando minha boca, desviei e antes que pudesse fazer algo, ela voou
longe.

— Tira a mão do meu marido, sua vadia!


Anny voou para cima da mulher lhe dando tapas estalados.
Puta que pariu, minha mulher virou uma leoa!
Não acredito que Dante concordou em vir para esta festa, que era
quase um baile funk. Ettore não gostava deste tipo de ambiente e muito
menos eu, mas era o sonho da Melzinha conhecer algo assim no Rio, então,
optamos por realizar o sonho dela em um lugar relativamente mais seguro.
A Jady requebrava até o chão seguindo o ritmo da grande caixa de som, e
seguia mais ou menos seu movimento. Melanie era um caso à parte, ela
estava um espetáculo e afirmava que ela nasceu para o Rio de Janeiro, já eu
nasci para habitar longe dele.
Olhei para trás, os rapazes estavam na deles se remexendo um pouco
e observei o exato momento em que o Dante foi para não sabia onde.
Puta merda, esse homem era lindo demais!
Até os homens olhavam para ele. Meu marido era perfeito, lindo e
maravilhoso, e melhor ainda era todo meu!

Meus olhos mudaram do amor para o ódio!


Quando uma menina surgiu do inferno abraçando o Dante, mas eu
reconhecia essa baranga do inferno. Jamais me esqueceria dela. Jenifer a
enviada do capeta para aterrorizar minha vida.
Eu não via nada à minha frente, voei até a safada, a jogando no chão,
bem longe do MEU Dante. Antes que alguém me segurasse, subi em cima
dela, peguei seu cabelo e fiz com que ela olhasse em meus olhos.

A desgraçada sorriu para mim como se o que estava acontecendo


fosse exatamente algo que desejasse.
— Nossa a piradinha é violenta — disse sorrindo. — Anny, sabia que
seu marido é ótimo de cama? — perguntou e riu. — Ele me preencheu
muito bem — provocou, passando a língua pelos lábios.
Respirei fundo, peguei o cabelo dela com força, puxando sua cabeça
mais para cima. Abaixei-me um pouco e sussurrei no seu ouvido:

— Deixa eu te falar uma coisa, sua vagabunda. Ele é meu marido, pai
dos meus filhos, meu companheiro, meu amante e você é só uma piranha no
cio que não pode ver um homem bonito. — Apertei seu pescoço e por fim,
dei um soco na sua cara. Deixei a vagabunda no chão e me levantei, não
sem antes cuspir em sua cara. — Fica no chão que é o seu lugar!
Virei-me e Dante estava me olhando com uma expressão surpresa,
Mel estava com a mão na boca, Jady abraçada com Pedro e Marco me
avaliava calmamente. Desviei meus olhos deles e saí toda poderosa rumo à
porta de saída. Andei a passos rápidos, não ligava se meus saltos me
machucavam e não olhei para trás.
Olhei a minha vida praticamente toda para trás, mas não dava mais.
Cansei de ser a vítima ou protegida. Cansei de sofrer e simplesmente lutar
calada! Passei por um julgamento crucial e agora era a minha vez de levar
os verdadeiros culpados ao tribunal.
Não queria carregar mágoas, mas não podia simplesmente deixar tudo
passar batido. Dante estava se ferindo e sangrando mais uma vez por minha
causa, e ainda havia essas mulheres do inferno dando em cima do que era
meu.
Merda!

Eu tinha que proteger meu marido, deixar bem claro que ele era meu,
que éramos um par, ou melhor, éramos UM SÓ!
A vida era uma montanha-russa repleta de emoções, havia dias que
tudo que você mais ansiava era sair dela, pedir ao maquinário que parasse e
me deixasse pular fora do poderoso círculo que ora subia, ora descia e hora
parava no topo te deixando de cabeça para baixo. O problema era que essa
montanha-russa só parava na hora da morte, e até este dia chegar era nossa
obrigação viver o máximo que pudéssemos e da melhor forma possível.
Às vezes a vida te dava uma, duas ou até mais bofetadas, mas entendi
que isto fazia com que ficássemos mais fortes e resistentes às dificuldades.
Demorei anos para entender o quão forte era e quão maravilhoso era se
amar. Estava tudo bem eu não estar bem, pois haveria dias em que estaria
de cama devido à minha doença e okay não me envergonhava ter tal
doença, era consequência de tudo que vivi, superei e curei a ferida, mas a
cicatriz sempre iria existir. Peguei um táxi já sabendo para onde devia ir.

Caminhei pela beira do lago, sentindo a brisa leve da noite, há mais


de dez anos tentei me matar aqui, mas Deus teve compaixão por mim e me
deu mais uma chance. Não foi fácil, fui testada e provada de todas as
formas, mas eu venci. É claro que tive um anjo da guarda a meu favor,
Dante chegou e me resgatou de uma forma geral. Hoje via que ele me
estendeu a mão para me levantar, mas foi uma escolha minha me reerguer.
Ele me pegou no colo e me carregou mesmo ferido, mas foi uma escolha
minha recomeçar e hoje me dava esses créditos.
Aproximei-me mais do lago tirando meus sapatos. Meu Deus do céu,
voei em cima da vagabunda com este salto! Comecei a rir me lembrando da
situação. Sempre quis bater nela e hoje, anos depois, consegui e não me
arrependia.

Joguei os saltos para longe, caminhando até as águas agridoces do


lago. A água fria fez com que meu corpo estremecesse e sorri com a
sensação de nostalgia que cresceu dentro de mim, era como se estivesse
vencendo uma guerra e realmente estava...
Estava superando as minhas feridas e lutando com garra!
Soltei uma gargalhada pulando na água igual a uma criança espoleta,
abaixei-me e pulei, jogando água para cima.
— Fico contente em saber que está feliz! — disse uma alma
assombrada, fazendo-me cair de bunda nas águas rasas.
— PEDRO! — gritei espantada com sua presença repentina.
— Sei que esperava o Dante, mas foi preciso o Marco e três
seguranças para segurar o homem — disse sorrindo.
O Pedro estava sempre sorrindo o que era de se invejar.
— Ele está bem? — perguntei, levantando-me.
— Tudo fica bem quando o rio segue seu rumo... — disse piscando.
— Ele está bem, mas precisa ficar sozinho um pouco e Annyzinha eu não
sabia que você era uma grande lutadora de MMA. Fiquei na torcida e quase
gritei, Anny é demais, o soco dela é dinamite! — cantou, fazendo a dança
típica das líderes de torcida.
Ri tanto que minha barriga chegou a doer, realmente o Pedro era o
melhor.

— Não pode fazer xixi na calça, Annyzinha — falou, gargalhando


ainda mais. — O bom é que você já está molhada, aí ninguém vai perceber
que é xixi.
Coloquei a mão sobre a minha barriga e gargalhei ainda mais. Minha
barriga doía, assim como as minhas bochechas, depois de um tempo,
respirei fundo e me acalmei um pouco.
— Por que você veio atrás de mim? — questionei, analisando-o.
— Eu não sou o Marco para lutar contra o Dante, então optei por vir
até você — respondeu com as mãos no bolso.
— Por quê?
— Porque nem todos queremos ficar realmente sozinhos. Não vim até
você porque achei que iria se matar nem nada do tipo, só vim lhe fazer
companhia — disse sorrindo. — Admiro sua coragem.
Olhei para o Pedro e percebi que ele nunca me rotulou como fraca,
ele sempre me fez rir, aliás, o Pedro fazia com que todos sorrissem um
pouco. Ele era uma pessoa leve, mas assim como todos, ele possuía suas
cicatrizes. Eu nunca o vi ficar abatido em situações difíceis, ele sempre
sorria para vida e pessoas como ele era uma raridade neste mundo
insensato.
— Obrigada por vir — agradeci, aproximando-me dele.
— Uma mulher grávida não deve entrar em guerra — disse, e dei dois
pulos para trás. — Jady não pode mais engravidar e o Marco já se castrou,
então o teste positivo no banheiro só pode ser você! — falou, e me calei.

Descobri hoje de manhã e estava esperando a melhor hora de dizer


isto a Dante e até mesmo preparar uma surpresa. Fiquei surpresa e nervosa,
por isto acabei me esquecendo do teste.
— Não conte ao Dante — pedi.
— Este é assunto de vocês e não meu... Meus parabéns! — exclamou
sorrindo e me abraçando. — Mas não entre mais em táxis quando se tem
motorista particular e um marido mais forte que o The Rock.

Devolvi o abraço grata por ele ser uma pessoa maravilhosa. Mais um
filho a caminho. Mais um milagre se encontrava dentro de mim...
Mais uma razão para que lutasse e vencesse qualquer atrocidade.

Cheguei à casa dos pais do Dante com o dia amanhecendo e Pedro


ficou a noite toda comigo na casa do lago, contando suas histórias. Ele me
fez companhia como um verdadeiro amigo.
Assim que abri a porta da frente, entrei e percebi que todos estavam
dormindo, ainda bem. Caminhei até a escada, subindo os degraus devagar,
tomando todo o cuidado do mundo. Os saltos em minha mão davam a
entender que tive uma noite repleta de emoção e esta teoria não estava
errada, pois minha noite foi repleta de emoção e reflexão sobre quais
caminhos devia tomar na minha vida maravilhosa. Respirei fundo antes de
abrir a porta do quarto em que estávamos instalados, abri bem
devagarzinho, mas parei surpresa ao apenas ver as crianças deitadas.
Segui até o banheiro e nada do Dante, fui até a sacada e nada do meu
marido.

Onde será que ele se meteu? Um desespero involuntário começou a


invadir meu peito. Onde Dante estava? Respirei fundo tentando me acalmar
enquanto contava até vinte e cinco, abri meus olhos e resolvi tomar um
banho morno, pois eu merecia. Confiava no meu marido e se ele não estava
aqui era porque algo aconteceu. Após um banho demorado, me sentia mais
leve, vesti uma roupa confortável e aguardei sentada em uma poltrona de
canto, as crianças acordarem. Logo mais seriam quatro crianças ou mais, e
não sabia se corria de medo ou se ficava e agradecia.
Preferia ficar e agradecer.
— BOM DIA, MAMÃE! — gritou Bruna, tirando-me dos meus
pensamentos.

— Bom dia, princesa da mamãe, dormiu bem? — perguntei, sorrindo


para ela que mesmo gritando não acordou os irmãos.
— Dormi muito bem! Brinquei muito ontem e me diverti muito! Foi
tão, mas tão legal! — disse, e caí na gargalhada.
— Isso é maravilhoso! — exclamei e me levantei. — Que tal agora
um banho e escovar os dentes, hein?

Antes que eu pudesse falar mais alguma coisa, ela voou da cama para
o chão e saiu correndo para o banheiro.
— Precisa de ajuda? — indaguei, entrando no banheiro onde ela já
estava tirando o pijama de Frozen.
— Só para lavar meu cabelo, mamãe! — respondeu rindo, sentindo-se
independente.
Ajudei minha princesa a tomar banho e lavei seu cabelo da cor do
meu com delicadeza, ele estava enorme e já passou do prazo de cortar.
— Mamãe quero cortar meu cabelo e doar para crianças com câncer
— disse e meus olhos se encheram d’água. — Papai diz que devemos
ajudar o próximo, eu não posso fazer muito ainda, mas já que tenho muito
cabelo e ele cresce rápido... Vou doar para quem precisa — falou toda feliz,
e precisei engolir em seco para não chorar na frente dela.
Pelo que parecia, a pequena bronca que Dante deu nela serviu, tudo
que ele desejava era que nossos filhos seguissem um caminho bom para
eles mesmos, um caminho íntegro e justo, e que eles jamais abrissem mão
da complacência que devia existir dentro de cada um de nós.

Meia hora depois, desci a escada com as crianças elétricas para uma
manhã. Só havia elas e eu acordados, todos estavam dormindo. Dei café da
manhã para eles que não paravam de matracar sobre a festa de ontem.
Quando meu sogro surgiu a festa piorou, ele me disse que iria sair com as
crianças mais uma vez, e respondi que para mim tudo bem.
Ficamos boa parte da manhã em casa e nada do Dante chegar ou dar
sinal de vida.
Avisei meus sogros que ia sair, me arrumei e pedi para os seguranças
me levarem ao lugar onde minhas feridas começaram.

