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E-BOOK – DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES

TEMA: DIVÓRCIO UNILATERAL

Introdução

Com relação ao divórcio, sua a previsão está na Constituição Federal, em seu


art. 226, § 6º, que recebeu nova redação pela Emenda Constitucional nº 66,
de 13.07.2010, sendo a seguinte: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo
divórcio”.

Anteriormente, a concessão do divórcio pressupunha a separação judicial por


mais de um ano, ou a comprovação da separação de fato por mais de dois
anos. A separação judicial era, pois, um degrau necessário, ou um estágio no
trajeto a ser percorrido entre o casamento e o divórcio.

Com a referida modificação, basta apenas a intenção de se divorciar, sem a


necessidade de se aguardar qualquer prazo.

Para Rolf Madaleno: “ De acordo com o artigo 1.581 do Código Civil é possível
decretar o divórcio judicial e extrajudicial, sem que haja a prévia partilha de
bens, cujo dispositivo foi ratificado pelo parágrafo único do artigo 731 do CPC.
Os divorciandos podem diferir a partilha de seus bens para depois da sentença
ou da escritura pública de dissolução de seu matrimônio. Depois da Emenda
Constitucional 66/2010, o divórcio direto pode ser concedido a qualquer tempo,
e igualmente dispensa a concomitante partilha dos bens conjugais, que
poderão ser divididos em outra fase processual ou por escritura pública”.1

Divórcio Unilateral

O divórcio assim dissolve o casamento, extinguindo o vínculo, tornando as


pessoas então casadas livres para contraírem novas núpcias, através do
processo da prévia habilitação.

As disposições existentes no Código Civil pertinentes ao divórcio permanecem


em vigor desde que não haja colidência com o § 6º do art. 226 da Carta
Magna, na versão da Emenda nº 66. Assim, não há mais que se aguardar
qualquer prazo para a ação de divórcio.

A Lei nº 11.441/2007 estabeleceu a possibilidade da realização do divórcio,


inventário e partilha de forma extrajudicial e diretamente no Tabelionato de
Notas.

A apontada Emenda Constitucional nº 66/2010 eliminou definitivamente os


prazos para a solicitação do divórcio e estabeleceu o direito potestativo ao
mesmo.

Podemos conceituar o divórcio unilateral ou impositivo como um ato de ruptura


conjugal efetuado por uma das partes sem o consentimento da outra, no qual
o solicitante pode efetuar o pedido a qualquer momento.

1
MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. 3º ed, Forense, 2021.
Dessa forma, é possível que seja realizado o divórcio unilateral com a
manifestação de vontade de apenas um dos cônjuges em se divorciar,
diretamente perante o Ofício de Registro Civil.

Maria Berenice Dias, ao comentar sobre o assunto, esclarece que, por se tratar
de um direito potestativo, “não é necessária a concordância do par para a sua
decretação. Basta haver o desejo de somente um dos cônjuges, que não
precisa justificar o pedido, para buscar o divórcio via ação judicial”2.

Para Flávio Tartuce, reconhecido o divórcio como um direito potestativo, “não


há como haver resistência da outra parte, que se encontra em estado de
sujeição”. A única opção do outro cônjuge é aceitar e sujeitar-se ao direito
daquele que deseja o divórcio”.3

O STJ assim decidiu:

Conforme vêm reconhecendo doutrina e jurisprudência, desde a alteração


constitucional, o divórcio passou a consubstanciar verdadeiro direito
potestativo de quaisquer dos cônjuges, passível de exercício de maneira
incondicionada, dependente, tão só, do querer íntimo dos consortes, ou de
atribuição do culpado pelo fim do relacionamento”.4

2
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 12. ed. Salvador: JusPodvim, 2021.
3 TARTUCE, Flávio. Direito civil. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. v. 5: Direito de família.
4 REsp. 1.782.820-MG. Relatora Ministra Nancy Andrighi. DJ de 07.05.2019.
Segue decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo – S.P de 2020:

DIVÓRCIO – Decretação antecipada por decisão parcial de mérito,


prosseguindo-se o feito em relação à controvertida partilha de bens –
Insurgência de um dos cônjuges, sob alegação de risco de prejuízo patrimonial
– Não acolhimento – término da sociedade conjugal incontroverso nos autos,
sendo o divórcio um direito potestativo do cônjuge – Aplicação do art. 356, I
do CPC – Possibilidade – Existência de meios próprios, que não a manutenção
do casamento, para garantir proteção patrimonial do cônjuge em relação aos
bens a serem partilhados – Decisão mantida, nos termos do art. 252 do
RITJSP – Recurso improvido5.

Dessa forma, tanto a nossa doutrina quanto a jurisprudência já reconhecem o


direito potestativo ao divórcio. Em uma relação em que não há mais afeto e
felicidade, é necessário que se permita o divórcio de uma forma mais célere e
menos burocrática.6

Divórcio Unilateral Extrajudicial

Considerando o movimento contemporâneo de desjudicialização, o Tribunal de


Justiça do Estado de Pernambuco, por meio de sua Corregedoria-Geral de
Justiça, editou o Provimento nº 6, de 26 de abril de 2019, de autoria do
Desembargador Jones Figueirêdo Alves, trazendo a possibilidade do divórcio
unilateral pela via extrajudicial.

5
Agravo de Instrumento nº 2190994-53.2020.8.26.000. Relator: Álvaro Passos, 2ª Câmara de
Direito Privado. Data da publicação: 23.09.2020.
6

ibdfam.org.br/artigos/1759/Divórcio+unilateral+extrajudicial#:~:text=Com%20o%20reconhecimento
%20do%20divórcio,devendo%20aceitar%20e%20respeitá-lo. Acesso em 28/03/2022.
Com tal provimento, os cônjuges poderiam comparecer ao Cartório de
Registro Civil para que fosse efetuado o divórcio extrajudicial.

Após a entrada em vigor do provimento pernambucano, o Corregedor Nacional


de Justiça, Ministro Humberto Martins instaurou Pedido de Providências
0003491-78.2019.2.00.0000 em desfavor da Corregedoria-Geral de Justiça do
Estado de Pernambuco, entendendo que haveria empecilhos ao mesmo.

Foi reconhecido que o divórcio unilateral não é um direito potestativo e que


não haveria consenso entre os cônjuges, mas sim um litígio, e por isso deveria
remetido ao Poder Judiciário e que a competência para legislar sobre direito
civil e direito processual civil é exclusiva da União, por meio de lei federal.
Logo, não poderia tal matéria ser tratada por meio de um provimento estadual.7

Ademais, a decisão não observou o princípio da isonomia, pois teria sido


criada uma forma de divórcio existente apenas no estado de Pernambuco.

Diante do exposto, foi determinado à Corregedoria-Geral de Justiça do Estado


de Pernambuco que revogasse o Provimento nº 6/2019, e o próprio Conselho
Nacional de Justiça editou a Recomendação nº 36, de 30.05.2019.

Projeto de lei no senado nº 3.457/2019

Após a decisão do Corregedor Nacional de Justiça proibindo o divórcio


unilateral nos Ofícios da Cidadania, um grupo de juristas, formado pelos
professores Flávio Tartuce, Mário Luiz Delgado, José Fernando Simão, além

7
Ibidem.
do próprio Desembargador Jones Figueirêdo Alves, resolveu propor ao
Senador Rodrigo Pacheco, atual Presidente do Senado Federal, um projeto
de lei tratando do divórcio unilateral.

O projeto visa acrescentar o art. 733-A ao Código de Processo Civil, buscando


assim afastar aqueles impedimentos apontados na decisão do Corregedor
Nacional de Justiça.8

A questão dos alimentos, guarda dos filhos e partilha dos bens serão
discutidos em momento posterior e não influenciarão o pedido.