O caminho foi feito mais rápido do que eu gostaria, passei pelos


portões e pedi para os seguranças ficarem do lado de fora à minha espera. O
caminho de pedra que levava até a porta da frente foi feito com agonia, mas
muita determinação. Peguei as chaves em minha bolsa e antes de abrir a
porta fechei meus olhos me lembrando de quem era hoje. Destranquei e
empurrei a porta devagar, a casa se encontrava cheia de poeira com os
móveis cobertos por um lençol branco e cada passo que dava me lembrava
de algo. Seria tolice minha dizer que aqui só havia lembranças ruins, havia
muito poucas, mas ainda assim, tinha algumas lembranças boas.
Olhei para o sofá e sorri ao me lembrar de uma vez em que minha
mãe e meu padrasto haviam saído e Eduardo, Pietro e eu ficamos assistindo
a desenhos deitados no tapete. Me lembro de que havia uma parte do
desenho que tinha uma dancinha e ficamos iguais doidos tentando imitar,
foi uma cena hilária e mesmo com tanta tristeza dentro desta casa
conseguimos sorrir ao menos uma ou duas vezes.

Olhei para a escada e me lembrei da vez que minha mãe com raiva
empurrou Eduardo escada abaixo e ele quebrou o braço. Subi a escada
seguindo para o meu quarto e a porta se encontrava aberta. Chorei ao olhar
para minha antiga cama e na hora me recordei das múltiplas vezes em que
fui violentada. Eu venci e isto não me feria mais. Fui uma criança
maltratada por quem mais devia me amar, mas estava tudo bem, a vida não
era perfeita e se fosse qual seria a graça. Isto fez com que eu me tornasse a
mulher que era hoje e me orgulhava e muito de quem me tornei, minhas
cicatrizes eram sinais de que eu era mais do que vencedora.
Saí do quarto fechando a porta, desci a escada seguindo até a
garagem, lá encontrei um galão de gasolina e o peguei. Por todo caminho
que fiz, joguei um pouco de gasolina, fui à cozinha e peguei uma caixa de
fósforo velha que devia servir para algo. Subi até meu antigo quarto,
jogando uma boa quantidade de gasolina na cama que um dia foi minha e
onde passei por tantos horrores. Ao descer a escada, joguei o resto de
gasolina e quando estava no último degrau acendi o fósforo jogando-o para
trás. Na hora senti o calor do fogo surgir, apressei meus passos e quando
cheguei à porta da frente acendi outro fósforo jogando novamente para trás.
Abri a porta e saí do lugar que um dia foi meu “lar”.

Ouvi o barulho de vidro estourando e de madeira queimando. Nem


liguei quando olho para trás e vi a casa de horrores sendo queimada assim
como meus demônios.
Em menos de uma semana, estava duas vezes em um hospital, isto era
o meu auge, só que dessa vez o problema se encontrava em mim. Eu não
sabia o que havia de errado com o meu corpo ou até mesmo com a minha
mente, mas eu simplesmente apaguei do nada e acordei no hospital com
Marco ao meu lado. Já fiz tudo que é tipo de exame e até agora nenhum
resultado, ou melhor, ninguém me fala nada. Tinha uma mulher que bateu
na Jennifer em casa, meus filhos e poderia estar com eles, mas estava
deitado em uma cama hospitalar esperando acharem o que havia de errado
comigo.

Respirei fundo tentando me manter calmo, eu sabia que não estava


bem e que tudo e todos possuíam limites, mas não esperava desmaiar. Eu só
queria estar com a minha família e aguardar a Anny me dizer que estava
grávida. Ela era minha esposa, raramente deixava algo passar e sabia
perfeitamente que um novo bebê se aproximava.
Mais um filho, dois ou três, enfim, o importante era vir com saúde.
— Olá, senhor Boltoni — cumprimentou um homem sorrindo ao
entrar no quarto.
Ele era psicólogo e disso não tinha a menor dúvida.
Caminhou até mim sorrindo e apertou minha mão, se sentando na
cadeira que havia ao lado da minha cama. Respirei fundo tentando não ser
grosso ou algo do tipo, às vezes cansamos de tudo e precisamos de um
tempo para nós mesmos...

Estou cansado!
— Senhor Boltoni, me chamo Daniel Fagundes, sou o psicanalista do
hospital, mas também sou formado em psicologia.
— Boa tarde, doutor — cumprimentei.

— Como o senhor se sente?


— Estou cansado, mas acho que uma boa noite de sono ajudará.
— Provavelmente... O senhor trabalha muito ou anda sob muito
estresse?
Parei um pouco para pensar e refleti sobre o que ele me disse. Abaixei
a cabeça, tentando acalmar minha mente e optei por ser sincero comigo e
com ele.
— Estou exausto psicologicamente, eu sabia que uma hora chegaria
ao meu limite e pelo que percebi, cheguei. Venho passando por algumas
coisas ruins, todos nós passamos e está tudo bem... A vida é cheia de
momentos bons e ruins. Creio eu que devido a estar sob muito estresse,
tenha passado mal e é só descansar que tudo ficará bem, aliás, está tudo
bem, não está? Logo ficarei bem, correto? Quando recebo alta?
— O senhor está mascarando o real problema — disse, olhando-me
nos olhos. — O senhor falou por menos de cinco minutos, aliás, foi menos
de dois minutos. Dante te chamarei pelo primeiro nome para ser menos
formal... Percebe que tenta mascarar o seu problema com o discurso de que
“está tudo bem”? O senhor sabe que tem um problema real, mas quer
acreditar que pode lidar com ele de qualquer jeito. Lidar com ele o senhor
pode, o que não pode é achar que é capaz de tapar “o sol com a peneira’’,
como dizem por aí. Seja sincero, Dante, me pergunto o que levou o senhor a
lutar tanto ou melhor o que leva o senhor a lutar tanto contra as batidas a
mais do seu coração. Eu não vim aqui dizer o que você deve fazer, eu vim
apenas dizer que você precisa descansar seu corpo e mente, pois ambos
estão em colapso — explicou e fiquei espantado. — Conversei com os
outros médicos, você está com a pulsação muito acelerada, ansioso, nervoso
e querendo ir além do que seu corpo aguenta, talvez, eu esteja errado, mas,
Dante, me pergunto qual o motivo de me dizer que “está tudo bem”. Me
diga o que está tudo bem?
Parei para analisar sua pergunta.

Engoli em seco algumas vezes.


O que estava bem?
Minha família se encontrava bem, minha mãe e Anny se encontravam
bem, seria pai mais uma vez e Anny estava bem. Minhas empresas estavam
bem, mas eu não me encontrava realmente bem, concordei com ele que
estava tentando tapar o sol com a peneira, quando tentei acreditar que tudo
ficaria bem, mas antes de desejar que tudo ficasse bem eu precisava ficar
bem. Estava abalado, cansado, confuso e triste com toda a situação que se
encontrava à minha volta. Estava exausto há muito tempo e vinha tentando
ignorar meus próprios sinais. Acho que precisava descansar um pouco,
parar e cuidar de mim...

Precisava ter mais complacência por mim mesmo.


— Eu não estou bem... Eu quero ajudar todo mundo, mas não sei
como me ajudar. — Sorri. — Acho que todos precisamos dar tempo ao
tempo e eu cheguei ao meu próprio limite e tempo. Não posso extrapolá-lo
— disse sorrindo amargamente. — Todos dizem que sou forte, mas venho
me sentindo tão fraco, carente de força, de um colo para que eu possa me
deitar e descansar um pouco. Venho dando o meu melhor para que todos
fiquem bem e possamos ter paz, mas estou perdendo minha própria paz pelo
caos que está sendo criado dentro de mim. — Respirei fundo. — Preciso
descansar e descansarei se quero ao menos ver meus filhos se tornarem
melhor do que eu fui um dia...
— Fico contente que tenha entendido que precisa se cuidar mais.
Sorri e aguardei ansioso minha alta.

Cheguei à casa dos meus pais depois das cinco da tarde, ao adentrar a
casa fiquei espantado ao ver todos reunidos na sala, menos os meus pais
que provavelmente deviam ter saído com as crianças mais uma vez. Me
agradava que eles estivessem gostando de passar este tempo junto das
crianças.
— Boa tarde. — Olhei para Anny e sorri. — Oi, meu amor!
Ela sorriu para mim e mandou um beijo.

— Já que todos estão reunidos aqui irei falar algo importante e


gostaria que ninguém me cortasse até que eu terminasse — disse, olhando
para cada um, e Marco fez um sinal de afirmação com a cabeça. — Eu
passei a noite no hospital. — Anny me olhou surpresa, mas não disse nada.
— Ontem à noite minha mente entrou em colapso, devido às altas descargas
de estresse que venho tendo ultimamente, eu já estava me sentindo cansado
psicologicamente antes, mas nestas últimas semanas cheguei ao meu limite
e creio que todos nós quase chegamos. — Anny ergueu a cabeça e me olhou
com determinação. — Eu percebi que não posso mais me permitir chegar ao
extremo e não posso mais ir além do que meu corpo e mente permite ou do
que eu vá merecer. — Respirei fundo e continuei: — Por isso estou me
desligando da corporação e passando meu cargo de CEO para Anny que
junto com o Marco e o Pedro irão reger bem. Ficarei em casa com as
crianças e por nada nesse mundo me chamem. Isso está valendo a partir de
agora. Preciso me curar e ficar bem não só por mim, mas por todos nós. A
vida é um campo regado de flores e minas prestes a explodir, cabe a cada
um de nós saber quando colher as flores e como saber lidar com as
explosões. Vamos dar um passo de cada vez e acredito em cada um aqui.
— Amor, já que falou de incêndio venho lhe dizer que coloquei fogo
na antiga casa da minha mãe... — Anny contou, e pisquei duas vezes antes
de rir.

— Você colocou o quê? — perguntei já me sentindo nervoso.


— Sim, e o Marco já resolveu qualquer burocracia — Anny falou,
mudando de assunto.
— Você está bem? — inquiri, aproximando-me dela.

— Melhor não poderia estar!


Eu não podia lutar todas as suas batalhas e muito menos lidar com
todos seus lados ocultos, eu sempre soube que a guerra interna que ela
travava era algo que só ela poderia lutar.
Ela se livrou dos seus demônios.
Observei Dante deitado na cama de barriga para cima sem camisa,
seus gominhos estavam à mostra assim como toda a sua beleza eminente e
seduzente[12].
Sua cueca boxer preta deixava claro o quão bem-dotado ele era, o que
deixava minha boca cheia de água e meu corpo quente e pronto para a ação.
Eu só estava sofrendo um dilema, se devia ir até ele ou deixá-lo descansar
um pouco.

Nesta guerra entre o prazer da carne e a consciência, notoriamente o


prazer ganhava disparado.
Tirei minha camisola ficando nua, caminhei até a cama e engatinhei
até ficar mais próxima a ele. Sentei-me com minha boceta bem em cima do
seu pênis. O que me surpreendeu foi que ele sorriu ainda com os olhos
fechados e, minha nossa, ele estava extremamente excitado.
Dante Ettore Boltoni, nunca me decepciona.

Joguei meu tronco para frente e beijei seus lábios macios e


suculentos. Sua boca me recebeu com ternura, mas hoje estava em chamas e
desejava brutalidade.
Puxei seu lábio inferior com os dentes e o chupei logo em seguida,
voltando a beijá-lo com fervor. Ele entendeu meu ritmo e o seguiu juntando
mais meu corpo ao seu. Sua mão apertou minha cintura com força e a outra
apertou minha nuca, mantendo nossos lábios ainda mais juntos. O atrito dos
nossos corpos me deixou ainda mais excitada, o que me fez buscar por uma
proximidade maior. Desejava tê-lo sobre mim, melhor dizendo, dentro de
mim. Ele me testou quando desceu beijando meu pescoço com certa
ternura, mas com uma pegada safada que tanto amava. Ele se sentou sem
desconectar nossos corpos, me apertou ainda mais contra seu corpo,
fazendo com que nossos corpos ficassem ainda mais próximos. Quando fui
levar minha mão ao cós da sua cueca, ele parou e sorriu de lado. Ele sabia o
que desejava, mas aparentava estar a fim de brincar de rato e gato comigo.

Dante e seu autocontrole perfeito.


Quando menos esperei, ele nos girou ficando sobre mim. Seus lábios
foram descendo pelo meu pescoço até meu seio esquerdo, onde beijou meu
bico antes de abocanhá-lo, arrancando de mim um gemido alto. Ergui meu
corpo sobre seus lábios, buscando algum tipo de alívio para minha tensa
excitação. Sua mão desceu pela minha barriga até minha virilha, quando
chegou entre meus lábios ficou passando a mão e brincando com minhas
dobras sensíveis. Arfei quando seu dedão apertou com leveza meu botão de
prazer e agarrei seu ombro cravando minha unha bem fundo em sua pele.
Ele massageou com leveza meu botão, colocando um pouco de pressão e
seu toque me acendeu por inteira, parecendo que todo o meu corpo se
encontrava em chamas.
Seu dedo fazia movimentos circulares e senti meu gozo vindo em tão
pouco tempo. Do nada senti seu corpo se afastando do meu, antes de
protestar, meu corpo e meu tornozelo foram puxados, deixando minha
bunda empinada, e ele me deu um tapa forte que me deixou ainda mais
excitada. Dante segurou firme minha cintura, puxando-me ainda mais para
perto dele, o que fez com que sentisse sua ereção bater em minhas costas.
Rebolei minha bunda, deixando claro o que queria, mas ele não fez nada, só
ficou parado. Necessitava tê-lo dentro de mim, mas o homem parecia que
não queria colaborar comigo. Quando pensei em me afastar senti-o guiar
seu grande e grosso membro para o meu canal. Estava chorando de
ansiedade, minha boceta não estava com teia de aranha, mas se encontrava
necessitada dele, como sempre.
Ao mesmo tempo em que ele ia me invadindo com suavidade fazendo
com que eu sentisse toda sua extensão, tocou meu clitóris com mais
brutalidade, o que aumentou meu prazer. Joguei meu corpo contra suas
costas, tentando compreender melhor a combustão em que meu corpo se
encontrava. Soltei um grito e ouvi Dante rir.
— Gozou, meu amor? — perguntou o safado ao pé do meu ouvido,
deixando-me toda arrepiada.
Meu Deus, como seu toque pode me causar tudo isso?
O que havia nesta química tão perfeita que nos unia cada vez mais?
Eu nunca me enjoava do seu corpo contra o meu, em cada rapidinha
ou noite longa. Cada vez que nos encaixamos um no outro, me sentia como
se fosse a primeira vez e extremamente realizada.
Bastava eu vê-lo para sentir sempre as mesmas sensações de euforia,
borboletas voando no meu estômago e coração acelerado. Seu toque sempre
me acendia, fazendo com que eu me sentisse mais mulher, mais sexy e até
mesmo a mais gostosa do mundo.
Acho que amar alguém eternamente é isso.
Minhas paredes escorregadias o recebiam com honra e glória. Quando
ele tocou em um ponto importante dentro de mim, gritei de prazer. Dante
começou um vai e vem rápido que me levou à loucura, voltou a apertar meu
seio com certa força, enquanto beijava meu pescoço e sussurrava safadeza
no meu ouvido. Esta combinação perfeita fez com que eu gozasse
novamente.

— Sabe, eu adoraria tentar fazê-la gozar mais de oito vezes esta noite,
mas tenho que saber como vai sua disposição... Você aguenta, senhora
Boltoni?
— Dante Boltoni me dê tudo.
Ele sorriu e chupou meu pescoço.

— Você terá tudo de mim esta noite, baby.


Gritei quando ele estocou com mais força.
Oh, meu Deus!

Dias depois...
Estava assada de tanto transar, minha libido aumentou intensamente e
acreditava eu que fosse por causa da gravidez. Ainda não contei para o
Dante e muito menos para as crianças, pois sentia que devo esperar mais
um pouco. Optamos por ficar mais um tempo no Brasil, o que estava
fazendo bem às crianças e a mim, estava me fortalecendo neste lugar que
tanto me feriu.
Eu não culpava o Rio de Janeiro pelo que me aconteceu, mas podia
dizer que daqui tinha poucas lembranças boas. Vinha construindo novas e
boas lembranças. A vida não era perfeita, mas eram estas imperfeições que
faziam com que ela fosse maravilhosa.

Hoje deixei Dante em casa com as crianças e seu pai, e vim trabalhar.
Dante precisava descansar, se cuidar e acalmar a mente e coração, era
estranho que ainda não tivéssemos tocado no assunto do seu desmaio na
noite em que dei umas bofetadas na Jenifer piranha. Ele chegou ao limite
naquele dia e teve um colapso nervoso. Fiquei contente em saber que ele
pediu ajuda e se deu um descanso, mas não imaginava que assumiria à
frente de alguns trabalhos seus e acabei tomando, por mais perdida que eu
estivesse iria dar meu melhor sem pensar muito no fracasso.
Entrei em uma das ONGs que tínhamos aqui no Brasil e logo vi uma
mulher vindo em minha direção sorrindo. Os seguranças também me
acompanhavam, mas de longe.
— Boa tarde, senhora Boltoni, sou Esmeralda e irei apresentar o
nosso espaço — disse a mulher negra e alta de cabelo encaracolado.
— Olá, Esmeralda — cumprimentei, apertando sua mão e dando dois
beijinhos em seu rosto, um em cada lado. — Obrigada por me guiar, mas
neste momento desejo participar da reunião que está havendo sobre uma
jovem, ouvi dizer que o caso é grave.
Ela passou a mão por seus cachos antes de me dar um sorriso triste.
— É um caso bem complicado, senhora, mas a levo sim até onde se
encontra a jovem que está sob nossos cuidados.
Ela pegou minha mão e me guiou até uma ala médica.
Passamos por algumas salas amplas com um excelente suporte
médico até parar diante de uma porta azul clara. Esmeralda abriu a porta e
me deparei com uma jovem menina chorando compulsivamente nos braços
de uma mulher que julgava ser sua mãe.

— Meu Deus, mãe, que mundo é este? — perguntou a jovem entre


lágrimas e na hora meu coração se partiu.
Fiquei uma hora diante delas, enquanto me explicavam o que
aconteceu.
A única coisa que sabia era que precisava do advogado Dante
Boltoni, me perdoe, meu amor, mas não poderei deixar você descansar
agora.
Precisamos de justiça!
Saí da sala revoltada da vida, deixando todas espantadas com a minha
saída repentina. Eu sabia pelo que ela passou, pois senti a dor que ela
sentiu.
Eu sabia qual era a sensação de sentir que tudo em você é um lixo...
Essa menina merecia a justiça que eu não tive, Sula merecia receber
tudo que muitas Annys não puderam ter. Ela teria quem lutasse por ela,
porque eu me calei, mas ela resolveu falar e estava gritando. Seu grito não
foi silencioso como o meu e de diversas mulheres.
Pedi ao motorista para que me levasse até a casa dos meus sogros o
mais rápido possível. Graças ao bom Deus, o trânsito se encontrava leve e
sem nada que me impedisse de chegar o mais rápido possível ao meu
destino. Minhas mãos tremiam, mas era de raiva...
Literalmente de raiva.
O motorista mal parou o carro, saí correndo para dentro de casa e abri
a porta já gritando o nome de Dante.

— DANTE! DANTE!
Ouvi seus passos apressados até que ele surgiu no alto da escada com
toda a sua glória, de bermuda e regata com o cabelo bagunçado. Uma visão
sexy e atraente que quase fez com que eu desistisse de lhe falar algo, mas
eu precisava.
— Anny, o que houve, meu amor? — perguntou, descendo a escada
apressado.

— Preciso da sua ajuda. Na verdade, a Sula precisa.


— Quem é essa? — indagou, parando diante de mim elevando sua
mão até meu rosto com carinho.
— Sula é uma menina de dezenove anos que foi estuprada e quer
justiça — respondi com raiva. — Nenhum advogado quis pegar o caso,
porque o cara é filho de um homem poderoso. — Coloquei minha mão
sobre a sua em meu rosto. — Poder versus poder. Dante, vença por esta
menina e por outras diversas que se calam como eu me calei, ajude-as, elas
imploram gritando em alto e bom som que precisam de ajuda e pedem
justiça. Eu não tive esta força, mas Sula tem. Lute por ela como se fosse
lutar por mim — pedi, olhando dentro dos seus olhos escuros.

Ele suspirou e sorriu para mim com certa delicadeza que só ele
possuía.
— Anny mesmo se não me pedisse eu lutaria por esta menina. Eu
lutaria por ela da mesma forma que luto por você — disse, afastando-se. —
Não me implore complacência ou amor... Só me implore quando estiver
dentro de você, eu pegarei este caso e farei dele exemplo nacional e
internacional. Vou me arrumar e conversarei com ela...
Ao falar isto ele beijou minha testa e subiu a escada com pressa, nem
ao menos tive tempo de me desculpar por tirá-lo do seu descanso.
Passei a mão em meu ventre e sorri.
Ele ou ela ainda não nasceu, mas já estava sentindo o impacto que era
ser filho de Dante Boltoni.

Olhei para Sula Fernandes e tudo que via em seus olhos era tristeza.
Este olhar, mãos nervosas que oras se entrelaçavam, oras se afastavam, oras
mexiam em seu cabelo encaracolado e oras puxavam algum cacho para
baixo...
Ela estava nervosa e com medo.
Nesta sala, somente havia ela e eu, e talvez a assustasse um pouco,
mas não tinha certeza se era pelo simples fato de ser um homem.

— Por favor, não fique nervosa não irei te ferir — disse para ela, que
me olhou e arregalou os olhos. — Seus olhos dizem o que você teme falar
— falei, abrindo um sorriso gentil. — Sula, tenho uma esposa que já sofreu
abusos assim como você e eu não pude fazer nada porque não sabia na
época... — Abaixei minha cabeça e dei um sorriso triste. — Minha esposa
naquela época não tinha força para gritar e pedir por justiça como você está
pedindo e exigindo, ela se calou e se sufocou. Quero que seu caso se torne
exemplo mundial e seja exemplo para outras mulheres lutar e merecer mais
do que respeito. Então, lhe peço que me deixe fazer da sua história
pública... Me deixe mostrar ao Brasil e ao mundo que vocês mulheres não
estão só... Deixe que eu faça da sua força a força para as outras que se
calam assim como a minha esposa se calou... Me permita usar a mídia a
nosso favor, dando exemplo para o mundo de que vocês não estão só.
— E se eu perder o caso? — perguntou, olhando dentro dos meus
olhos.

Olhei para ela e sorri abertamente.


Eu poderia dar mais de um motivo a ela para confiar em minhas
palavras, mas iria apenas fazer o que não fiz até agora.
— Sula Fernandes, me chamo Dante Boltoni e não desistirei da sua
causa!
Fiquei olhando para as diversas meninas, mulheres e adolescentes
diante de mim e me perguntei o que devia falar para elas. Olhei para o lado
e vi Dante sentado com Bruna no colo. Passei levemente a mão por meu
ventre, talvez aqui dentro tivesse uma menina e seria mais uma mulher para
no futuro sofrer com o machismo desnecessário que havia no mundo.
Queria ensinar a minha filha a ser forte e não abaixar a cabeça por causa
destes homens malditos. Queria que ela fosse forte, que lutasse por ela, que
nunca abaixasse a cabeça para um homem e que nunca se calasse em
circunstância alguma. Queria dar para todas estas mulheres força e que
estas meninas que estavam aqui fossem mais do que eu sou ou fui.
Queria que a Anny de hoje desse força para elas nunca se permitirem
sofrer o que sofri...

Aproximei-me do microfone e olhei para as câmeras que ali estavam.


Havia jornalistas, youtubers, blogueiros e mais do que imaginei que viriam.
Quando Dante teve a ideia de trazer o caso da Sula ao público percebi que o
meu também tinha que ser exposto, por isso em vez de falar sobre Sula
resolvi falar sobre mim, e não, eu não falei absolutamente nada a Dante.
Decidi não me calar e o que me doía era saber que meus filhos ouviriam
sobre este assunto. Mentalmente torcia para que Dante os tirasse daqui. Para
meu alívio, Dante se levantou com Bruna no colo e se retirou, seguido por
minha sogra que levava Pietro e Nicholas. Entendia que ela preferisse se
retirar, assim meu coração ficava até mais leve e menos preocupado com as
palavras que precisaria usar. Voltei minha atenção para o público diante de
mim.
Respirei fundo e sorri para todos.