A valorosa lição de José Fernando Simão e Mário Luiz Delgado esclarece que:
“o pedido de divórcio direto por averbação fica restrito, exclusivamente, à
dissolução do vínculo, sem possibilidade de cumulação de qualquer outra
providência. Outras questões, como alimentos, partilha de bens, medidas
protetivas etc., devem ser judicializadas e tratadas no juízo competente, porém
com a situação jurídica das partes já estabilizada e reconhecida como de
pessoas divorciadas. Ou seja, a averbação do divórcio não repercute em
nenhum outro direito patrimonial ou existencial. Só evita que a pessoa se veja
compelida a postular uma providência judicial que não tem qualquer outra
função senão a de dissolver o vínculo”. 9

8
Senado Federal : https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/137242
9https://www.conjur.com.br/2019-mai-19/processo-familiar-barrar-declaracao-unilateral-divorcio-
negar-natureza-coisas Acesso em 28/03/2022.
Comissão mista de desburocratização

Também foi criada uma Comissão Mista de Desburocratização, a qual possui


um projeto de lei que visa a permitir o divórcio extrajudicial quando o casal tiver
filhos menores, dependendo nesse caso de homologação do Ministério
Público.

Assim, sendo, a concessão do divórcio unilateral extrajudicial é algo


necessário e que visa a garantir a dignidade humana, o afeto e a autonomia
privada, reduzindo cada vez mais a interferência do estado na vida privada das
pessoas.

No item V, que trata da Flexibilização das Regras aplicáveis aos Serviços


Notariais e de Registro, especificamente quanto ao tema do divórcio, o projeto
de lei pretende admitir o divórcio extrajudicial ainda que o casal possua filhos
incapazes ou nascituro; no entanto, a eficácia quanto a eles, bem como quanto
à guarda, ao regime de vistas e ao valor da contribuição para criar e educar os
filhos, dependeria de homologação do Ministério Público.

Legislação:

CF – Art. 226

EC 66/2010

CC – Art. 1.581
CPC – Art. 731

Lei 11.4441/2001

Jurisprudência:

2198328-07.2021.8.26.0000
Classe/Assunto: Agravo de Instrumento / Dissolução
Relator(a): José Aparício Coelho Prado Neto
Comarca: São José do Rio Preto
Órgão julgador: 9ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 24/03/2022
Data de publicação: 24/03/2022
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO – Ação de Divórcio Litigioso - Decisão que indeferiu
a tutela antecipada para decretação do divórcio do casal - Inconformismo do autor,
alegando que o divórcio é um direito potestativo e incondicional, ou seja, depende da
vontade de uma das partes – Cabimento - Divórcio que é direito potestativo, sendo que a
partir da Emenda Constitucional nº 66/2010, não é mais necessária a discussão acerca da
culpa -Possibilidade, portanto, da concessão da tutela pleiteada para decretação do
divorcio, diante da desnecessidade de concordância da outra parte - Recurso provido.

2293413-20.2021.8.26.0000
Classe/Assunto: Agravo de Instrumento / Casamento
Relator(a): Alexandre Marcondes
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 22/02/2022
Data de publicação: 22/02/2022
Ementa: Agravo de instrumento. Ação de Divórcio c.c. partilha de bens, regulamentação
de guarda, alimentos e visitas. Decretação liminar do divórcio. Possibilidade (E.C. nº
66/2010). Direito potestativo da parte. Agravada que expressamente concordou com o
pedido de divórcio. Decisão reformada. Recurso provido.

BIBLIOGRAFIA
- DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 12. ed. Salvador:
Juspodvim, 2021.

- MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. 3º ed, Forense, 2021. Direito


de família.

- RIZZARDO, Arnaldo. Direitos de Família. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Forense,


2019.

- TARTUCE, Flávio. Direito civil. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. v. 5: -
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