— Boa tarde a todos — disse sorrindo. — Meu nome é Anny Rizzi


Boltoni, é uma honra tê-los aqui nesta tarde chuvosa do Rio de Janeiro. —
Sorri mais uma vez. — O motivo que trouxe todos vocês aqui hoje, é um
assunto bastante atual, mas que poucos falam ou preferem não falar. Eu me
cansei de me calar, assim como muitas outras mulheres que passam por isto.
Gritamos muitas vezes em silêncio para não perturbar ninguém com as
nossas dores, muitas vezes escondemos o sangue para que vejam nossas
feridas e há noites que desejamos a morte com medo do que o raiar do dia
poderá nos trazer. — Todos me olharam com certa expectativa. — A cada
um minuto uma mulher é estuprada ou espancada por seu marido e eu, fui
uma dessas mulheres. Na verdade, eu fui uma destas crianças de cada um
minuto... — Vi todos ficarem espantados. — Há mais de vinte anos não
havia ninguém me dizendo o que eu deveria fazer, não havia internet ou
campanhas na televisão... Não havia nada que me dissesse que eu deveria
denunciar. — Respirei fundo antes de continuar. — Eu tinha cinco, seis ou
sete anos? Não sei ao exato, mas me lembro que me doeu tanto que a minha
voz foi perdida. Eu me lembro de que ninguém me ajudou e quem sabia do
ocorrido me disse, “bem-feito”, sabe minha mãe foi quem me condenou...
Ela me deu ao meu padrasto como “oferenda” e sabem o quanto isso me dói
hoje? Dói saber que uma mãe pode dar seu filho como se ele fosse um
NADA! A maioria dos estupros infantis acontecem dentro de casa e muitos
sabem, mas ninguém fala para não desunir a família, mas uma família desta
é unida? Por favor, me diz cadê a união? Pelo amor de Deus, por quanto
tempo mais vocês serão hipócritas e dizer que está tudo bem? Nada se
encontra bem... Poças de lágrimas são formadas a cada segundo, a cada
minuto e nada está bem. — Uma lágrima escorreu dos meus olhos. — Eu
tenho uma filha e luto para que ela nunca passe pelo que eu passei. — Bati
no meu peito. — Observo cada dia como ela está e se seu comportamento
vai mudar ou não. Você, mãe, tia, avó, pai, irmão, estranho observe uma
menina, uma criança, uma adolescente e até mesmo a mulher adulta que
anda ao seu lado no ônibus. Às vezes tudo que se precisa é que alguém te
observe e pergunte, “O que há de errado? Conte para mim, eu te ajudo.” —
Olhei para todos e abri um sorriso triste. — E você que é vítima assim
como eu fui, por favor, não tenha vergonha de pedir ajuda, não tenha medo
de ser ajudada e de forma alguma se cale. Eu me calei por anos e parte deles
foi presa em uma clínica psiquiátrica sendo maltratada e violentada, mas eu
superei.... Eu venci... Não é nada fácil! — disse, colocando a mão em meu
peito. — Na verdade, é extremamente difícil aceitar que você precisa de
ajuda e de se autoajudar e não serão todos que te estenderam a mão — falei
e sorri levemente. — Alguns irão fingir estender a mão, outros irão dizer te
ajudo e no final te condenarão, agora há aqueles que não possuem asas, mas
são anjos. Quando acharem um desses se agarrem a eles igual eu fiz e de
forma alguma os solte... Não tenham medo...
Peguei o microfone, caminhei pelo palco e parei bem na frente de
uma mulher grávida.

— Temos medo de ser mãe de meninas, temos medos por nossas


filhas aos olhos do mundo e temos mais medo ainda quando elas começam
a voar, mas por que temos que temer? Não era para termos medo de ser
mãe, mas tememos sem perceber. Sonhamos com o mundo rosa, lilás e
branco, mas sufocamos a dor e a preocupação de ser mãe de lindas meninas.
— A mulher de olhos verdes e cabelo dourado que se encontrava na
arquibancada diante de mim passou a mão pela barriga enxugando as
lágrimas. — É isso, tememos o mundo porque apenas somos mulheres, mas
porque é tão cruel assim ser mulher? — perguntei, olhando todos à minha
volta e olhei para o máximo de rostos que consegui. — Desde a antiguidade
é assim, mulheres eram queimadas em fogueiras por usarem ervas para
fazer chá e éramos chamadas de “bruxas”. — Fiz aspas com a mão. —
Mulher era dada como objeto de troca pelos seus pais, e ainda somos,
mesmo estando em um novo século, em um novo tempo, mas ainda
seguimos ao pé da letra o passado... A MULHER ainda é considerada uma
escrava do lar. — Muitos me olharam espantada. — “Minha mulher não vai
trabalhar”, “Mulher minha tem que lavar e passar”, “Mulher nasceu para ser
dona de casa”, “Ouça o que te falo e me obedeça senão irei te bater”. —
Meus dedos faziam tantas aspas no ar enquanto falava que até sinto vontade
de cair na gargalhada. — Ai de nós mulheres se ousarmos ir contra estas
vozes, ai de nós! Eu me casei com um homem maravilhoso, que luta mais
por nós mulheres do que eu, um dia darei o microfone para ele falar, mas
hoje sou eu quem falo. — Muitos deram risadas. — Não se queima mais
mulheres na fogueira, não nos chicoteiam em praça pública ou nos vendem
por terras, mas nos estupram nos becos, nos matos, nos espancam dentro de
casa e todos fingem não ouvir os gritos. Nos queimam em tribunais, quando
nos culpam pelo erro do homem.... Os tempos mudaram, mas as atitudes
não. — Abaixei minha cabeça, buscando formas para me recompor e
lágrimas escorriam dos meus olhos. — Por favor, quem quiser fazer
pergunta pode fazer agora.
Vi um monte de mão sendo levantada e então escolhi uma mulher de
casaco verde que usava óculos.
Apontei o dedo para ela que se levantou.

— A senhora disse que passou anos e anos sendo maltratada, mas


pergunto como conseguiu se casar e permitir que alguém volte a te tocar tão
intimamente?
Olhei para ela e sorri ao me lembrar de toda a paciência e carinho que
Dante teve comigo.
— Eu também pensava que não aceitaria nenhum outro toque, mas
sempre o amei incondicionalmente... Eu sempre me vi o amando e sendo
amada por ele, era essa esperança que me manteve em pé por tanto tempo.
Quando ele me tirou da clínica psiquiátrica, achei que ele me deixaria, mas
ele me levou para sua casa, tomou minhas dores e me amou exatamente do
jeito que sou. — Lembranças do meu encontro com Dante após dez anos
separados invadiram minha cabeça, me lembrava de como ele foi delicado e
gentil comigo, havia certa distância dele, a qual achei super coerente, mas
então, ele me pegou em seus braços e nunca mais me soltou. — Ele não é
perfeito, mas são as imperfeições dele que faz com que ele seja perfeito.
Não é fácil permitir que outro alguém te toque depois de tudo que
passamos, mas quando há amor se torna possível o impossível. Encontre
alguém que não te apresse... Encontre alguém que faça com que se sinta
ainda mais MULHER do que já é... Encontre alguém que te ame e queira
crescer ao seu lado e te ajude... Encontre alguém que te apoie e ajude você a
se amar.

Todos me aplaudiram como se eu tivesse dito algo maravilhoso e


perfeito, mas eu só disse o que gostaria de ter ouvido da minha mãe ou de
uma outra pessoa.
Eu me orgulhava de hoje ser eu a falar isto para todas estas mulheres,
falar isto para elas era como olhar no meu próprio espelho e dizer:
“Parabéns Anny, você venceu...

Você venceu não só seu passado, mas também a si mesma.


Hei, garotinha Anny de cinco anos, saiba que você irá chorar muito,
mas a alegria e o sorriso chegarão regado a lágrimas de felicidade, aguente
firme e não desista...”

Assim que cheguei à casa dos meus sogros, subi para o quarto onde
Dante e eu estávamos dormindo, e me deparei ao entrar com Dante sentado
com um notebook em seu colo e vários papéis em volta, com toda certeza
esta posição não era favorável a ele.
— Amor, por que não usa o escritório do seu pai?
Ele me olhou, levantou a cabeça e suspirou ao passar as mãos pelo
rosto.
— Prefiro ficar aqui, estou montando a defesa da Sula... Não será
algo fácil já que lidarei com lobos em pele de cordeiro, mas vencerei —
disse convicto, e sorri para ele. — Então, quando diremos para nossos filhos
que teremos mais um bebê ou dois pela casa? — perguntou do nada,
deixando-me abismada.
— Acho que ainda não é a hora — respondi, e ele sorriu.

O sorriso dele me estremeceu toda.


— Para mim, quanto mais cedo falarmos sobre a novidade, melhor
será para eles e para nós — falou e estalou o pescoço. — Não era meus
planos ter mais filhos agora, mas estou tão, tão feliz que já me vejo sendo
pai de uma menininha novamente.
Sorri para ele e passei as mãos pela minha barriga feliz por ele
também sentir e compartilhar da mesma alegria que a minha.

— Vou marcar uma consulta e veremos tudo antes de falar com os


pequenos — disse, e ele sorriu para mim abertamente.
— Que venha só um, mas o que Deus mandar recebo de braços
abertos.
Fechei meus olhos e senti a mão de Dante em meu ventre.
Não sabia o que viria, se seria menino ou menina, mas se fosse
menina, ela saberia assim como a Bruna que a mãe delas não ia mais se
calar. Agora era eu que declarava guerra e ao mesmo tempo levantava a
bandeira de paz, porque agora havia uma paz dentro de mim que ninguém
jamais iria tirar.
Apresento, eu, Anny Bella, armada e preparada para tudo.
Faltavam dois dias para a audiência da Sula, Dante e ela se reuniam
todos os dias desde então com a presença de psicólogos para ajudá-la,
estávamos correndo contra o tempo para que tudo desse certo e que
pudéssemos vencer mais esta batalha em nossas vidas.

Hoje veríamos como andava o baby dentro de mim e algo me dizia que
seria mais de um, mas seja o que Deus quiser e o que viesse estava pronta
para receber. Hoje ainda iríamos contar para as crianças do novo baby em
nossas vidas e esperava que eles compartilhassem da nossa alegria. Planejei
esta gravidez antes de ter minhas crises e quando ele disse que não era a hora,
entrei em desespero. Não sabia o que fazer ao certo, mas eu já havia deixado
de me prevenir, então o que me restou foi lidar com o milagre que estava por
vir e chegou.
Caminhei pelo corredor da ONG aguardando Dante sair da reunião,
todos que passavam por mim acenavam e sorriam, e eu devolvia feliz da vida.
O meu depoimento para o mundo fez com que outras mulheres também
viessem falar sobre seus traumas, o mundo me ouviu, mas o que esperava era
que com a minha declaração houvesse mais denúncias e as mulheres não se
calassem. Fizesse com que parassem de ter medo e de esconder suas dores
com vergonha ou até mesmo nojo de si mesma. Eu sabia o que era ter cada
um desses pensamentos negativos e por isso dizia...

CHEGA!
Só temos que parar de temer por sermos mulheres...
Parei meus passos diante de um homem alto, olhos verdes e cabelo
castanho-escuro e ele me olhou com certa percepção.
— Boa tarde, posso ajudá-lo com algo? — perguntei sendo simpática.

— Pode me ajudar em muita coisa, na verdade, somente você poderá


me ajudar, senhora Rizzi Boltoni — respondeu com certa frieza, mas não me
intimidei.
— Por favor, em que posso ajudá-lo?

Ele respirou fundo e sorriu baixo.


— Minha filha cometeu suicídio há dois anos após ser estuprada por
colegas da escola, minha esposa e eu nos separamos por causa disso. Eu não
acreditei que minha filha poderia passar por algo assim, mas minha esposa
lutou por nossa filha até que minha Mirela desistiu de lutar por si... Ela tinha
dezesseis anos e a senhora não sabe o tamanho da culpa que carrego dentro de
mim. Eu a julguei e até mesmo a culpei, como pode minha filha passar por
algo assim? — Lágrimas escorriam dos olhos dele. — A senhora consegue
imaginar que minha agora ex-esposa me mandou o vídeo em que a senhora
fala sobre tudo que passou e me pediu para lhe trazer a carta da nossa filha,
por favor, alerte os outros pais que assim como eu, não querem enxergar o
que está acontecendo. Por favor, use a carta da minha Mirela e a da minha
esposa.
Caminhei até ele, segurei sua mão e abri um sorriso sincero.
— Será uma honra para mim ler estas cartas abertamente. Obrigada por
confiar isto a mim. Espero que vocês dois se entendam e caso queira aqui há
psicólogos que podem ajudar vocês... Basta se cadastrar.

— Agradeço, mas tem certas coisas que precisam estar como estão —
disse, pegando dois papéis e me entregou indo embora logo em seguida.
Esse homem não estava bem, mas sentia que não podia ajudá-lo.

Às vezes você precisava deixar ir, igual à pétala que caía da rosa e
voava pelo vento, leve e sem destino, apenas sendo guiada...
Diziam que a vida não era feita de acasos, na minha concepção viver
era o maior dos acasos.

Dante segurava a minha mão enquanto a médica passava o gel frio pela
minha barriga.

Mãe de Deus que agonia...


Que desespero...

Que alegria!
Olhei para o monitor e quase soltei um grito ao perceber que havia dois
bebês.

Meus Deus, são dois!

— Acho que não sabemos fazer apenas um bebê, meu amor — Dante
disse, beijando minha testa com carinho. — É acho que cinco é um número
bom, o que acha? — perguntou enquanto beijava meu rosto, melhor, beijava
onde as teimosas lágrimas insistiam em rolar de alegria.

— Parabéns papai e mamãe, vocês terão dois bebês, mas não idênticos
— disse sorrindo.
Eu só me concentrei no barulho rápido que saía pelo aparelho de som,
me dizendo o quão forte eles eram. Este tum, tum, só me dizia que mais uma
vez daria à luz a dois milagres, o que me fez sorrir e chorar ao mesmo tempo.

— A mamãe é saudável, os bebês estão saudáveis, por isso irei passar


apenas as vitaminas e espero revê-los em breve — disse a doutora sorrindo.
— Bem qualquer coisa basta ligar.
Nós nos despedimos dela e saímos em completo silêncio.

Dante segurou minha mão o percurso todo e não o larguei nem mesmo
quando entramos no carro para voltarmos para casa. Me perguntei o que ele
pretendia e como pretendia contar às crianças sobre os novos irmãozinhos que
vinham por aí. Sentia-me nervosa, sempre foi eles três e do nada vinha mais
dois para somar, era muito até para eu compreender.
Ao descermos em frente à casa dos pais de Dante, senti aquele friozinho
na barriga de nervosismo. Melanie e Marco estavam na cobertura de Dante
com as crianças, assim como Pedro e Jady. Não sabia até quando eles
ficariam no Brasil conosco. Na verdade, estava até estranhando eles estarem
ainda aqui. Me lembro que o sonho da Mel e da Jady era ficar no Rio por
tempo indeterminado. Eram duas doidas que quando juntavam com a doideira
do Pedro ferrava mais ainda. Eram pessoas leves que faziam com que
flutuássemos até no meio do deserto.

Mal abrimos a porta da frente e Dante já gritou pelas crianças que


vieram correndo até nós. Ficamos um tempinho nos abraçando até que Dante
tomou à frente de tudo.
— Crianças, sei que talvez para vocês isto seja impactante, mas saibam
que o papai e a mamãe independente de qualquer coisa continuaram amando
vocês — disse, e as crianças olharam para ele atentamente. — Deus enviou há
alguns anos, não muitos, três anjos para a vida da mamãe e do papai e agora
ele está mais uma vez enviando mais dois anjinhos para a nossa vida. Não é
questão de possuir asas ou não, assim como vocês três se tornaram o nosso
maior motivo de viver, os dois anjinhos na barriga da mamãe também
entraram para o time e vocês como mais velhos devem sempre protegê-los,
assim como eu protejo vocês... Posso contar com vocês para serem esses
super-heróis maravilhosos? — perguntou, enquanto me acabava em lágrimas.

— SIM! — gritaram os três.


— Amar, proteger e sempre cuidar... Nadar e nadar, seguir o rio, mas
saber compreender sua correnteza — disse Nicholas. — Eu vou amá-los!

Dante e eu nos entreolhamos.


Nicholas era bem evoluído e temia esta sua percepção tão aguda da
vida...
Olhei para Sula balançando suas mãos nervosas, tentando se acalmar.
Ela sempre ficava nervosa diante de mim, mesmo tentando ser simpático e
delicado, mas nada fazia com que ela se sentisse mais à vontade à minha
frente. Chegava a me dar raiva, mas no final achava engraçada sua atitude.
— Ouvi falar que a Anny está grávida, meus parabéns! — disse e me
olhou rapidamente antes de virar o rosto para o outro lado.

— Obrigado.
— Meu sonho é ser mãe um dia, mas tenho tanto medo que nem sei
como irei cuidar de um bebê. O mundo é assustador.
— O mundo é realmente assustador, eu também tive medo de ser pai
e fui logo de cara de três... Era meu sonho e realizei, é trabalhoso, cansativo
e tem horas que você se questiona se eles irão realmente para o caminho
que você tanto escolheu para eles, mas você fecha os olhos, se lembra que a
caminhada é deles e só cabe a nós pais saber guiá-los. No final a decisão
será somente deles — disse, e ela me olhou nos olhos. — Não se pode e
nem deve obrigar ninguém a seguir o caminho que você segue, não temos o
livre arbítrio? Eles também devem ter e se caso caírem no meio do caminho
os ajudarei se preciso for, se não, os deixarei se levantarem sozinhos para
entenderem que são fortes e capazes... Um pássaro só aprende a voar
quando arrisca o voo...

— Você... quem é você? — perguntou, olhando-me com curiosidade.


— Você é o que há de melhor neste mundo, não, você só pode ou deve ser
um anjo que Deus deixou aqui na Terra com nós meros seres humanos...
Sua confusão de palavras fez com que eu me divertisse.
Ela não era a primeira a me dizer isto e algo me dizia que não seria a
última, mas não era algo que eu gostasse muito de ouvir. Não era um anjo e
muito menos desejava ser, apenas ainda tinha uma fé abundante no bem e
nas pessoas...

Ainda acreditava que tudo podia ficar bem, bastava ter paciência. Não
era porque eu caí que eu devia me manter no chão ou porque meu coração
foi quebrado que eu devia mantê-lo distante de todos, aliás, quantas vezes o
coração podia ser quebrado e não destruído?
Não era fácil ficar bem quando nada se encontrava bem, eu sabia o
quanto doía perder algo valioso, mas tia Ana dizia: “As entrelinhas têm
mais a dizer do que possamos imaginar”.
Um barco não veleja sozinho...

— Não sou o que há de melhor neste mundo. Na verdade, não sou


nem o que há realmente bom nele e se sou fico contente em ser. A vida não
é um mar de rosas e nem se fosse seria tranquila, aliás, rosas possuem
espinhos e nadar em um mar deste também causará feridas por mais lindo
que seja — disse e sorri. — Eu dou o melhor de mim para mim mesmo, eu
pego tudo que há de bom e absorvo... Tem tantas coisas ruins por aí que se
eu as levasse comigo me tornaria algo com alto poder de destruição. —
Olhei dentro dos seus olhos e suspirei. — Não sou um anjo... Não sou
ninguém especial... Sou apenas alguém que sonha e ainda acredita que
existe muitas coisas boas tanto nas pessoas quanto em cada esquina e para
mim está bem não estar tudo bem. Hoje eu choro, amanhã minhas lágrimas
regam as sementes e depois eu colho... Para haver dias de sol é preciso
antes dançar na chuva. A vida é mais do que sim ou não, é mais do que
errado ou certo... É mais do que julgamentos e eu não sou aquilo que tanto
abomino. Essa era uma das minhas maiores metas de vida, ser o oposto do
que mais me feria neste mundo imenso.
Ela me olhou e enxugou algumas lágrimas que escorriam pelos seus
olhos.

Esta menina se encontrava ferida e buscava acreditar bravamente em


algo ou alguém que a mantivesse em pé, mas acho que ela não entendeu que
ela mesma era seu próprio bote salva-vidas.
— Você é especial.
— Sula, seja você mesma a sua pessoa especial — falei, e ela me
olhou surpresa. — Não espere que alguém se torne seu porto seguro, seja
você sua própria rocha. Confie em si mesma e de forma alguma deixe se
amar — disse simpático. — Agora me deixe lhe informar que sua audiência
foi marcada para daqui uma semana. Por favor, vá armada e de forma
alguma atire. Saiba que serei seu escudo e toda a munição está comigo.
Apenas seja a guerreira que sei que é.

— Essa audiência declara a minha sentença?


— Não, só a deles!
Audiência
Quando o advogado de defesa do senhor Alves se levantou, soube que
neste exato momento começaria a guerra. Amava este momento e sabia que
ele jogaria baixo. Sabia que tentaria culpar minha cliente e eu gostava deste
jogo de poder deles, gostava desta certeza de que ganhariam e só me resta
rir destes sorrisos convencidos...
— Senhor juiz, a senhorita Sula Fernandes diz que meu cliente Diogo
Alves a estuprou, abusou dela, mas me pergunto cadê o abuso sexual se
houve consentimento de ambos os lados — disse, e senti Sula estremecer.
— Ela diz que ele a feriu, mas cadê as feridas? Ela se jogou em cima dele e
praticamente se vende nas redes sociais. Como uma mulher exige respeito
se não se dá respeito?
Tive vontade de atirar uma pedra na cabeça dele.
Jesus, peço perdão por pensar assim e mesmo eu sendo um pecador
não consigo entender como podem julgar o próximo assim. Julgar não, eles
estão condenando não só a Sula, mas diversas mulheres, por serem
mulheres. É quase inacreditável, mas é real.
Essa baixaria iria durar por mais um tempo e esperava que Sula
aguentasse bem.
Durante minutos ele ficou falando, mostrando fotos dela de biquíni de
tudo que era jeito. Fotos que para mim não demostravam nada, eram fotos
dela, fotos pessoais que não levava a nada e não dizia nada sobre o caráter
de ninguém e muito menos dava razão para abusarem de uma mulher.

Diante de um júri tudo era provável de se acontecer.


Diante do juiz e do promotor o que você achava que era certo podia
ser errado para eles e nem sempre a lei era o que gostaríamos que fosse. Às
vezes o certo saía errado e o errado se dava como certo. Eu, um homem da
lei, que tentava seguir tudo corretamente me sentia no meio de uma guerra
entre o certo e o errado, onde a vítima se encontrava com a corda no
pescoço e eu, estava com a faca prestes a ser enfiada no peito. Olhei para o
senhor juiz e me perguntei se ele tinha filhos, ou melhor, se tinha filha?
Se ele tivesse ao menos paixão e amor por ela ou até mesmo por sua
mãe, irmã, cunhada e amiga, entenderia que havia uma falta de respeito
aqui. Ele veria que estavam fazendo um show de horrores.

Levantei-me e olhei para o juiz.


— Vossa excelência — chamei sua atenção para mim. — Qual crime
a minha cliente cometeu para ser tratada desta forma? — perguntei em alto
e bom som. — Quem ela matou? Quem ela feriu? Me diga quem ela
roubou? — inquiri saindo detrás da mesa, caminhando pela sala, me virei
para a promotoria respirando fundo. — Ela só veio aqui atrás de justiça,
mas está sendo injustiçada quando ela é a vítima. Quando foi que uma
audiência passou a ser um castelo de horrores? Porque minha cliente, vítima
de um estupro coletivo por homens poderosos tem que ser tratada como
uma criminosa e até mesmo pior que um — disse e então sorri. — Por
favor, que crime ela cometeu me digam? Ela está implorando respeito como
mulher e eu como homem exijo respeito por ela e por todas as mulheres que
existem. Senhor juiz, por favor, me diga cadê a justiça que vocês e eu
fizemos em seus juramentos. Se fosse a filha de vocês aqui vocês iriam
tratá-la assim? Eu aposto que não... Minha cliente pode postar a foto que ela
quiser, pode usar a roupa que ela quiser que NÃO DÁ MOTIVO PARA
NINGUÉM NESSA TERRA ABUSAR DELA. TOCAR NELA SEM O
SEU CONSENTIMENTO. PORQUE NÃO É NÃO! — gritei. — Ela
estava drogada e abusaram dela como muitos abusam de várias vítimas.
Tentaram intimidá-la, mas ela está lutando não só por ela e sim por todas as
outras que passaram pelo que ela passou — afirmei, olhando para todos à
minha volta, parando meu olhar no juiz. — Vossa Excelência, Meritíssimo
juiz, lhe peço que por favor tenha complacência pela cliente e por todas as
mulheres que sofrem abusos. Olhe seu relógio, Vossa Excelência, que estou
olhando o meu. São 15h17min, neste exato momento uma mulher está
sendo estuprada em um beco, um motel, em casa ou em qualquer lugar. É
uma mulher por minuto, uma criança, uma senhora e uma jovem... Imploro
que me digam qual crime estas mulheres cometeram? Ah, já sei nasceram
mulher em uma sociedade machista e hipócrita — disse e passei a mão no
peito. — Eu tenho uma filha, uma esposa, uma mãe, uma irmã. Vocês
também devem ter, mas é mais fácil fechar os olhos e fingir que nada
aconteceu — falei, voltando até a minha mesa, peguei alguns arquivos e
caminhei até o Meritíssimo excelentíssimo juiz. — Aqui está o que o senhor
precisa — declarei, entregando o envelope a ele.
Sentei-me ao lado da Sula apertando sua mão.
Uma hora depois o juiz retornou e me olhou nos olhos quando
pronunciou a sentença. Assim que a escutei sorri pela vitória da Sula.
Esta vitória não era só dela, era de todas as mulheres.
Então ele olhou para a Sula que chorava ao meu lado e disse:

— Peço perdão. — Ao falar isso ele bateu o martelo e encerrou a


audiência.
— Obrigada, senhor Boltoni — agradeceu Sula entre lágrimas. —
Muito obrigada.
— Não me agradeça, por favor — disse sorrindo. — O mérito é todo
seu por não se calar... Muitas mulheres irão lutar por igualdade, igual a
você... Vocês, mulheres fortes, sempre terão meu apoio para lutar ao lado de
vocês... Vocês merecem respeito.
— Dante, foi uma honra conhecê-lo! — exclamou, e sorri.
— A honra é minha em conhecê-la — falei sorrindo. — Vamos
encarar as feras ao lado de fora? — perguntei, guindo-a para fora.
Na saída fomos cercados por jornalistas.
— SENHOR BOLTONI ME DIGA COMO SE SENTE POR
CONSEGUIR ESTA VITÓRIA? — perguntou um homem gritando.
— Eu não consegui essa vitória, ela conseguiu. Todo o mérito vai
para Sula Fernandes. Ela que lutou por seus direitos, foi ela que não se
calou, assim como nenhuma mulher deve se calar. Aplaudam a ela e não a
mim. Sejamos justos, eu só fiz o meu trabalho. Agora peço licença para
poder me retirar — disse, e eles abriram caminho.
— Senhor Boltoni? — chamou um homem parando diante de mim,
meus seguranças foram tomar à frente, mas os parei.

— Sim?
— Sua esposa assim como dona Sula Fernandes foi estuprada, ela
mesma disse isso em rede nacional, mas ela sofreu por tantos e por tantos
anos, me pergunto onde o senhor estava em todos os anos que ela sofreu?
Senti um chicote acertar minhas costas e uma faca invadir meu
coração.

Olhei dentro dos olhos dele e um filme do primeiro dia que conheci a
Anny passou pela minha cabeça. Eu era jovem e para mim só em vê-la me
deixava extasiado. Era alienado em relação à sua dor, foi um erro meu, mas
não era um fardo de culpa que eu tinha que carregar.
— Em alguns desses anos eu passei ao lado dela, e inclusive
namoramos, mas eu não sabia. Apenas sabia que ela se mutilava e com isso
tentei ajudar e conversar, mas ela não se abria e eu talvez fosse cego demais
para perceber o que se passava com ela. Nada é tão simples quanto
imaginamos, às vezes, não sempre, abrimos os olhos para o desconhecido e
fechamos para os conhecidos por ser mais fácil, mais prático, menos
dolorido e tudo bem. Ninguém é perfeito.
— O senhor se culpa pelo que sua esposa passou?
— Por um tempo me senti culpado, mas percebi que não tinha culpa
alguma da maldade humana, assim como ela e como todas as mulheres que
passam por isso não tem — disse e sorri de leve. — A vida é um mar e não
é de rosas, aliás, se fosse não só haveria beleza porque até as rosas mais
belas possuem espinhos e ao mergulhar na imensidão da sua beleza se
cortará todo — falei, e ele me olhou atento. — Temos que aceitar as
singularidades da vida e lidar com as consequências que ela traz... Algumas
lástimas valem a recompensa no fim.
— Como se sente após vencer esta grande causa?

— Esta causa ganha é mérito de todas as mulheres — respondi com


simplicidade. — Não pode se calar, é preciso que denunciem, mulher
nenhuma tem que se intimidar, são elas que devem intimidar os homens
machistas e hipócritas de merda — disse e abri um largo sorriso. — Hoje
foi só mais uma causa ganha entre tantas perdidas, mas podemos fazer de
hoje um exemplo de que vale sim a pena lutar! — exclamei e sorri ainda
mais. — Eles não podem e nem devem calar uma mulher.
Justiça é que o gritarei até meus últimos dias.
Dizendo isto me afastei e caminhei até o carro que me aguardava.
Entrei nele pedindo ao motorista para mudar o destino, não queria ir até a
festa surpresa da Sula. Desejava ir a outro lugar, um lugar onde eu pudesse
desabafar um pouco comigo mesmo.
— Por favor, encoste o carro e vá no outro. Guiarei de agora em
diante e irei seguir sozinho — disse, e o motorista fez o que pedi.
Desci do banco traseiro e assumi a direção, ao dar partida no carro
suspirei de alívio e saí do acostamento rumo ao meu destino. Sentia falta de
Boston, da minha casa e do meu lar. O Rio de Janeiro por um tempo foi
minha casa, mas agora era só um lugar onde vinha quando precisava.
Dirigi mantendo atenção na estrada e graças a Deus o trânsito não se
encontrava lento.
Ao chegar ao meu famoso penhasco da discórdia onde tentei tirar a
minha vida, suspirei ao sentir a maresia sobre mim. Este vento forte de final
de tarde e o sol se pondo era algo lindo, me surpreendia quase ninguém vir
aqui.
— Obrigado! — agradeci para o ar. — Obrigado por todo este tempo
cuidar de mim e me guiar. Eu quase me perdi ao mergulhar neste imenso
mar, mas graças ao carinha lá de cima eu não me perdi. A vida é difícil, até
mais do que eu possa imaginar e te digo que estou cansado, muito cansado
de lutar, faço de você meu dicionário aberto, porque dá muito trabalho
escrever um e aqui as palavras ficaram ao vento e em mim. Hoje venci uma
causa entre tantas outras que já venci, mas esta foi diferente... Foi pela
Anny.

Eu não pude ir ao júri defender a Anny, mas lutaria por cada mulher,
por cada vítima.
— Estou lutando tanto, mas tanto que me pergunto se conseguirei me
manter em pé por mais algum tempo. Eu nunca reclamei das minhas dores
ou das minhas lutas e agora preciso de uma perene estadia de paz, mas
dentro de mim mesmo.
Caminhei para mais perto da beira e admirei as ondas indo de quebra
as rochas.
— Me sinto agitado como o mar, entretanto, leve como a brisa da
manhã... Uma louca confusão de sentimentos... Que ironia, Ettore, pare de
tentar lutar contra a correnteza e deixe que ela te guie entre as águas
tranquilas. Ninguém disse que a vida seria fácil e por toda a vida não
precisa haver somente pedras no caminho...
Suspirei e me sentei no chão.
Puta merda!
Estava de terno e gravata sentado no chão, isto estava uma vergonha!
Fiquei um tempo sentado perdido olhando para o céu escurecendo e
para as ondas oscilando. Se até o mar se acalma e se agita, por que eu não
posso?
— Isto é algo que se vê todos os dias, o poderoso Dante Boltoni
jogado no chão na beira de um penhasco! — Ouvi meu pai dizer e não me
virei para olhá-lo. — Está tudo bem, filho? — perguntou, agachando-se
atrás de mim, colocando as mãos sobre meus ombros.
— Estou feliz pela causa ganha.
— Eu perguntei se está bem? — insistiu e se sentou ao meu lado. —
Deite a cabeça um pouco no meu colo, filho.
Suspirei pesadamente.
— Até você precisa de um pouco de carinho e de colo. Só se deite um
pouco aqui nas pernas deste velho, me deixe cuidar um pouco de você.

Fiz o que ele pediu e quando deitei minha cabeça em seu colo me
senti como uma criança desprovida de brandura. Fechei meus olhos,
sentindo suas mãos alisarem meu cabelo com delicadeza, o que me fez
sentir protegido do mundo...
Sentia-me em uma zona de conforto, era como se eu tivesse achado o
meu refúgio.
Alguns dias depois da audiência
Andei pelo corredor todo branco, o qual eu mesma já fiz mais de uma
vez, mas a situação era diferente e as coordenadas também. Hoje eu era a
visitante e aqui sabia que ninguém passava pelo que passei ao ser internada
em uma clínica psiquiátrica.
Hoje vim visitar quem tanto me fez mal, até antes mesmo de conhecê-
lo.
Que ironia da vida!
Um irmão mais velho que me odiava por achar que vivi uma vida
melhor do que a dele, mas algo me dizia que a vida dele também não foi
fácil.
Acho que tivemos o azar de nascer do ventre de uma mulher sem
amor no peito.
Parei diante da porta branca que faria com que pela primeira vez
ficasse cara a cara e sozinha com meu irmão, se é que podia chamá-lo de
irmão. Abri a porta e ao adentrar o vi sentado de frente para a janela
olhando o céu. Ele não se virou para me olhar nem nada do tipo, era como
se ele estivesse parado no tempo. Olhei para o outro lado e vi um dos
enfermeiros ali em pé, é claro, que Dante garantiria minha segurança. Meu
marido não se encontrava na sua melhor fase, ele tinha ultimamente ficado
mais com as crianças e bem largado até, inclusive, seu cabelo estava maior
e sua barba nem se fala, mas havia um certo alívio em seus olhos e menos
tensão sobre seus ombros. Definitivamente ele precisava relaxar um pouco.
Estava trabalhando e confesso que estava amando, era algo que vinha
me fazendo muito bem e estava me descobrindo cada dia mais.

Caminhei para mais perto do André, mas parei a alguns passos de


distância, não por medo, mas por respeito ao seu espaço pessoal. Eu sabia o
quão ruim era ficar aqui e sabia que pior ainda era a grade que era imposta
sobre a nossa própria mente.
— Irmã caçula, você por aqui... — disse ainda olhando para fora.
— Não se preocupe, não vim na intenção de incomodar nem nada do
tipo, por mais que eu ache que minha presença seja um grande incômodo
para você — disse e suspirei. — A vida de nenhum dos filhos da Júlia
Maria foi fácil, cada um de nós carrega as marcas desta mulher que nunca
foi mãe. Não pense que fui amada por ela, porque fui ferida a ferro e fogo e
ela não teve dó alguma. Não precisa falar comigo, não precisa olhar na
minha cara nem nada. Só saiba que tem meu perdão mesmo sem pedi-lo...
A vida é cruel demais para que carregue um fardo de raiva e culpa dentro de
mim, eu já chorei, me culpei e me perguntei por várias noites seguidas que
mal havia feito para vocês, mas cheguei à conclusão de que nada fiz e que
sou inocente. Então, por favor pare de me culpar por algo que nenhum de
nós tem culpa. Aceite seu tratamento e busque sempre o melhor para si...
Não se tranque dentro de si mesmo, sua vida pode recomeçar a partir daqui
ou você pode se prender... A escolha é somente sua — falei e me virei para
sair já que não haveria diálogo entre nós dois.
— Nem todos temos um herói para pedir resgate — disse, se
referindo ao Dante, mas parei e sorri. — Sabe, nossa mãe me manteve
escondido por todos esses anos sendo torturado por ela mesma, e acredite
quando digo que só eu sei como era. Passei parte da minha vida em uma
fazenda escondido e outra parte em lugares escuros por aí. Você ficava em
um quarto macio com ar-condicionado, enquanto ficava no inferno — falou
sorrindo. — Agora, vive no paraíso com seu marido e herói perfeito.

— Sim, ele me resgatou das grandes ondas, mas fui eu que me libertei
das minhas prisões — respondi, e ele olhou para mim. — Esta prisão —
apontei para a minha cabeça —, fui eu que me libertei, porque somente sou
eu que a vejo e sabe como se soltar. Demorei anos para achar a chave e
abrir a cela que havia bem lá no fundo... Fui eu mesma que me coloquei
dentro dela por ter medo, vergonha e nojo de mim mesma, mas quando
percebi que eu também era um raio de sol, entendi que poderia e deveria
sair da escuridão que tanto me aprisionei. Fui minha heroína! Dante me
salvou de todo o mal que me cercava, mas a última prisão... A última grade
somente eu poderia me livrar — expliquei e sorri para ele. — Esta é a pior
de todas, mas saiba que é possível se livrar dela, basta aceitar e
compreender.
Falando isto me virei e saí com a consciência bem mais leve e
tranquila. Todos precisamos de um perene momento de paz. Todos
precisamos buscar refúgio na tempestade, mas o que muitas vezes não
compreendemos era que a prisão se encontrava dentro de nós mesmos. Era
preciso aceitá-la e depois caçar a chave da fechadura para enfim abrir e sair.
Eu saí de vez das minhas prisões quando me abri sobre o que havia
além de mim...
Eu me tornei livre!

Observei com atenção as crianças olharem os peixes com admiração.


O aquário aqui do Rio, um dos maiores da América Latina concentrando
uma grande diversidade de peixes e espécies marítimas. As crianças
estavam se divertindo mais do que eu poderia imaginar. Pietro olhava tudo
atentamente, Bruna se mantinha em silêncio e Nicholas lia o que se dizia
sobre fosse lá o que ele estivesse vendo. É engraçado ver que mesmo sendo
trigêmeos, cada um possuía uma interação diferente e um gênio bem oposto
um do outro. Bruna parecia contente por doar o cabelo para as crianças,
Pietro falou que gostaria de fazer algo parecido, mas lhe disse que ele pode
ir divertir as crianças e contar histórias para elas. Nicholas se manteve
neutro, o que para mim era algo bem estranho, mas acredito que ele devia
estar planejando algo.
— PAPAI! — gritou Bruna feito louca. — AQUELE É UM
TUBARÃO! EU QUERO NADAR COM TUBARÃO!
Dizendo isto ela saiu correndo e se grudou no vidro, olhando o grande
peixe que nem dava ideia para quem tanto o admirava.
— Não acho que você tenha idade para nadar com eles, filha — disse
ao me aproximar.
— Poxa, papai, quero tanto — disse fazendo um bico enorme.
— Um dia, Bruna... Um dia.
— Um dia pode demorar muito — resmungou.
— Paciência, irmã! Nossos irmãozinhos ainda vão nascer! — Pietro
disse.

— Vai vir duas meninas! — respondeu Bruna.


Deus me livre!
Nada de duas meninas, uma só já quase me matava e não saberia lidar
com mais duas...

Eu realmente não saberia lidar!

Dias depois
Nosso penúltimo dia no Rio estava sendo cheio de comemorações,
ver minha mãe e a Anny se dando bem, era muito mais do que eu poderia
pedir. Assim como ver Eduardo aqui conosco me deixava extremamente
feliz, na verdade, vê-lo mais feliz me deixava contente. Ele era uma pessoa
recheada de traumas, mas aos poucos estava encontrando sua própria luz.
Olhei para meus filhos correndo no jardim dos meus pais e isto fez
com que eu percebesse o quão sortudo era por ter mais do que eu poderia
pedir ou imaginar. Estava sim em uma fase bem reclusa onde queria cuidar
de mim mesmo e nestes últimos dias vinha recuperando minha força. A
presença da minha família vinha me ajudando muito. É claro que a Anny e
as crianças eram minha maior origem de força, mas passei muito tempo
afastado daqueles que me deram a vida e me criaram. Tivemos nossos
impasses, mas família é família e pai e mãe eram apenas um.
Minha mãe e meu pai erraram feio, mas quando se havia perdão e
gratidão tudo ficava mais leve e fácil de se viver.

As pessoas me chamavam de super-herói, de todo poderoso e homem


trilionário, talvez eu fosse alguma destas coisas que tanto me chamavam,
mas bem lá no fundo ainda era um menino sonhador que sonhava com um
mundo melhor. Todos os dias renovava este sonho em mim e não me
importava quantas guerras eu tivesse que declarar para manter este sonho
vivo. Sabia que muitas batalhas perderia, mas estava bom. Eram dias de
glória e dias de derrota que fazia com que a vida fosse tão maravilhosa e
perfeita. Sabe o que me deixava mais feliz era saber que comecei o ano em
guerra, mas que iria terminá-lo em paz. Na verdade, já estava sentindo esta
paz sobre mim.
— Tudo bem? — perguntou Anny, aproximando-se de mim.
Ela era linda, perfeita, maravilhosa e melhor ainda totalmente minha!
Porém, melhor do que ser minha era ela ser dela mesma e ainda ser
forte e capaz de enfrentar a própria escuridão. Anny era sua própria força e
possuía uma luz que de longe se via.
— Está tudo mais do que bem, está tudo perfeito.
Ela sorriu e me abraçou.
Havia vozes em minha cabeça que muitas vezes diziam que tudo que
sonhei iria por água abaixo, mas quando observava tudo que pude
conquistar percebia o quão errada estas vozes estavam. Não podia mudar o
mundo, mas ao mudar a vida de alguém estava mudando um mundo.
Foi isto que a Anny fez e iria continuar fazendo.
Ela criou uma rebelião que buscava justiça e isto era algo grandioso
que me deixava cheio de orgulho. Ela cresceu, amadureceu, lutou, caiu e
agora se levantou e venceu a si mesma.
Esta mulher me excitava e me deixava louco cada segundo mais...

Se o meu “eu” criança soubesse o que sabia hoje a teria segurado com
ainda mais força, mas o que ele não pôde fazer eu fazia agora. Eu por um
tempo a protegi do mundo, mas agora o mundo precisava se proteger da sua
força e senso de justiça.
Minha avó tinha razão, mas cometeu um pequeno engano, um
pequeno e relevante engano. Não teria paz quando todos levantarem a
mesma bandeira que eu, teria paz no momento em que compreendesse que
eu era a minha própria paz, e hoje compreendia isso perfeitamente.
Eu era a minha paz...

Era minha própria calmaria, e, sinceramente, estava tudo bem se


ninguém levantasse a minha poderosa bandeira.
Se as ondas do mar vierem difíceis, okay.
Era só me lembrar que tudo passava, bastava dar tempo ao tempo.

— Dante, tudo vai dar certo — disse Anny. — A tempestade já


cessou...
—Tempestades sempre irão surgir, meu amor, mas a forma como
lidamos com elas é que irá mudar tudo — disse, beijando seus lábios de
leve. — Nossa casa é construída sobre rocha, nosso amor é feito da mais
pura compaixão e nós renascemos da dor. A vida sempre irá fazer com que
tracemos novas batalhas, sempre haverá um vendaval vindo contra nós, mas
tudo bem. Somos fênix, quanto mais nos matam, mais renascemos e mais
forte ficamos. Somos a chama da vida... Do recomeço...
Eu não imaginei em momento algum da minha vida tendo que vir
visitar minha não tão amada sogra na cadeia. Minha vida estava
perfeitamente bem, mas nem sempre o que era perfeito durava para sempre.
Construímos “o para sempre” com bons momentos, deixando-os guardados
nas nossas memórias para que em dias ruins pudéssemos usá-las como
ótimas lembranças.
Aprendi na marra com as surras da vida que era preciso chorar para
sorrir e que era preciso sambar na tempestade para poder ver o sol. Era
necessário cair para poder se levantar e era preciso se amar para poder dar e
receber amor.
Aprendi que era mais do que aceitável o choro durar mais de uma
noite, estava aprendendo que ser pai era cometer erros diariamente e nunca
ter certeza dos acertos, mas estavam bem com meus erros.
Lá na frente saberia se acertei ou não, mas por agora me manteria em
paz.
Suspirei ao ver minha detestável sogra sorrindo para mim. Júlia Maria
se encontrava algemada e sentada em uma cadeira de ferro.
A sala em que ela se encontrava estava desnecessariamente fria.
Entrei, fechando a porta atrás de mim e caminhei até a cadeira que se
encontrava em frente a ela. Vi uma vaidosa mulher destruída pela sua
própria vaidade. Júlia Maria era uma linda mulher, mas o desejo de poder a
destruiu por completo, poderia listar todas as coisas que ela fez para se
autodestruir, entretanto, preferia me calar.
Era trabalhoso demais listar algo tão grande...
— Vejo que meu genro resolveu vir visitar a sogra!
— Não fique feliz, não vim por você... — disse, sentando-me na
cadeira metálica. — Por que me chamou aqui, Júlia Maria?
— Não posso querer ver meu genro?
— Não vim aqui fazer joguinhos... Vamos direto ao assunto, pois não
tenho tempo a perder por algo tão banal.
— Preciso de ajuda. Estou sendo muito maltratada aqui e gostaria que
me desse uma área vip.
Gargalhei em alto e bom som até que lágrimas escorreram dos meus
olhos.
Que hilária esta mulher é, hein? Por essa eu não esperava!

— Acho que está pedindo para a pessoa errada, senhora Júlia Maria
— disse, olhando em seus olhos. — De forma alguma eu a ajudaria... A
senhora está apenas colhendo o que plantou.
— Dante, meu querido, eles me batem, inclusive me molestam! —
falou chorosa.
— Se fazem tais atos recomendo que denuncie ao diretor do presídio
— aconselhei.
— Sabe que não vai adiantar nada. Por favor, eu imploro. Me ajude
— pediu, olhando-me com os olhos marejados.

Que idiotice esta mulher estava cometendo? O que a fazia acreditar


que eu acreditaria nesta mentira mais deslavada do que as contas bancárias
dos políticos corruptos? Júlia Maria arrumou briga com a esposa de um
traficante bem poderoso e a mulher a ameaçou de morte. Eu poderia
interferir, mas aqui se faz, aqui se paga.
Não estava querendo ser uma pessoa ruim e muito menos desejava
mal a alguém, mas Júlia Maria cavou a própria cova quando achou que
tinha peito para bater de frente com uma traficante.
— Não posso ajudá-la — falei, passando a mão por minha barba.

— É aquela putinha que não quer que me ajude, né? — perguntou


com o rosto vermelho de raiva.
— Primeiramente lave sua boca para falar da minha esposa — disse
sério.
— O que foi, ela não tem feito o trabalho direto? Se ela não está
fazendo, eu posso fazer! — insinuou-se.

Nojo! Sentia cada dia mais nojo desta mulher que estava à minha
frente.
— Se eu gostasse de uma meretriz, não estaria casado com a mulher
mais incrível deste mundo todo.
— A mulher que já foi comida por metade dos enfermeiros da clínica
psiquiátrica em que estava.
— Basta!
— Uma vagabunda mais aberta que...

— EU DISSE BASTA! — gritei, ficando de pé. — A única


vagabunda que estou vendo na minha frente é você. Não se cansa de fazer
maldade? Sabe eu poderia ficar horas te xingando de tudo que é nome, mas
você não merece nem minhas palavras de revolta. Olhe para você, está
sozinha e sem ninguém. Aposto todas as minhas fichas que existe um vazio
dentro de você que de forma alguma vá conseguir preencher um dia... Já
olhou à sua volta? Quantas pessoas já vieram te visitar? Apenas Anny e
eu... A filha que você tanto detesta, é a única que de alguma forma ainda se
importa com você. Pare de se achar melhor que os outros... Você humilha as
pessoas para se sentir melhor e olha só continua da mesma forma. É
perceptível o quanto você sente inveja da própria filha, você poderia ter tido
até uma vida de rainha, mas optou e ainda opta pelo caminho errado. Suas
escolhas e ações a trouxeram para onde se encontra. É ruim ter que beber do
próprio veneno. A senhora irá morrer sozinha, velha e acabada dentro do
próprio círculo de horrores que construiu... Bom dia! — disse e me levantei
saindo da sala fria, mas não tão fria quanto à mulher que se encontrava
dentro dela.

Suspirei feliz ao ver Anny brincando com as crianças no lago. Ela


forrou o chão com uma grande toalha quadriculada de piquenique e havia
uma cesta enorme repleta de guloseimas. Meus filhos corriam para lá e para
cá com os cachorros que pareciam nunca se cansar de latir e correr. Bruna e
Pietro estavam mais do que alegres, já Nicholas, bem, ele era um caso à
parte. Meu pequeno era mais contido, falava pouco e observava muito, o
que era bom. Ouso dizer que ele era calculista até demais para uma criança.
Nicholas seguiria passos diferentes dos irmãos e isso eu já previa, só
esperava que o caminho que ele escolhesse fosse melhor do que o meu.

Anny se encontrava sentada na toalha com nossos caçulas, ela estava


amamentando Matteo, enquanto Noah estava deitado mexendo suas
perninhas ao lado da mãe. Eles vieram ao mundo extremamente saudáveis e
chorões, Matteo era um menino emburrado por natureza, já Noah era
sorridente, carinhoso e meigo, meu menino sorriso.
O bom era que eles dormiam a noite toda mesmo sendo tão novos.
Sorri com a cena diante de meus olhos. Quem diria hein, Dante?
Quem diria que hoje você seria o homem mais do que realizado? Fiquei um
tempo admirando a cena bem diante dos meus olhos, inclusive, tinha
vontade de chorar de felicidade.
Porra!
Ia bater no peito e gritar: CONSEGUI A FELICIDADE QUE
TANTO BUSQUEI!
Se minha morte viesse, morreria sabendo que vivi tudo que sonhei e
um pouco mais. Caminhei até minha linda esposa que se encontrava sentada
com Matteo no colo enquanto Noah estava de barriga para baixo na grande
toalha xadrez.
Criança travessa!
— Que bebês mais lindos, meu Deus! — disse, beijando o rostinho do
Matteo enquanto pegava Noah. — Sorri para o papai, filho.
Nada...
Ele não sorria nem a pau, já Noah vivia rindo sem parar.

Gêmeos não idênticos e com personalidades completamente


diferentes uma da outra. Era algo comum em meus filhos.
— Oh fala para o papai que já está na hora do soninho gostoso da
tarde! — Anny disse sorrindo, enquanto ninava o pequeno até ele dormir.
Fiz o mesmo com o risonho que logo dormiu, o deitei com cuidado na
toalha para que pudesse dormir em paz e dei um beijo na boca da Anny
rápido. Admirei um pouco os dois pequenos de cabelo castanho-claro
dormindo serenamente.

Cinco filhos é o meu limite!


— Como foi lá? — perguntou, sentando-se no meu colo.
— Foi desnecessário... Ela queria o que já sabemos.

— Algumas pessoas nunca mudam, né? — indagou sorrindo triste.


— Amor, não vamos pensar nisso. Vamos continuar vivendo um dia
após o outro. Temos que nos concentrar em nós, nada mais do que nós!
— Você está certo, mas ainda desejo de todo o meu coração que ela
seja uma mulher melhor para o bem dela. — Suspirou. — É minha mãe,
sabe? Quando segurei nossos filhos pela primeira vez, algo em mim mudou
e um sentimento bom surgiu dentro de mim.
Beijei seus lábios para calá-la.
Este assunto sempre a deixava triste, por isso evitava o máximo
possível.
Anny merecia sorrir o tempo todo...
Ela merecia o mais belo arco-íris do céu...
Ela merecia o amor!

Fazia questão de todos os dias lhe dizer de todas as formas o quanto a


amava.
Anny é uma fênix!

Horas depois a casa ficou em silêncio...


Anny dormia com Bruna e Pietro agarrados a ela, os bebês dormiam
no berço e sentia que faltava um aqui neste quarto.

Olhei no banheiro e nada, já imaginava onde ele podia estar.


Encontrei Nicholas deitado na grama à beira do lago olhando as
estrelas. O pequeno possuía a mesma mania que eu tinha quando mais
novo, e me sentei ao seu lado.
— O céu hoje está estrelado — disse, quebrando o silêncio.

— Sim, está. Dá até para dançar entre as estrelas! — comentou,


olhando o céu.
— Se quiser danço com você! — falei ganhando sua atenção.
— Não sei dançar, pai — rebateu, fazendo-me rir.

— Me diga por que choras? — perguntei, analisando seu rosto


banhado de lágrimas.
— Porque meu coração dói! — disse quase gritando. — Meu coração
dói, pai... Dói por motivos que desconheço. Estou me sentindo assim desde
hoje de manhã quando vi que uma menina foi morta pelo pai por motivos
que desconheço.
— Vai doer por um tempo... Vai doer por um bom tempo até você
aprender a controlar este sentimento de compaixão ao próximo. Quando eu
era criança me sentia igual a você impotente. Queria poder ajudar o mundo,
mas não podia... Sabe, filho, a nossa empresa tem vários projetos de ONGs
para ajudar as pessoas. Amanhã o levarei a uma das nossas instituições e
você verá quanto o projeto é lindo e um dia você irá cuidar de uma destas
instituições, mas até lá seja forte — falei, sequei suas lágrimas, aproximei-
me e depositei um beijo em sua testa. Ele olhou para mim com expectativa.
— O mundo é cruel, Nicholas, mas são nossas escolhas, atitudes e atos que
vão fazer dele melhor ou pior. Não tenha medo desta maldade descabida,
seja você a bondade motivadora.
— Quando crescer desejo ser alguém tão bom quanto o senhor —
afirmou, abraçando-me.
— Não deseje ser tão bom quanto eu, deseje ser tão bom quanto você.
Se supere todos os dias e busque mais de si... Seja alguém melhor, não por
alguém, mas por si próprio... Se ame para poder amar o mundo... Seja você
a esperança do mundo. Seja sua própria luz. Seja abrigo. Seja a paz que
tanto deseja e lembre-se sempre que não há luz sem trevas, por isso pondere
o bem e o mal na sua vida!
Ele não disse nada, apenas veio e deitou a cabeça no meu peito.

No futuro ele iria sofrer por tamanha bondade que havia no seu
coração.
Talvez ele perdesse a cabeça e tomasse decisões ruins...
Talvez ele se revoltasse com a vida...

Ou só talvez ele conseguisse se manter em pé.

Júlia Maria, mãe de Anny morreu vinte e nove dias depois da minha
visita. Morreu em uma tentativa falha de fuga com outras presidiárias. Não
houve enterro nem nada e Anny jogou no mar uma rosa por ela, apenas isto
e nada a mais.
Aprendi com Júlia Maria através dos seus erros, que devia amar meus
filhos mais do que tudo nesta vida e que nada nesta vida passava
despercebido por Deus.
O ditado popular se cumpriu, “aqui se faz, aqui se paga”.
Hoje com cinco filhos não conseguia compreender o que fazia um pai
e uma mãe abandonar seus filhos. Não sabia o que os faziam maltratar e
matar seus reflexos, pois filhos eram nossos reflexos.
Juro pelo que acho mais sagrado que não entendo...
Depois de ficar horas, dias e meses buscando explicações, não as
encontrei e acabei desistindo. Aceito o fato de que há uma diferença entre
ser pai e mãe e ser PAI E MÃE.

Encarei o céu estrelado tendo certeza de que tudo ia para o seu devido
lugar.
Hoje estava no meu devido lugar e era muito grato por ter feito
escolhas que me levaram a tudo que tinha hoje. Não desejava a ninguém
menos do que eu merecia ou tinha...
Desejava a todos a felicidade, paz e amor!
Queria que todos fossem como Anny e eu...
Uma fênix!

FIM.
ANOS DEPOIS...
— O que vamos fazer, Dante? — Anny perguntou entre lágrimas. —
Como deixamos chegar a este ponto?
Anny não aceitava o fato de que nosso filho estava indo seguir o
próprio caminho. Gostaria de ter todas as respostas que ela desejava, mas
infelizmente não as possuía. Optamos por ter apenas cinco filhos, desejei
muito tentar mais uma menina após o nascimento de Matteo e Noah,
entretanto, o destino já estava traçado e por isso tivemos apenas Bruna que
era a menina dos meus olhos.
— Não deixamos, meu amor. Ele tomou as próprias decisões, cabe a
nós agora assistir onde esse caminho o levará. Se preciso for, uma hora
iremos ter que interferir, mas por agora vamos ficar em paz.

Não podíamos interferir nos caminhos que nossos filhos tomavam,


podíamos apenas aconselhar a seguirem um caminho melhor. Meu coração
doía em saber o quanto ele ia apanhar da vida, mas não havia nada que eu
pudesse fazer neste momento.
Anny saiu, me deixando na sala sozinho, aguardando nosso filho para
me despedir dele antes de ir para o aeroporto.
— Não quero fazê-la chorar, mas desejo seguir meu caminho —
disse, descendo a escada de vidro.

— Uma mãe e um pai sempre irão chorar pelos seus filhos, seja de
felicidade ou de tristeza. Sua mãe apenas tem medo do mundo lá fora, mas
você precisa enfrentá-lo e por este motivo. Por esta razão deixarei que vá —
falei, olhando em seus olhos. — Tenho orgulho de você e não se deixe
abalar tanto pelas tempestades. Seja você a rocha que tanto deseja.
— Um dia serei metade do homem que você é, meu pai. Peço sua
benção para seguir meu caminho.
— Deus te abençoe! — exclamei.

Assim ele se foi. Sabia que ainda teria bastante dor de cabeça, mas
não iria interferir nas suas escolhas. Meu filho foi ferido pela vida de uma
forma brutal e cada um reage de uma forma as suas dores.
Ele por exemplo estava se rebelando com o mundo e o que ele não
sabia é que o mundo já era naturalmente rebelde!

A estória de Nicholas Boltoni só começou...


Quero agradecer a cada leitor que me incentivou a continuar a
escrever, mesmo quando eu queria parar. A cada leitor que me ameaçou a
terminar essa estória. Concluir amor de fênix foi algo muito difícil, mas
consegui por vocês e por mim. Escrevi cada página com calma e
sinceridade.
Muito obrigada!
Quero agradecer meu padrasto por me ajudar e aceitar algumas das
minhas loucuras, quero agradecer a minha irmã, Tânia, por me ouvir falar
sem parar e sempre bagunçar as coisas. Bruna, muito obrigada por me
aturar mais do que eu mereça, você sempre me dá um empurrão seja no
estudo ou nos livros. E, mãe, muito obrigada por me amar mais do que eu
poderia imaginar, não há família perfeita, mas vocês são maravilhosos e
perfeitos para mim.
Muito obrigada por me amarem...
Amo vocês até depois do fim.
Enfim, posso dizer que concluí um dos meus maiores sonhos, Dante e
Anny chegaram ao final de um começo.
Obrigada a todos vocês.
Com amor, Thamy.
[1]
Que é eterno, perpétuo.
[2]
Que tem rapidez; rápido, ligeiro, veloz.
[3]
Disposição habitual para corresponder aos desejos ou gostos de outrem com a intenção de ser-lhe
agradável.
[4]
Qualidade ou virtude do que é benigno.
[5]
Que é muito grande em tamanho, quantidade, extensão, alcance; amplo.
[6]
É uma declaração aparentemente verdadeira que leva a uma contradição lógica, ou a uma situação
que contradiz a intuição comum. Em termos simples, um paradoxo é "o oposto do que alguém pensa
ser a verdade
[7]
Disposição habitual para corresponder aos desejos ou gostos de outrem com a intenção de ser-lhe
agradável.
[8]
Que se conseguiu compadecer; que sentiu compaixão por uma outra pessoa; que demonstra
compadecimento.
[9]
Distúrbio associado a alterações de humor que vão da depressão a episódios de obsessão.
[10]
É um estado psicológico em que a pessoa submetida a intimidação, medo, tensão e até mesmo
agressões, passa a ter empatia e sentimento de amor e amizade por seu agressor.
[11]
O transtorno de personalidade borderline é caracterizado por um padrão generalizado de
instabilidade e hipersensibilidade nos relacionamentos interpessoais, instabilidade na autoimagem,
flutuações extremas de humor e impulsividade
[12]
Atraentes, cativantes, fascinantes, sedutores.

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